A flexibilização da pós-graduação
EDITORIAL
A flexibilização da pós-graduação
Periodicamente surgem palavras que se transformam em palavras de ordem, que
resultam em ações e que afetam de forma significativa o público e/ou o sistema
alvo. No caso do Ensino Superior brasileiro, uma das palavras mais recorrentes
no momento é FLEXIBILIZAÇÃO. Com relação aos cursos de graduação, a palavra
flexibilização recebeu destaque com a promulgação da nova LDB em 1996 (Lei
9.394/96) e do Edital n 04/97 da Secretaria de Educação Superior do MEC, os
quais estabelecem que os currículos dos cursos superiores precisam ser
revistos, considerando o fim da exigência de currículo mínimo e a necessidade
de uma flexibilização curricular que, sem prejuízo de uma formação didática,
científica e tecnológica sólida, avance também na direção de uma formação
humanística que dê condições ao egresso de exercer a profissão em defesa da
vida, do ambiente e do bem estar dos cidadãos. Quanto à pós-graduação, a
flexibilização é recorrente no esboço do IV Plano Nacional de Pós-Graduação.
O ensino de quarto grau -a pós-graduação- consolidou-se no Brasil na segunda
metade do século vinte, especialmente nas últimas três décadas e hoje
constitui-se na parte mais competente e organizada do sistema de ensino do
país. Um dos fatores que mais contribuiu para o crescimento e consolidação da
Pós-graduação brasileira foi a criação da CAPES, do Sistema de Avaliação dos
Cursos e dos Planos Nacionais de Pós-Graduação (PNPG). A avaliação da CAPES
ocorre bienalmente e o seu resultado é recebido pelos cursos como uma
sinalização para ações futuras, levando inclusive a correções de natureza
programática ou estrutural. Já os PNPG's representam as diretrizes gerais de
prioridades para o setor.
O primeiro PNPG (1975-9) tinha por objetivo reforçar o sistema universitário
para formar os recursos humanos qualificados, necessários ao desenvolvimento
econômico, ou seja, visava prioritariamente a capacitação docente das
Instituições de Ensino Superior (IES). O segundo PNPG (1982-5) pretendia
consolidar o sistema implantado, através de reforço nos mecanismos de
acompanhamento e avaliação, objetivando melhorar a qualidade dos Programas e a
racionalização dos investimentos. Iniciava-se a ênfase na qualidade do ensino
superior e da pós-graduação. O terceiro PNPG, em 1986-9, incentivava a
integração Universidade, Pós-Graduação e o "Setor Produtivo",
estimulando a institucionalização da pesquisa e a sua integração com o sistema
nacional de ciência e tecnologia.
Praticamente dez anos após o III PNPG, toma corpo a discussão do que será o IV
PNPG. De acordo com documentos elaborados pela CAPES e discussões no âmbito do
Forum de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação, as diretrizes gerais do IV
PNPG serão: i) a expansão do sistema nacional de pós-graduação e a manutenção
de sua qualidade acadêmica; ii) diminuição das desigualdades regionais na
oferta e no desempenho da pós-graduação; iii) maior compromisso institucional
da pós-graduação com a graduação, visando a melhoria e renovação deste nível de
ensino.
O modelo atual de pós-graduação stricto sensu consolidou o mestrado e doutorado
acadêmicos, bem como um esquema seqüencial entre estes, que onera o processo de
formação de pós-graduados, no tempo e nos recursos. A flexibilização do modelo,
incentivando a cooperação interinstitucional e a criação de novos cursos de
doutorado, sem queda de qualidade, permitirá o acesso direto a este nível,
quebrando o esquema seqüencial. Nesse sentido, a criação de mestrados não
acadêmicos (mestrado profissional ou mestrado temático) permitirá a melhoria no
atendimento ao mercado profissional e o desaquecimento do mestrado acadêmico.
A integração graduação-pós-graduação ocorre basicamente na melhoria da
qualificação dos docentes e na atuação dos professores dos cursos de pós-
graduação em aulas na graduação, em projetos específicos no âmbito do PROIN
(Programa Integrado entre Pós-Graduação e Graduação) e na orientação de
estudantes de iniciação científica e PET (Programa Especial de Treinamento). Na
maioria das vezes, estas ações são individualizadas e desordenadas. Esta
integração deverá evoluir de forma a resultar numa ampla articulação didático-
científica, visando a melhoria do ensino de graduação e que permita, entre
outros, o acesso amplo de seus estudantes (bolsistas ou não) a cursos e
atividades da pós-graduação, bem como aos estudantes da pós-graduação atuarem
no ensino de graduação, para a complementação da sua formação pedagógica.
O fomento aos cursos de pós-graduação é realizado, em grande parte, pela CAPES,
através de quotas de bolsas, recursos financeiros no âmbito do PROAP (Programa
de Apoio à Pós-Graduação) e financiamento de projetos especiais. O
financiamento está intrinsecamente ligado ao desempenho do curso na avaliação
bianual, a qual reflete o impacto do curso com relação aos demais de sua área.
Se por um lado a visão da Agência é fragmentada, por outro lado os cursos
recebem recursos em rubricas pré-determinadas e com poucas opções de
remanejamento de acordo com as suas necessidades, enquanto que as Universidades
não tem qualquer participação na definição da política de fomento. Resultado:
recursos escassos e gestão engessada. A flexibilização do modelo de fomento, de
modo a apoiar um projeto de pós-graduação institucional e a permitir uma forma
de gestão compatível com as necessidades institucionais, contribuirá para uma
utilização otimizada dos poucos recursos, potencializando o seu efeito no curso
e uma melhor definição de políticas institucionais de pós-graduação.
Esperamos que o sentido da palavra flexibilização na Pós-graduação seja maior
autonomia no modelo e na gestão do sistema!
Jailson Bittencourt de Andrade (UFBA)
[