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1718LCCLJC60b

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Género de textoEnsaio
ContextoLivre
DisciplinaLinguagem e Comunicação
ÁreaCiências Sociais e Humanas

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Representações de Género: as disparidades produzidas pelos Media

Abstract

O presente trabalho pretende estudar as disparidades de género que são reproduzidas pelos Media na atualidade, estudando o impacto dos meios de comunicação na posição da Mulher pelo modo como tem vindo a ser pelos mesmos retratada.

Este procura evidenciar a influência dos Media na construção de comportamentos e ideologias sociais, demarcando, através de estudos e gráficos, as consequências das ambíguas representações de género com que os indivíduos são diariamente abalados. Demonstra, ainda, os principais impedimentos a uma transmissão do conceito de género atual, dando a conhecer as diversas carências que os meios de comunicação enfrentam e que constituem um obstáculo na representação igualitária de género.

Através do mesmo é possível concluir que os Media funcionam como fortes modeladores das identidades colectivas, cujas mensagens, mass-mediatizadas, enraizadas em tradições e velhos estereótipos, resultam numa sociedade díspar onde as Mulheres são continuamente afetadas. A noção de equidade encara, deste modo, severos impedimentos decorrentes das necessidades sofridas pelos meios de comunicação.

Palavras-chave: Ciências da Comunicação ? Meios de Comunicação ? Disparidades de género ? impacto dos meios de comunicação na posição da Mulher ? Obstáculos à representação igualitária de género

  1. Introdução

Este trabalho foi-me proposto pela professora doutora Joana Vieira Santos, no âmbito da unidade curricular de Linguagem e Comunicação, lecionada pela mesma.

A evolução dos vínculos virtuais de uma sociedade cada vez mais interligada por redes de comunicação origem a questões que se prendem com o conflito constante entre a dependência face aos meios de comunicação e as consequências dessa conexão no desenvolvimento do Homem.

Ao ter em conta o pensamento de Marshall McLuhan, a aldeia global que rapidamente se tem vindo a formar possibilitou a extensão das nossas capacidades na medida em que todos os aparelhos eletrónicos funcionam como uma ampliação dos nossos sentidos, das nossas emoções e da nossa mente. No entanto, o sentido crítico do Homem tem vindo a perder-se perante uma panóplia de argumentos pré-tratados que lhe está disponível à ?distância de um click? e que ele absorve sem qualquer tratamento. (Carvalho, 2012)

É neste contexto que os Media nos são apresentados como perigosos agentes modeladores do pensamento social, numa época em que manipulam os consumidores, absolvidos de literacia. A publicidade ?bombardeia? o espetador com novos e aliciantes produtos que prometem salvaguardá-los dos seus maiores receios. A mulher que não quer envelhecer, porque a sociedade estipula que as marcas desse evento não são atraentes, tem um vasto leque de cosméticos que a protegem, tal como a que não quer engordar, emagrecer ou ter estrias. Não existe necessariamente um descontentamento pela ordem natural do nosso desenvolvimento corporal. Trata-se, frequentemente de pormenores que permanecem invisíveis até os Media nos ?massajarem? ? conceito encontrado em McLuhan, 1967 ? com conteúdos que os opõem ao padrão estereotipado de beleza feminina.

O presente trabalho pretende, assim, desenvolver três problemáticas essenciais para a compreensão da representação da Mulher na atualidade. Em primeiro lugar, explorar as pressões que os Media exercem sobre os indivíduos, analisando, num segundo ponto, as dissimilitudes de representações de género nos mesmos e os impactos resultantes das duas problemáticas que daí advêm. Em terceiro lugar, e em jeito de conclusão, procura extrair as principais ações desenvolvidas pelos meios de comunicação que se assumem como uma ameaça e retroalimentam os tradicionais papéis de género.

Ao longo da História, a Mulher tem enfrentado um caminho doloroso na busca pelos direitos que são próprios de cada indivíduo e que sempre negados. Em pleno século XXI, nós, Mulheres, continuamos a ser vistas pelos Media como um ser submisso, passivo e dominado pelo Homem. Numa atualidade repleta de movimentos sociais que reivindicam valores de Igualdade e Respeito entre géneros, num contexto de Liberdade assumida, abraçados pela Democracia.

Devemos questionar-nos sobre o papel dos meios de comunicação e analisar até que ponto representam ou não um impedimento à circulação e divulgação de uma perspetiva transversal e igualitário de género.

  1. Impacto dos Media nas sociedades

Embora a Imprensa tenha nascido com Gutenberg, as ações publicitárias coabitam com o Homem milhões de anos, desde mensagens comerciais na antiga arábia, a papiros na Era Egípcia e anúncios de combates, em tabuletas, entre gladiadores, em Pompeia. (Bijóias, 2014)

Foi com a Revolução Industrial e o despoletar dos primeiros jornais, em Inglaterra, que nasceu o conceito de patrocínio, destinado à promoção de produtos e serviços disponíveis. A explosão demográfica facultou ao processo um aumento de potenciais clientes, o que resultou na criação da primeira agenda publicitária, em 1841, nos EUA, seguindo-se, nos anos 20, o aparecimento da rádio e, mais tarde, da televisão. (Bijóias, 2014)

Esta realidade, quando associada aos avanços tecnológicos e à adesão do cidadão comum aos mesmos, levaram os Media tradicionais a migrarem para o ciberespaço facilitando o acesso a informação sem custos.

Tal como José Alberto afirma, o mundo encontra-se hoje repleto de informação no seu sentido lato, ultrapassando a forma noticiosa ou jornalística, permitindo ao individuo aceder a uma panóplia de conteúdos em formato digital, que se encontra ao alcance de qualquer motor de busca, servindo este como porta para o conhecimento, ou mera sensação do mesmo. (Carvalho, 2012)

A absorção destas temáticas virtuais anulam o sentido crítico do Homem, que se acomoda com a ilusão de conhecimento e satisfação instantâneos, e fazem emergir problemáticas que se prendem com a desmaterialização física dos suportes e o desvanecimento do espaço, onde termos como ?longe? e ?perto? ultrapassam os seus limites físicos. Vivemos, por isso, ?num século ?preso? às ?máquinas? nas quais jovens e adultos investem grande parte do seu tempo?, o que nos leva a pôr em causa até que ponto a realidade que enfrentamos é favorável ao nosso desenvolvimento. (Carvalho, 2012)

Sherry Turkle debruçou-se sobre a dúvida salientada e, numa Ted Talk, intitulada Connected, but alone?, evidenciou a dificuldade de encarar a solidão como positiva e digna para o desenvolvimento pessoal, demarcando as dissimilitudes entre a atualidade e os últimos trinta anos, onde ?tudo era uma autêntica descoberta [?] mal sabíamos as utilidades de um computador; no momento atual [?] podemos criar, navegar e executar as nossas vidas emocionais. A tecnologia é hoje arquiteta das nossas intimidades [?]?. (Turkle, 2012) A ideia de privacidade encontra-se, então, ameaçada pela constante partilha de informação, reproduzindo um acentuado dilema entre a necessidade de privacidade e a urgência da sociedade em saber. (Carvalho, 2012)

Esta problemática foi também estudada por Marshall McLuhan, o qual demonstrou a modificação de sete circunstâncias sociais ? ?tu, a tua família, a tua educação, o teu emprego, a tua vizinhança, o teu governo e os outros? ? em resultado da dependência do Homem face aos avanços tecnológicos (McLuhan, 1967, p. 12-24). Deles, e tal como Sherry e José Alberto, salientou o alargamento do circuito familiar, onde a espiral de informação, com que as crianças são ?bombardeadas? (Carvalho, 2012), combate qualquer influência exercida pelos pais, também eles mergulhados nesta realidade:

?Parents text and do emails at breakfeast and at dinner while their children complain about not having their parents? full attention but then these same children deny each other full attention? (Turkle, 2012)

McLuhan afirmara que ?a comunicação eletrónica está a transformar o mundo numa aldeia global? ao constatar as mutações sofridas pelo Homem, enquanto ser social. (McLuhan, 1967, p.67-67) O conceito de aldeia global espelha a noção de que tudo acontece em simultâneo num mundo em rede, onde os aparelhos ?elétricos? aparecem como extensões do nosso corpo, mente e sentidos, ampliando as nossas capacidades. Isto acontece na medida em que a rádio nos é apresentada como extensão da capacidade auditiva, a televisão como extensão da capacidade visual e o próprio vestuário como extensão da nossa pele. (Pereira, 2015)

As mudanças descritas foram principalmente propiciadas pelas mensagens mass-mediatizadas, que oferecem poderosas estratégias para moldar as realidades, funcionando como técnicas de mediação, que criam um ?imaginário social?. (Silva, 1991,p.2) São, assim, agentes criadores de normas sociais ?e uma das vias de transmissão que mais influem no processo de socialização? (Expresso das Ilhas, 2014).

É neste contexto que podemos, como Marshall McLuhan, comprovar a veracidade da citação ?All media work us over completely?. (McLuhan, 1967)

  1. Enquadramento histórico da Mulher, dos Media e do conceito de género

            A Mulher foi, desde os primórdios da História, um ser marginalizado e privado de direitos políticos e morais, sendo definida em função do homem que biologicamente reproduzia. Em algumas cidades da Grécia Antiga (5/4 a.C) ? pólis ?, ou do Egito, o sexo feminino possuía direitos limitados de propriedade, conquanto, regra geral, a mulher dependia da figura masculina que lhe era mais próxima. (Olivieri, 2007)

            Esta crença estendeu-se até ao século XIX, altura em que a Mulher, submissa e passiva, se associava à esfera privada, como administradora do lar. Em oposição, o Homem pertencia ao espaço público enquanto cidadão e sujeito político ativo. (Tarraja, 2015, p.17-18)

            O domínio masculino encontrava-se enraizado em leis que fundamentavam os valores da sociedade e que representavam a figura feminina como menor e incapaz, como se pode observar no código civil francês, outorgado por Napoleão, em 1804, o qual foi seguido por diversos países europeus, nomeadamente Itália, Suíça, Bélgica, Espanha e Países Baixos: (Tarraja, 2015, p.15)

            ?O marido deve à sua esposa proteção, e a esposa deve ao marido obediência [?] a esposa [?] não pode dar, facilitar ou [?] adquirir propriedades [?] sem que o marido participe na transação ou o seu consentimento por escrito? (Nash, 2005, p. 28; apud Tarraja, 2015, p.16)

            A ?domesticidade? que recaiu sobre a Mulher foi efetivada por numerosas publicações literárias que consomaram as disparidades entre os sexos. (Tarraja, 2015 ,p.17)

            A exclusão social a que foram submetidas resultou numa intensa luta pelos seus direitos civis, políticos e morais, através de movimentos sufragistas, assumidos como opositores ao monopólio masculino. A Grã-Bretanha, enquanto país conservador, encarava estas ações como um ataque à sociedade patriarcal, opinião que fundamentou a criação de organizações anti-sufragistas, como a Liga Nacional Contra o Sufrágio Feminino, que utilizavam a propaganda como principal suporte de ridicularização da Mulher. As primeiras campanhas de apoio às sufragistas avançaram neste contexto e foram dirigidas por Lídia Becker, em 1890, seguida de Millicent Fawcett e Emmeline Pankhurts, cujas ações possuíam um forte cunho radical, através da prática de sabotagens e incendimentos de ruas. Foi Pankhurts, no entanto, quem se destacou ao afirmar: (Tarraja, 2015, p. 43-45)

            ?Cavalheiros, as vossas leis não nos prestam atenção. [?] vamos continuar com esta guerra como o fizemos no passado; mas não seremos responsáveis pela propriedade que sacrificarmos, ou pelo prejuízo que [?] sofrerá por consequência. O Governo é culpado de tudo isto, porque, apesar de admitir que as nossas petições são justas, se nega a satisfazê-las.? (Nash, 2005, p. 119; apud Tarraja, 2015, p.45)

            Com a chegada dos finais do século XIX surgiu, no contexto da consolidação da sociedade burguesa, o conceito de Género, tendo-se apoiado ?num conjunto de leis e de normativas oficiais que regulavam a situação de subalternidade feminina?. (Tarraja, 2015, p.15) Foi na época contemporânea que o socialista Charles Fourier fez emergir em França o conceito de Feminismo. Contudo, a feminista Hubertune Auclert assume-se como inventora do termo e fundadora da primeira sociedade francesa de sufrágio feminino. Este movimento generalizou-se pela Europa, Estados Unidos da América, Ásia e América Latina estando, em 1914, completamente difundido. (Tarraja, 2015, p.24)

            A sua definição sofreu diversas alterações e foi retratada de diferentes maneiras, consoante as dimensões políticas, sociais e culturais dos países em questão. Do mesmo modo, a representação da Mulher foi sofrendo retificações, principalmente a partir da Primeira Guerra Mundial, a qual deu lugar à ?mulher moderna? e que permitiu a transformação do modelo feminino através da implementação de ideais que formularam as bases para uma remodelação da estrutura familiar. (Tarraja, 2015, p.21)

no século XX, a posição feminina sofreu um forte impulso pela apropriação do espaço público e mediático por parte das ?stun girls?, jornalistas que incorporavam diversos papéis sociais com a intenção de revelar ?factos da vida urbana, pleno de emoção e escândalo? (Silveirinha, 2012, p.175). Um dos exemplos mais marcantes veio a público graças a ?Nellie Bly?, pseudónimo de Elizabeth Cochrane, que se debruçava sobre problemáticas políticas e perturbadoras da sua sociedade, nomeadamente o internamento de mulheres em alas psiquiátricas. Ela introduziu-se/ durante dez dias numa dessa alas psiquiátricas, relatando, em seguida, as atrocidades que presenciara. Foi também ela a primeira Mulher jornalista do Pittsburgh Dispach, mesmo sem qualquer formação ou credenciais específicas. (Silveirinha, 2012, p.176).

A publicidade foi outra das áreas a permitir às mulheres uma carreira, tanto mais que a primeira mensagem de cariz sensual foi concebida e protagonizada por duas mulheres. (Bijóias, 2014)

Nos anos 80 e 90 e apesar de o público feminino começar a ganhar importância, havia poucas mulheres no ramo jornalístico. Além disso, raramente acediam aos principais postos de trabalho. Eram, no entanto, bastante procuradas pelas indústrias do entretenimento e para a criação de conteúdos sensacionalistas.

Desta época, merece especial destaque Sara Willis, uma das primeiras mulheres a ser colunista paga. (Silveirinha, 2012, p.177)

Esperava-se que com o avanço da História a acessibilidade da Mulher pudesse ser equiparada à do Homem. O desenvolvimento seguinte mostra que, apesar do caminho percorrido, as disparidades entre os sexos continuam a ser acentuadas.

É de salientar que o discurso mediático promove a construção da opinião pública que, ao ser difundida e absorvida pela sociedade origina uma identidade social, justificada e formada pelo discurso (Silveirinha, 1997). A mesma estabelece uma categorização dos indivíduos por género, permitindo que a figura feminina continue a ser representada de forma ambivalente e estereotipada, continuamente exposta pelos meios de comunicação num formato sexualizado e angelical. (Expresso das Ilhas, 2014)

O desenvolvimento que se segue propõe uma análise social às díspares realidades que os géneros enfrentam nos Media atuais, evidenciando como, em pleno século XXI, a invisibilidade da Mulher nos mesmos existe e persiste.

  1. Media: assimetrias nas representações de género

 Apesar dos debates e avanços alcançados relativamente às questões de género e de Media, continuamos a debater-nos, à medida que acumulamos informação, com uma necessidade urgente de analisar as mesmas (Silveirinha, 2017, p.5)

A esperança de que a ciência trouxe-se um equilíbrio entre as representações de género nos Media foi sendo cada vez mais destruída pela incapacidade de acompanhar os acelerados progressos tecnológicos. (Tarraja, 2015, p.18) Esta é uma realidade que ilustra o exemplo facultado pelo jornalista José Alberto Carvalho ao indicar que caminhamos de marcha atrás para o futuro, assinalando que o principal obstáculo se prende com um Governo cujas respostas são de cariz antiquado a problemas atuais, não olvidando a própria sociedade que se debate com a ansiedade de comentar os acontecimentos (Carvalho, 2012), espelhando uma carência acentuada de literacia.    

A problemática central não se encontra na existência de papéis de género, na medida em que livre poder de escolha para os preencher ou não. O conflito surge quando os indivíduos se sentem obrigados a fazê-lo, temendo represálias como a exclusão social. (Lantagne, 2014)

Os Media têm demonstrado dificuldades em quebrar os estereótipos provenientes da cultura popular e continuam a ?bombardear? o público com imagens que reforçam barreiras culturais e papéis tradicionais (Silveirinha, 1997), preenchendo a figura feminina de simbologia sexual ou retratando-a como habitual cuidadora do lar.

Ao ligar a televisão pouco temos de esperar até sermos atingidos por propaganda da indústria de cosméticos onde é exigida à Mulher uma aparência cuidada com um rosto rejuvenescido sem marcas de envelhecimento. A par disto vem o retrato sexualizado da figura feminina onde sem qualquer exceção se observam Mulheres magras e tonificadas. Esses anúncios espelham uma tipologia de corpo como sendo normal e descartam os ?acessórios? naturais do físico feminino tais como a celulite.

Neste contexto, a sociedade tem vindo a revelar sintomas preocupantes que dão a conhecer a insegurança do grupo feminino que tenta, a todo o custo, criar uma silhueta semelhante à que lhes é apresentada como padrão. Consequentemente, verifica-se um aumento de distúrbios alimentares, tendo-se observado um total de 12,461 casos entre 2010 a 2015, sabendo que no último ano referido foram realizados 47 internamentos no Hospital de Santa Maria (Expresso, 2016).

Desempenhando um papel de mediação entre os leitores e a realidade, a qual é previamente construída e nunca um retrato fidedigno, a publicidade intervém na sociedade e molda as suas formas e normas de conduta. No entanto, a sua falta de sensibilidade ao género (Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p.16), quando associada às produções noticiosas que reproduzem ?práticas que legitimam a dominação masculina? (Expresso das Ilhas, 2014), silencia a figura feminina da comunicação social, assumindo-a como um objecto, representada segundo uma imagem ambivalente, demarcada por valores puramente femininos. (Expresso das Ilhas, 2014)

A doutora Maria João Silveirinha assume que, apesar de existir uma tendência geral para uma relativa harmonia entre as respostas de Homens e Mulheres, se registam discrepâncias quanto à situação laboral e ao campo das condições de trabalho. (Silveirinha, 2017, p.7)

A partir daqui podemos salientar o relatório da Global Media Monitoring Project que, na sua edição de 2015, registou apenas um total de 24% de pessoas ouvidas, lidas ou vistas nas notícias como sendo do género feminino, representando um aumento de 7% desde 1995. Apontou ainda uma melhoria de meio ponto percentual por ano, na visibilidade das mulheres nas notícias, o que significa que serão necessários, pelo menos, mais 40 anos para alcançar a paridade de género neste contexto. (Silveirinha, 2017, p.5) Ainda em questões de visibilidade é sabido que ?em 2012, os homens representavam 63% dos artigos assinalados nos dez principais meios de comunicação [?] contra 37% para as mulheres? (Benjeria, 2015)

A sub-representação das Mulheres nos media originam assimetrias em variados campos de trabalho, desde o acesso a cargos e funções de alta responsabilidade à fraca proteção quanto a abusos de poder. 

Um estudo financiado pelo Instituto Europeu para a Igualdade de Género, explorou a inserção e a acessibilidade das Mulheres a cargos superiores na área da gestão, analisando um conjunto de 99 organizações públicas e privadas da União Europeia e da Croácia, entre 2012 e 2013. Foi observado que de um total de 3376 cargos, apenas 1037 (30%) eram ocupados por figuras femininas, sendo, desses, um terço de serviços públicos e um quarto do setor privado. O mesmo salientou que apenas 25% destas organizações mencionam nos contratos o assédio sexual, a maternidade (17%) e diversas políticas de dignidade de trabalho (19%). (Silveirinha, 2017, p. 64-67)

É ainda de destacar que em 2013, num total de 308 Camaras Municipais espalhadas pelo país, apenas 23 tinham na sua presidência Mulheres. É também digno de relevo, a percentagem de figuras femininas que, até à entrada no século XXI, integraram os Governos Constitucionais portugueses. O II Governo Constitucional, liderado por Mário Soares, não contou com a participação de nenhuma Mulher. Em contrapartida, o executivo de António Costa foi o que registou maior número de Mulheres na sua composição, alcançando os 30,5%. (Santos, 2017)

Escandalosamente, em pleno século XXI, o assédio sexual corrompeu o parlamento europeu, tendo sido noticiado que mais de uma dúzia de assistentes foram abusadas pelos eurodeputados não esquecendo que, ?segundo a eurodeputada socialista espanhola Iratxe Garcia, cerca de 50% das mulheres europeias foram vítimas de alguma forma de assédio sexual.?. O caso torna-se ainda mais chocante com os depoimentos de Janusz Korwin-Mikkle, independente polaco, quando afirma que ?Algumas mulheres gostam de ser assediadas, outras não. E os homens normais sabem quais são as mulheres que querem ser abordadas ou não?. Para agravar a situação, pelo menos outros nove deputados parecem estar de acordo com as afirmações do polaco, como se verificou na votação para a proposta de resolução contra o assédio: 580 votos a favor, 27 abstenções e 10 votos contra. (Euronews, 2017)

Esta realidade vem alertar, por um lado, para a invisibilidade que tem vindo a ser dada, pelas fontes, à temática ? realidade percecionada por Lippman, o qual acreditava na existência de fontes, compostas por profissionais de altos cargos e que, através de um esquema de interesses, passam determinada informação para a comunicação social ? e, por outro, para a importância dos gatekeepers no mundo jornalístico. O conceito de gatekeeper foca-se na selecção que o jornalista faz, segundo critérios por ele estipulados, dos acontecimentos que como sendo ou não de cariz noticioso. A realidade percecionada no Parlamento Europeu, não mais fez do que espelhar na sociedade a fraca importância que tem vindo a ser dada aos abusos de poder por parte de Homens que exercem a sua autoridade para serem predadores sexuais. (ideia retirada de um pensamento da doutora Maria João Silveirinha, numa das suas aulas)

As disparidades entre géneros acentuam-se principalmente a nível das remunerações, o que pode ser comprovado pelo gráfico que se segue.

 

O ícone 1 denota as disparidades salariais no ano de 2013, em Portugal. É evidente uma tendência para o aumento percentual das mesmas à medida que nos aproximamos dos cargos profissionais superiores, enquanto para praticantes e aprendizes a diferença salarial se situa nos 8,8 %, nos quadros superiores ronda os 28,9%. (CITE, 2013)

A representação de versões da realidade que refletem as relações de género como dominante/submisso, perpetuam as desigualdades na vida quotidiana e mantêm o status quo desigual. (Silveirinha, 2017, p.6) Um exemplo disso passa pela associação tradicional de cores, profissões, vestuário e objetos concretos às figuras masculinas e femininas que, desde cedo, se veem obrigados a cumprir os padrões previamente estabelecidos para o seu género.

            O conteúdo da figura 2 ilustra as pressões sociais que recaem sobre os indivíduos, desde que vêem ao mundo. No mesmo, as figuras femininas são coletivizadas e apresentadas como personagens-tipo, às quais Hollie se refere como ?Pink?. Por sua vez, as figuras masculinas são intituladas de ?Blue? numa tentativa de demarcar, tal como a sociedade, o individualismo. Podemos encontrar no poema expressões como ?Now pink is told to be a lady. Do not spit, swear, smell. Blue is told to be a man. Do not cry or ask for help. Blue is told to man-up. Pink is told to make-up? que atingem o espetador através de relatos atuais e constantes de realidades sofridas por quem atenta ir contra os padrões estandardizados. McNish opta por terminar a sua obra com a frase ?Babies born in naked flesh, welcome to the world?, a qual nos permite assumir os vinculados papéis sociais, e o que lhes é inerente, como um ataque à singularidade dos indivíduos.

            Apesar de os direitos e deveres dos Homens e das Mulheres, enquanto cidadãos, serem, por ambos, subentendidos, a igualdade de género continua a não ser devidamente seguida pelos Media. Estas dissimilitudes são absorvidas por todas as instituições que formam o indivíduo social, inclusive o Governo, como se pode observar no discurso de Laurent Fabius, ministro francês dos Negócios Estrangeiros e do Desenvolvimento Internacional, dirigido a Ségolène Royal, ministra francesa da Ecologia, do Desenvolvimento Sustentável e da Energia, durante a campanha eleitoral de 2008, a quem questionou ?Mas quem vai cuidar das crianças?? (Benjeria, 2015). também uma maior exposição da Mulher quando se trata de representar ações pecaminosas. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a Princesa Diana de Gales e a descoberta da sua relação extraconjugal. Apesar de esta ação ser igualmente praticada pelo seu ex-marido, os Media trataram-nas de forma diferente: enquanto a dele foi praticamente ignorada, a dela foi evidenciada. (Tarraja, 2012, p.70-71)

A existência de assimetrias nas representações de géneros por parte dos meios de comunicação não podiam ser mais evidentes. Existe, no entanto, a necessidade de delimitar as principais problemáticas que as originam e propor eventuais resoluções.

  1. Impedimentos a uma divulgação transversal da noção de género: Soluções

            Como referido anteriormente, os meios de comunicação mostram-se, na atualidade, como uma das principais ferramentas de influência das massas, razão pela qual constituem um poderoso agente de mudança. No entanto, a linha que separa o uso dos Media como apoio da igualdade de género mostra-se muito ténue em relação à apropriação dos mesmos como reforço de imagens estereotipadas, enquanto agente de opressão. Isto reflete uma agudizada incapacidade de eliminar e combater estereótipos, associada a uma insensibilidade perante a própria noção de género. (Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p.16)

            Esta realidade espelha diversas carências por parte dos Media atuais, nomeadamente, a necessidade de trabalhar o enfoque do conceito nos produtos comunicacionais, através de uma linguagem não discriminatória, utilizada como ferramenta de mudança social. (Narayana, A.; Ahammad, T., 2016, p.16) Perante a urgência da criação de uma linguagem alterada que represente uma imagem equilibrada dos contributos femininos para a sociedade, Alberto Melluci afirma que ?A ação coletiva produz orientações e significados que os atores reconhecem e, por isso, haverá que dar prioridade analítica à construção ativa da identidade colectiva [?]?. (Melucci, 1996; apud Silveirinha, 1997) A emergência descrita pode ser ilustrada através de uma comparação feita no presente ano, tendo em conta as audiências dos filmes Grown Ups 2, que conta com um elenco feminino de cerca de um quarto dos atores e que vendeu cerca de 200.000.00 milhões de bilhetes, face ao The Call, protagonizado por Halle Berry e Abigail Breslim, que não mostrou ser uma preferência para as audiências. (Lantagne, 2014) A problemática relaciona-se com o facto dos consumidores passarem uma mensagem de predileção quanto a produções onde as figuras femininas se enquadram num papel resignado e silencioso de género, como foi o caso do primeiro exemplo.

            Está inevitavelmente associada a esta realidade uma alteração da representação indecente da Mulher nos conteúdos de multimédia e eletrónica, como podemos verificar no artigo Gender Roles in Media que nos fornece o exemplo do programa The Office, o qual contou com cinco fortes e dinâmicas lideranças femininas. (Lantagne, 2014)

            O aumento da participação e do acesso feminino à expressão e tomada de decisões articula-se com a obrigação de disseminar conhecimento e informação, através dos meios de comunicação e das novas tecnologias, limitadas maioria das Mulheres nos países em desenvolvimento. (Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p.16)  

O frame visível na figura 2, evidencia uma entrevista elaborada em 2014 que se debruçou sobre as disparidades de género internacionais, dando a conhecer diversas realidades de indivíduos de todo o mundo. Uma Mulher indiana afirmou que ?se as Mulheres tivessem acesso à educação e à cultura, mudariam de certeza [?] Caso contrário [?] irão reproduzir exatamente o mesmo esquema. Se quisermos que se verifique uma mudança real, temos de dar-lhes acesso ao conhecimento.?. Este depoimento reforça a necessidade de acesso a uma educação cuidada que germine uma literacia capaz de combater os abusos de poder e os retratos negativos internacionais. (Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p.17)

            Neste contexto, o Governo fica incumbido de criar técnicas de apoio à educação, à formação e ao emprego internacional, desenvolvendo técnicas de apoio para as Mulheres trabalhadoras. inclusive uma necessidade de assegurar o equilíbrio de género na nomeação de Mulheres e de Homens para todos os cargos nos setores públicos, privados e estatais e de incentivar o aumento do número de programas que espelhem as suas necessidades e preocupações destas, incluindo campanhas que enfatizem a igualdade de género através da partilha de responsabilidades familiares.(Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p.17) Em 2014, foi produzido um anúncio publicitário do detergente Tide, intitulado de ?Dad Mom?, o qual retrata a figura masculina com capacidades para realizar tarefas desde sempre associadas à Mulher, como o permanecer em casa a cuidar dos filhos. (https://www.youtube.com/watch?v=RDZ0SdlKPXU).

            A professora Sherry Turkle denunciou ainda a urgência da criação de grupos de vigilância dos Media, numa tentativa de controlar os assédios sexuais (Turkle, 2012), sendo para isso primordial a criação de debates e palestras que promovam o entendimento das diversas plataformas online e o seu funcionamento (Judd, 2016).

            Concluindo, embora a Mulher tenha sido um apoio fundamental para o avanço dos meios de comunicação, é hoje banalizada e sexualizada por e através destes. A publicidade tornou-se sinónimo de persuasão (Bijóias, 2014), impondo ao sexo feminino a venda do produto exposto, através de sistemas de identificação. (Expresso das Ilhas, 2014) Por outro lado, a Mulher é fortemente assediada através das diversas plataformas online, como relata Ashley Judd ? ?It is a routine for me to be treated in ways I´ve already described to you.? ? (Judd, 2016), o que evidencia a urgência da tomada de medidas eficazes que constituam uma legislação contra a pornografia e os abusos de poder, espalhando códigos de conduta na publicidade. (Narayana, A; Ahammad, T., 2016, p. 18)

  1. Conclusão      

            É-nos possível concluir que existem imensas barreiras nas representações de género que chegam aos consumidores através das mensagens mass-mediatizadas. Somos, durante toda a vida, acompanhados pelas pressões inerentes aos nossos papéis sociais, as quais são reforçadas pelas imagens que os Media transmitem à sociedade. (Silveirinha, 1997)

Identidade, Media e espaço publico são conceitos que parecem relacionados na medida em que, mais do que simples lugares de representação, os meios de comunicação constituem um importante conjunto de sistemas simbólicos, através dos quais são produzidos significados que, ao serem reconhecidos pelos indivíduos, são seguidos e recriados, alterando a identidade pessoal e, consequentemente, coletiva, dando origem a uma nova visão do que somos, do que podemos vir a ser e do mundo que nos rodeia. (Silveirinha, 1997)

Os discursos construtores dos Media são-nos apresentados como criadores de uma visão socialmente construída que tem, historicamente, secundarizado a experiencia das Mulheres. (Silveirinha, 1997) A passagem de um protótipo de modelo feminino nos Media influencia, portanto, as atitudes sociais e origina assimetrias de género.

São, insistentemente, criados estereótipos que maquinizam o ser Humano e lhe atribuem características de acordo com o género a que pertence. A cultura de massas do século XXI permanece, por isso, enraizada no domínio masculino, princípio que continua a ser reforçado pelos Media.

Em suma, é possível constatar que a existência de impedimentos ao alcance de posições igualitárias é uma realidade que demonstra urgência em ser combatida. (Silveirinha, 2017, p.15) um longo caminho a percorrer ate à criação de uma sociedade em que as Mulheres sejam dignamente representadas e protegidas de abusos de poder, começando pela necessidade dos Media assumirem o importante papel que lhes cabe e darem voz às Mulheres. (Narayana, A.; Ahammad, T., 2016)

O questionamento sobre a representação das mesmas na comunicação não pode parar e deve abordar diferentes dimensões. É apenas a partir da acumulação de conhecimento detalhado que nos é possível, por um lado, reforçar o que sabemos, criando posições criticas e fundamentadas e, por outro, acompanhar as novas formas de desigualdade que surgem com o decorrer do tempo (Silveirinha, 2017, p.5).


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