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BrBRCEEx0100-40421998000100015

BrBRCEEx0100-40421998000100015

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolEx-Tech-Multi Sciences
Great areaExact-Earth Sciences
ISSN0100-4042
Year1998
Issue0001
Article number00015

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Estratégias para a obtenção de compostos farmacologicamente ativos a partir de plantas medicinais: conceitos sobre modificação estrutural para otimização da atividade *Método da concentração inibitória mínima41,42 - Atividade analgésica: * Modelo de contorções abdominais induzidas pelo ácido acético em camundongos43,44 * Modelo de dor induzida pela formalina em camundongos45,46 * Modelo da placa quente47 - Atividade antiinflamatória: * Modelo do edema de pata de rato48,49 * Modelo da pleurisia induzida por neurotransmissores50 - Atividade antiespasmódica: * Contração de órgão isolado induzida por neurotransmissores51,52 - Atividade antialérgica: * Modelo do edema alérgico em camundongos ativamente sensibilizados por ovoalbumina53 - Atividade antitumoral: * Modelo da leucemia "in vivo"54 2.4. Separação, purificação e identificação dos constituintes químicos O extrato selecionado no item 2.2 deverá ser submetido à diferentes técnicas cromatográficas. A princípio, é geralmente empregada a cromatografia em coluna aberta (CC)55, com silica gel como fase estacionária, onde, dependendo do extrato, a mesma é eluída com uma mistura de solventes que deve ser previamente determinada por cromatografia em camada delgada (CCD)56,57. Outros suportes cromatográficos podem ser usados, como alumina, celulose, poliamida e sephadex58,59.

As frações obtidas devem ser reunidas segundo seu perfil cromatográfico, verificado por CCD. Em muitos casos, se obtém compostos puros numa única CC, ou utilizando a cromatografia "flash"60ou ainda após uma simples recristalização da substância isolada. As frações reunidas, após serem analisadas farmacologicamente e se apresentarem atividade, devem ser novamente submetidas à CC ou, dependendo da complexidade da mistura, à técnicas cromatográficas especiais, como cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE)61, cromatografia de dupla contra-corrente (CDCC)62, etc. Uma vez isolados os compostos ativos, deve-se proceder a elucidação estrutural dos mesmos. Uma ferramenta que seria importante para a identificação rápida e eficiente de misturas, consiste no uso de cromatografia gasosa ou cromatografia gasosa acoplada ao espectrômetro de massa, onde grande parte dos componentes de uma mistura pode ser identificada e quantificada63,64.

O uso em conjunto de técnicas espectrais, como UV, IV, RMN 1H e 13C e MS65-68 aliado ao uso de técnicas sofisticadas de RMN (NOE, COSY, HETCOR, INADEQUATE, etc.)3, 69-71 tem permitido propôr com segurança a estrutura molecular de substâncias naturais. Além disso, o uso de difração de raios-X, quando possível, possibilita avaliar a estereoquímica real destas substâncias72.

2.5. Modificação estrutural e correlação entre estrutura química e atividade biológica Uma vez obtido um composto biologicamente ativo, pode-se lançar mão de estudos envolvendomodificação molecular, também chamada de variação molecular ou manipulação molecular, que constitui-se, certamente, no método mais usado e recompensador para otimizar essa atividade73,74. Muitas mudanças podem ser introduzidas numa molécula, dependendo de seus grupos reativos. Inicialmente, realizam-se modificações procurando introduzir grupos que conferem ao composto em estudo uma maior ou menor hidrofobicidade ou grupos doadores e/ou aceptores de elétrons, permitindo posteriormente a aplicação de algum método de correlação entre a estrutura química e a atividade biológica, que pode ser qualitativa como quantitativa (SAR e QSAR).

Neste contexto, foram desenvolvidos vários métodos de correlação estrutura- atividade, objetivando promover um planejamento racional de novas moléculas ativas. A aplicação destes métodos auxilia na predição de qual novo grupo ou átomo pode ser introduzido em determinada molécula para torná-la mais ativa, proporcionando assim muitas vantagens aos químicos e farmacólogos. O método mais usado, principalmente por indústrias farmacêuticas, foi desenvolvido por Hansch e colaboradores75, que procura relacionar a atividade biológica com as propriedades físico-químicas das moléculas em estudo: a hidrofobicidade (p), fatores eletrônicos (s) e estéricos (Es), valores estes tabelados, obtidos experimentalmente. Detalhes sobre estes e outros métodos de QSAR podem ser obtidos em vários livros e artigos relatados na literatura76-81.

Abaixo são citados dois exemplos recentemente obtidos por nosso grupo de pesquisa, sobre a aplicação de modificações estruturais em compostos naturais abundantes, que proporcionaram a obtenção de resultados farmacológicos relevantes: a) a xantoxilina (1), um produto natural antiespasmódico isolado da Sebastiania schottiana (sarandi negro) com rendimento de 0,25 %82teve seu efeito farmacológico notavelmente aumentado quando grupos benzilas contendo substituintes hidrofóbicos e doadores de elétrons foram introduzidos (2)83,84, segundo indicações obtidas com o uso do método manual de Topliss76,77.

b) a astilbina (3), flavonóide glicosilado isolado de Hymenaea martiana (jatobá) com alto rendimento85,86, após hidrólise ácida foi transformada na taxifolina (4), molécula muito mais efetiva como analgésica do que a própria astilbina. A metilação de (4) forneceu a taxifolina tetrametilada (5), que apresentou efeito analgésico muito mais potente do que várias drogas tradicionalmente usadas na clínica10, 87,88.

Outro aspecto importante que vale ressaltar é que a partir de compostos inativos em determinado modelo farmacológico, com pequenas modificações estruturais, empregando o critério da similaridade com compostos de reconhecida ação biológica, pode-se sintetizar compostos de relevantes efeitos biológicos89. Como exemplo deste caso, podemos citar a síntese do derivado benzofurânico (6), a partir de (1), baseada na reconhecida atividade farmacológica de compostos do tipo benzofurano90. Este composto apresentou efeito analgésico extremamente potente quando testado em diferentes modelos de dor em camundongos, sendo cerca de 130 vezes mais ativo do que a aspirina e o acetaminofeno no modelo de contorções abdominais induzidas pelo ácido acético, e parece atuar por um novo mecanismo de ação analgésica, diferente dos conhecidos mecanismos da aspirina e da morfina91,92.

2.6. Síntese de compostos análogos a princípios ativos Um dos aspectos de interesse no que tange ao estudo de plantas medicinais envolve a utilização dos compostos naturais ativos como modelo para a síntese de substâncias análogas mais potentes e seletivas, que podem ser obtidas mais facilmente e talvez a custos menores. Muitos fármacos disponíveis atualmente no mercado farmacêutico foram obtidos sinteticamente baseados em estruturas naturais ativas80,93,94. Podemos citar como exemplo da importância químico- medicinal da síntese de análogos de princípios ativos os estudos obtidos em nossos laboratórios com a molécula da filantimida (7). Este composto, um alcalóide inédito isolado de Phyllanthus sellowianus com efeito antiespasmódico moderado34,95foi usado como modelo para a obtenção de vários análogos, particularmente succinimidas e maleimidas (8), os quais apresentaram potentes ações antiespasmódicas96, analgésicas97, antibacterianas98,99 e antifúngicas100. Estas imidas cíclicas, além de demonstrarem efeitos muito mais potentes do que a própria filantimida e drogas padrões utilizadas na terapêutica atual, possibilitaram a elucidação de vários fatores estruturais relacionados com os efeitos biológicos indicados10.

3. INTERAÇÃO ENTRE A QUÍMICA E A FARMACOLOGIA Um dos fatores de extrema importância para a descoberta de princípios ativos naturais consiste, principalmente, na interação entre a química e a farmacologia. Quanto mais estreita for esta colaboração, mais rápida e consistentemente serão alcançados os objetivos almejados. Podemos citar como exemplo da necessidade desta integração os resultados obtidos em nossos laboratórios com as plantas do gênero Phyllanthus, conhecidas como "quebra pedra" e amplamente usadas na medicina popular de vários países, incluindo o Brasil, contra várias patologias101,102. Em nossos estudos, demonstramos que os extratos brutos de diferentes espécies de Phyllanthus exercem potentes efeitos analgésicos quando analisados em diferentes modelos experimentais de dor em camundongos103-105 com potência muito maior do que algumas drogas utilizadas na clínica, como a aspirina e o acetaminofeno. Considerando como exemplo o P. sellowianus, foi inicialmente verificado que seu extrato hidroalcoólico, quando testado no modelo de contorções abdominais induzidas pelo ácido acético 0,6%, apresentou inibição dose-dependente, com uma DI50 (dose capaz de inibir em 50% as contorções em relação ao controle) de 53,0 (45,0-61,0) mg/kg103. Após sucessivas partições a partir deste extrato, realizadas no laboratório de química, constatou-se, no laboratório de farmacologia, que as frações de hexano (DI50 < 30 mg/kg) e de acetato de etila (DI50 < 20 mg/kg) apresentavam uma maior potência do que o extrato de partida.

Estas frações semi-purificadas foram novamente analisadas no laboratório de química, onde obteve-se dois fitoesteróides muito comuns em plantas, estigmasterol eb-sitoesterol, que nunca foram avaliados quanto aos seus efeitos analgésicos, mas cujos resultados farmacológicos indicaram uma ação equipotente à aspirina. Os valores de DI50 foram 16,0 (13,6-20,3) e 9,0 (3,5-23,2) mg/kg para estigmasterol e b-sitoesterol, respectivamente106, sendo portanto mais ativos do que os extratos de origem. Por outro lado, o extrato de acetato de etila, quando avaliado fitoquimicamente, forneceu vários compostos ativos como os taninos furosina e geranina, cujos resultados farmacológicos obtidos no modelo de contorções induzidas pelo AcOH foram bastante promissores, com valores de DI50 de 12,9 (7,1-23,4) e 19,0 (10,9-33,1) mg/kg, respectivamente107. Além disso, foi possível isolar também deste extrato os flavonóides quercetina e rutina, que apresentaram relevante ação analgésica com DI50 de 4,3 (3,3-5,7) e 1,3 (0,8-2,1) mg/kg, respectivamente, além do galato de etila, composto fenólico que também exerceu efeitos analgésicos com DI50 de 34,7 (27,5-43,7) mg/kg108-109.

A presença de todos os compostos analgésicos isolados de P. sellowianus demonstra a complexidade do estudo de plantas medicinais e a necessidade de uma clara orientação na interpretação dos resultados. No entanto, a ocorrência ou não de sinergismo entre os compostos indicados está sendo atualmente investigada em novos experimentos, que estes estudos são importantes para uma melhor compreensão dos efeitos biológicos de produtos naturais. É importante ressaltar que, embora algumas teorias médicas modernas contestem a ocorrência de sinergismo em plantas, são muitos os exemplos práticos relatados na literatura. Como exemplo, podemos citar um trabalho desenvolvido por pesquisadores japoneses, que demonstraram recentemente esta hipótese no estudo do fitoterápico Sho-Saiko-To, uma mistura de 7 ervas que atua na prevenção de câncer de fígado110.

Conforme mencionado, pode-se afirmar que tanto a química quanto a farmacologia são áreas imprescindíveis para a obtenção de princípios naturais ativos, e devem sempre estar em íntima colaboração no desenvolvimento destas investigações.

4. PARTE EXPERIMENTAL: PRINCIPAIS CUIDADOS E DIFICULDADES Um dos fatores importantes no estudo de plantas consiste na experiência dos pesquisadores envolvidos. Muitas vezes, a falta de experiência leva a erros que podem tanto comprometer os resultados experimentais como dispender maior tempo e recursos e não atingir os objetivos almejados. Assim, pode-se enumerar alguns cuidados que devem ser tomados em laboratório quando se busca obter compostos bioativos: 1) Seleção_do_material_vegetal: Um dos cuidados que deve ser levado em consideração envolve informações sobre possíveis efeitos tóxicos da planta a ser selecionada. Plantas que tenham o nome popular de mata-boi, mata-cavalo, etc, devem ser vistas com restrições, que a presença de constituintes tóxicos pode comprometer todo o estudo realizado. A planta a ser investigada deve ser classificada com segurança e a coleta deve ser feita com muito cuidado para não serem agregadas outras espécies diferentes. Também deve ser levada em consideração a quantidade de planta que viceja no local de coleta, para que os estudos não fiquem prejudicados. A secagem, em estufa (40oC) ou à sombra à temperatura ambiente deve ser procedida logo após a coleta para evitar a proliferação de fungos. Caso se deseje armazenar o material vegetal, o mesmo pode ser acondicionado em freezer. Na preparação dos extratos, a planta deve estar completamente fresca ou totalmente seca para definir com melhor exatidão o rendimento tanto da massa bruta como dos constituintes químicos.

2)Solvente: A escolha do solvente é de fundamental importância tanto para a obtenção de extratos como para utilizá-lo como eluente em cromatografia em coluna. Impurezas, como ftalatos, usados como estabilizantes de plásticos, podem ser transferidas para o extrato e também dificultar o isolamento dos constituintes naturais. Outro aspecto que deve ser verificado é a presença de água, que influencia significativamente nas separações cromatográficas.

A formação de artefatos na preparação de extratos é muito comum. Isto ocorre, geralmente, quando se aquece demais determinado extrato ou se usa um solvente inadequado para extração. Por exemplo, o clorofórmio, que geralmente contém HCl, quando usado para extração, pode fornecer produtos não naturais formados pela ação do ácido. A acetona também deve ser usada com restrição, que pode reagir com alguns compostos que contém o grupo amino.

3) Testes_biológicos: A avaliação dos efeitos biológicos tanto "in vitro"como " in vivo" depende de vários fatores, tanto estruturais quanto experimentais. É essencial que a Instituição de pesquisa possua um bom biotério e um laboratório exclusivo para a realização dos experimentos, e a escolha dos modelos deve ser de maneira que possam ser reproduzidos corretamente e evitados os resultados falso-positivos. Os experimentos devem ser repetidos várias vezes para se obter dados estatísticos que comprovem a eficácia do material testado.

5. CONCLUSÕES A fitoterapia constitui uma forma de medicina que vem crescendo visivelmente ao longo dos anos onde atualmente o mercado mundial de fitofármacos gira em torno de 15 bilhões de dolares. Talvez o principal fator a contribuir consideravelmente para o crescimento em questão consista na evolução dos estudos científicos, particularmente os estudos químicos e farmacológicos, que comprovam, cada vez mais, a eficácia das plantas medicinais, principalmente aquelas empregadas na medicina popular com finalidades terapêuticas.

Entretanto, a necessidade de se chegar aos compostos puros responsáveis pelos efeitos biológicos apresentados pelos extratos, leva a uma obrigatória integração entre a química e a farmacologia molecular, cujo elo pode levar à obtenção de substâncias naturais ou sintéticas de grande interesse químico- medicinal.

Em nosso país, os estudos científicos envolvendo produtos naturais ativos, suas indicações e contra-indicações, podem proporcionar aos fitofármacos um maior nível de aceitação médica, respaldados pela comprovação de sua eficácia terapêutica em experimentos farmacológicos pré-clínicos e clínicos. Este fato é de extrema importância, considerando-se que o Brasil se encontra atualmente nas primeiras posições no mercado mundial de fármacos, necessitando urgentemente que as indústrias de fitofármacos existentes se desenvolvam para competir inclusive a nível internacional. A instalação de indústrias envolvendo a síntese de fármacos a partir de produtos naturais poderia, assim, ser um considerável polo de crescimento para a química e a farmacologia.


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