Crescimento e sobrevivência de mudas de cagaiteira (Eugenia dysenterica DC) nas
condições do cerrado
CRESCIMENTO E SOBREVIVÊNCIA DE MUDAS DE CAGAITEIRA (Eugenia dysenterica DC) NAS
CONDIÇÕES DO CERRADO1
INTRODUÇÃO
O Cerrado ocorre, predominantemente, no Planalto Central do Brasil e constitui-
se na segunda maior formação vegetal brasileira, ficando entre 5º e 20º de
latitude Sul e 45º e 60º de longitude Oeste. Sua flora é considerada a mais
rica dentre as savanas do mundo, estimando-se um número entre 4 mil e 10 mil
espécies de plantas vasculares (Alho & Martins, 1995).
Infelizmente, a atual forma de expansão agrícola do Brasil tem desprezado o
potencial de uso das espécies nativas do Cerrado, ainda que este bioma
apresente um enorme grupo de espécies que podem ser aproveitadas de formas
diversas, quer na indústria alimentícia ou farmacêutica, quer como ornamentais
(Ribeiro et al., 1994).
A cagaiteira (Eugenia dysenterica DC.) pertence à família das Mirtáceas e é uma
árvore frutífera que, de acordo com Ribeiro et al. (1994, 1996), ocorre no
Cerradão, Cerrado e Campo Sujo do Distrito Federal, Goiás, Minas Gerais, São
Paulo, Tocantins e Bahia. Segundo Naves (1999), a cagaiteira ocorre em maior
densidade nos Latossolos Vermelho-Amarelos, sendo observada em áreas com
temperaturas médias anuais variando entre 21,1 ºC e 25,5 ºC e altitudes de 380
a 1100 m.
A cagaiteira é grande produtora de frutos, e sua árvore apresenta, também,
diversas utilidades. Entretanto, praticamente não existem pesquisas
relacionadas com o cultivo desta espécie do Cerrado (Ferreira, 1972). Na
literatura, encontram-se alguns trabalhos sobre germinação e produção de mudas
em viveiro. Silva (1999) obteve mudas de cagaiteira com altura e diâmetro
médios, aos 250 dias após semeadura, de 5,56 cm e 0,14 cm, respectivamente.
Relatos de estudos realizados na Embrapa Cerrados citam que algumas mudas, com
25 cm de altura, foram levadas para o campo e atingiram até 47 cm após cinco
meses de plantio (Almeida et al., 1987).
A cagaiteira apresenta germinação satisfatória, porém com crescimento posterior
lento, o que motivou o desenvolvimento deste trabalho, com o objetivo de
avaliar o crescimento e a sobrevivência das mudas produzidas em tubetes, com
três capacidades volumétricas e três substratos, após transplantadas para o
campo.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido na área experimental da Escola de Agronomia da
Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia-GO, latitude 16º35'12" Sul,
longitude 49º21'14" Oeste, a 730m de altitude, no período de maio de 1998
a novembro de 1999, segundo os registros da Estação Evaporimétrica de Primeira
Classe, da Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás, e o solo
classificado como Latossolo Vermelho-Escuro. As médias de dados climatológicos
da região, no período de 1961 a 1990, foram: temperatura média anual 23,2 ºC,
temperatura média anual mínima 17,7 ºC, temperatura média anual máxima 29,8 ºC,
precipitação média anual 1575,9 mm, com menor precipitação de maio a agosto,
36,4 mm (maio), 9,5 mm (junho), 6,2 mm (julho), 12,7 mm (agosto), e com maior
precipitação em dezembro e janeiro, respectivamente, 258,8 mm e 270,3 mm
(Brasil, 1992).
As mudas de cagaiteira utilizadas para o plantio no campo foram provenientes de
tubetes com capacidades volumétricas diferentes (50 cm3, 120 cm3 e 228 cm3) e
três tipos de substrato {substrato comercial Plantmax; solo + terriço de mata +
vermiculita (1:1:2, em volume) + 1g/litro de termofosfato Yoorin; e solo +
terriço de mata + vermiculita (1:1:2, em volume)}. Para a composição dos dois
últimos substratos, utilizou-se solo classificado como Latossolo Vermelho-
Amarelo. Mudas conduzidas nessas mesmas condições apresentavam, em média, 12g,
20g e 31g, de massa de matéria seca do sistema radicular, respectivamente, para
os tubetes com volume de 50 cm3, 120 cm3 e 228cm3 (Souza, 2000).
Na Tabela_1, são apresentados os resultados das análises física e química do
solo, do local onde foi realizado o plantio, sendo este coletado e analisado
segundo metodologia proposta pela EMBRAPA (1979).
O delineamento adotado foi o de blocos completos casualizados, em esquema
fatorial 3 x 3, sendo tubetes com três volumes e três tipos de substratos,
utilizando-se de cinco repetições e cinco plantas por parcela.
Para o preparo da área, foram realizadas duas gradagens, uma com grade aradora
e outra com niveladora. Não foi aplicado calcário nem adubação química. O
plantio no campo foi realizado no dia 22 de maio de 1998 (175 dias após a
semeadura).
Durante o transcorrer do experimento, foram realizadas irrigações por aspersão,
de forma uniforme, durante o período de baixa precipitação. As capinas foram
manuais com enxada e realizadas sempre que necessário.
A avaliação do experimento foi feita por meio de anotações mensais da
sobrevivência das mudas, acompanhadas de coleta de dados de altura e diâmetro
do caule, ao nível do solo, durante seis épocas, até aos 180 dias após o
plantio. Uma última leitura foi realizada em novembro de 1999 (540 dias após o
plantio), coletando-se dados de diâmetro do caule a 5 cm do nível do solo,
altura das plantas e sobrevivência. Considerou-se como altura da planta o
comprimento do caule, desde o colo até a região de inserção da folha mais nova.
Os resultados foram submetidos à análise de variância, e as médias obtidas
foram comparadas pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade. Para a avaliação
do crescimento em altura e em diâmetro, durante o período do ensaio, fez-se
análise de regressão em função da época de avaliação.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O tipo de substrato em que as mudas foram produzidas exerceu influência
significativa sobre a altura e o diâmetro das plantas em todas as épocas
avaliadas, ao passo que o volume de substrato dos tubetes, da fase anterior,
afetou a altura aos 90 e 120 dias e o diâmetro aos 90; 120; 150 e 180 dias. A
análise de variância não mostrou significância para a interação volume dos
tubetes e substratos, considerando o diâmetro e a altura das mudas.
Nas Tabelas_2 e 3, verifica-se que os substratos solo + terriço de mata +
vermiculita e esta mistura mais adubação química foram superiores ao Plantmax
em todas as épocas avaliadas, para altura e diâmetro médio de plantas. Aos 540
dias após o plantio, havia plantas com altura variando entre 12 cm e 130 cm e
diâmetro entre 0,28 cm e 1,60 cm. Esta variabilidade pode ser devida à origem
das sementes, as quais foram coletadas de plantas diversas e, ainda, pela falta
de domesticação desta espécie, o que poderia levar a uma maior uniformidade de
crescimento (Silva, 1999).
As mudas de cagaiteira provenientes dos tubetes com menores capacidades de
volume (50 e 120 cm3) tiveram um maior crescimento em altura e diâmetro quando
comparadas com aquelas provenientes de tubetes com capacidade para 228 cm3,
após o plantio no campo (Figuras_1 e 2). A diferença obtida para altura média
entre o menor e o maior volume de tubete foi de 23% aos 90 dias e 22,2% aos 120
dias após o plantio. Para o diâmetro, esta diferença aos 90; 120; 150 e 180
dias foi de 16%, 15%, 23% e 27%, respectivamente. Tais diferenças, embora
significativas, são de pouco efeito, pois as cagaiteiras apresentam um
crescimento vegetativo inicial lento. O acompanhamento do crescimento destas
mudas no campo por mais tempo poderá confirmar ou não se estas tendências
persistirão. Talvez já não seja possível afirmar que o efeito apresentado seja
apenas do volume de substrato utilizado nos tubetes para produção das mudas, ou
seja, o crescimento maior do sistema radicular de espécies do Cerrado
(Poggiani, 1973; Sano et al.,1995), como é o caso da cagaiteira, pode ter
interferido nos resultados apresentados.
Ao analisar a sobrevivência das mudas aos 540 dias após o plantio, verificou-se
que houve maior sobrevivência para aquelas mudas provenientes de tubetes com
maiores capacidades volumétricas e com os substratos 2 (solo + terriço de mata
+ vermiculita + adubação química) e 3 (solo + terriço de mata + vermiculita)
(Figura_3). Os menores índices de sobrevivência observados para as mudas
provenientes de tubetes menores podem ter ocorrido em função de as mudas
apresentarem menor desenvolvimento do sistema radicular. Os tubetes com 50 cm3
e 120 cm3, diferiram dos tubetes com 228 cm3, respectivamente, com massa de
matéria seca de 12 g, 20 g e 31 g, indicando que as mudas desta espécie não
devem permanecer por longo período no viveiro, devendo ser levadas mais
rapidamente para o campo, devendo-se, também, atentar para a escolha de mudas
mais desenvolvidas, até certo limite, uma vez que as condições no local
definitivo são mais estressantes, além de reduzir os tratos culturais em
relação ao viveiro.
Os valores médios obtidos para o diâmetro das plantas, aos 120 dias,
comparativamente àqueles registrados aos 90 dias, foram menores em todos os
tratamentos relativos ao tipo de substrato (Tabela_3). Nessa época do ano
(julho e agosto de 1999), houve uma elevação da temperatura média (22,5% e
23,0ºC), redução da umidade relativa do ar (61% e 46%) e ausência de chuvas(0,0
e 0,0 mm), conforme registrado na Estação Evaporimétrica de Primeira Classe, da
Escola de Agronomia da Universidade Federal de Goiás. Com isto, as plantas
entraram em dormência e, possivelmente, gastaram parte de suas reservas
nutritivas durante certo período. Entretanto, após a melhoria das condições
ambientais, as plantas retomaram o seu crescimento normal. Comportamento
semelhante foi verificado por Alvim & Silva (1982) em seu trabalho que
visava a determinar a influência da disponibilidade de água no solo sobre o
crescimento cambial de diversas árvores típicas do Cerrado.
Aos 540 dias, o diâmetro do caule, a 5 cm do colo das cagaiteiras (Tabela_3),
atingiu valores médios de 0,637 cm e 0,644 cm para mudas originadas do
substrato solo + terriço de mata + vermiculita, com e sem adubo químico,
respectivamente. Tais valores encontrados podem ser considerados satisfatórios
para a realização da enxertia, principalmente pelo método da garfagem,
recomendado para algumas frutíferas, como a mangueira, o abacateiro e a
gravioleira (Pinto, 1996).
CONCLUSÕES
Nas condições que se realizou o trabalho, pode-se concluir que:
1- O substrato solo + terriço de mata + vermiculita, com ou sem adubação
química, proporciona bom crescimento das plantas e alta taxa de sobrevivência
destas após o transplante das mudas para o campo, podendo ser utilizado para
produção de mudas de cagaiteiras.
2- As mudas de cagaiteiras apresentam crescimento em altura e diâmetro
desuniformes, constituindo um problema para a propagação sexuada de plantas
desta espécie.
3- Aos 540 dias, de idade, nas condições de campo, o diâmetro das plantas é
considerado adequado para a realização da enxertia, para mudas de cagaiteiras
originadas do substrato solo + terriço de mata + vermiculita, com e sem adubo
químico, respectivamente.