Atividade e seletividade de catalisadores a base de caulim modificado
INTRODUÇÃO
O estudo das argilas como catalisadores é devido, principalmente, à indústria
petroquímica, onde são utilizadas com grandes vantagens na produção de gasolina
e como descorante de óleo, embora o seu uso nos processos catalíticos seja
limitado por suas características químicas e estruturais, e pelas possíveis
alterações da sua superfície1-3. As argilas apresentam comprovada atividade
catalítica para muitas reações como craqueamento, desidratação e hidratação,
condensação, adição e eliminação de cloro, isomerização e ciclização de
compostos orgânicos e polimerização4-6. É importante citar que em poucos casos
as argilas são ativas na sua forma natural, necessitando, quase sempre, de
tratamentos químicos baseados na sua capacidade de troca iônica. Tratamentos
térmicos e lixiviações ácidas, podem aumentar sua área específica e seu volume
de poros, além de levar ao surgimento de sítios ácidos dos tipos de Lewis, nos
átomos de alumínio, e de Brönsted, com força ácida, Ho, elevada7,8. Cerca de
75% dos processos químicos existentes usam argilas em alguma etapa do processo
industrial de fabricação dos respectivos produtos finais9. Outro aspecto
importante é a facilidade com a qual as argilas são encontradas10-12.
Em vista do potencial químico do caulim, pretende-se realizar ensaios visando a
obtenção de matrizes ácidas a partir de um caulim sedimentar, para catalisar
reações de isomerização do cicloexeno, verificando a atividade e seletividade
das matrizes obtidas.
PROCEDIMENTOS
A preparação das matrizes catalíticas foi realizada conforme os procedimentos
apresentados no fluxograma da Figura_1.
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A etapa de separação da argila se baseou em ensaio sedimentológico que
consistiu na colocação em suspensão aquosa em uma proveta de 1 L, 30g do
sedimento com ajuste do pH~10, através da adição de hidróxido de amônio para
auxiliar na desfloculação da argila13. A mistura foi agitada vigorosamente
durante 30 minutos, e em seguida foi deixada em repouso durante 16 horas e 30
minutos14. Este procedimento permitiu também, a determinação da distribuição
dos diâmetros de partículas14-16. Decorrido este tempo, a suspensão até 10 cm
de profundidade foi sifonada e seca em banho-maria. A fração de argila
resultante, foi dividida em duas partes sendo uma delas submetida a lixiviações
com ácido clorídrico em concentrações variando entre 0,1 e 5,0 mol.L-1,
resultando, respectivamente, nos catalisadores FA-73, FA-74, FA-75 e FA-76. A
outra parte foi novamente dividida em outras quatro partes. Uma foi seca a
110oC, e as demais calcinadas, durante 2 horas, a 450oC, 600oC e 900oC. Após as
calcinações estas amostras foram lixiviadas com ácido clorídrico 0,05 mol.L-1,
levando a obtenção dos catalisadores FA-72, FA-45, FA-60 e FA-90,
respectivamente.
Após a obtenção de todos os catalisadores, foram realizadas caracterizações
utilizando várias técnicas, como a difração de raios X, em um difratômetro
modelo Universal X-Ray Diffractometer H2G 4/C da Carl Zeiss. As medidas foram
realizadas utilizando uma fonte de radiação CuKa 1,5423Å, operado a 36 KV e 20
mA. Os espectros de absorção na região do infravermelho foram obtidos em um
espectrofotômetro Nicolet modelo 5ZDX FT-IR, com diluições das amostras em KBr.
As áreas específicas foram obtidas em um medidor de área CG 2000 da
Instrumentos Científicos CG.
As determinações de acidez superficial foram realizadas fazendo-se passar
amônia sob pressão, durante 10 horas, através dos catalisadores. Em seguida,
purgou-se o excesso de gás com um fluxo de argônio. Todas as amostras saturadas
com amônia também foram investigadas por espectroscopia na região do
infravermelho. Este mesmo procedimento foi empregado no envenenamento dos
sítios ácidos, com verificação do comportamento catalítico através das reações
envolvendo o cicloexeno.
Os testes de atividade e seletividade dos catalisadores foram realizados sob
condições de fluxo constante em um microrreator de leito fixo. Os gases de
arraste utilizados foram o hidrogênio e o argônio sob fluxo de 0,5 L.h-1 e
velocidade de injeção do substrato de 0,65 mL.h-1. Os produtos gasosos foram
coletados e identificados por cromatografia em fase gasosa, em um cromatógrafo
a gás CG500A com detector do tipo DIC, em uma coluna empacotada com 6 m de
comprimento e diâmetro 1/8", tendo como suporte o Chromosorb P e fase
estacionária composta com 20% de SE-30.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após a purificação e caracterização verificou-se que a argila era um caulim de
elevada pureza, no qual apenas o argilomineral caulinita foi identificado. Este
foi submetido a uma análise química total, para a determinação dos teores das
espécies, Si, Al, Na, K, Ca, Mg, Fe, Ti, cujos valores estão mostrados na
Tabela_1. Os resultados desta análise indicaram a presença de 2,66% de ferro
total. Essa espécie pode significar prejuízos para a atividade catalítica, pois
a sua presença leva a formação de coque17. Esta, juntamente com os trocáveis,
Na, K, Ca e Mg, podem ser lixiviadas com uma solução diluída de ácido18. Esta
lixiviação leva a um aumento na concentração da espécie H+, que poderá
representar um aumento na acidez de Brönsted. Além da lixiviação, foram
realizadas calcinações em temperaturas que coincidem com as principais
transformações térmicas pelas quais o caulim passa, quando aquecido a
temperaturas de até 1000oC. A calcinação a 450oC levou a uma perda de massa de
10,07%; a 600oC o caulim perdeu 14,73% e a 900oC a perda foi de 15,33%. A
calcinação a 450oC leva a argila a perder água, e dá início ao processo de
desidroxilação; já a perda de massa a 600oC, se refere ao final dessa
desidroxilação. Nesta temperatura a caulinita passa a apresentar uma fase de
baixa cristalinidade, a metacaulinita, como mostra a curva de difração de raio-
X da Figura_2B, onde os átomos de alumínio estruturais assumem coordenação
tetraédrica, tornando a estrutura mais vulnerável ao ataque ácido. A 900oC a
metacaulinita sofre uma transição de fase, assumindo a estrutura do espinélio.
Esta mudança implica na eliminação de um mol de SiO2 por mol de mineral.
Portanto, as alterações na composição química são respectivamente, 2Si2Al2O5
(OH)4(caulinita), 2Si2Al2O7(metacaulinita) e Si3Al4O12(espinélio)19. Estas
mudanças puderam ser acompanhadas por difração de raios X, Figura_2 e
espectroscopia na região do infravermelho, Figura_3. Hunt20 observou que a
secagem da caulinita acarreta uma diminuição da intensidade da banda em 3450cm-
1, referente às hidroxilas entre as folhas tetraédricas e octaédricas, e a
forte banda em 1632cm-1 é atribuída às hidroxilas interlamelares. O espectro B
mostra alterações significativas nas bandas referentes às hidroxilas
interlamelares, corroborando o processo de desidroxilação. Parte destas
hidroxilas persiste, como mostram as bandas em 3699cm-1 e 3621cm-1, que só
desaparecerão com as calcinações a partir de 600oC, espectros C e D. Estas
alterações tem implicações fundamentais no funcionamento dos catalisadores,
pois acarretam alterações na acidez e na textura dos mesmos.
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As lixiviações às quais as amostras calcinadas foram submetidas, tiveram
comportamentos diversos em relação a cada uma das espécies químicas removidas,
como mostra a Tabela_2. A amostra FA-72, foi a que apresentou melhores
resultados quanto à remoção de alcalinos e alcalinos terrosos. Este
comportamento está relacionado com as propriedades intrínsecas da caulinita,
que apresenta uma estrutura resistente ao ataque com ácido diluído ficando
apenas as espécies livres susceptíveis a troca iônica. Nas amostras calcinadas,
FA-45, FA-60 e FA-90, verifica-se uma inversão no comportamento de troca, onde
o efeito é extremado em relação à desaluminização em função da desestruturação
provocada pela calcinação. As amostras submetidas a lixiviações ácidas apenas,
tiveram resultados crescentes com o aumento na concentração do ácido,
favorecendo também a desaluminização. No entanto, a intensidade desta é muito
menor do que a verificada para as amostras calcinadas. A consequência da
lixiviação ácida pode ser acompanhada pelas curvas de difração de raio-X da
Figura_4, e pelos espectros vibracionais apresentados na Figura_5. As bandas
mais afetadas pelos tratamentos ácidos foram as das hidroxilas, principalmente
aquelas presentes nos espaços entre as folhas de silicato e hidróxido, que
aparecem em 1390cm-1 a 1650 cm-1. Observou-se ainda, alterações nas posições
das bandas em 538 cm-1 e em 469 cm-1, que são atribuídas aos acoplamentos Al¾O
e Si¾O, que podem estar relacionados com a remoção dos óxidos livres e sais
solúveis.
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Como o desempenho dos catalisadores depende diretamente de suas áreas,
associadas aos sítios catalíticos dispersos sobre as mesmas, foram realizadas
determinações de área específica de todas as amostras preparadas, resultando
nos valores mostrados na Tabela_3. Como os argilominerais são constituídos por
micropartículas com estrutura lamelar, estes tendem a apresentar áreas
específicas muito baixas em relação às dos suportes tradicionais como a sílica
gel, a g-alumina e o carvão ativo. A caulinita "in natura", além de
apresentar área específica relativamente baixa, não é porosa. A área
determinada para a caulinita foi de 61m2.g-1. Os resultados encontrados para as
áreas dos catalisadores obtidos, mostram que as preparações empregando apenas a
lixiviação ácida, apresentaram áreas específicas maiores do que as amostras que
sofreram calcinação. A lixiviação com ácido clorídrico 5,0 mol.L-1, que
resultou no catalisador FA-76, levou a um aumento de 28% da área específica, em
relação à caulinita. Já a diminuição da área para alguns catalisadores da série
calcinada não era esperada, porém acredita-se que isto se deva ao uso de
agentes químicos como o desfloculante hidróxido de amônio. Apesar dessa
substância permitir uma melhor desagregação da argila, segundo Swartzen-Allen e
Matijevic13, o uso do mesmo poderá levar a interações químicas do íon NH4+ com
a argila, de difícil reversibilidade. Esta espécie desloca os trocáveis Na+,
K+, Mg2+ e Ca2+, e sendo mais volumosa, poderia alterar as propriedades
texturais, como por exemplo, reduzindo a área específica. Por esta razão, tem
havido ultimamente, a tendência em substituir a desagregação química, por
processos físicos que não destruam a estrutura dos argilominerais, como o
ultra-som com potência de até 40KHz. No caso específico da amostra calcinada a
900oC, o abaixamento da área pode ser explicado pelas mudanças de fase.
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Folhas de aluminossilicatos carregadas negativamente constituem bases
conjugadas de oxiácidos, usualmente fortes, que se estendem indefinidamente em
duas dimensões19. A superfície de uma argila pode ser fortemente ácida, onde os
sítios ácidos de Brönsted são atribuídos às hidroxilas terminais e aos íons
hidrogênio ligados aos átomos de oxigênio interlamelares. A alta acidez é
devido principalmente a estes últimos, e a medida desta acidez é feita tendo
por base a função de Hammett expressa em Ho. Lavando-se a argila com ácido
mineral ocorre um aumento da acidez superficial, que no caso do HCl, é de -6Ho
a -8Ho, o que é atribuida às trocas catiônicas que ocorrem durante o
tratamento7,13,21. Para se medir a acidez superficial dos catalisadores
utilizou-se amônia, que permite distiguir entre os sítios de Lewis e de
Brönsted. Os espectros da Figura_6-I, mostram fracas absorções na região de
1430 cm-1 a 1450 cm-1, que correspondem ao nN-H assimétrico, para adsorção
sobre os sítios de Lewis, e absorções na região de 1600cm-1 a 1620cm-1,
correspondem ao nN-H assimétrico para adsorções sobre os sítios de Brönsted. A
maior acidez está associada ao aumento da intensidade das bandas
características de cada sítio ácido. Com isso, os catalisadores FA-45 e FA-60,
resultantes das calcinações a 450oC e 600oC, foram os que apresentaram maior
acidez, que é atribuído às modificações estruturais que estes tratamentos
térmicos causaram à caulinita. Os catalisadores da série ácida, apresentaram
acidez variável, Figura_6-II, porém associada à severidade (concentração) da
lixiviação com aumento gradativo dessa acidez.
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AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE CATALÍTICA
Foram efetuados testes de conversão do substrato na ausência do catalisador,
Figura_7, com aumento gradativo da temperatura, desde 50oC até 500oC e
verificou-se que praticamente não ocorreu conversão térmica, com isso, os
resultados obtidos foram atribuídos unicamente, aos catalisadores. A Figura_8
apresenta um cromatograma típico do cicloexeno e outro da análise dos produtos
da conversão catalítica. Os principais produtos identificados são o 2-
metilpenteno-1, o metilciclopentano e o cicloexano.
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Nas Figuras_de_9 a 12, expõe-se uma comparação entre os desempenhos dos
catalisadores preparados. Observa-se um aumento na conversão de cada
catalisador com o aumento gradativo da temperatura, Figura_9 e 11. Verifica-se
que a capacidade conversora está associada à preparação dos catalisadores.
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Para a série calcinada, Figura_9, o catalisador FA-60 é o mais ativo nas
temperaturas de 200 a 350oC, e na temperatura de 400oC sua conversão é quase
igual a apresentada pelo catalisador FA-45. O catalisador FA-90, ao contrário,
teve conversão muito reduzida, até mesmo a 400oC, fato que pode ser justificado
pela calcinação a 900oC, que leva a estrutura da caulinita ao colapso,
diminuindo a área específica e a capacidade de troca iônica, e isto faz com que
a atividade seja menor que a dos catalisadores FA-45 e FA-60, em todas as
temperaturas. Como a única diferença que existe na preparação desses
catalisadores é a temperatura de calcinação, pode-se atribuir o melhor
desempenho do catalisador, às mudanças de fase. Ainda para a série calcinada,
verifica-se que não ocorre uma desativação apreciável dos catalisadores com o
tempo, Figura_10, que aliado à alta conversão, indica que os catalisadores FA-
45 e FA-60 apresentam boa atividade catalítica.
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Acredita-se que o declínio verificado nas atividades dos catalisadores FA-72 e
FA-90, nas primeiras horas de corrida, possa estar relacionado com a formação
de uma substância escura e oleosa, com aspecto de óleo lubrificante queimado,
dentro do reator, que em contato com o leito catalítico levou a uma redução na
atividade, mas que devido a temperatura do forno, 400oC, foi sendo volatilizada
com o tempo, e com isso, desimpedindo o fluxo dos produtos da conversão
catalítica. Esta substância também foi detectada nos testes com os outros dois
catalisadores, o FA-45 e o FA-60, porém com muito menos intensidade, não sendo
suficiente para provocar um declínio na atividade inicial.
Para a série ácida, Figura_11, verifica-se que as atividades de conversão
crescem com o aumento da concentração do ácido usado na lixiviação. Isso é
válido para cada uma das temperaturas utilizadas. Como na série calcinada, a
conversão para a série ácida aumenta com o aumento da temperatura, mas se
observa que abaixo de 200oC, praticamente não existe conversão do substrato, e
que mesmo nessa temperatura a conversão é muito baixa. Isto está,
possivelmente, associado ao fato dos tratamentos ácidos não terem sido tão
drásticos, a ponto de realizar uma grande desaluminicação da caulinita usada na
preparação dos catalisadores. Caso isso ocorresse, haveria um aumento
apreciável na conversão4.
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Para a série ácida, Figura_12, também se observa que não ocorre desativação
significativa com o tempo. Esse fato, aliado a alta conversão, indica que os
catalisadores dessa série, apresentam boa estabilidade e atividade na conversão
do cicloexeno.
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O envenenamento dos sítios ácidos pela amônia, Figura_13, impediu as reações de
conversão do substrato, ressaltando a importância dessses sítios na realização
dessas reações.
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CONCLUSÕES
As lixiviações favoreceram o aparecimento de sítios ácidos de Lewis e de
Brönsted. E através dos testes de conversão catalítica verificou-se que as
alterações estruturais, decorrentes dos tratamentos térmicos, afetaram o
desempenho dos catalisadores.
Acredita-se que os baixos valores de área específica obtidos para os
catalisadores da série calcinada, são consequência das alterações estruturais,
da caulinita.
Os metais presentes não se caracterizam como sítios catalíticos, visto que o
envenenamento do catalisador não induz a nenhum tipo de conversão.
Finalmente, existem fortes razões para acreditar que argilas cauliníticas sejam
bons materiais para a obtenção de catalisadores com elevada atividade
catalítica.