ARMAZENAMENTO DE MAÇÃS 'ROYAL GALA' SOB DIFERENTES TEMPERATURAS E PRESSÕES
PARCIAIS DE OXIGÊNIO E GÁS CARBÔNICO
ARMAZENAMENTO DE MAÇÃS 'ROYAL GALA' SOB DIFERENTES TEMPERATURAS E PRESSÕES
PARCIAIS DE OXIGÊNIO E GÁS CARBÔNICO1
INTRODUÇÃO
A temperatura de armazenamento exerce importante papel na conservação das
qualidades físico-químicas dos frutos e na prevenção e, ou diminuição da
incidência de doenças e distúrbios fisiológicos. O abaixamento da temperatura
diminui a respiração dos frutos (Childers, 1975) e retarda o amadurecimento
(Bartley, 1974), resultando em maior período de conservação (Lyons, 1975).
A cv. Gala comporta-se muito bem em temperaturas entre 0oC e 2oC, não
apresentando perdas acentuadas na firmeza de polpa (Little & Peggie, 1987).
Bender (1989b) observou que temperaturas de 0 a 1oC conservam maçãs por um
período máximo de cinco meses. Entretanto, caso a temperatura permaneça muito
baixa, pode ocasionar ocorrência de desordens fisiológicas (Fidler & North,
1967).
Inúmeros trabalhos têm demonstrado os efeitos da atmosfera controlada (AC)
sobre a fisiologia e qualidade de maçãs durante o armazenamento. Os efeitos
benéficos do armazenamento de maçãs sob baixas pressões parciais de O2 e altas
pressões parciais de CO2 incluem redução da taxa respiratória e de produção de
etileno, conservando, assim, as características físico-química e inibindo a
incidência de alguns distúrbios fisiológicos. A cv. Gala, por exemplo, pode ser
armazenada em atmosfera controlada por até 8 meses (Hansen & Zanon, 1982).
As pressões parciais de O2 e CO2 adequadas para o armazenamento de maçã 'Gala'
diferem em função do local e ano de colheita (Sharples & Johnson, 1987;
Meheriuk, 1989). A redução da pressão parcial de O2 é necessária para reduzir a
respiração, porém, deve-se observar um valor mínimo entre 1kPa e 3kPa,
dependendo do produto e tempo de exposição. Isso é para evitar o processo de
respiração anaeróbica. O CO2, quando em níveis elevados, também diminui a taxa
respiratória dos frutos, mas, quando em pressão parcial muito alta, pode causar
danos (Kader, 1985). Meheriuk (1993) recomenda para o armazenamento da cv.
Gala, nas condições de cultivo do Brasil, pressões parciais de 1,5kPa a 2kPa de
O2 e 2,5kPa a 3kPa de CO2, apresentando melhores resultados de qualidade de
frutos na avaliação realizada na saída da câmara. Já após cinco dias de
exposição à temperatura ambiente, os melhores resultados foram obtidos com 1kPa
de O2 e 1 a 3kPa de CO2, salientando que essa cultivar é sensível a altas
pressões parciais de gás carbônico, podendo causar distúrbios fisiológicos.
O objetivo desse trabalho foi determinar o efeito de temperaturas de
armazenamento e diferentes condições de AC sobre as qualidades físico-químicas
e ocorrência de distúrbios fisiológicos e podridões em maçãs cv. Royal Gala.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento de armazenamento de maçã cv. Royal Gala foi conduzido no Núcleo
de Pesquisa em Pós-colheita (NPP) do Departamento de Fitotecnia da Universidade
Federal de Santa Maria-RS. Os frutos foram colhidos em pomar comercial
pertencente à empresa Agropecuária Schio de Vacaria (RS), com ponto de
maturação utilizado pela empresa, ou seja, com índice iodo-amido igual a 5,46.
Ainda na empresa, os frutos foram selecionados e classificados, utilizando-se
do calibre 135, que equivale ao número de frutos por caixa de 18kg. Após o
transporte dos frutos à UFSM, em Santa Maria, procedeu-se nova seleção destes,
eliminando aqueles com lesões e/ou defeitos e, posteriormente, homogeneizaram-
se as amostras experimentais.
Para o armazenamento, foram utilizadas minicâmaras experimentais de AC, com
volume de 232 litros, as quais foram conectadas por tubulações plásticas a um
equipamento de controle automático das pressões parciais de gases da marca
Kronenberger Sistemtechnik. As minicâmaras permaneceram no interior de câmaras
frigoríficas de 45m3, com sistema de refrigeração por ar forçado, nas
temperaturas de ¾0,5oC e 0oC.
Após a colocação das amostras dentro das minicâmaras, foram instaladas as
atmosferas, conforme as pressões parciais de O2 e CO2 estabelecidas nos
tratamentos. As pressões parciais iniciais de O2 foram obtidas pelo princípio
da diluição do O2, com a injeção de gás nitrogênio, proveniente de um gerador
de nitrogênio que utiliza o princípio "Pressure Swing Adsorption"
(PSA), até a obtenção das concentrações parciais preestabelecidas. As
concentrações parciais de CO2 foram obtidas através da injeção deste gás nas
minicâmaras.
Para a manutenção constante dos níveis de O2 e CO2, que continuamente se
modificavam em função do processo respiratório dos frutos, foram realizadas
diariamente três análises e correções das pressões parciais dos gases, e pelo
sistema automático de controle dos gases. O O2 consumido pela respiração foi
reposto através da injeção de ar atmosférico nas minicâmaras. O CO2 em excesso
foi absorvido pelo absorvedor de CO2que utiliza uma solução de hidróxido de
potássio (40%).
A temperatura foi controlada automaticamente por termostatos de alta precisão,
sendo monitorada diariamente, utilizando termômetros de mercúrio introduzidos
na polpa de frutos que apresentaram uma oscilação de ±0,2oC.
Após nove meses de armazenamento, os frutos foram retirados das minicâmaras e
separados em oito amostras de 25 frutos. Quatro amostras foram analisadas no
mesmo dia e as outras quatro, após uma semana de exposição à temperatura de
20oC, em câmara de climatização. Para cada tratamento, foram calculadas a média
e a variância das variáveis avaliadas, sendo as médias comparadas pelo teste de
Duncan (5%).
As variáveis teste iodo-amido, firmeza da polpa, sólidos solúveis totais (SST),
acidez titulável, podridões e degenerescência da polpa dos frutos e polpa
farinhenta foram avaliadas conforme metodologia citada por Brackmann &
Saquet (1995).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Após nove meses de armazenamento, a firmeza de polpa, na saída da câmara,
apresentou-se menor nos frutos armazenados em 1,2kPa de O2 e 2kPa de CO2, na
temperatura de ¾0,5oC (Tabela_1). Após sete dias a 20oC, a melhor combinação de
gases para a manutenção da firmeza de polpa foi de 1kPa de O2 e 3 kPa de CO2
(Tabela_1 e 3). Esta combinação de gases está bastante próxima à obtida por
outros autores que demonstram que o uso de altas pressões de CO2 mantém maior a
firmeza de polpa durante o armazenamento (Anderson, 1967; North & Cockburn,
1978). Esses autores também afirmam que o aumento de CO2 apresenta maior efeito
sobre a redução dos processos metabólicos dos frutos que uma leve redução do
O2. A temperatura de armazenamento que manteve maior a firmeza de polpa foi de
0oC, concordando com Bender (1989) que recomenda temperaturas de 0oC a 1oC para
a cv. Gala.
A acidez titulável apresentou, na saída da câmara, valores que não diferiram
estatisticamente em relação à temperatura de armazenamento, sendo que a melhor
combinação de gases foi de 1,2kPa de O2 e 2kPa de CO2(Tabela_1). Já após sete
dias, não houve diferença estatística entre as condições de AC ( Tabela_3). Na
temperatura de 0oC, os frutos armazenados em 1kPa de O2 com 2kPa de CO2 e 1,2
kPa de O2 com 3 kPa de CO2 apresentaram os maiores níveis de acidez titulável,
podendo isto ser atribuído à menor taxa respiratória dos frutos. Alguns
autores, como Lidster et al. (1980), com a cv. McIntosh, e Brackmann &
Saquet (1995), com a cv. Gala, afirmam que pressões parciais de O2 próximo a
1kPa ou menos mantém a acidez dos frutos mais elevada.
Na avaliação do teor de sólidos solúveis totais (SST), tanto na saída da câmara
quanto após sete dias(Tabelas_1 e 3), os tratamentos não diferiram
estatisticamente com relação às condições de AC, confirmando o resultado obtido
por Brackmann & Saquet (1995). Provavelmente, isto é devido ao fato de que
os SSTs são degradados pela respiração após uma acentuada degradação dos ácidos
orgânicos e, além disso, a degradação é mais lenta em AC (atmosfera controlada)
do que em atmosfera refrigerada normal (Brackmann, 1990). Estes resultados
estão de acordo com os obtidos por Lidster et al. (1980), que também não
verificaram diferenças significativas nos SSTs em decorrência do baixo O2 (1 e
1,5kPa). Porém, houve diferença significativa com relação à temperatura de
armazenamento, sendo que a 0ºC manteve-se um valor mais elevado de SST. Não
houve diferença estatística em relação à incidência de frutos com polpa
farinácea em função das pressões parciais de O2 e CO2, tanto na saída da câmara
quanto após sete dias de exposição à temperatura de 20oC (Tabelas_2 e 4).
Quanto à temperatura de armazenamento, após sete dias a 20oC, a temperatura de
0,5oC apresentou maior incidência de frutos com polpa farinácea. Isso pode ser
explicado pelo fato de os tratamentos a ¾0,5ºC apresentarem uma menor média da
firmeza de polpa na saída da câmara e uma porcentagem maior da degenerescência
senescente após sete dias a 20ºC.
Não houve diferença estatística em relação à ocorrência de degenerescência
senescente, na saída da câmara, em função da variação da temperatura e da
pressão parcial dos gases durante o armazenamento ( Tabela_2). Já após sete
dias de exposição ao ambiente, a temperatura de armazenamento que apresentou
uma maior incidência de frutos com degenerescência senescente foi a de ¾0,5oC
(Tabela_4). Segundo Lyons (1975), a temperatura de armazenamento, quando muito
baixa, influi nos complexos enzimáticos e permeabilidade das membranas,
solidificando a parte lipídica. Fortes & Petri (1982) afirmam que a
suscetibilidade de maçãs ao CO2 aumenta com a redução de temperatura, e de
acordo com Little & Peggie (1987), a cv. Gala pode apresentar danos por
baixas temperaturas. De acordo com Ebert (1984), este dano pode ocorrer na cv.
Gala após longos períodos de armazenamento, sendo que a mudança bioquímica mais
importante no tecido afetado é a acumulação de acetoaldeído, que pode também
induzir a degenerescência da polpa dos frutos.
Não houve diferença estatística no número de frutos podres, em relação à
temperatura de armazenamento, tanto na saída da câmara como após sete dias de
exposição dos frutos à temperatura de 20oC (Tabelas_2 e 4). A combinação de
gases que apresentou maior incidência de frutos podres foi 1,2kPa de O2/2kPa de
CO2. Brackmann & Saquet (1995) também verificaram maior incidência de
frutos podres nos tratamentos com CO2 mais baixo e O2 mais elevado. Entretanto,
após sete dias a 20oC, não houve diferença estatística entre as condições de
AC.
Pelos resultados obtidos, podemos observar que a melhor temperatura de
armazenamento é de 0oC, pois proporciona frutos com maior acidez titulável, na
saída da câmara, e maior firmeza de polpa, menor incidência de frutos com polpa
farinácea e degenerescência, após sete dias a 20oC. Em relação à atmosfera
controlada, foi verificado que a melhor combinação de gases é de 1kPa de O2 com
2 e 3kPa de CO2, pois os frutos armazenados nestas condições apresentaram
satisfatória manutenção da acidez titulável e menores valores de ocorrência de
podridões e distúrbios fisiológicos.
CONCLUSÃO
A melhor temperatura para o armazenamento de maçãs cultivar Royal Gala é 0ºC e
1kPa de O2 com 2 ou 3kPa de CO2 a melhor combinação de gases.