Um modelo para analisar o problema de filas em caixas de supermercados: um
estudo de caso
1. Introdução
No Brasil, o setor de supermercados vem crescendo significativamente nos
últimos anos, mas ainda tem a característica de ser um setor regional e
fragmentado. Os varejistas de comida in natura que operam no sistema self-
service detêm aproximadamente 84% do total de vendas do setor, o que é uma alta
porcentagem para a América Latina (Andersen, 1997). De acordo com a Associação
Brasileira de Supermercados (ABRAS), este percentual corresponde a cerca de
US$44 bilhões, ou 6,6% do PIB brasileiro (Superhiper, 1998). As duas maiores
companhias do setor detêm 18% do mercado, enquanto que as vinte maiores detêm
58%. Para efeito de comparação, na Alemanha, por exemplo, as cinco maiores
redes de supermercados já respondem por 70% do mercado. Pode-se observar uma
tendência a lojas grandes fazendo uso de tecnologias avançadas, menor número de
empregados, e maior número de caixas de atendimento.
Para aumentar o volume de vendas, gerentes de supermercados têm se preocupado
em melhorar o nível de serviço ao consumidor. De acordo com uma pesquisa
realizada em 1996 na grande São Paulo (OMC/EAN, 1996), o consumidor em geral é
fiel ao supermercado que compra, pois, segundo os entrevistados, o costume leva
ao conhecimento do espaço físico, da distribuição dos produtos, e dos horários
menos congestionados do supermercado. Os clientes de supermercados mais
automatizados valorizam, como primeira opção, o atendimento rápido e
funcionários competentes e educados. Por outro lado, os clientes de
supermercados menos automatizados valorizam mais o preço e a proximidade do
supermercado. Em ambos os casos, preços e filas exagerados são apontados como
os fatores mais negativos.
Ainda segundo esta pesquisa, é interessante notar que os consumidores
correlacionam o tempo total gasto no supermercado com a falta de organização
geral do supermercado. Os consumidores consideram que economizam tempo com uma
boa disposição de produtos nas gôndolas, presença de preços nos produtos e
atendimentos mais automatizados nos caixas, mas apontam como o maior problema a
ser atacado o tempo de espera nas filas dos caixas. Desta maneira, uma
preocupação dos gerentes de supermercados é como reduzir o tamanho das filas
nos caixas. Ao aumentar o número de caixas em operação, o gerente estará
reduzindo o tempo médio de espera em fila, por outro lado, também estará
aumentando os custos operacionais do sistema. Surge então um interessante
tradeoff a ser analisado entre o nível de serviço a ser oferecido ao cliente e
a escolha de capacidade do sistema de atendimento.
No presente trabalho estamos interessados em modelar o tempo médio de espera em
função da capacidade do sistema, por meio de teoria de filas. Três modelos são
explorados: (i) representar o sistema por meio de um simples modelo M/M/m de
fila única, onde m é o número de caixas em operação, (ii) representar o sistema
por meio de mmodelos M/M/1 paralelos e independentes, e (iii) representar o
sistema por meio de um modelo Markoviano mais geral, onde os dois modelos
anteriores podem ser vistos como casos particulares. Para avaliar o desempenho
destes modelos, realizamos um estudo de caso num dos supermercados da rede Jaú-
Serve, que atua no interior de São Paulo. Os resultados apresentados na seção 5
mostram que o terceiro modelo, apesar de demandar um esforço computacional
maior do que os anteriores, é bem mais apropriado para descrever o sistema.
2. Definição do problema
Poucos trabalhos foram encontrados na literatura analisando o problema de
congestão em caixas de supermercados. Umesh et al (1989) estudaram a
sensibilidade dos consumidores com relação ao tempo de espera num supermercado.
Um consumidor que ficar insatisfeito com o tempo de espera, embora possa não
desistir de efetuar a compra, pode não voltar mais ao supermercado. O problema
abordado foi o de maximizar a margem de contribuição, definida como o ganho R
(L) menos o custo V(L), onde Lé a taxa de demanda do consumidor em função do
tempo médio de espera. O procedimento foi aplicado para determinar o número de
caixas numa filial de uma rede de supermercados na Nova Inglaterra, EUA. Ao
aumentar o número de caixas de 6 para 10 (nos horários de pico), o tempo médio
de espera foi reduzido de 34 minutos para menos de 15 minutos. Conforme os
autores, o volume de vendas cresceu 19%, e as reclamações dos clientes
diminuíram em cerca de 40%. Os ganhos reais cresceram 17%, justificando os
custos adicionais do aumento do número de caixas.
Outro estudo interessante sobre congestão em caixas de supermercados foi
encontrado em Dijk (1997). O artigo analisou a aplicação de uma alocação
flexível da capacidade em um supermercado na Holanda, para reduzir as
flutuações no atendimento da demanda e balancear os workloads dos caixas. O
número de consumidores neste supermercado passou a ser eletronicamente
controlado ao longo do tempo e, em função deste número, caixas iam sendo
abertos ou fechados conforme os resultados de um modelo baseado em teoria de
filas. O supermercado adotou uma estratégia de dar descontos especiais aos
consumidores que não encontrassem caixas com menos de três consumidores em
fila. Conforme Dijk (1997), esta estratégia resultou num custo adicional de 2%
do valor das vendas, enquanto que as vendas cresceram 20%. Uma pesquisa de
opinião junto aos consumidores indicou que este aumento das vendas deveu-se
mais à redução dos tempos de espera dos consumidores, do que à possibilidade
deles obterem descontos especiais.
No presente trabalho, admitimos que não sabemos como a demanda de consumidores
do supermercado varia em função do tempo médio de espera em fila, diferente do
estudo em Umesh et al (1989). Também supomos que não dispomos de informações
on-line sobre o número de consumidores no supermercado ao longo do tempo,
diferente do estudo em Dijk (1997). Os caixas são separados em caixas normais e
caixas rápidos, estes últimos atendem exclusivamente consumidores com até 10
itens. Os caixas normais atendem em geral consumidores com mais de 10 itens,
embora também possam atender consumidores com menos itens. Para cada tipo de
caixa, admitimos que os consumidores chegam durante um dado período de tempo
conforme um processo de Poisson. Os tempos de serviço, tanto dos caixas normais
quanto dos rápidos, são supostos exponencialmente distribuídos (estas hipóteses
são analisadas na seção 4).
Consideramos que os consumidores, ao chegarem no sistema, podem desistir de
comprar e sair do supermercado, se as filas dos caixas estiverem muito grandes
ou demoradas. Devido a limitações de espaço na frente dos caixas e para reduzir
as dificuldades para movimentar carrinhos carregados de compras, os
consumidores aguardam atendimento na fila de um dos caixas, ao invés de em uma
fila única, como acontece em outros sistemas como bancos, correios, etc. Também
consideramos que os consumidores, ao chegarem, escolhem sempre o caixa com
menor fila, e que mudam de fila durante o tempo de espera, dependendo do
tamanho da fila dos outros caixas.
3. Modelagem por meio de teoria de filas
Admitindo-se que os intervalos de tempo entre chegadas de consumidores e os
tempos de serviço dos caixas sejam exponencialmente distribuídos, os dois
candidatos mais simples da teoria de filas para modelar o sistema de
atendimento dos caixas de supermercados são:
(i) um modelo M/M/m com fila única e disciplina de atendimento FCFS
(First Come, First Served), onde m é o número de caixas (normais ou
rápidos). Consideramos que l consumidores por unidade de tempo chegam
em média no sistema, e que os m caixas em paralelo são iguais, cada
um com capacidade média de m consumidores por unidade de tempo
(figura_1a).
(ii) m modelos M/M/1 paralelos e independentes, cada um com
disciplina de atendimento FCFS. Consideramos que l/m consumidores por
unidade de tempo chegam em média em cada caixa, e que cada um dos
mcaixas tenha capacidade m(figura_1b).
Note que ambos os modelos (i) e (ii) envolvem hipóteses que podem comprometer
suas aplicações no sistema em estudo. Por exemplo, o modelo (i) admite que o
sistema se comporte aproximadamente como um sistema de fila única, enquanto
que, na prática, as filas se formam na frente de cada caixa. Por outro lado, o
modelo (ii) admite que o sistema se comporte aproximadamente como msistemas de
filas independentes, ou seja, o modelo supõe que, uma vez que um consumidor
tenha entrado em uma das filas, ele não troque mais de fila. O que se observa
na prática é que a troca de filas ocorre com freqüência. Note também que os
modelos (i) e (ii) não consideram que os consumidores podem desistir de
comprar, se as filas estiverem muito grandes.
A grande vantagem dos modelos (i) e (ii) é a simplicidade de análise, uma vez
que os modelos M/M/1 e M/M/msão modelos Markovianos de fácil análise exata
(veja, p.e., Kleinrock, 1975, Gross e Harris, 1974). Diversas medidas de
desempenho podem ser facilmente computadas admitindo-se que o sistema esteja em
equilíbrio, tais como a utilização média dos caixas, o número médio de
consumidores no sistema, o tamanho médio da fila, o tempo médio de espera em
fila, etc. Por exemplo, o tempo médio de espera em fila Wq é determinado
simplesmente por:
onde:
Um modelo Markoviano mais preciso para o presente problema do que os modelos
(i) e (ii), aqui denominado modelo (iii), pode ser construído definindo-se o
espaço de estados do problema como (n1, n2, ..., nm), onde ni denota o número
de consumidores (em fila e serviço) no caixa i, i=1,..,m. No caso dos
supermercados, é razoável considerar que, a partir de um certo número N de
consumidores (em fila e serviço) em cada caixa, os novos consumidores, ao
chegarem, desistem de entrar na fila e saem do supermercado sem comprar. Por
exemplo, num sistema com m=3 e N=3, se um consumidor chega quando o sistema
está no estado (3,3,3), então este consumidor desiste de comprar e sai do
supermercado. Assim, temos que 0 £ ni £ N deve ser satisfeito para todo caixa
i.
Em supermercados com um número de caixas não muito grande, digamos m<10, é
razoável supor que os consumidores, ao chegarem, entram na fila de menor
tamanho. Também é razoável supor que, após um certo tempo, se duas filas
tiverem uma diferença de mais de k consumidores, digamos k = 1, 2 ou 3, os
consumidores da fila maior mudam para a fila menor (neste caso consideramos que
a mudança ocorra instantaneamente). Desta forma, o espaço de estados do
problema passa a ser definido por:
(n1, n2, ..., nm), com: 0 £ ni £ N, ½ni - nj½ £ k, i ¹ j, i, j = 1, .., m.
As possíveis transições entre estados ocorrem nos instantes em que: (i) um novo
consumidor chega e entra no sistema, (ii) um consumidor termina de ser atendido
por um caixa, o que pode envolver também alguma troca (instantânea) de filas.
Sejam l a taxa média de chegada de consumidores no sistema, m a taxa média de
serviço (capacidade) de cada caixa, ambos definidos conforme anteriormente, e
(n1, n2, ..., nm) o estado atual do sistema.
No caso (i), o sistema muda do estado atual:
(n1, n2, ..., ni, ..., nm), ni < N
para o novo estado:
(n1, n2, ..., ni + 1, ..., nm)
com taxa de transição l /m' , se ½ni + 1 - nj ½ £ k para todo j ¹ i, j =
1,..,m. O denominador m' , m' £ m, representa o número de possíveis transições
a partir do estado atual (n1, n2, ..., nm), devido a chegada e entrada de um
novo consumidor no sistema. Por exemplo, num sistema com m=3, k=1 e N=3, se o
estado atual for (1,0,0), o número de possíveis transições a partir de (1,0,0)
devido a uma chegada de um novo consumidor é m' =2, uma vez que o sistema pode
mudar apenas para os estados (1,1,0) e (1,0,1) (com taxa de transição l /2 para
cada um). Note que, dado que k=1, o sistema não pode mudar para o estado
(2,0,0). Genericamente, m' pode ser definido por:
m' = å i=1,..,m d(½ni + 1 - nj½£ k)
onde
d(½ni + 1 - nj½ £k)1, se ½ni + 1 - nj½£ k, para todo j ¹ i, j = 1,..,m.
0, caso contrário.
No caso (ii), temos que considerar dois subcasos. No primeiro subcaso, temos
que:
å j=1,..,m f(nj) < m
onde
f(nj) = 1, se nj >0
0, se nj = 0.
Note que, neste subcaso, há pelo menos um nj = 0. Desta forma, o sistema muda
do estado atual:
(n1, n2, ..., ni, ..., nm), ni > 0
para o novo estado:
(n1, n2, ..., ni- 1, ..., nm)
com taxa de transição m, se ½ni - 1 - nj½£ k, para todo j ¹ i, j = 1,..,m. Por
exemplo, num sistema com m=3, k=1 e N=3, se o estado atual for (1,1,0), o
sistema pode mudar apenas para os estados (0,1,0) e (1,0,0), com taxa de
transição m para cada um (obviamente não pode mudar para o estado (1,1,-1)).
O segundo subcaso é aquele em que:
å j=1,..,m f(nj) = m
isto é, todos os nj são não nulos. Desta forma, o sistema muda do estado atual:
(n1, n2, ..., ni, ..., nm)
para o novo estado:
(n1, n2, ..., ni- 1, ..., nm)
com taxa de transição mm/m", se ½ni - 1 - nj½£ k, para todo j ¹ i, j =
1,..,m. Similarmente ao caso (i), o denominador m", m"£ m, representa
o número de possíveis transições a partir do estado atual (n1, n2, ..., nm),
devido a uma saída de um consumidor do sistema. Por exemplo, num sistema com
m=3, k=1 e N=3, se o estado atual for (2,1,1), o número de possíveis transições
a partir de (2,1,1) devido a uma saída de um consumidor é m"=1, uma vez
que o sistema pode mudar apenas para o estado (1,1,1) (com taxa de transição 3m
). Note que, dado que k=1, o sistema não pode mudar para os estados (2,0,1) ou
(2,1,0), uma vez que admitimos que os consumidores mudam de fila
instantaneamente. Genericamente, temos que:
m" = åi=1,..,m d(½ni - 1 - nj½£ k)
onde
d(½ni - 1 - nj½£ k)1, se ½ni - 1 - nj½£ k, para todo j ¹ i, j = 1,..,m.
0, caso contrário.
Escrevendo-se as equações de equilíbrio para cada possível estado do sistema
(n1, n2, ..., nm), com: ni£ N, ½ni - nj½£ k, i ¹ j,i, j = 1, .., m, e
substituindo-se uma destas equações pela equação representando a soma das
probabilidades de todos os estados igual a 1 (para evitar um sistema
indeterminado), obtemos um sistema linear com, no máximo, (N+1)m equações e
incógnitas (lembre-se que temos a condição adicional ½ni - nj½£ k que,
dependendo do valor de k, reduz o tamanho do sistema). Note que, dados N e k,
este sistema cresce exponencialmente com o número de caixas m.
Por exemplo, para um problema com m=3, k=1 e N=3, o sistema resulta em 22
equações, bem menor do que o limitante acima (N+1)3=64. Aumentando-se m para 4
e 5, obtemos sistemas com 46 e 94 equações, respectivamente, também bem menores
que (N+1)4=256 e (N+1)5=1024, mas ainda com crescimento exponencial. A figura_2
ilustra parte do diagrama de transição de estados para o problema com m=3, k=1
e N=3.
Resolvendo-se o sistema linear, obtemos p(n1, n2, ..., nm), a distribuição de
equilíbrio dos estados do sistema. Tomemos, por exemplo, os estados (0,0,1) e
(2,2,1) da figura_2. Note que, seguindo as definições dos casos (i) e (ii)
discutidos acima, as equações de equilíbrio para estes estados resultam em:
Estado (0,0,1): (l/2 + l/2 + m ) p(001) = l/3 p(000) + m p(101) + m p(011)
Estado (2,2,1): (l+ 3m/2 + 3m/2 p(221) = l/2 p(121) + l/2 p(211) + 3m/3 p(222)
(o sistema linear completo para o caso em quel=m=1 encontra-se no anexo). Com a
distribuição p(n1, n2, ..., nm), podemos facilmente computar medidas de
desempenho do sistema, por exemplo, o workload do caixa i é calculado
simplesmente por:
e o tempo médio de espera na fila do caixa i é facilmente obtido por:
Convém observar que os modelos (i) e (ii) podem ser vistos como casos
particulares do modelo (iii). Pode ser mostrado que o modelo (i), com um
sistema M/M/m com fila única, é o caso particular do modelo (iii) quando k=1 e
N=infinito. Por outro lado, o modelo (ii), com m sistemas de fila M/M/1, é o
caso particular do modelo (iii) quando k=infinito e N=infinito. Neste trabalho
não são explorados modelos baseados em um sistema M/M/m/N com fila única, ou
msistemas M/M/1/N paralelos e independentes, uma vez que estes também podem ser
vistos como casos particulares do modelo (iii) quando k=1 e k=infinito,
respectivamente. Os resultados obtidos com a aplicação dos três modelos para os
dados do estudo de caso da próxima seção são comparados e analisados na seção
5.
4. Estudo de caso
Um estudo de caso foi realizado num supermercado da rede Jaú-Serve, localizado
em São Carlos, SP. Esta rede vem crescendo nos últimos anos no interior de São
Paulo, com consumidores principalmente das classes média e baixa. As lojas vem
sendo modernizadas, com check-outscom leitura ótica, consultores de preço
eletrônicos, etc., e procuram avaliar a credibilidade e fidelidade dos seus
consumidores por meio de pesquisas de opinião.
Para absorver o acréscimo de demanda nos dias/horários mais congestionados, o
gerente do supermercado conta com funcionários que normalmente não trabalham
nos caixas durante os outros dias/horários, mas que são capazes de desempenhar
essa função quando necessário. Nos demais dias/horários, o supermercado opera
com um número menor de caixas, e costuma abrir um novo caixa assim que o número
de clientes nas filas começa a ficar maior do que três.
Coletamos uma amostra num sábado, das 14:00 às 18:00 hs. Durante este período,
o sistema operou com 5 caixas normais (caixas 1, 2, ..., 5) e 2 caixas rápidos
(caixas 6 e 7). Para cada caixa, foram coletados os instantes de chegadas de
consumidores na fila, de eventuais desistências durante a espera, e de início e
término de serviços (ordem de centenas de observações). A tabela_1 apresenta os
intervalos médios entre chegadas e os tempos médios de serviço dos consumidores
para cada caixa. A média geral dos intervalos médios entre chegadas nos caixas
normais é 7,0 minutos (i.e., 0,14 chegadas por minuto em cada caixa, ou l=
0,71), e nos caixas rápidos é 3,5 minutos (0,29 chegadas por minuto em cada
caixa, ou l= 0,57). A média geral dos tempos médios de serviço nos caixas
normais é 4,6 minutos (i.e., m= 0,22 atendimentos por minuto em cada caixa), e
nos caixas rápidos é 1,55 minutos (m= 0,64 atendimentos por minuto em cada
caixa). A última coluna da tabela apresenta os tempos médios de espera em fila
obtidos pela amostra (e não pelos modelos)
Para cada tipo de caixa testamos, por meio de análise de variância, as
hipóteses de que as médias dos intervalos de tempo entre chegadas eram iguais.
Em ambos os casos, não foi possível rejeitar estas hipóteses com 5% de
significância. Também testamos as hipóteses de que as médias dos tempos de
serviço eram iguais para os caixas normais e rápidos, e, em ambos os casos,
também não foi possível rejeitar tais hipóteses com 5% significância. Observe
que, para cada tipo de caixa, os desvios padrões dos intervalos de tempo entre
chegadas e dos tempos de serviço são bem pequenos, comparativamente às suas
respectivas médias (tabela_1). Assim, é razoável admitir que todos os caixas
normais e todos os caixas rápidos têm intervalos médios entre chegadas e tempos
médios de serviço iguais. A tabela_2 apresenta as taxas e as utilizações médias
correspondentes.
Para verificar as hipóteses da seção 3 de que os intervalos de tempo entre
chegadas e os tempos de serviço são exponencialmente distribuídos, aplicamos os
testes de Kolmogorov-Smirnov e Anderson-Darling (utilizamos o software Best-Fit
2.0d da Palisade Tools). Os testes não rejeitaram (5% de significância) a
hipótese de intervalos entre chegadas exponenciais em todos os caixas, exceto
no caixa normal 4. No caso dos tempos de serviço, os testes não rejeitaram a
hipótese de distribuição exponencial em todos os caixas, exceto nos caixas
rápidos 6 e 7. Entretanto, por simplicidade, admitimos que os intervalos entre
chegadas e os tempos de serviço sejam exponencialmente distribuídos em todos os
caixas, com taxas médias iguais às da tabela_2. Desta maneira, os três modelos
discutidos na seção anterior podem ser utilizados como aproximações.
5. Medidas de desempenho
Nesta seção analisamos os resultados obtidos com a aplicação do modelo (i) (um
sistema M/M/m de fila única), modelo (ii) (m sistemas M/M/1 paralelos e
independentes), e modelo (iii) da seção 3. Neste último, admitimos que N = 5
para os caixas normais, e N = 10 para os caixas rápidos. A escolha destes
valores levou em conta o espaço disponível para formação de filas na frente dos
caixas, e o fato dos consumidores dos caixas normais em geral utilizarem
carrinhos grandes, ao contrário dos consumidores dos caixas rápidos. Conforme o
gerente do supermercado, filas com mais de três consumidores em todos os caixas
normais começam a gerar reclamações por parte dos consumidores.
Os modelos (i)-(iii) foram implementados em linguagem Pascal (compilador Delphi
4) num microcomputador Pentium 100 Mhz. Os sistemas lineares do modelo (iii)
foram gerados automaticamente, conforme as idéias de Larson (1974) para o
modelo hipercubo, e resolvidos por meio do método de Gauss-Jordan. Os tempos
computacionais para resolvê-los foram da ordem de poucos segundos.
As tabelas_3 e 4 apresentam o número médio de consumidores no sistema e o tempo
médio de espera em fila obtidos com cada um dos três modelos para os caixas
normais (m = 5) e rápidos (m = 2), respectivamente. Por conveniência, a última
coluna das tabelas apresenta novamente o tempo médio de espera em fila
observado na amostra coletada, conforme tabela_1. No caso do modelo (iii), as
tabelas_3 e 4 apresentam os valores obtidos variando-se ka partir de 1, até que
os tempos médios de espera em fila Wqfossem maiores do que os observados na
amostra (última coluna da tabela_1). Lembre-se da seção 3 que os tempos médios
de espera em fila para os modelos (i) e (ii) são casos especiais do modelo
(iii) com k=1 e N=infinito, e k=infinito e N=infinito, respectivamente.
Como era esperado (conforme discussão na seção 3), tanto para os caixas normais
quanto para os rápidos, os tempos médios de espera mais próximos dos observados
na amostra foram obtidos com o modelo (iii). Nos caixas normais (tabela_3), o
valor 2,47 minutos foi obtido com k = 2 (com um desvio de 14% do valor
observado 2,16 minutos), enquanto que nos caixas rápidos (tabela_4), o valor
0,93 minutos foi obtido com k = 3 (desvio de apenas -2% em relação ao observado
0,95 minutos). Os sistemas lineares correspondentes resultaram em 876 e 65
equações, respectivamente. A precisão da aproximação fornecida pelo modelo
(iii) é aceitável para tomar decisões de alocação de capacidade em função do
nível de serviço desejado para os consumidores (no caso, o tempo médio de
espera em fila). Isto sugere que o modelo (iii), diferente dos modelos (i) e
(ii), pode ser uma boa aproximação para o sistema de filas do supermercado em
consideração.
Convém observar que, na amostra em consideração, os consumidores dos caixas
rápidos parecem ser um pouco mais tolerantes a variações nos tamanhos das filas
dos caixas adjacentes do que os consumidores dos caixas normais (k = 2, no caso
dos caixas normais, contra k = 3, no caso dos caixas rápidos). Isto talvez seja
devido ao fato de que os tempos médios de espera em fila e os tempos médios de
serviço nos caixas rápidos sejam bem menores do que nos caixas normais.
Acreditamos que isso nem sempre ocorre, mesmo porque esperávamos o efeito
oposto, devido ao fato dos caixas normais serem mais numerosos (m = 5 caixas
normais, contra m =2 caixas rápidos) e seus consumidores carregarem bem mais
itens de compra, o que poderia desestimular os consumidores em fila a mudarem
para filas mais distantes. Experimentos adicionais precisariam ser realizados
para verificar melhor estas observações; note que, no presente experimento, a
hipótese de distribuição exponencial para os tempos de serviço dos caixas
rápidos foi rejeitada (seção 4), o que pode comprometer parte das observações
acima, baseadas nos resultados de um modelo Markoviano.
Uma última observação é que os resultados do modelo (iii) são robustos em
relação à pequenas variações no parâmetro N. Por exemplo, variando-se Ndos
caixas normais em mais ou menos 20% (i.e., de N=5 para N=6, ou de N=5 para
N=4), o tempo médio de espera em fila varia menos de 0,5% (i.e., de 2,47 para
2,48 minutos, ou de 2,47 para 2,46 minutos, respectivamente).
6. Conclusões e perspectivas
Neste estudo aplicamos teoria de filas para modelar o tempo médio de espera dos
consumidores nos caixas de supermercados. Três modelos foram explorados: (i)
representar o sistema por meio de um modelo M/M/m de fila única, onde m é o
número de caixas em operação, (ii) representar o sistema por meio de mmodelos
M/M/1 paralelos e independentes, e (iii) representar o sistema por meio de um
modelo Markoviano mais geral, onde os dois modelos anteriores podem ser vistos
como casos particulares. Para avaliar o desempenho destes modelos, realizamos
um estudo de caso num dos supermercados da rede Jaú-Serve, que atua no interior
de São Paulo. Os resultados mostraram que o modelo (iii) pode ser uma boa
aproximação para o sistema, ao contrário dos modelos (i) e (ii).
Acreditamos que outros experimentos ainda são necessários para avaliar a
precisão do modelo (iii) e sua validação nos casos práticos. Uma perspectiva
interessante para pesquisa futura é investigar a sensibilidade do modelo com
respeito a variações no valor dos parâmetros, e explorar o projeto ótimo e a
análise de curvas de tradeoff entre medidas de desempenho do sistema, a exemplo
do que foi feito em Tang e Yoo (1991), Fontanella e Morabito (1997) e Bitran e
Morabito (1999). Em particular, poderia-se estudar melhor o tradeoff entre o
nível de serviço (p.e., tempo médio de espera em fila) e a capacidade do
sistema (número de caixas normais e rápidos num dado período).
Outra perspectiva interessante para pesquisa futura é desenvolver aproximações
baseadas no modelo (iii) para os casos em que o número de caixas mé grande
(lembre-se da seção 3 que o número de equações de equilíbrio do modelo cresce
exponencialmente com o aumento de m). Nestes casos, o modelo (iii) deve ser
adaptado para tratar situações em que os consumidores, ao chegarem, escolhem o
caixa com menor fila apenas dentre os caixas mais próximos ou dentro do seus
campos de visão, ao invés de todos os caixas. Similarmente, as situações em que
os consumidores mudam de fila dependendo do tamanho das filas apenas dos caixas
adjacentes, ao invés de todos os caixas.