CULTURA IN VITRO DE EMBRIÕES ZIGÓTICOS DE AÇAIZEIRO
CULTURA IN VITRODE EMBRIÕES ZIGÓTICOS DE AÇAIZEIRO1
INTRODUÇÃO
O açaizeiro (Euterpe oleracea Mart.) é uma palmeira tipicamente tropical e está
distribuída geograficamente na América do Sul, principalmente no Brasil, nos
Estados do Pará, Amazonas, Acre, Amapá e Maranhão (Kahn, 1997). É uma planta
dominante em áreas de mata do estuário amazônico, fazendo parte da vegetação de
terra firme, várzea e igapó, sendo mais comum em áreas de várzeas, onde chega a
formar populações homogêneas (Jardim et al., 1995).
Dentre as diversas espécies nativas da região Amazônica, o açaizeiro destaca-se
com grande potencial de exploração socioeconômico,visto quepode ser utilizado
integralmente para a exploração econômica de frutos, palmito e celulose. De
seus frutos, obtém-se um suco denominado de açaí, que tem grande aceitação no
mercado regional e, atualmente, devido ao seu excelente valor nutritivo e
calórico, vem conquistando os mercados nacional e internacional, sendo
comercializado "in natura", como suco gelado, na fabricação de
geléias, sorvetes e picolés (O Sabor..., 1992).
A propagação in vitro constitui-se numa ferramenta de grande importância para
plantas com dificuldade de serem multiplicadas vegetativamente (Robles, 1983),
como é o caso das palmeiras e, mais especificamente, do açaizeiro, onde o
pegamento de perfilhos é menor que 1 %. Esta técnica tem despertado interesse
por facilitar a produção de mudas de material elite em escala comercial, por
produzir plantas livres de patógenos e acelerar programas de melhoramento que,
no caso de palmeiras, são demorados e complexos em virtude do longo ciclo,
hábito de crescimento e ausência de métodos convencionais de propagação
vegetativa em virtude da ausência de câmbio vascular em monocotiledôneas.
Dentre as técnicas de cultura de tecidos, a cultura de embriões, por tentar
reproduzir in vitro o normal desenvolvimento de embriões, apresenta-se como uma
ferramenta para o controle da embriogênese, o resgate de embriões
interespecíficos, quando apresentam alguma incompatibilidade, a produção de
haplóides, a quebra de dormência e a produção de plântulas assépticas, além de
elucidar alguns problemas como nutrição do embrião no óvulo entre outras
aplicações (Collins & Grosser, 1984; Hu & Ferreira, 1998).
Conforme relatado por Hu & Ferreira (1998), embriões excisados no estádio
maduro ou próximo a este são quase autotróficos e, em geral, dependendo da
espécie, não há necessidade de suplementação de fonte de energia, podendo
germinar e crescer num meio inorgânico, e os reguladores de crescimento tornam-
se dispensáveis.
Os objetivos do presente trabalho foram avaliar o efeito da adição de ANA e BAP
no meio de cultura e estabelecer um protocolo para a conversão in vitro de
embriões zigóticos de açaizeiro.
MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi conduzido no Laboratório de Recursos Genéticos e Biotecnologia da
Embrapa Amazônia Oriental, em Belém-Pará. Frutos maduros, obtidos da coleção de
germoplasma de açaizeiro da Embrapa Amazônia Oriental e com peso médio de 2,35
g, foram lavados em água corrente e submetidos ao despolpamento em água a 40ºC.
As sementes foram desinfestadas em câmara de fluxo laminar, com a imersão em
álcool etílico a 70 % por dois minutos e, em seguida, em solução de NaClO a 2 %
por 20 minutos sob agitação e, posteriormente, foram lavadas quatro vezes em
água destilada e autoclavada.
Os embriões zigóticos, excisados de sementes assépticas sob câmara de fluxo
laminar, foram inicialmente inoculados, em tubos de ensaio contendo 10 mL de
meio de cultura MS (Murashige & Skoog, 1962), modificado pela ausência de
vitaminas e aminoácidos, suplementado com 0,6 % de ágar e 0,25 % de carvão
ativado. O pH do meio de cultura foi ajustado para 5,8 e, em seguida, submetido
à esterilização autoclave a 120ºC durante 15 minutos.
As culturas foram mantidas em sala de crescimento com temperatura de 26º± 2ºC,
umidade relativa do ar média em torno de 70 % e fotoperíodo de 16 horas de luz
branca fria sob 52 µmol.m-2.s-1 de irradiância/ oito horas de escuro.
Aos três dias da inoculação, foi realizada a avaliação quanto às percentagens
de contaminação por microorganismos e de oxidação. Em seguida, os embriões
foram transferidos para tubos de ensaio com 10 mL de meio MS modificado pela
presença de 0,17 g.L-1 de NaH2PO4, com 0,6 % de ágar, 0,25 % de carvão ativado
e 3 % de sacarose, suplementado com diferentes combinações de ácido
naftalenoacético (ANA) e 6-benzilaminopurina (BAP), ajustando-se o pH a 5,8
antes da autoclavagem.
Foram testadas três concentrações de ANA (0,54; 2,68 e 5,37 mM) combinadas com
quatro de BAP (0,44; 1,11; 1,55 e 2,22 mM) e uma testemunha adicional (sem
regulador de crescimento), perfazendo um total de 13 tratamentos.
O delineamento estatístico utilizado foi o inteiramente casualizado, com quatro
repetições. Cada unidade experimental foi constituída de 10 tubos de ensaio,
contendo um explante cada.
Aos 10 dias após a inoculação, avaliou-se a percentagem de conversão de
embriões zigóticos em plântulas e, aos 48 dias, a percentagem de plântulas
anormais, o comprimento da parte aérea (mm) e o número de raízes por plântula.
Como plântulas anormais, foram consideradas aquelas que apresentavam ausência
ou crescimento atrofiado da parte aérea, do sistema radicular atrofiado e do
haustório. As variáveis foram submetidas à análise de variância pelo teste F e
as médias comparadas pelo agrupamento de Skott & Knott, em nível de 5% de
probabilidade.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na primeira semana de cultura, observaram-se o intumescimento dos embriões
zigóticos e o início da expansão da lâmina cotiledonar na região basal,
estrutura correspondente ao haustório que, devido a sua atividade digestiva,
substitui progressivamente o albúmen no processo de germinação. Os tecidos do
nó cotiledonar apresentavam-se intumescidos e avermelhados. Aos 14 dias, foi
observada a emissão da radícula e do coleóptilo cotiledonar a partir da região
apical periférica. Na terceira semana, verificaram-se a formação do pecíolo a
partir do coleóptilo, o início da expansão do limbo foliar e a emissão de
raízes secundárias (Figura_1A). Nas plântulas normais, observou-se o rápido
crescimento do haustório que, aos 60 dias, se apresentava com coloração branca
e consistência esponjosa, sendo que, nas plântulas anormais se apresentava
atrofiado (Figura_1B).
A análise de variância detectou efeitos significativos da interação "ANA x
BAP" para o comprimento da parte aérea (P = 0,01) e do ANA para a
percentagem de plântulas normais (P = 0,05) (Tabela_1).
O contraste "Fatorial vs Testemunha" (y = xF - xTe) foi
significativo, sendo que os valores da estimativa do contraste para todas as
variáveis avaliadas foram positivos (Tabela_1), ou seja, em média, os
tratamentos constituídos da combinação de ANA e BAP foram superiores à
testemunha.
Observa-se, na Figura_2A, que as maiores percentagens de conversão de embriões
zigóticos e formação de plântulas normais foram verificadas, em média, em todos
os tratamentos constituídos da presença de ANA e BAP quando comparado com a
testemunha. Estes resultados concordam com Lemos et al. (1999), que observaram
apenas 25 % de conversão de embriões de Euterpe oleracea Mart., com a formação
de apenas 12,5 % de plântulas normais na ausência de ANA e BAP. Llano-Agudelo
et al.(1995) obtiveram 85,7 % e 83,3 % de conversão de embriões zigóticos
maduros de Persea americana Mill cv. Americana em meio MS suplementado com 0,3
mg.L-1de AIB e 1,0 mg.L-1 de KIN e 0,1 mg.L-1de AIB e 0,3 mg.L-1 de KIN,
respectivamente. Entretanto, Yokoo et al. (1992) obtiveram a formação de
plântulas completas, a partir de embriões zigóticos de Euterpe oleracea Mart. e
do híbrido Euterpe oleracea x Euterpe edulis, em meio MS modificado na ausência
de reguladores de crescimento.
Conforme Hu & Ferreira (1998), embriões excisados no estádio maduro ou
próximo a este são quase autotróficos e, em geral, dependendo da espécie, não
há necessidade de suplementação de fonte de energia, e os reguladores de
crescimento tornam-se dispensáveis. Entretanto, no presente trabalho, ficou
evidenciada a necessidade de enriquecimento do meio com reguladores de
crescimento considerando que, na ausência destes, obteve-se 55 % de conversão
de embriões e a formação de 45,42 % de plântulas anormais (Figuras_2A e 2B).
Provavelmente, além da espécie e do estádio de desenvolvimento dos embriões, o
nível endógeno de fitormônios nos explantes deve ser considerado na cultura de
embriões.
As concentrações de 0,54 e 2,68 mM de ANA promoveram, em média, maior formação
de plântulas normais quando comparado com o nível de 5,37 mM de ANA (Figura
2B). Elevadas concentrações de auxinas induzem, predominantemente, a formação
de raízes em detrimento da formação da parte aérea, conforme relatado por Skoog
& Miller (1957), podendo este fato ter contribuído para a maior conversão
de embriões em plântulas anormais em elevada concentração de ANA.
O maior crescimento da parte aérea foi induzido pela presença de 2,68 mM de
ANA, combinado com 1,11; 1,55 e 2,22 mM de BAP (Figura_2C). Em concentração
elevada de ANA (5,37 mM), foi observado o menor desenvolvimento da parte aérea
das plântulas em todas as combinações de BAP. Não foram verificadas diferenças
significativas (P > 0,05) entre as concentrações de ANA e BAP para o número de
raízes por plântula; entretanto, estes tratamentos apresentaram desempenho
superior quando comparados à testemunha (Figura_2D).
CONCLUSÕES
Com base nos resultados obtidos e nas condições em que o trabalho foi
conduzido, pode-se concluir:
1 - É possível a conversão in vitro de embriões zigóticos, isolados de sementes
maduras de açaizeiro, em plântulas completas e normais.
2 - A concentração de 2,68 mM de ANA, combinada com 1,11; 1,55 ou 2,22 mM de
BAP, promove o melhor crescimento da parte aérea das plântulas.
3 - É necessária a presença de ANA e BAP no meio de cultura para a conversão de
embriões zigóticos e para o crescimento inicial de plântulas cultivadas in
vitro.