Manejo integrado de pragas em macieira no Rio Grande do Sul II: uso de
Neoseiulus californicus para o controle de Panonychus ulmi
INTRODUÇÃO
O ácaro-vermelho Panonychus ulmi Koch (Acari: Tetranychidae) é considerado uma
praga-chave da macieira no Sul do Brasil. O controle biológico é uma das
estratégias para o controle desse ácaro (Mathy & Baggiolini, 1967;
Baggiolini & Guignard, 1969; McMurtry et al., 1970; Fauvel & Atger,
1981), a partir da introdução de ácaros predadores da família Phytoseiidae
(Croft & Hoyt, 1983). A adaptação desses inimigos naturais ao novo
agroecossistema é uma exigência do controle biológico, verificada pelos
reaparecimentos espontâneos nos anos seguintes à introdução (Rosen &
Huffaker, 1982). Para o sucesso do controle biológico, o ácaro predador deve
ser tolerante às mudanças climáticas e sincronizar sua ocorrência com a da
praga; além disso, as pragas-chave precisam ser manejadas com agroquímicos
seletivos, sem os quais, ocorrem reduções de ácaros predadores (Baggiolini
& Guignard, 1969; Bostanian & Coulombe, 1986; Monteiro, 1993). Os
efeitos negativos do clima e das práticas fitossanitárias sobre os fitoseídeos
podem ser compensados com a sua multiplicação e liberações inoculativas ou
inundativas, proporcionando a manutenção desses inimigos naturais em densidade
suficiente para limitar o desenvolvimento de ácaros fitófagos (Hoy, 1976).
Em Vacaria (RS), Anastrepha fraterculus (Wied) (Diptera: Tephritidae) é a
espécie dominante de mosca-das-frutas na região, com freqüência de 96% das
capturas em frascos caça-moscas (Salles & Kovaleski, 1990a). Muitos dos
agroquímicos recomendados (Bleicher, 1982; Salles & Kovaleski, 1990b;
Salles, 1991) para o controle desse díptero são extremamente tóxicos para
ácaros predadores (Besson et al.,1978; Service de la Protection des Végétaux,
1983; Association Nationale pour la Protection des Plantes, 1987). A presençade
outras pragas, como Grapholita molesta (Busck.) (Lepidoptera: Tortricidae)
eNaupactussp. (Coleoptera: Curculionidae), cujos conhecimentos bioecológicos na
região não foram devidamente aprofundados, conduzem aos tratamentos
preventivos, levando à seleção de indivíduos resistentes aos agroquímicos e
provocando desequilíbrio entre as espécies de fitófagos e inimigos naturais.
O objetivo deste trabalho foi definir uma estratégia de controle do ácaro-
vermelho da macieira, associando o controle biológico com o controle químico,
por meio da multiplicação e de liberação inundativa de Neoseiulus californicus
McGregor (Acari: Phytoseiidae) e da seleção de inseticidas menos tóxicos aos
ácaros predadores.
MATERIAL E MÉTODOS
Área experimental -O presente estudo foi realizado entre outubro de 1992 e
fevereiro de 1996, em um pomar comercial de macieiras da empresa Rincão das
Flores Agropastoril, localizada no município de Vacaria, Rio Grande do Sul. O
pomar situa-se no km 32 da BR 285, distante 10 km do pomar mais próximo. A área
de plantio foi de 229,1 ha, dividida em 6 parcelas de macieiras, as quais foram
subdivididas em quadras, plantadas com as variedades Gala e Fuji (Tabela_1). No
primeiro ciclo vegetativo (1992-93), duas quadras de macieiras, com 2 ha cada,
foram utilizadas como testemunhas, sendo uma da variedade Gala (Gala
testemunha), localizada na parcela III, e a outra de Fuji (Fuji testemunha),
pertencente à parcela V, ambas não sofreram nenhum tratamento para o controle
de ácaro-vermelho e não houve a liberação de ácaros predadores. Além dos
tratamentos regulares, as testemunhas foram pulverizadas com deltametrina uma
vez por mês, com o objetivo de evitar o desenvolvimento de ácaros predadores
que porventura pudessem migrar para estas áreas; nos anos subseqüentes, não foi
possível impedir a migração de ácaros predadores liberados no pomar para as
quadras-testemunha.
Analisando o histórico fitossanitário do pomar (Tabela_2), verificou-se que as
pragas mais importante nos ciclos vegetativos de 1989/90 e de 1990/91 foram: A.
fraterculus, P. ulmi, G. molesta, Eriosoma lanigerum (Hausmann) (Hemiptera:
Aphididae) e Naupactussp. Os agroquímicos empregados para o controle dessas
pragas foram: azinphos ethyl, clofentezine, deltametrina, diazinon, dimetoato,
fenpropatrina, fenthion, malathion, phosmet, propargite, triclorfon e
vamidothion.
Criação do ácaro predador em estufa - Em 1992, fêmeas do fitoseídeo N.
californicus foram obtidas do Centro Nacional de Pesquisa do Meio Ambiente
(CNPMA), unidade da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), em
Jaguariúna-SP, as quais foram originárias do Peru. Os ácaros predadores foram
criados no pomar experimental, em estufas de plástico, contendo oito salas de
12 m2, das quais, três foram destinadas à produção do ácaro predador e duas
para o ácaro-rajado, Tetranychus urticaeKoch (Acari: Tetranychidae), utilizado
como alimento para o ácaro predador. Aproximadamente quinze sementes de feijão
foram semeadas em cada pote de plástico de 20x15 cm; a capacidade média da sala
foi de 300 potes, quantidade suficiente para assegurar a produção de N.
californicus (Monteiro, 2001a). A produção média de N. californicus por pote,
entre outubro e março, foi de 420 ninfas e adultos, não incluindo os ovos e as
larvas. O intervalo de liberação foi de 4 a 7 dias, no período estival,
enquanto, nos meses de abril a setembro, houve redução natural na produção de
ácaros predadores e o intervalo médio entre as liberações foi de 25 dias. A
diminuição da produção no inverno ocorreu devido à baixa temperatura interna
das salas, pois o aquecimento com resistências de 900 watts/hora/sala não foi
suficiente para compensar a perda de calor. As salas foram iluminadas por 4
lâmpadas fluorescentes de 40W.
Multiplicação de ácaros predadores no pomar ' macieiras de porte vigorosos, em
condições de serem podadas (poda verde), receberam as primeiras liberações de
N. californicus. Essas foram conduzidas de modo a permitir que a população de
P. ulmi fosse maior do que a tolerada pelo índice do nível de controle (NC),
com a finalidade de aumentar a população do ácaro-vermelho, disponibilizando
alimento suficiente para o desenvolvimento de várias gerações de N.
californicus. À medida que P. ulmi foi reduzido pelo ácaro predador, as
macieiras foram podadas e os seus ramos distribuídos em parcelas previamente
selecionadas, visando a introduzir ou aumentar a população de N. californicus
(Blommers, 1989). Foram transferidos materiais vegetativos de uma área
equivalente a, aproximadamente, 12 ha nos ciclos vegetativos de 1992/1993 e
1993/1994. A estimativa do número de ácaros predadores distribuídos na poda
verde foi calculada pela multiplicação do número médio de folhas por ramo (10
folhas), de ácaros predadores por folha (4 a 7 indivíduos), de ramos-ladrão
retirados por macieira (média de 5 ramos), de macieiras por hectare (média de
1500 plantas) e do número de hectares em que foi realizada a poda verde.
Liberação dos ácaros predadores -Os ácaros predadores foram liberados sobre as
macieiras junto com as folhas de feijoeiros e ácaros-rajados. Utilizaram-se em
torno de 250 potes para cada liberação, aproximadamente 105.000 ninfas e
adultos. A quantidade de material depositado por hectare foi proporcional à
massa foliar das macieiras e à porcentagem de presença do ácaro-vermelho, a
qual foi previamente determinada pelo monitoramento. Os adultos levaram de 12 a
24 horas para migrarem das folhas de feijoeiros para as macieiras, enquanto as
larvas permaneceram nas folhas dos feijoeiros por mais tempo. As parcelas de
Gala e Fuji receberem N. californicusa partir de outubro de 1992, priorizando
àquelas que apresentaram 30% de folhas com presença de P. ulmi. Normalmente, as
liberações foram realizadas entre 8 e 12 horas e 16 e 18 horas, evitando os
dias chuvosos; sempre que possível, a liberação ocorreu no período da tarde,
pois as folhas do feijoeiro permanecem mais tempo túrgidas e abertas, o que
facilita a passagem do ácaro predador para as macieiras (Monteiro, informação
pessoal).
A partir da primavera de 1993, as liberações de ácaros predadores foram
realizadas prioritariamente de acordo com os resultados da amostragem de ovos
de inverno. No verão, os monitoramentos de folhas identificaram as áreas para
liberação, cuja distribuição foi total ou parcial. Por meio da poda verde, os
ácaros predadores foram distribuídos no pomar, depositando de dois a três ramos
por macieira, em posição transversal à linha de plantio e à altura de 1,6 m.
Monitoramento das formas móveis de ácaros - Durante os 4 anos do estudo, os
levantamentos dos ácaros foram realizados segundo a metodologia Baillod &
Schlaepler (1982) e Baillod (1989), baseada na presença e ausência de ácaros
sobre as folhas. Foram coletadas de 40 a 60 folhas por ha, localizadas em ramos
do ano, a 1,70 m de altura e na periferia média da copa. A amostragem foi
realizada em 3 a 4 filas por ha, dependendo do formato das parcelas,
quantificando a porcentagem de ácaros em cada fila. A amostragem serviu para
determinar a estimativa de risco imediato e potencial que, segundo Audemard et
al. (1982), foi definida, respectivamente, como sendo: o nível obtido indica o
limite máximo de infestação, além do qual exige intervenção imediata" e
" determina o nível de previsão da infestação, estimado a partir de um
estado precedente da fase nociva da praga". O NCfoi de 40% de folhas com
presença de P. ulmi, sendo que, em 1994/95 e 1995/96, o NC passou para 80% de
presença, à condição que houvesse 40% de N. californicus (Staübli et al.,
1991), e que as macieiras não apresentassem o sintoma de bronzeamento
generalizado.
Monitoramento de ovos de inverno do ácaro-vermelho ' Os ácaros-vermelhos
depositam ovos hibernantes em torno das gemas dos ramos das macieiras, o que
possibilita o seu monitoramento. Com o auxílio de um estereomicroscópio (10 a
20 vezes), foram contados todos os ovos de inverno em torno de uma gema bem
desenvolvida, inserida em ramos de dois anos de idade (Baillod, 1979). O número
de ramos observados foi de 45 a 60 por hectare, distribuídos em 3 a 4 filas por
quadra. Este monitoramento avalia a eficiência do manejo fitossanitário do
ciclo anterior e estima o risco potencial de infestação de P. ulmi para a
primavera seguinte. Nas duas primeiras avaliações, determinou-se o efeito do
óleo mineral (Triona 4%) sobre os ovos de inverno, realizando o monitoramento
antes e depois da pulverização. O NC foi de 10 ovos por unidade de amostra
(ramos de 1 cm) (Baillod, 1979).
Monitoramento de mosca-das-frutas 'A. fraterculus foi monitorada com frasco
caça-moscas do tipo McPhail, utilizando suco de uva a 25% e distribuídas 1 para
cada 5 ha, em pontos de entrada da praga no pomar, previamente identificados. A
leitura foi feita 2 vezes por semana. O NC foi de 0,5 mosca/frasco/dia. O
monitoramento dos demais insetos baseou-se no método visual, sem uma
metodologia específica, pois, neste pomar, A. fraterculus foi considerada a
única praga-chave.
Seleção de agroquímicos 'Para o ciclo 1992/93, os agroquímicos utilizados para
o controle de insetos foram selecionados a partir de Salles & Kovaleski
(1990b) e Salles (1991). Entre 1993/94 e 1995/96, a escolha dos inseticidas foi
baseada nos experimentos realizados em laboratório e no pomar (Monteiro, 1993;
Monteiro, 2001b) (Tabela_2).
As populações de ácaros-vermelhos foram pulverizadas com acaricidas específicos
ao alcançarem o NC. No primeiro ano, foram usados acaricidas do mercado e, a
partir do segundo ano, selecionou-se propargite, em função de sua baixa
toxicidade para a população de fitoseídeos, de acordo com Service de la
Protection des Végétaux (1983) e Association Nationale pour la Protection des
Plantes (1987). A quebra de dormência das macieiras foi feita com cianamida
hidrogenada (0,4%) + óleo mineral (Triona a 4%), pulverizado a 1.000 l/ha com
um turbopulverizador.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Ciclo vegetativo de 1992/93.
Outubro a dezembro ' Os ácaros predadores foram distribuídos em 82,8 ha da
variedade Gala (Tabela_3), cuja densidade média estimada foi de 13.569
indivíduos por hectare. A dispersão do predador entre as macieiras foi lenta,
pois, na variedade Gala, a porcentagem média de folhas com a presença de N.
californicus foi de 6,5% em 4 de janeiro (Figura_1-A). Na variedade Fuji,
ácaros predadores foram liberados em 46,5 ha, na densidade estimada de 9.000
ácaros por hectare. Diferente do ocorrido em Gala, observou-se que os
predadores se distribuíram mais eficientemente na massa foliar de Fuji,
variando de 9,4 a 48,8% de presença de N. californicus, em 4 de janeiro (Figura
1-B). Considerando que a densidade estimada de ácaros predadores liberados na
Fuji foi menor do que na Gala, parece que a melhor distribuição de N.
californicus nas parcelas de Fuji pode estar relacionada como o manejo das
macieiras, cujas copas foliares foram abertas no inverno anterior ao início das
liberações, retirando ramos mais vigorosos ou "ladrões". Esta é uma
prática cultural que visa a obter frutos de qualidade e permite maior aeração
da planta, o que pode ter facilitado, indiretamente, a dispersão de fitoseídeos
durante as pulverizações com turbopulverizadores. O volume de ar produzido
nestas turbinas equivale a 19,5 m3/seg, sendo projetado violentamente na
direção das plantas, à velocidade de 112 km/h (modelo básico de Jacto 2000),
podendo, assim, reproduzir o efeito que as correntes de ar têm sobre a
dispersão de ácaros predadores (Hoy, 1982; Tixier et al., 1998).
Nestes três primeiros meses, foram distribuídos ácaros predadores em 55% do
pomar; entretanto, não foi em quantidade suficiente para evitar altas
porcentagens de presença de P. ulmi em certas quadras do pomar (Figura_2). Nas
quadras onde foram liberados N. californicus, as pulverizações de acaricidas
foram realizadas de forma parcial, limitando-as às fileiras com porcentagens de
presença maiores do que o NC, permitindo que N. californicus manifestasse o seu
potencial de predação e de crescimento, o que se verifica quando em altas
densidades de presas (Huffaker et al., 1977; Fauvel, 1993); no restante do
pomar, as pulverizações foram em área total (Tabela_4). Neste período, foram
pulverizados o equivalente a 178,9 ha em Gala e a 62,3 ha em Fuji, o que
corresponde, respectivamente, a 146,2% e a 58,4% da área plantada com cada
variedade.
Observou-se que, nas parcelas de Gala, foi realizada 1,8 pulverização a mais do
que na Fuji. Essa diferença reflete as dificuldades em realizar a estimativa de
risco potencial de P. ulmi nas parcelas de Gala, após o monitoramento de 11 de
dezembro, pois esta estimativa depende da capacidade de desenvolvimento da
população de ácaro-vermelho e o período de carência das matérias ativas.
Recomendou-se o controle químico em várias quadras de Gala, mesmo quando as
populações de P. ulmi não tenham atingido o NC, pois a ação do aumento da
temperatura sobre o desenvolvimento do ácaro-vermelho poderia fazer com que
estas populações ultrapassassem o NC nas primeiras semanas de janeiro,
coincidindo com o período de carência dos acaricidas e impossibilitando o seu
controle. Os acaricidas recomendados, propargite e clofentezine, possuem,
respectivamente, 30 e 40 dias de carência (Andrei 1990); logo, a última
pulverização em Gala não poderia ser realizada após 2 de janeiro. Esta
recomendação ocorreu em quase todas as quadras onde não haviam sido liberados
ácaros predadores.
Nas parcelas de Fuji, o uso de acaricidas foi menor, influenciado pelos
seguintes motivos: 1) Controle químico de P. ulmi foi baseado na estimativa de
risco imediato (NC), podendo ser realizado a qualquer momento; 2) A colheita de
Fuji não coincide com o período mais favorável para o desenvolvimento do ácaro-
vermelho (janeiro e fevereiro); 3) Melhor distribuição de N. californicus nas
quadras (Figura_1-B); 4) Menor efeito de acaricidas sobre o desenvolvimento de
ácaros predadores, em função da redução do número de pulverizações (Tabela_4);
5) Maior tolerância ao bronzeamento foliar em Fuji do que em Gala. Os danos
provocados pela alimentação de ácaros fitófagos nas macieiras são influenciados
pela intensidade de ataque, tolerância da planta e condições do clima (Huffaker
et al., 1969).
Os inseticidas usados para o controle de A. fraterculus foram diferenciados nas
parcelas com ou sem ácaros predadores. Nas parcelas onde foram liberados N.
californicus, optou-se por phosmet, pois apresenta menor toxicidade para os
fitoseídeos, segundo Besson et al. (1978), Service de la Protection des
Végétaux (1983), Association Nationale pour la Protection des Plantes (1987) e
Monteiro (1993) e Monteiro (2001 b, no prelo). Em 21-12-92 foi utilizado
fenthion em ambas as variedades, sendo que as amostragens não revelaram
reduções de ácaros predadores, imediatamente após a pulverização (Figuras_1-A,
1-B), exceção à Parcela V, contrariando os resultados de Monteiro (1993) e
Monteiro (2001 b, no prelo).
Janeiro a abril ' Neste período, foram produzidos, aproximadamente, 2.500.000
ácaros predadores na estufa que, juntamente com 6.300.000 N. californicus
originados da poda verde, foram transferidos para novas quadras ou liberados em
quadras que apresentaram baixa densidade de ácaro predador. Todas as parcelas
de Gala e de Fuji receberam N. californicus ao final deste ciclo vegetativo
(Tabela_3), sendo que as parcelas de Fuji continuaram tendo maior presença de
ácaros predadores. Em 30-01-1993, verificou-se acentuada redução de P. ulmi
(Figura_1-C, 1-D), coincidindo com aumento da distribuição de N. californicus
na massa foliar (Figura_1'A, 1-B), características observadas em um predador do
tipo limpeza (Baillod, 1984), enquanto, nas quadras-testemunha (Gala testemunha
e Fuji testemunha), os ácaros-vermelhos desenvolveram-se sem limitações,
provocando a queda de folhas em fevereiro (Figura_1-C, 1-D), demonstrando que,
neste ano, não houve influência negativa do clima (Jeppson et al., 1975) sobre
a flutuação de ácaros fitófagos. Assim, pode-se atribuir esta redução
exclusivamente aos fitoseídeos e ao manejo de acaricida (44,3% da área de
Fuji).
A presença de N. californicus nas folhas de macieira diminuiu com a redução de
P. ulmi, o que é normal, pois a dispersão de N. californicus está associada à
capacidade de busca de novas presas, ocorrendo quando os níveis de P. ulmi
forem baixos ou próximos ao ponto de equilíbrio entre ambas as populações
(Baillod, 1984; Huffaker et al.,1977). N. californicus migrou para o solo entre
março e abril, provavelmente à procura de abrigo e alimento (Figura_1),
migração também observada por Fauvel (1993).
Embora os testes de toxicidade tenham revelado o efeito nocivo do fenthion
sobre N. californicus(Monteiro, 1993; Monteiro, 2001 b, no prelo), a amostragem
no pomar realizada em 4-01-1993 não mostrou acentuada redução na flutuação de
N. californicus em função do fenthion aplicado em 21-12-92, provavelmente,
porque houve tempo suficiente para a recuperação dos ácaros predadores neste
intervalo. Somente os ácaros predadores da parcela V, em Fuji, tiveram uma
redução significativa após pulverização (Figura_1-B).
A amostragem de ovos de inverno nas seis parcelas, em ambas as variedades,
realizadas antes da quebra de dormência, mostrou significativa redução de ovos
hibernantes quando comparados com as testemunhas Gala testemunha e Fuji
testemunha (Tabela_5), as quais tiveram em média 43,2 vezes mais ovos de
inverno do que as demais. A baixa taxa de ovos de inverno foi resultado da
redução de fêmeas de P. ulmi entre fevereiro e abril (Figura_1-C, 1-D). O uso
de óleo mineral para a quebra da dormência provocou redução média de 70% dos
ovos hibernantes, diminuindo o risco potencial de infestação para o próximo
ciclo; entretanto, este valor foi menor do que o encontrado por Reis Filho
& Petri (1992).
Ciclo vegetativo de 1993/94.A metodologia utilizada para levantamentos de ovos
de inverno mostrou-se adequada, possibilitando identificar fileiras com maiores
infestações de ovos hibernantes, o que permitiu pulverizações localizadas com o
ovicida clofentezine, reduzindo o risco potencial de infestação na primavera
(Degrange, 1987; Monteiro, 1994). Assim, a população hibernante de P. ulmi
originou baixa porcentagem de formas móveis até novembro (Figura_3), tendências
similares foram obtidas por De Busschère (1970) e Baillod et al. (1989).
A maior densidade do ácaro-vermelho coincidiu com o pico populacional dos
ácaros predadores (Costa-Comelles & Avilla 1992) (Figura_3) e com o pleno
desenvolvimento foliar das macieiras, o que possibilitou aceitar níveis maiores
para o ácaro-vermelho, devido à maior tolerância da planta (Fauvel et al.1993).
Neste segundo ano, 55,8% da área não recebeu acaricida, sendo que as parcelas
de Gala foram responsáveis por 59% das pulverizações (Tabela_3). O menor uso de
acaricidas foi em conseqüência do aparecimento natural de N. californicus e das
liberações de 2.100.000 e de 3.600.000 ácaros predadores obtidos,
respectivamente, na estufa e nas podas verdes. Estas liberações ocorreram,
preferencialmente, nas parcelas de macieira com baixa densidade de ácaros
predadores ou em áreas que necessitavam estabilizar ambas as populações.
O uso de phosmet, trichlorfon e sumithion para o controle de mosca-das-frutas
não apresentou efeito negativo marcante sobre o desenvolvimento de N.
californicus no pomar, sugerindo que a população foi selecionada, obtendo
indivíduos tolerantes, o que é desejável em programas de controle biológico
(Rosen & Huffaker, 1982). Os resultados de toxicidade levaram a eliminar os
inseticidas pertencentes à classe dos altamente tóxicos ou utilizá-los com
restrição, como foi o caso do fenthion, que foi utilizado somente quando havia
mais do que 20 moscas-das-frutas/frasco/dia, fato que ocorreu em parcelas
isoladas, principalmente próximas às matas, capoeiras e outros redutos naturais
de A. fraterculus (Orth et al. 1986). Fenthion não foi descartado completamente
devido à eficiência de sua ação de profundidade (Salles & Kovaleski 1990b)
e à necessidade econômica de manter a qualidade dos frutos. Outro produto de
uso com restrição foi azinphos ethyl, recomendado exclusivamente contra E.
lanigerum.
Ciclo vegetativo de 1994/95 e 1995/96.As amostragens de ovos de inverno (Tabela
5) e de porcentagem de presença de P. ulmi revelaram populações baixas (Figura
4 e 5) durante estes dois ciclos vegetativos. N. californicus acompanhou estas
flutuações, mantendo-se em equilíbrio (Figura_4 e 5), o que é desejável para um
inimigo natural (Rosen & Huffaker, 1982). A migração para as ervas daninhas
em abril e o ressurgimento natural possibilitaram reduzir em 70% a produção de
ácaros predadores na estufa. Nesses dois ciclos, as liberações ocorreram em
certas linhas de plantio, principalmente, em beira de estrada, pois observou-se
que os ácaros-vermelhos se desenvolvem melhor nas bordaduras do que no interior
das quadras (Monteiro, informação pessoal), provavelmente, devido ao estresse
hídrico que a poeira das folhas promove sobre a fisiologia das macieiras
(Specht 1965, Wermelinger et al. 1990; Monteiro & Fauvel, 1996).
As maiores dificuldades para a implantação do controle biológico de ácaros
ocorreram nos dois primeiros anos, em função da restruturação das práticas
fitossanitárias realizadas no pomar. Os agroquímicos foram selecionados a
partir da eficiência do controle de artrópodos e da toxicidade em relação aos
inimigos naturais. A manutenção dos ácaros predadores no pomar, por meio de
liberações inundativas, foi uma estratégia correta, permitindo o equilíbrio
entre as duas espécies em áreas de baixa densidade de ácaros predadores, de
maneira que o controle biológico de P. ulmi foi possível a partir do segundo
ano. A adaptação de N. californicus às condições climáticas e culturais do
pomar foram manifestadas pela capacidade de ressurgência natural, nos anos
posteriores à liberação, sugerindo que o predador sobreviveu durante o inverno,
utilizando outras fontes de alimento. N. californicus dirigiu-se para as ervas
daninhas quando houve redução de P. ulmi nas folhas de macieira; abrem-se
perspectivas de novos estudos para demonstrar a importância do manejo de ervas
daninhas na sobrevivência de N. californicus durante o inverno