Armazenamento de abacaxi 'smooth cayenne' minimamente processado sob
refrigeração e atmosfera modificada
INTRODUÇÃO
O abacaxi , das cultivares Pérola e Smooth Cayenne, são bastante consumidos,
tanto in natura como industrializados, pois apresentam ótima qualidade
organoléptica, são boa fonte de vitaminas, açúcares e fibra, além de auxiliar
no processo digestivo (Gonçalves e Carvalho, 2000).
O processamento mínimo de frutos e hortaliças refere-se às operações que
eliminam partes não comestíveis, como cascas, talos e sementes, seguidas pelo
corte em tamanhos menores, tornando-as prontas para o consumo imediato, sem que
as frutas e hortaliças percam a condição de produto fresco ou in natura(Santos,
2002).
O aumento no grau de conveniência do abacaxi para os consumidores poderia ser
efetivado através do processamento mínimo, fazendo-se uso de diferentes tipos
de cortes e embalagens adequadas que permitissem o consumo direto do produto.
O presente trabalho teve como objetivo avaliar a influência da atmosfera
modificada em diferentes concentrações sobre a qualidade do abacaxi 'Smooth
Cayenne' minimamente processado.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados frutos do abacaxizeiro (Ananas comosus L. Merr) cv. Smooth
Cayenne, oriundos de Monte Alegre, região do Triângulo Mineiro. Os frutos foram
colhidos no estádio 2 de maturação, ou seja, cor amarela envolvendo mais de
duas fileiras de olhos, sem ultrapassar a metade da superfície, e tiveram a
superfície lavada e sanificada por imersão em solução de cloro ativo a 200
mg.L-1, a temperatura ± 5 o C, durante 15 minutos. Após lavados e sanificados ,
os frutos foram descascados manualmente e, em seguida, foram cortados em
palitos com 10 mm de lado e 40 mm de comprimento, utilizando-se de um
multiprocessador Cardano Al Campo-Master AT. Estes palitos foram submetidos a
sanificação por imersão em solução de cloro ativo à concentração de 100 mg.L-1,
a temperatura ± 5 o C, durante 3 minutos (Rocha et al., 1996). Realizou-se a
drenagem dos pedaços, mantendo-os em peneiras especiais de plástico por 3 min,
para a retirada do excesso de líquido acumulado.
Feito o processamento, os pedaços de abacaxi foram acondicionados em embalagem
de polipropileno média barreira (13,5 cm de comprimento x 10,0 cm de largura x
4,0 cm de altura) e seladas com filme flexível de polietileno + polipropileno
alta barreira (60 micras), em seladora a vácuo, fazendo uso da injeção de
mistura gasosa para a obtenção da Atmosfera Modificada (AM). Foram utilizados
três tratamentos : AM Passiva (Controle), AM Ativa com 5% de O2 e 5% de CO2
(AM1), e AM Ativa com 2% O2 e 10% de CO2(AM2). As embalagens, com cerca de 150
g de produto, foram armazenadas a 5 oC, em câmara fria com 85% UR, e analisadas
a cada 2 dias, num total de 8 dias de armazenamento, determinando-se os teores
de acidez total titulável (ATT), sólidos solúveis Totais (SST), pH, textura,
líquido drenado (LD), pectina total (PT), pectina solúvel (PS) e a atividade
das enzimas poligalacturonase (PG), polifenoloxidase (PFO).
O Líquido Drenado foi retirado do interior das embalagens e medido em g. O teor
de sólidos solúveis totais no suco foi determinado por refratometria,
utilizando-se de refratômetro tipo ABBE (AOAC, 1990), com os resultados
expressos em graus Brix. A acidez total titulável (ATT) foi determinada pela
técnica preconizada pela AOAC (1990), e expressa em porcentagem de ácido
cítrico. Os valores do pH foram determinados por potenciometria, utilizando-se
de pHmetro B474 da Micronal (AOAC 1990). A firmeza dos palitos, expressa em
Newtons (N), foi determinada com o auxílio de um analisador de textura modelo
TA.XT2i em plataforma HDP/90, utilizando-se de uma sonda de aço inoxidável de 2
mm de diâmetro (P/2N), com força de penetração na velocidade de 5 mm.s-1, numa
distância máxima de 7 mm. Os conteúdos de pectina total e pectina solúvel foram
extraídas de acordo com Mc Cready e Mc Comb (1952), e determinadas
espectrofotometricamente segundo a técnica de Blumenkrantz e Asboe-Hansen
(1973). A atividade da poligalacturonase (PG) foi determinada segundo Markovic
et al. (1975), e consistiu na hidrólise destas substâncias e doseamento dos
grupos redutores pela técnica de Somogyi, adaptada por Nelson (1944). Uma
unidade de PG foi definida como a quantidade de enzima capaz de catalisar a
formação de 1 nmol de açúcar redutor por minuto, sob as condições de ensaio. A
extração da Polifenoloxidase (PFO) foi feita de acordo com o método proposto
por Matsuno & Uritane (1972) e a atividade expressa em unidade por minuto
por grama de tecido fresco (Teisson,1979). O experimento foi conduzido em
delineamento inteiramente casualizado (DIC), em fatorial 3x5 (3 atmosferas e 5
datas de amostragem), com 3 repetições. A parcela experimental foi constituída
de uma bandeja.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Observaram-se valores médios de 3,34 para o pH, os quais são semelhantes aos
relatados por Smith (1988) em frutos in natura (3,10 a 3,85) (Tabela_3). Não
houve diferença significativa entre os tratamentos estudados, porém encontrou-
se diferença significativa (p < 0,05) no oitavo dia de armazenamento, que se
diferenciou dos demais por apresentar valores médios inferiores. A interação
entre as variáveis atmosfera e tempo não foi significativa.
Os teores de ATT variaram de 0,45% a 0,57% de ácido cítrico (Tabela_1),
concordando com os resultados obtidos por Antoniolli et al. (2000), que
trabalharam com abacaxi 'Pérola' e 'Smooth Cayenne' minimamente processados e
encontraram valores menores que 1% de ácido cítrico. A interação entre os
tratamentos utilizados e o tempo de armazenamento foi significativa (p<0,05),
como pode ser observado na Tabela_1, indicando que as atmosferas modificadas
não possuem o mesmo comportamento em todos os tempos de armazenamento. A
concentração de gás 2% O2 e 10% CO2 apresentou os menores teores de ATT aos 6 e
8 dias de armazenamento, e esta determinou maior ATT no quarto dia, diferindo
significativamente somente do controle. Pequena oscilação na acidez titulável,
durante o armazenamento de abacaxis ' Pérola', também foi observada por Vilas
Boas e Lima (1999).
Observou-se uma interação significativa entre tratamentos e o tempo de
armazenamento (p<0,05) com relação à variável SST. Aos 4 e 6 dias de
armazenamento, o controle apresentou maiores valores de SST, diferindo do
tratamento AM1 e AM2, respectivamente (Tabela_2). Ocorreu uma ligeira
diminuição nos teores de SST com o tempo de armazenamento. Provavelmente, esta
diminuição dos SST ocorreu devido ao maior consumo de constituintes orgânicos
no processo respiratório do produto, concordando com Santos (2002), que
trabalhou com abacaxi 'Pérola' minimamente processado e também sugeriu o
predomínio das reações catabólicas características da senescência.
A textura não foi influenciada pelo tempo de armazenamento ou pelos tratamentos
(Tabela_3), e notou-se ligeira diminuição com o tempo de armazenamento, porém
sem significância. Sarzi e Durigan (2002) trabalharam com produtos minimamente
processados de abacaxi 'Pérola' e também não observaram amaciamento na textura
da polpa.
Observou-se um aumento nos teores de PT no decorrer do período de armazenamento
(Figura_2) e que a aplicação da AM2 (2% O2 e 10% CO2) propiciou maiores valores
de pectina total no abacaxi minimamente processado que nos demais tratamentos
(Tabela_3). O aumento nos teores de pectina total durante o armazenamento do
produto pode ser devido à predominância de síntese de pectinas em resposta à
injúria sofrida pelo fruto no processamento ou devido ao aumento na perda de
líquido durante o armazenamento, concentrando os teores de pectina total.
A solubilização de substâncias pécticas iniciou-se a partir do segundo dia de
armazenamento para todos os tratamentos analisados (Figura_3). Atmosferas
modificadas ativas (2% de O2, 10% de CO2 e 5% de O2, e 5% de CO2)
proporcionaram menor solubilização destas substâncias (p<0,05), indicando estes
tratamentos como os mais efetivos (Tabela_3). Faria et al. (1994), citado por
Lima (1999), sugerem que a elevação no teor de pectina solúvel se deve à ação
de enzimas, como a PG e a PME.
A perda de líquido resulta em perdas quantitativas, de aparência (murchamento e
enrugamento), nas qualidades texturais (amaciamento, perda de frescor e
suculência) e na qualidade nutricional (Carvalho 2000). Apesar de esta perda
não ter sido afetada pelos tratamentos (Tabela_3), notou-se um aumento na
quantidade de líquido drenado com o decorrer do tempo em todos os tratamentos
analisados (Figura_4).
Com relação à atividade da PFO, observou-se um efeito interativo entre
tratamento e tempo de armazenamento (p<0,05). O tratamento-controle apresentou
menor atividade a partir do segundo dia de armazenamento, diferindo
significativamente dos demais tratamentos que apresentaram atividade da PFO bem
mais elevada (Tabela_4). Este fenômeno pode ter ocorrido devido à injuria pela
atmosfera, ou seja, concentrações muito baixas de O2e muito altas de CO2. Kader
(1986) relatou que o escurecimento de tecidos externos ou internos pode ocorrer
como resultado de altos níveis de CO2 e/ou reduzidos níveis de O2, acima
daqueles tolerados pelo vegetal. Segundo Ke e Saltveit (1989), o aumento do
teor de. CO2 induz a atividade da fenilalanina amonialiase que, por sua vez,
aumenta a produção de ácido cinâmico e seus derivados, que são metabolizados a
compostos fenólicos solúveis e utilizados como substrato pela PFO, causando
escurecimento.
No presente trabalho, a PG apresentou atividades com valores que variaram na
faixa de 36,05 a 69,83 U/min/g. Sua atividade aumentou em todos os tratamentos
em função do tempo de armazenamento até o sexto dia e, a partir daí, diminui
nos tratamentos com atmosfera modificada passiva (Controle) e atmosfera
modificada ativa com 5% de O2 e 5 % de CO2 (Figura_5). Os três tratamentos
diferiram significativamente entre si, sendo que o tratamento com 5% de O2 e 5%
de CO2 apresentou menor atividade da PG (Tabela_3). Ao relacionar o teor de
pectina solúvel com a atividade da PG, constata-se que os tratamentos AM1 e AM2
apresentaram menor atividade da PG e, conseqüentemente, menor solubilização de
substâncias. Thé (2001) também, trabalhando com abacaxi 'Smooth Cayenne',
verificou uma menor atividade da poligalacturonase em frutos sob atmosfera
modificada.
CONCLUSÕES
O abacaxi, cv. Smooth Cayenne, minimamente processado e armazenado a 5oC ± 1oC
e 85% ± 5% UR, apresentou uma vida útil de 6 dias pois mudanças drásticas nas
variáveis analisadas, tais como, pectinas total e solúvel, pH, acidez total
titulável, líquido drenado e sólidos solúveis totais, somente foram observadas
a partir do sexto dia de armazenamento.
Apesar de a atividade da poligalacturonase e de o teor de pectina solúvel terem
sido menores nos tratamentos com injeção de gases, estes tratamentos
apresentaram ação injuriosa sobre o tecido do abacaxi minimamente processado,
estimulando a atividade da polifenoloxidase. Isso leva-nos a indicar a
atmosfera modificada passiva como melhor tratamento no armazenamento de abacaxi
'Smooth Cayenne' minimamente processado.