Captura de Rhynchophorus palmarum L. (Coleoptera: curculionidae) em armadilhas
iscadas com o feromônio de agregação e compostos voláteis de frutos do abacaxi
INTRODUÇÃO
A cultura do coqueiro (Cocus nuciferaL.) é de fundamental importância para a
economia dos Estados do Nordeste do Brasil. Os insetos-praga limitam a sua
exploração, porque são os principais responsáveis pela baixa produtividade da
cultura. Os adultos e as larvas de Rhynchophorus palmarum (Coleoptera:
Curculionidae) fazem galerias no meristema apical da planta, e os odores
emanados dos tecidos atacados atraem outros indivíduos machos e fêmeas da
espécie. Os machos de R. palmarum alimentam-se e liberam o feromônio de
agregação, atraindo mais machos e fêmeas. Segundo Griffith (1968), uma
população de 30 larvas é suficiente para matar uma planta adulta. Em plantas
jovens, é possível que um número menor de larvas cause o mesmo efeito (Sánchez
& Cerda, 1993). Vários autores observaram larvas do gênero Rhynchophorus
alimentando-se de uma grande variedade de plantas das famílias Arecaceae,
Gramineae, Caricaceae, Bromeliaceae e Musaceae (Hagley, 1965; Wattanapongsiri,
1966). Em laboratório, larvas e adultos de R. palmarum são alimentados com
frutos de abacaxi (Ananas comosus L.) e colmos de cana-de-açúcar, Saccharum
officinarum L. (Giblin-Davis et al., 1989).
Pesquisas anteriores à identificação e síntese do feromônio de agregação de R.
palmarum, 6-metil-2(E)-hepten-4-ol (rincoforol), já evidenciavam que alguns
odores provenientes da fermentação de tecidos vegetais, tais como o etanol,
atraem adultos de várias espécies do gênero Rhynchophorus (Hagley, 1965;
Gunatilake & Gunawardena, 1986). Armadilhas iscadas apenas com o feromônio
de agregação, ou com partes de plantas hospedeiras, não são muito eficientes na
captura dos besouros das palmeiras. Porém, quando combinados, o efeito
sinérgico aumenta a atração em até 20 vezes (Oehlschlager et al., 1992; Gries
et al., 1993; Perez et al., 1994; Oehlschlager et al., 1995). Devido a esse
sinergismo, muitas substâncias voláteis, provenientes dos tecidos de palmeiras
e de outras plantas hospedeiras, têm sido identificadas. Vários ésteres de
palmeiras, como o acetato de etila, propionato de etila, butirato de etila e
isobutirato de etila, testados em associação com o feromônio, aumentaram a
atração de R. phoenicis, R. cruentatus, R. palmarum, R. bilineatus, R.
ferrugineus e R. vulneratus (Gries et al., 1994). Esses mesmos autores também
relataram que o propionato de etila foi o único éster testado capaz de aumentar
a atração de R. phoenicis para as armadilhas iscadas com (±)-fenicol. O acetato
de etila, propionato de etila, butirato de etila, isobutirato de etila e
etanol, testados em várias dosagens, proporcionaram efeito sinérgico na atração
de R. cruentatus para armadilhas iscadas com (±)-cruentol (Giblin-Davis et al.,
1994). Em proporções desconhecidas, o acetato de etila aumentou a atração de R.
palmarum para armadilhas contendo (±)-rincoforol (Jaffé et al., 1993).
Substâncias voláteis, provenientes da fermentação de toletes de cana-de-açúcar,
acetato de etila, propionato de etila e butirato de etila, igualmente
aumentaram a atratividade de Metamasius hemipterus para armadilhas contendo o
feromônio metalure (Perez et al., 1995). Entretanto, nenhum dos ésteres
testados foi tão eficiente na captura da broca-da-palmeira quanto pedaços de
palmeiras ou de cana-de-açúcar em associação com o feromônio de agregação
(Jaffé et al., 1993; Giblin-Davis et al., 1994; Gries et al., 1994). Isso
sugere que outros componentes cairomonais precisam ser adicionados e testados
em diferentes proporções.
O objetivo deste trabalho foi determinar os índices de captura de Rhynchophorus
palmarum em armadilhas iscadas com o feromônio de agregação, 6-metil-2(E)-
hepten-4-ol (rincoforol), associado a toletes de cana-de-açúcar, a pedaços de
frutos do abacaxi e a seis compostos voláteis isolados de frutos do abacaxi.
MATERIAL E MÉTODOS
O (±)-rincoforol foi sintetizado no departamento de Química da Universidade
Federal de Alagoas (Navarro et al., 2002), utilizando 1-bromo-2-metilpropano
(MERK), tetrahidrofurano (VETEC) e crotonaldeído (Aldrich). O hexanoato de
etila, hexanoato de metila, acetato de pentila e o octanoato de metila foram
sintetizados em laboratório a partir dos álcoois e ácidos carboxílicos
correspondentes (Aldrich). O decanoato de metila e o heptanoato de etila foram
adquiridos comercialmente (Aldrich).
Frutos maduros de abacaxi das variedades Pérola e Jupi foram aerados por 48
horas, utilizando-se de um dessecador de vidro com capacidade para 7,5 litros
(25 cm de diâmetro de boca x 32,5 cm de altura), o qual permitia a passagem do
ar atmosférico, previamente filtrado, na câmara onde estava acondicionado o
fruto. Os voláteis liberados pelos frutos foram arrastados pelo vácuo,
proporcionado por uma trompa d'água e aprisionados em um tubo (14 cm de
comprimento x 0,8 cm de diâmetro) contendo um adsorvente (carvão ativo ou
tenax). Os constituintes voláteis foram dessorvidos do adsorvente pela passagem
de hexano, e o extrato obtido foi concentrado com nitrogênio seco. Os extratos
foram analisados por cromatografia gasosa (HP5890, série II) acoplada à
espectrometria de massas HP5970 controlado por um computador ChemStation
50070C. Os componentes químicos presentes nos extratos foram separados em
coluna capilar com fase estacionária apolar (polidimetilsiloxano, 15m x 0.32 mm
D. I. x 0.5 µm espessura do filme de fase estacionária). As zonas de
aquecimento do cromatógrafo foram programadas para operar nas seguintes
temperaturas: injetor 150 ºC, detector (espectrômetro de massas) 270 ºC e forno
do cromatógrafo 30 ºC por 2 minutos, com velocidade de aquecimento de 8 ºC min-
1 até atingir a temperatura de 150 ºC. Hélio (1mL/min-1) foi utilizado como gás
de arraste. A energia de ionização foi de 70 eV, e o espectrômetro de massas
operou sob o modo "scan". Os compostos voláteis liberados pelos
frutos foram identificados por comparação dos tempos de retenção, e espectros
de massas de padrões autênticos e/ou espectros, registrados na literatura.
Dois experimentos seqüenciados foram instalados no campo com a finalidade de
observar-se o efeito sinérgico do rincoforol associado a seis componentes
voláteis do abacaxi. O delineamento estatístico utilizado foi o quadrado latino
com oito tratamentos. Para a realização dos experimentos, foram utilizadas
armadilhas previamente testadas, de modo a permitir o acesso, mas não a saída,
dos besouros do seu interior. As armadilhas foram confeccionadas, modificando-
se um balde de plástico com capacidade para 5 litros. Um funil de plástico foi
adaptado na tampa, que, por ser provida de rosca, facilitava o trabalho de
inspeção. As armadilhas foram instaladas em diferentes localidades ao longo do
litoral norte do Estado de Alagoas, sendo enterradas no solo para facilitar o
manuseio e diminuir a possibilidade de serem danificadas. A distância média
entre armadilhas foi de 5 km. As armadilhas foram inspecionadas a cada 8 dias,
contando-se o número de machos e fêmeas capturados em cada uma delas. Após cada
inspeção, os pedaços de cana-de-açúcar eram substituídos e as armadilhas
trocadas de local, para observar-se o efeito do local e época na captura dos
besouros. O primeiro experimento foi realizado no período de 64 dias. O
feromônio e os componentes voláteis do abacaxi foram colocados em cápsulas de
plástico do tipo "Eppendorf safe-lock®", contendo um furo de 1mm na
tampa. Em cada cápsula, adicionaram-se 700 µL de rincoforol ou 400 µL de cada
um dos ésteres em estudo. Os tratamentos foram os seguintes:
1) 3 pedaços de abacaxi
2) 1 cápsula com rincoforol
3) 1 cápsula com rincoforol e 3 pedaços de cana-de-açúcar (testemunha)
4) 1 cápsula com rincoforol e 3 pedaços de abacaxi
5) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com éster A do abacaxi
6) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com éster B do abacaxi
7) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com éster C do abacaxi
8) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com éster D do abacaxi
Onde: éster A= hexanoato de etila; B = hexanoato de metila; C = acetato de
pentila, e D = octanoato de metila.
O segundo experimento foi realizado no período de 64 dias. O feromônio e os
componentes voláteis do abacaxi foram colocados em cápsulas de plástico como
descritas no experimento anterior. Em cada cápsula, adicionaram-se 700 µL de
rincoforol ou 160 µL de cada um dos ésteres em estudo. Os tratamentos foram os
seguintes:
1) 1 cápsula com rincoforol e 3 pedaços de cana-de-açúcar (testemunha)
2) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres A + B + C + D + E
3) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres A + B + C
4) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres A + B + D
5) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres A + B + E
6) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres C + D + E
7) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres A + B
8) 1 cápsula com rincoforol e 1 cápsula com ésteres D + E
Onde: éster A = hexanoato de etila; B = hexanoato de metila; C = octanoato de
metila; D = decanoato de metila, e E = heptanoato de metila.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Flath & Forrey (1970), utilizando a técnica de extração líquido-líquido,
identificaram quarenta e cinco compostos em frutos da variedade Smooth Cayenne,
sendo, na maioria, compostos oxigenados. Dos dezoito compostos aqui
relacionados (Tabela_1), apenas seis foram também identificados por Flath &
Forrey (1970): hexanoato de metila, hexanoato de etila, heptanoato de etila, 3-
metiltiopropionato de etila, octanoato de metila e octanoato de etila. A
técnica de aeração com fase sólida de carvão ativo ou tenax para adsorção dos
voláteis de pedaços de abacaxi proporcionou a obtenção de compostos de função
éster, confirmando, segundo Rochat et al.(1991), serem voláteis provenientes da
fermentação alcoólica do material vegetal.
Os componentes encontrados em maiores proporções, obtidos da aeração do abacaxi
em pedaços, foram 2-metil butanoato de etila, hexanoato de metila, hexanoato de
etila, octanoato de metila e octanoato de etila. Por outro lado, hexanoato de
metila, hexanoato de etila e octanoato de etila foram os mais abundantes
obtidos por aeração do abacaxi inteiro. Esses resultados indicam que, exceto
pela presença de 2-metil butanoato de metila, os dois extratos têm os mesmos
componentes em maior abundância (Tabela_1). Verificou-se também que a exposição
da polpa do fruto na aeração do abacaxi em pedaços proporcionou maior número de
voláteis identificados do que os obtidos pela aeração do abacaxi inteiro.
Para estudar o efeito sinérgico do rincoforol e os constituintes voláteis do
abacaxi na captura de adultos de R. palmarum, utilizaram-se os ésteres em maior
abundância nos dois extratos. Hexanoato de metila, hexanoato de etila, acetato
de pentila e octanoato de metila foram sintetizados no Departamento de Química
da Universidade Federal de Alagoas, enquanto heptanoato de etila e decanoato de
metila foram adquiridos comercialmente.
A análise dos resultados do primeiro experimento instalado no campo mostrou que
não houve efeito significativo do local e da época na captura de R. palmarum.
Os índices de captura dos tratamentos rincoforol e toletes de cana-de-açúcar, e
rincoforol e pedaços de abacaxi mostraram não possuir diferenças significativas
entre si, contudo apresentaram índices de captura mais eficientes que os demais
(teste de Tukey, P < 0,05) (Figura_1).
No segundo experimento, também não houve efeito significativo do local e da
época na captura de R. palmarum. As armadilhas iscadas com rincoforol e toletes
de cana-de-açúcar apresentaram índices de captura significativamente superiores
aos demais tratamentos, os quais não diferiram entre si (teste de Tukey, P <
0,05) (Figura_2).
Os resultados deste estudo indicaram que o rincoforol, combinado com pedaços de
cana-de-açúcar ou pedaços de abacaxi, tornaram as armadilhas mais eficientes,
apresentando índices de captura superiores aos obtidos pelas armadilhas iscadas
apenas com rincoforol ou apenas com pedaços de cana-de-açúcar. Sugere-se que os
componentes voláteis, oriundos da fermentação da cana-de-açúcar ou do abacaxi,
quando combinados com o rincoforol, são os responsáveis pela atração dos
adultos de R. palmarum para as armadilhas. Estes resultados coincidem com os de
vários autores, os quais foram unânimes em afirmar que o feromônio sozinho não
foi eficiente na captura de adultos de R. palmarum, mesmo quando se liberou no
ambiente cerca de 30 mg/dia (Oehlschlager et al., 1992, 1993; Gries et al.,
1993; Jaffé et al., 1993; Perez et al., 1994; Oehlschlager et al., 1995). No
entanto, esses mesmos autores afirmaram que quando o feromônio foi utilizado
juntamente com pedaços de tecidos da planta e acetato, houve um aumento
significativo no número de insetos capturados, sugerindo que existe uma
interação entre os componentes químicos da planta e o feromônio produzido pelo
inseto, aumentando a atratividade das armadilhas em até 20 vezes.
Jaffé et al. (1993) relataram que, em laboratório, a mistura de 68% de etanol,
27% de acetato de etila e 5% de pentano atraiu os adultos de R. palmarum tanto
quanto os tecidos de plantas de coqueiro. Entretanto, quando testados em
condições de campo, nenhum deles, separados ou em combinação, foram atraentes,
sugerindo que estes compostos atraem os besouros apenas a curta distância da
fonte de odor. Dessa forma, o rincoforol, associado a outros odores é
responsável pela atração e orientação do inseto a longa distância. Os
resultados aqui obtidos mostraram que não houve diferenças significativas
quanto ao número de machos e de fêmeas capturados nas armadilhas, coincidindo
com os de Tiglia et al. (1998), Rochat et al. (1991), Oelhschlager et al.
(1993) e Jaffé et al. (1993), os quais afirmaram que o feromônio de agregação
atrai igualmente ambos os sexos.
CONCLUSÕES
1) O (±)-rincoforol, combinado com pedaços de abacaxi, torna as armadilhas tão
atraentes quanto aquelas contendo (±)-rincoforol com pedaços de cana-de-açúcar.
2) Não houve aumento significativo na captura dos insetos pelo uso do (±)-
rincoforol associado aos voláteis mais abundantes do extrato hexânico obtido da
aeração do abacaxi, se comparada à captura dos insetos nas armadilhas iscadas
com (±)-rincoforol associada à cana-de-açúcar ou abacaxi.