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BrBRCEEx0100-40421999000100013

BrBRCEEx0100-40421999000100013

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolEx-Tech-Multi Sciences
Great areaExact-Earth Sciences
ISSN0100-4042
Year1999
Issue0001
Article number00013

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A qualidade do ar de interiores e a química

1. INTRODUÇÃO A qualidade do ar de interiores (QAI) tornou-se um tema de pesquisa importante na área de saúde pública nos últimos 15 anos. Esse interesse ocorreu após a descoberta de que baixas taxas de troca de ar nestes ambientes ocasionam um aumento considerável na concentração de poluentes químicos e biológicos no ar1.

Como todos passamos boa parte de nossa vida diária em recintos fechados, seja em casa, no trabalho, no transporte, ou mesmo em locais de lazer, a preocupação com concentrações de contaminantes no ar em ambientes internos é justificável.

A disciplina que estuda a qualidade do ar de interiores, chamada "Indoor Air Quality", é nova, com cerca de 25 anos no mundo e com apenas 5 anos no Brasil. É uma nova área de estudo que reúne profissionais de diferentes disciplinas, principalmente químicos, microbiologistas, engenheiros, arquitetos e toxicologistas.

Nessas últimas décadas, houve um grande aumento de queixas relacionadas à qualidade de ar em locais fechados nos países desenvolvidos, principalmente em edifícios de microclima artificial. Essas queixas geraram estudos que foram conduzidos em diferentes países e períodos, indicando que o ar dentro de casa e outros locais fechados pode estar mais poluído do que o ar externo nas grandes cidades industrializadas2a-f.

Ironicamente, o movimento mundial de conservação de energia, desencadeado na decáda de 70, contribuiu de uma forma bastante marcante para as preocupações atuais referentes à qualidade do ar de interiores. Com o intuito de obter uma melhor eficiência nos aparelhos de refrigeração e aquecimento e, com isso, minimizar o consumo de energia, os prédios de escritórios e residenciais (principalmente em países desenvolvidos localizados em clima frio) a partir daquela década, foram construídos visando uma vedação térmica mais eficiente, surgindo os chamados prédios selados.

Paralelamente, houve um grande aumento na diversidade de produtos para forração, acabamento e mobiliário, que contém substâncias químicas passíveis de serem dispersas no ar de interiores, disponível no mercado consumidor. Esses materiais, na maioria dos casos, foram desenvolvidos sem uma preocupação com suas emissões. Atualmente, sabe-se que uma das causas do deterioramento da qualidade do ar de interiores é devida a essa emissão de substâncias químicas, principalmente compostos orgânicos voláteis (COVs), presentes na composição de materiais de construção3, limpeza e mobiliário4.

A combinação desses dois fatores pode ocasionar, via de regra, uma baixa qualidade do ar de interiores. Em resumo, a existência de "prédios doentes" coincide com as mudanças no meio ambiente interno, que ocorrem não apenas devido à introdução de novos produtos de materiais de construção, consumo e mobiliário, como também às trocas arquitetônicas no ambiente interno, com o intuito de economizar energia.

Esses estudos têm sido realizados principalmente na Europa e nos Estados Unidos. Contudo, a simples comparação desses estudos com a realidade brasileira não é recomendável. No Brasil, diferenças relacionadas a fatores climáticos, sócio-econômicos, geográficos e habitacionais são bastante evidentes. Por exemplo, os países desenvolvidos, situados no hemisfério norte, apresentam um clima temperado, ao passo que o Brasil possui um clima predominantemente tropical e subtropical. Somente esta diferença climática acarretará uma variação considerável na dinâmica dos poluentes atmosféricos nesses dois sistemas.

Atualmente, no Brasil, está havendo uma conscientização da imprensa não especializada5sobre a importância da qualidade do ar de interiores em locais não industriais, tais como escolas, residências, edifícios públicos e comerciais. Em meados de 1996, o Governo Federal Brasileiro proibiu o fumo em lugares fechados de uso coletivo, baseado em pesquisas realizadas por agências internacionais. Contudo, essa lei é bastante simplória, que induz a pensar que a fumaça do tabaco é a grande e única culpada da baixa qualidade do ar respirado em locais fechados.

Apesar do interesse despertado, infelizmente ainda não existe nenhuma medida, tanto do governo federal quanto do estadual, em avaliar o ar, o qual a população média brasileira estaria exposta. Na realidade, a discussão em torno das leis que regulamentam a qualidade do ar de interiores (QAI) em nosso país esconde questões muito mais abrangentes, dentre as quais a formulação de conclusões precipitadas, geradas antes mesmo das devidas ponderações.

Em resumo, a QAI envolve a combinação de vários fatores complexos que estão constantemente sofrendo alterações. Logo, a avaliação e a remediação dos problemas relacionados à QAI requerem um entendimento das fontes de emissão, da ventilação do prédio e das salas, e dos processos que afetam o transporte e o destino dos contaminantes. Juntos, esses processos determinam as concentrações finais dos contaminantes que, após serem detectados e quantificados, possibilitam a avaliação da QAI.

As seções seguintes tratarão, com maior destaque, das questões referentes aos processos de emissões e destino de poluentes químicos. Contudo, em ambientes climatizados artificialmente, o conhecimento de engenharia de ar condicionado é sempre muito útil. De uma maneira geral, em um sistema de ar condicionado central, várias salas são servidas por uma mesma máquina (fan-coil) e nem sempre, por ocasião do projeto, essas terão o mesmo tipo de atividade (gerando o mesmo tipo de poluentes). Outro fator complicador é o rearranjo de ambientes com divisórias, sem levar em consideração os diferentes pontos de captação do retorno de ar para cada fan-coil.

A Figura_1 ilustra, de uma maneira simplificada, o mecanismo de transporte, em um sistema de ventilação mecânica, de poluentes presentes no ar. Através desse processo, fontes desconhecidas de emissão, presentes em um determinado local do prédio, podem contaminar toda a área em que atua a unidade de ar condicionado.

2. DESENVOLVIMENTO NO BRASIL Entre 1965 e 1994, a porcentagem da população brasileira vivendo em áreas urbanas cresceu de 46% para 75,5%. Na maioria dos casos, a migração da população residente em áreas rurais para áreas urbanas ocasionou um saturamento da malha rodoviária dos grandes centros urbanos, ocasionando constantes congestionamentos, principalmente nas horas de maior movimento. Esse aumento ocasionou a deterioração da qualidade do ar urbano, refletindo-se na QAI, tendo em vista que o ar interno procede do exterior.

No início de 1993 foi realizado o primeiro levantamento brasileiro sobre poluição química do ar de interiores, operacionalizado pelo Laboratório de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico (LADETEC), do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em cooperação com o Laboratório de Aerossóis e Gases Atmosféricos (LAGA), do Instituto de Química da Universidade de São Paulo, São Paulo. Nesse estudo foram avaliados ambientes de escritório, hotéis e restaurantes nas cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas6,7,8.

A pesquisa detectou níveis de vários poluentes acima ou próximos aos limites fixados pelas legislações internacionais.

No final de 1995 e durante o ano de 1996, foi realizado o segundo levantamento da QAI no Brasil. Foram avaliados escritórios em prédios administrativos na cidade do Rio de Janeiro e no Museu Nacional de Belas Artes, localizado no centro do Rio. Valores de contaminantes até dez vezes maiores do que no ar externo foram encontrados nesses prédios [razão interna/externa de contaminantes (I/E)], indicando um acúmulo de poluentes no ar interno, devido primariamente ao fato de o sistema de ar condicionado central operar com baixa troca de ar9,10,11. No museu que possui ventilação natural12, a razão interna/ externa (I/E) de contaminantes ficou próxima de um, mostrando a importância de uma ventilação natural diluidora na QAI. Esse estudo concorda com outros estudos internacionais que indicam que a ventilação deficiente do ar é a principal causa de problemas de poluição em ambientes internos.

Apesar de QAI ser uma área de pesquisa recente no Brasil, em novembro de 1995 foi instituída a Sociedade Brasileira de Meio Ambiente e Controle de Qualidade de Ar de Interiores - "BRASINDOOR" - com o objetivo de promover o intercâmbio de diferentes especialidades na questão da QAI.

Paralelamente à contribuição dos químicos na questão da QAI, existe o interesse de outras áreas interligadas a essa questão. É o caso do Sindicato das Indústrias de Refrigeração, Aquecimento e Tratamento do Ar do Município do Rio de Janeiro, que contactou o LADETEC-IQ/UFRJ em 1995, solicitando consultoria e seminários com o intuito de conscientizar seus membros. Existe um grupo na Faculdade de Saúde Pública da USP realizando estudos referentes à contaminação microbiológica. Na última conferência internacional referente ao assunto "INDOOR AIR'96", realizado no Japão, foi observada a publicação de trabalhos realizados no Brasil por grupos com formação em engenharia civil e arquitetura e urbanismo13.

A avaliação de contaminantes no ar de ambientes residenciais no estado do Rio de Janeiro faz parte do nosso próximo projeto nesta área. Até o presente momento, apenas dois levantamentos de exposição ao radônio foram efetuados em ambientes residenciais no Brasil14,15. Levando-se em conta que um brasileiro típico gasta no mínimo 12 horas do seu tempo diário no ambiente doméstico (considerando, por exemplo, um indivíduo que sai de casa para o trabalho às 6 h e chega do trabalho às 18h), torna-se de considerável importância a avaliação da qualidade do ar em residências urbanas brasileiras típicas, com o intuito de um mapeamento dos níveis de contaminantes encontrados em tais ambientes.

Atualmente, o Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH), da Fundação Oswaldo Cruz, está desenvolvendo um programa de estudos da Qualidade do Ar de Interiores. Um dos principais objetivos desse programa é promover o intercâmbio dessa área de pesquisa entre diferentes grupos brasileiros, através de estudos inter-institucionais.

3. FONTES, TIPOS E INDICADORES DE POLUIÇÃO As próprias pessoas e suas respectivas atividades ocupacionais são um dos maiores contribuintes para a poluição do ar em ambientes fechados. Não apenas pela liberação de dióxido de carbono através da respiração, ou de substâncias químicas pela transpiração, mas também pelo transporte de microorganismos (bactérias, fungos, vírus e ácaros). Além disso, o hábito de fumar somado ao desempenho de funções, como pintar, cozinhar e limpar, contribuem para a dinâmica de poluição do ar nesse tipo de ambiente16,17.

A rigor, pode-se dividir os tipos de poluentes em: materiais particulados, aerossóis, vapores e gases. Esses, por sua vez, podem ser classificados em orgânicos, inorgânicos e biológicos (Tabela_1). Fontes típicas de poluição do ar, nesse tipo de sistema, incluem materiais de construção, de acabamento e de escritórios. Itens como, carpetes, móveis, roupas e tapetes não somente liberam fibras, formaldeído e outras substâncias químicas, como também fornecem ambiente propício para a proliferação de agentes biológicos, tais como bactérias, fungos e ácaros (Fig._2). Simples processos de limpeza, como varrer, aspirar e espanar a poeira, normalmente removem as partículas grandes.

Entretanto, freqüentemente aumentam, por ressuspensão, a concentração de partículas pequenas no ar.

Indicadores relacionados à QAI são fatores que potencialmente causam18,19,20 (ou estão associados a outros fatores que causam) a chamada Síndrome do Edifício Doente (SED; seção IV). Estes indicadores podem ser usados para identificar fontes de poluição, determinar falhas no sistema de ventilação e de ar condicionado, e correlacionar sintomas dos ocupantes com a qualidade do ar.

Os indicadores mais comuns da QAI são: concentrações de contaminantes, velocidades de emissão das fontes, velocidades de ventilação do ar, odor e percepção sensorial, razão de concentração interna/externa e densidade ocupacional.

Dentre os contaminantes usualmente monitorados estão o dióxido de carbono (CO2), o monóxido de carbono (CO), os compostos orgânicos voláteis totais e especiados, os compostos orgânicos semi-voláteis, o radônio, a matéria particulada, a nicotina, e as concentrações total e específica de microorganismos21.22. A poluição do ar de interiores por aerossóis alergênicos tem sido cada vez mais reconhecida como causa de sintomas respiratórios23. A quantificação de alérgenos específicos para ácaros e fungos, em ar de recintos fechados, forneceria informações importantes para entender a problemática da SED. Infelizmente, a caracterização de indicadores confiáveis ainda é problemática, especialmente para fungos, uma vez que não somente o cultivo e preparação de extratos, como a própria padronização, são bastante variáveis entre os laboratórios24,25.

Dentro desse contexto, geralmente são feitos vários tipos de determinações de diferentes classes de contaminantes. Isso é necessário devido à presença de diversas fontes de emissão, somadas às diferenças nos processos de transporte e destino dos contaminantes. Por exemplo, concentrações de COVs e COSVs podem ter pouca correlação com concentrações de fungos. Similarmente, os COVs podem ter pouca correlação entre si, devido a fontes diferentes de emissão; por exemplo, emissão de hidrocarbonetos alifáticos por tinta, formaldeído por resinas, etc.

Os fatos supra-mencionados demonstram que a determinação pura e simples de um único contaminante não serve como indicador global do problema da QAI.

3.1. Matéria Particulada Matéria particulada é a forma mais visível de poluição do ar, e é razoavelmente fácil de se determinar quantitativamente com instrumentação mínima. O termo matéria particulada total (MPT) refere-se à matéria total, em fase líquida e/ou sólida no ar, que é coletável. Matéria particulada inalável (MPI) refere-se somente àquelas partículas que são pequenas o bastante para passar pelas vias aéreas superiores e alcançar o pulmão (Fig._3). Contudo, existe, ainda, muita controvérsia relacionada ao tamanho de partícula que é depositada no aparelho respiratório. Enquanto se discute a faixa de tamanho de partícula que consegue atingir as diferentes partes do aparelho respiratório, a medida de matéria particulada inalável, por sua vez, é muito importante, pois parte do que é inalado pode ser irreversivelmente depositado nas vias respiratórias.

Os diâmetros das partículas determinam o seu destino, isto é, se elas se depositarão em superfícies horizontais e verticais, se ficarão suspensas no ar, ou se serão removidas por filtros de ar condicionado ou aspiradores à vácuo. E, uma vez inaladas, se serão removidas pelas vias aéreas superiores ou se irão atingir os alvéolos e depositar-se irreversivelmente (Fig._3). A composição química da matéria particulada no ar, em ambientes fechados, é altamente variável, constituindo-se de esporos de mofo, amianto, fibras sintéticas, restos de insetos e comida, pólen, aerossóis de produtos de consumo (desodorante, fixador de cabelos) e alérgenos26. Portanto, o conhecimento da composição da matéria particulada de um determinado ambiente possibilitará a previsão de efeitos específicos que sejam adversos à saúde.

Existem vários mecanismos pelos quais as partículas do ar em recintos fechados podem ser produzidas, ou tornar-se aéreas27. O atrito entre partes que se movimentam ou pedaços de móveis produzirão partículas sólidas; varrer, tirar a poeira, ou limpar utilizando aspiração à vácuo facilita a reentrada de partículas sólidas no ar; umidificadores e vários tipos de "sprays" produzem partículas líquidas28. O ato de fumar, ou mesmo cozinhar, produz a condensação de aerossóis, tanto sólidos, como líquidos, bem como o simples acionar da descarga de banheiros.

Os problemas causados por partículas, além daqueles relacionados à saúde, incluem deposição nas superfícies29, resultando em chão e janelas sujas, estragos nas máquinas de precisão, depósito de sujeira, descoloração de obras de arte em museus, etc.

3.2. Radônio O radônio é um gás radioativo produzido pelo decaimento do elemento químico rádio. Esse gás está presente nos solos, águas freáticas, e em inúmeros materiais de construção, tais como concreto, pedras e tijolos22. Os mecanismos de penetração em recintos fechados variam enormemente. O radônio originário do solo pode entrar em recintos fechados através de fissuras e rachaduras localizadas no alicerce do prédio, paredes e lajes. Paralelamente, materiais de construção de origem natural, tais como tijolo de argila, mármore e arenito, variam amplamente em concentração de radônio, e o nível de radônio em ambientes fechados pode aumentar consideravelmente pela emissão a partir desses materiais. A Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (U. S. EPA) tem estimado que a concentração de radônio em milhões de residências nos Estados Unidos é maior que o nível recomendado de 4 pCi/L, e classifica esse gás como um dos principais poluentes em recintos fechados, pois representa um sério risco à saúde da população30. Por outro lado, esse limite é discutível e varia de país para país. No Canadá, por exemplo, o nível máximo recomendado é de 20 pCi/L. Segundo STONE31, um estudo realizado em residências canadenses não encontrou nenhuma relação entre níveis de radônio e câncer no pulmão. No Brasil, existem alguns poucos trabalhos realizados sobre o problema do radônio na atmosfera e em materiais de construção14,15.

3.3. Compostos Orgânicos São os que apresentam maior variedade. Em sua maioria, são considerados inócuos quando em concentrações baixas. Contudo, existem pessoas que, com o passar do tempo, desenvolvem uma sensibilidade a um determinado composto químico. As principais classes de compostos com potencial mutagênico são as N-nitrosaminas, aldeídos e hidrocarbonetos insaturados e/ou aromáticos. A reação de compostos orgânicos com NO2, gerado pela queima de tabaco e processos de combustão, pode acarretar num acréscimo adicional de compostos orgânicos nitrados com potencial mutagênico32.

3.3.1. Compostos Orgânicos Voláteis A evaporação de COVs oriundos de materiais de construção, acabamento, decoração e de mobiliário, é uma das principais fontes de COVs em recintos fechados33.

Outras fontes importantes são os processos de combustão e emissões metabólicas de microorganismos34. Contribuem ainda para agravar o quadro, os processos que melhoram o transporte desses compostos para a fase vapor35, tais como umidificadores, uso de produtos à base de aerossol36 e até mesmo os sistemas de ar condicionado, supostamente purificadores e condicionadores de ar, que podem ser uma das causas principais de poluição no ar interno37.

Como fontes comuns de COVs em ambientes fechados podemos citar os materiais de construção do próprio prédio, o sistema de ar condicionado, os produtos de consumo utilizados para manutenção e cuidados pessoais, móveis e decoração, e a incursão de ar externo. Atividades específicas como fumar cigarros e tirar fotocópias contribuem com um acréscimo de COVs38. Cada uma dessas fontes citadas faz com que os COVs em ambientes fechados sejam altamente variáveis, tornando difícil a detecção da fonte. Em outras palavras, as fontes de COVs são numerosas, e uma fonte relativamente pequena pode ocasionar um grande impacto na qualidade do ar, devido a baixos fatores de diluição, ou seu alto grau de toxidez.

Alguns COVs são relacionados a uma ou outra fonte principal, tais como formaldeído e clorofórmio. A maior fonte do formaldeído são os produtos de madeira, com ou sem acabamento, com resina de uréia-formaldeído. O clorofórmio é amplamente introduzido em ambientes fechados devido ao simples ato de tomar banho ou abrir a torneira doméstica de água39.

3.3.2. Compostos Orgânicos Semi-Voláteis Quando um composto orgânico semi-volátil (COSV) é emitido para o ar, talvez a partição vapor-partícula seja o processo físico-químico mais importante que governa o destino do composto. De fato, a extensão na qual a partição ocorre desempenhará um papel fundamental na determinação da importância relativa de deposição úmida, isto é, condensação de vapores, ou deposição seca. Existe, portanto, um interesse considerável em saber a maneira pela qual um determinado composto distribui-se entre as fases vapor e particulada40,41,42.

Os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs), variando em tamanho desde naftaleno (2 anéis) a coroneno (6 anéis), têm sido detectados em ambientes fechados. Os mais mencionados são o naftaleno e seus derivados metilados, antraceno e fenantreno, benzo[a]pireno e benzo[e]pireno, dibenzo[a,b]antraceno, benzo [g,h,i]perileno, indeno[1,2,3-cd]pireno e coroneno. O interesse em HPAs cresceu em 1978 quando Pitts et al. 43 demostraram que os HPA podem reagir com NOx para formar nitroarenos. A partir dessa data grandes esforços tem sido feitos, para detectar essa classe de composto no meio ambiente.

Os COSV são encontrados em emissões veiculares (especialmente veículos movidos a diesel), mas também nos cartuchos de fotocopiadoras, queima de madeira e tabaco. Estudos que visam a determinação da concentração de HPAs como agentes carcinogênicos, freqüentemente determinam concentrações de benzo[a]pireno e /ou "HPAs total"44. A determinação de benzo[a]pireno é muito importante, pois este composto exibe atividade carcinogênica alta em testes com animais e é considerado um provável agente carcinogênico em seres humanos45.

3.4. Queima do Tabaco A fumaça de tabaco contém milhares de constituintes químicos, e ela pode ser, em casos extremos, a maior fonte de matéria particulada respirável do ar em recintos fechados. Portanto, a queima de tabaco produz uma mistura complexa de poluentes, muitos dos quais são irritantes respiratórios46,47.

Sabe-se que concentrações altas de fumaça de tabaco incomodam e irritam os indivíduos, e que existe uma preocupação com relação aos efeitos potenciais na saúde48. Portanto, onde existe alta incidência de fumantes e mínima ventilação pode haver acúmulo da fumaça do tabaco, causando irritação, particularmente no sistema respiratório superior.

De todos os constituintes da fumaça do cigarro encontrados no ar, somente a nicotina, e outros alcalóides derivados da nicotina, algumas nitrilas, e alguns derivados da graxa da folha do tabaco, são fornecidos, quase que exclusivamente, pela fumaça do tabaco. A nicotina (I), uma piridina substituída na posição 3 pela N-metilpirrolidina, é um alcalóide da Nicotiana tabacum; é o principal alcalóide do tabaco. Durante o processo de fumar o cigarro, o tabaco queimado emite nicotina para a atmosfera. Em ar de recintos fechados, a nicotina é considerada o constituinte principal da fumaça do cigarro. Devido a sua alta afinidade por superfícies, a nicotina na fase vapor decai mais rapidamente que os outros constituintes da fumaça de cigarro49. Essa particularidade faz com que a nicotina não seja considerada um marcador ideal para processos de queima do tabaco. Contudo, enquanto se pesquisa um melhor marcador, o monitoramento da nicotina em ar de recintos fechados é uma prática aceitável.

Com relação às atividades fisiológicas, a nicotina é tóxica quando inalada, causando estresse excessivo nos sistemas circulatório e nervoso, e tem sido relacionada ao aumento da suscetibilidade para o desenvolvimento de câncer50. O Instituto Nacional para a Segurança e Saúde Ocupacional dos EEUU (NIOSH) estabeleceu um TLV para nicotina em local de trabalho de 0,5 mg/m351.

Em 1996, o governobrasileiro proibiu o fumo em locais públicos, o que não impediu que os ocupantes ainda fumassem em tais locais. Recentemente, o Instituto Nacional do Câncer (INCa) apresentou um relatório indicando que a grande mortalidade devida ao câncer do pulmão está relacionada ao fumo (11. 950 mortes).

3.5. Oxidantes Tem havido um interesse considerável em se determinar a concentração de oxidantes no ar de interiores52. Simulando as condições do ar em ambientes internos, ZHANG et al.53 mostraram reações de O3e NO2 com COVs insaturados, formando aldeídos e ácidos orgânicos. Sabe-se que o ozônio é um agente oxidante muito poderoso; esse gás reage rapidamente com certas classes de compostos orgânicos, especialmente aquelas que contém ligação insaturada carbono-carbono, gerando aldeídos e/ ou cetonas. Além de reações em fase gasosa, o ozônio participa também de reações em meio heterogêneo (exemplo, ozônio e borracha), gerando uma série de produtos de oxidação54 e, conseqüentente, causando a deterioração de materiais de construção e mobiliário dos recintos fechados.

Este mesmo ozônio é gerado usualmente, em pequena quantidade, por máquinas fotocopiadoras55 e impressoras a laser. Recentemente, Andersson et al.56 mostraram a reação entre estireno e ozônio em equipamento de ventilação simulada. A reação foi realizada num tempo de 23 segundos, tempo esse suficientemente razoável para o ar externo passar através dos dutos de ar de um determinado prédio, mostrando que a mesma reação entre COVs e ozônio é possível em condições ambientais reais.

o oxigênio, por sua vez, pode interagir com substâncias reativas e / ou luz, formando espécies reativas, tais como dióxido de nitrogênio, oxigênio singlete57, superóxido, peróxido de hidrogênio e peróxidos orgânicos. Esses transientes podem desempenhar um papel importante em reações redox, em atmosfera de ambientes fechados.

Outro gás freqüentemente encontrado tanto em ar externo quanto interno é o dióxido de nitrogênio. Esse gás oxidante é normalmente produzido por processos de combustão. Segundo Samet et al.58, a U. S. E. P. A. estabeleceu como concentração máxima anual média permitida de NO2 na atmosfera o valor de 53 ppb.

Atualmente, existem vários estudos sendo publicados tratando da problemática da presença de agentes oxidantes na formação/transformação de contaminantes no ar de recintos fechados59a-b,60. Essa nova tendência de pesquisa torna o estudo do ar de interiores ainda mais atraente.

3.6. Contaminantes externos No Brasil, onde a ventilação do ambiente geralmente é feita deixando-se as janelas abertas, a poluição do ar externo, principalmente por fumaça de veículos e emissões industriais, é o principal determinante da qualidade do ar de interiores, tanto em residências como em escritórios e casas comerciais situados próximos ao nível da rua61. A qualidade do ar externo é de importância óbvia na qualidade do ar interno. Se o ar externo não é de boa qualidade, o ar interno dificilmente será bom. Nesses casos, o ar externo deveria ser limpo através dos equipamentos de ventilação, antes de entrar no ambiente fechado.

Entretanto, medidas sérias deveriam ser tomadas a fim de se reduzir a poluição do ar urbano.

As emissões de COVs por veículos desempenham um papel importante na formação do "smog" fotoquímico, que tem ocorrido em áreas urbanas populosas no mundo inteiro62. O "smog" fotoquímico é uma mistura de poluentes secundários tais como ozônio, dióxido de nitrogênio, ácido nítrico, aldeídos e outros compostos orgânicos, formados a partir de reações fotolíticas entre dióxido de nitrogênio e hidrocarbonetos63. Portanto, a queima de combustível por veículos é uma das maiores fontes de poluentes em áreas urbanas, da qual uma boa porcentagem migra para os prédios, contribuindo para a poluição do ar interno64.

Vários estudos têm demonstrado que a qualidade do ar externo tem um impacto significativo no ar interno. FIELDet al. 65 monitoraram uma ampla variedade de poluentes no ar tanto interno quanto externo durante uma inversão térmica em Londres. Foi observado, nesse estudo, que porcentagens significativas de concentração de COVs específicos encontrados no ar externo estavam presentes no ar interno.

Apesar da importância do conhecimento da composição de poluentes na atmosfera urbana, existem poucos estudos relacionados a esse problema no Brasil66,67,68.

Grande parte desses estudos foram realizados no eixo Rio-São Paulo, tendo como principal objetivo estudos de níveis de aldeídos em atmosferas urbanas brasileiras. Esse interesse se deve, em parte, à utilização de etanol como combustível alternativo no país69a-d,70. Ainda assim, existem muitas lacunas a serem preenchidas, e existe uma necessidade imediata de estudos mais sistemáticos relacionando à interação de diferentes poluentes na atmosfera urbana tropical. Lamentavelmente, apesar do Brasil estar localizado em uma região tropical, não existe nenhum grupo de pesquisa brasileiro estudando os efeitos fotoquímicos em atmosfera tropical. Em resumo, o estudo da poluição atmosférica no Brasil ainda é pouco desenvolvido e aquele relacionado à QAI, praticamente inexistente6-12.

4. SÍNDROME DO EDIFÍCIO DOENTE A baixa qualidade do ar de interiores têm sido relacionada a um número de efeitos adversos à saúde humana, levando a Organização Mundial da Saúde (OMS) a classificar a Síndrome do Edifício Doente como um problema de saúde pública. O termo Síndrome do Edifício Doente (SED) é utilizado para descrever situações nas quais os ocupantes de um determinado edifício experimentam efeitos adversos à saúde e ao conforto. Esses efeitos parecem estar vinculados ao tempo de permanência no edifício, mas nenhuma doença específica, ou causa, pode ser identificada. As reclamações podem estar localizadas em uma determinada área ou sala, ou podem estar disseminadas por todo o edifício. Esse tipo de síndrome ocorre principalmente em edifícios selados, embora também tenha sido observada em edifícios que são ventilados naturalmente. A SED é um problema mundial, e a circulação mecânica do ar parece ser um fator bastante importante na sua prevalência. Milhões de pessoas, no mundo inteiro, trabalham em locais onde a ventilação é regulada através de sistema de circulação mecânica do ar71,72.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a SED é causada por emissões de contaminantes por fontes de várias origens, isoladas ou associadas, e pode produzir diversos sintomas. Essas condições ambientais adversas produzem altas taxas de absenteísmo e considerável redução dos níveis de produtividade do trabalhador. Os sintomas decorrentes da síndrome podem estar ligados a poluentes de origem química ou biológica.

As pessoas podem reclamar de um ou mais dos seguintes sintomas: irritação e obstrução nasal; desidratação e irritação da pele, ocasionalmente associada a rachaduras na superfície da pele exposta ao ambiente; irritação e secura na garganta; irritação e sensação de secura nas membranas dos olhos; dor de cabeça, letargia e cansaço generalizado, levando à perda de concentração.

Normalmente, esses sintomas aumentam durante a permanência no prédio (hora de trabalho) e diminuem rapidamente ao sair do prédio para o almoço e ao retornar para casa. A maioria dos sintomas, com exceção dos sintomas cutâneos, melhoram nos fins de semana e desaparecem completamente nas férias. Enfim, a Síndrome dos Edifícios Doentes implica, necessariamente, em um local de trabalho desagradável, com eficiência de trabalho reduzida e aumento nas faltas.

5. DOENÇAS, ALERGIAS E CONTAMINANTES QUÍMICOS Atualmente, uma proporção cada vez maior de pessoas está trabalhando em ambientes de escritórios em empregos relativamente sedentários. Como resultado, tem havido uma maior preocupação relacionada à exposição crônica, a níveis baixos de poluentes presentes usualmente em ambientes fechados. A resposta do trabalhador à qualidade de ar precária freqüentemente resulta numa reclamação de saúde não específica, reclamação essa que raramente pode ser diretamente relacionada a um determinado agente químico ou biológico presente no meio ambiente de escritório.

Dentre os poluentes analisados nesta revisão, os compostos orgânicos voláteis totais (COVsT) têm sido associados à presença de odores73, irritação nos olhos, nariz e boca. Numerosos estudos investigaram o efeito na saúde relacionados à inalação de formaldeído. Segundo SAMET et al.74,o limite humano para detectar o odor desse gás está na faixa de 60-1200mg/m3. a faixa de exposição na qual foi diagnosticada irritação na garganta oscila entre 120 e 3000mg/m3 na maioria dos indivíduos, enquanto irritação nos olhos tem sido registrada em níveis de 100mg/m3. LEISLIE75 relata vários trabalhos relacionados aos efeitos do formaldeído na saúde humana e, em particular, ao potencial carcinogênico dessa substância. Segundo HAYS et al.76, o grupo de estudos da OMS, responsável pela exposição de poluentes no ar interno, concluiu que concentrações de formaldeído menores que 0,05 ppm são aceitáveis, enquanto que concentrações maiores que 0,10 ppm são preocupantes.

Foi comprovado que níveis elevados de material particulado estão associados com o decréscimo da função pulmonar e aumento prevalente de doenças respiratórias77,78,79. Estudos realizados por DOCKERY mostraram que concentrações relativamente baixas de matéria partículada respirável têm sido associadas a um aumento de risco de bronquite aguda em crianças. Outro estudo, bastante interessante, realizado por POPE et al.80, mostrou que a matéria particulada inalável (MPI) tem sido associada ao aumento de sintomas respiratórios e uso de medicação. Por exemplo, uma concentração de 150µg/m3 de MPI durante um período de 24 horas, foi associada a um aumento de 26% em sintomas respiratórios superiores e a um aumento de 217% no uso de medicação usual para asma, quando comparada com o número de casos numa concentração de 50µg/m3.

Atualmente, está mais do que provado que a exposição de não-fumantes à fumaça de tabaco (o que caracteriza o chamado fumante passivo ou involuntário) está associada ao aumento de casos de doenças respiratórias e decréscimo das funções pulmonares81,82 e do crescimento. MURRY e MORRISON83 relataram um aumento de reação bronquial e da severidade de sintomas, em crianças com asma, que moram com mãe fumante. Recentemente, a Administração de Alimentos e Medicamentos Americana (FDA), classificou a nicotina (principal alcalóide do cigarro) como droga, regulamentando seu uso.

Devido a sua alta reatividade, os compostos oxidantes exercem um efeito bastante nocivo à saúde. O ozônio, um gás insolúvel em água, é conhecido por causar mudanças funcionais e efeitos bioquímicos e morfológicos adversos às vias respiratórias84,85,86. o gás NO2 causa efeitos similares ao ozônio, mas requer concentração mais elevada. Este gás causa dano oxidativo via geração de radicais livres, que podem oxidar aminoácidos no tecido protéico. O NO2 também inicia a peroxidação de ácidos graxos poliinsaturados nas membranas celulares do pulmão87.

Paralelamente, a níveis baixos, o CO pode produzir sintomas não específicos, parecidos com a gripe. BAKER et al88observaram sintomas como dores de cabeça, letargia, náusea ou desmaios em crianças com níveis de carboxihemoglobina entre 2% e 10%. O nível normal é de 0,6%89. Níveis de até 3% podem ser encontrados em não fumantes, podendo ainda ser considerados dentro do limite normal90. Segundo esses autores, níveis entre 10 e 15% podem ser registrados após fumar-se um cigarro. O poder carcinogênico do gás radônio é confirmado pelo consenso de opiniões de agências de saúde internacionais91.

Enfim, existem muitos estudos relacionados ao efeito adverso na saúde para várias classes de poluentes. Contudo, ainda muitas lacunas a serem preenchidas, principalmente relacionadas ao efeito sinérgico desses poluentes na saúde humana e a um consenso dos níveis de exposição em ambientes não industriais.

6. SINERGISMO E SENSIBILIDADE QUÍMICA MÚLTIPLA Compreender os possíveis efeitos na saúde associados aos contaminantes do ar em ambientes internos é fundamental para diagnosticar e remediar os problemas de qualidade do ar nestes ambientes. Todos os contaminantes analisados nesta revisão são responsáveis por inúmeros efeitos prejudiciais à saúde. Contudo, existe uma considerável incerteza relacionada ao período de exposição e concentração desses contaminantes para ocasionar problemas de saúde específicos, uma vez que o ser humano reage muito diferentemente à exposição aos poluentes. Além disso, do ponto de vista de diagnóstico, é muito difícil relacionar a exposição, nessas condições, à sintomatologia dos ocupantes dos recintos fechados. Essa é uma área da Epidemiologia e da Clínica Médica que necessita amadurecer.

O desenvolvimento de doenças alérgicas em indivíduos saudáveis é o resultado da interação entre a predisposição genética para reagir com antígenos e a exposição a fatores ambientais. Existem vários estudos na literatura92,93 indicando que fatores ambientais têm um papel fundamental no desenvolvimento de doenças alérgicas em gêmeos idênticos. Em outras palavras, pessoas que são expostas a poluentes no ar interno por um período de tempo mais longo são freqüentemente aquelas mais suscetíveis à poluição em ambientes internos. Tais grupos incluem as crianças, os idosos, e os pacientes que sofrem doenças crônicas, especialmente as respiratórias e cardiovasculares.

Vários poluentes químicos usualmente presentes em ar de ambientes internos, tais como o benzeno e o formaldeído, são agentes carcinogênicos. Os poluentes biológicos podem comportar-se como patogênicos ou alergênicos e, de acordo com seu desenvolvimento, provocam a queda de produtividade ou o absenteísmo. Os ambientes fechados climatizados artificialmente têm como principal fonte de poluição biológica as bandejas de condensação das máquinas de ar condicionado.

Mesmo quando os níveis de contaminantes individuais não representam risco à saúde significativo, pequenas concentrações desses poluentes podem causar um efeito clínico em seres humanos, tendo em vista que a exposição é regular. Esse efeito sinergístico tem sido diagnosticado como "sensibilidade química múltipla".

A sensibilidade química múltipla é uma condição na qual um determinado indivíduo é sensível a um número específico de substâncias químicas, todas em concentrações muito baixas. FIEDLER et al.94 mostraram que os sintomas não são consistentes com as propriedades toxicológicas das substâncias envolvidas, nem com o nível de exposição. Existe muita controvérsia relacionada à questão da sensibilidade química múltipla. Ainda se discute se existe realmente uma doença física, ou se ela é psicossomática.

Recentemente, GÓRSKI et al.95 publicaram um estudo mostrando a ocorrência de um efeito sinergístico entre a presença da fumaça do tabaco (fumante passivo) e concentrações baixas de formaldeído (<25,0-50,0mg/m3), na prevalência de asma.

7. PRESERVAÇÃO E CONSERVAÇÃO Além dos problemas de saúde, existe também o problema da deterioração de obras de arte e literárias pelos contaminantes presentes no ar. Os principais agentes de deterioração de acervo documental são: umidade e temperatura, insetos, fungos e roedores, poluição ambiental e iluminação96-100.

Os materiais orgânicos em geral, especialmente os de origem natural, como o papel, o couro e o pergaminho, necessitam de uma determinada quantidade de água em sua estrutura molecular. Em ambientes úmidos, como na maior parte do Brasil, estes materiais tendem a absorver água. O excesso de umidade favorece a combinação com poluentes atmosféricos, formando ácidos, que por sua vez promovem reações de hidrólise da celulose. O desenvolvimento de microorganismos, responsáveis pela deterioração biológica, também está ligado a essas condições.

Dentre os poluentes mais agressivos às obras, destacam-se a poeira101,102. 103, o gás ozônio104e os óxidos ácidos gerados a partir da queima de combustíveis (NOx, SOx ). A deposição contínua da poeira sobre os documentos prejudica a estética das peças, favorece o desenvolvimento de microorganismos e pode acelerar a deterioração do material arquivístico devido aos ácidos nele contidos105a-b. Por outro lado, os óxidos ácidos agridem mais rapidamente a estrutura química dos materiais construtivos das peças do acervo.

A luz, natural ou artificial, é um tipo de radiação eletromagnética capaz de produzir alterações físico-químicas na estrutura dos materiais usualmente utilizados na confecções de documentos, induzindo a um processo de envelhecimento acelerado106. As radiações são classificadas de acordo com seus comprimentos de onda. Desse modo, a radiação ultravioleta situa-se entre 200 e 400 nm, a radiação visível entre 400 e 700 nm e a infravermelha acima de 700 nm. Embora as três radiações mencionadas sejam potencialmente agressivas à documentação gráfica, os mecanismos de fotodegradação são diferentes, devido às diferenças de energia envolvidas, correspondentes aos comprimentos de onda107.

A deterioração fotoquímica depende de diversos fatores como, por exemplo, a faixa de comprimento de onda, a intensidade de radiação, e o tempo de exposição e natureza química do material documental (papel, pergaminho, couro, etc. ).

Em resumo, a presença de contaminantes químicos pode danificar o material artístico e bibliográfico mantido em museus e bibliotecas espalhadas pelo Brasil.

8. EDUCAÇÃO E CONSCIÊNCIA AMBIENTAL DA POPULAÇÃO A educação, no contexto sugerido por essa seção, está limitada à divulgação de informações, para os ocupantes de prédios e residências, da existência de poluentes no ar de interiores e a importância de se entender os mecanismos/ ações que os ocupantes podem realizar a fim de reduzir, ou mesmo eliminar, contaminantes geralmente encontrados em ambientes fechados.

A literatura está repleta de estudos indicando que a maioria dos prédios em que ocorrem reclamações dos ocupantes, procedimentos de manutenção inadequados, tais como filtros de ar condicionado sujos ou mesmo inexistentes, dutos e bandejas de ar condicionado sujos, e fotocopiadoras sem sistema próprio de exaustão têm sido o motivo principal do desconforto.

O conhecimento, pelos ocupantes desses ambientes, de situações que poderiam contribuir para o aumento das concentrações de agentes químicos e biológicos em recintos fechados, possibilitaria uma remediação mais efetiva por parte do pessoal encarregado da manutenção do prédio, ou do proprietário da residência.

Nos últimos anos, têm ocorrido inúmeras reportagens abordando a problemática da poluição do ar de interiores, realizadas pela imprensa falada e escrita108,109.

Contudo, a disponibilidade de informações para o público leigo não fornece nenhuma garantia de que a informação será utilizada. O uso da informação dependerá da motivação do indivíduo e disponibilidade de ação, pois muitas das vezes os ocupantes de prédios comerciais não possuem nenhum controle sobre o seu ambiente de trabalho. Logo, o simples conhecimento das possíveis causas de desconforto e habilidade de detectar possíveis fontes possibilitaria ao ocupante esclarecido exercer pressões junto ao setor responsável pela manutenção do seu local de trabalho. Por exemplo, a pressão para a prática de simples padrões de higiene pessoal, tais como dar descarga no toalete após uso, pode reduzir a contaminação por agentes microbiológicos gerados por atividades humanas. Além disso, os ocupantes podem pressionar os responsáveis pela manutenção do prédio a seguir os padrões mínimos de ventilação e limpeza no sistema de circulação mecânico do ar, práticas essas que minimizam o potencial de contaminação química e biológica.

Essa educação pode ter a forma de informações gerais através de cartilhas, palestras e vídeos, elaborados numa linguagem simples e rica, com exemplos de maneiras de detectar e remediar as fontes mais comuns de poluição do ar em recintos fechados. Da mesma maneira, o pessoal ligado à manutenção do prédio deve ser treinado para entender aspectos da QAI na rotina de seu trabalho.

Muitas atividades de manutenção afetam diretamente a QAI, e algumas podem ocasionar problemas graves. Logo, os ocupantes devem estar conscientes dos aspectos básicos da QAI e de como suas atividades podem ter um impacto direto na sua saúde e conforto.

9. PERSPECTIVAS A QAI é uma área de pesquisa emergente no Brasil, e ainda existem inúmeras lacunas a serem preenchidas. Dentre os assuntos que merecem atenção futura estão: • A avaliação química e microbiológica de ambientes residenciais, escolares, hospilares e de lazer. Dentre esses ambientes, o residencial merece atenção especial, uma vez que é o local no qual a maioria das pessoas passa grande parte do seu tempo.

• A necessidade de implantação de metodologias analíticas para outros tipos de contaminantes usualmente encontrados em tais ambientes. Dentre os principais contaminantes que precisam ter metodologia implantada no Brasil, estão o ozônio, NO2 e outros gases oxidantes, radônio, compostos orgânicos semi- voláteis, micotoxinas, endotoxinas e alérgenos de microorganismos e ácaros domésticos.

• Avaliação, em nível nacional, da QAI. As pesquisas até agora realizadas estão concentradas no eixo Rio-São Paulo. Com a implantação do Programa de Qualidade do Ar de Interiores no CESTEH - ENSP - FIOCRUZ espera-se a adesão de outros grupos no país, com o intuito de fazer um levantamento mais abrangente das condições ambientais em tais sistemas, em âmbito nacional. Seria, também, extremamente importante, a participação de profissionais especializados em engenharia de ar condicionado, arquitetura e urbanismo, saúde pública, epidemiologia, toxicologia, catálise, e fotoquímica da atmosfera.

• Levantamento estatístico dos dados ligados à questão da QAI. O atual estágio de desenvolvimento da QAI no Brasil não permite nenhum estudo estatístico relacionando os problemas de saúde à baixa qualidade do ar respirado em locais fechados. Espera-se que futuros trabalhos apresentem uma avaliação epidemiológica junto com o monitoramento químico e microbiológico.

• A implantação e consolidação de uma estrutura legislativa fundamentada em estudos sistemáticos e com o consenso de opiniões de autoridades científicas que atuem em diferentes áreas de pesquisa. Provavelmente, a melhor solução seria a criação de um grupo, sem vínculo com o governo federal, para coordenação de assuntos relacionados à legislação, junto aos ministérios governamentais competentes (Ministério do Trabalho e da Saúde). Talvez, a BRASINDOOR possa servir de elo entre a comunidade científica e as autoridades governamentais.

• Estudo da dinâmica de poluentes e a variação de parâmetros físicos, assim como o estudo cinético da reatividade de contaminantes no ar de ambientes internos.

• A criação de um banco de dados de emissão de COVs por produtos produzidos no país. Isto pode servir de base para orientar a indústria e os consumidores no sentido de utilizar materiais com níveis de emissões reduzidos.

Esses são apenas alguns exemplos do muito a ser realizado pela Química, em benefício da QAI. Um programa de Qualidade do Ar de Interiores bem estruturado pode servir como uma das vértice de um programa de medicina preventiva no país.


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