Tecnologias geoespaciais no gerenciamento da cultura da maçã
Tecnologias geoespaciais no gerenciamento da cultura da maçã1
Geospatial technologies on apple orchards management
Bernardo Friedrich Theodor RudorffI; Luigi Carli Marroni AulicinoI; Mauricio
Alves MoreiraI
IInstituto Nacional de Pesquisas Espaciais ' INPE, Divisão de Sensoriamento
Remoto - DSR. Av. dos Astronautas, 1.758 - CEP: 12.227-010 - São José dos
Campos-SP, Brasil. e-mail: [bernardo, luigi e mauricio]@ltid.inpe.br
INTRODUÇÃO
Atualmente, o Brasil é praticamente auto-suficiente na produção de maçã e ainda
exporta cerca de 10% da produção para mercados altamente exigentes, como a
Europa e os Estados Unidos. Até 1970, o Brasil era o maior importador de maçã
do Hemisfério Sul e o 5o no "ranking" mundial. A produção nacional de
maçã na safra de 2001 foi de cerca de 900 mil toneladas e o Estado de Santa
Catarina é responsável por aproximadamente 54% desta produção, sendo que 66% da
produção do Estado vem do município de Fraiburgo, onde se encontram grandes
empresas do agronegócio da pomicultura (http://www.fischerfraiburgo.com.br/
producp.htm).
Dentre elas, a Empresa Pomifrai Fruticultura S/A (POMIFRAI) estabeleceu um
contato com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), no início de
2000, no sentido de verificar a possibilidade de utilizar-se os recentes
avanços tecnológicos nas áreas de sensoriamento remoto, Sistema de Informações
Geográficas (SIG) e GPS (Global Positioning System) para auxiliar no
gerenciamento informatizado das lavouras de maçã. Essa empresa possui duas
fazendas: a Bom Futuro e a Rio Verde. A primeira é mais antiga na atividade da
pomicultura e foi amplamente estudada por Braga (1995) sob o ponto de vista da
utilização das técnicas de sensoriamento remoto e SIG, disponíveis na primeira
metade da década de 1990. Já a Fazenda Rio Verde não possuía informações
georreferenciadas das subparcelas (quadras) e o manejo da cultura não vinha
beneficiando-se da facilidade de utilização de um SIG. Com a melhora
significativa do sinal dos satélites para o GPS de navegação, a partir de maio
de 1999, o principal objetivo deste trabalho consistiu em utilizar este tipo de
GPS para gerar o mapa com a distribuição dos limites das quadras de maçã nessa
fazenda, de forma rápida, a baixo custo e com facilidade de atualização. Outro
objetivo foi mapear o uso e ocupação do solo através de imagens do sensor ETM+
do Landsat-7 nas demais áreas não levantadas pelo GPS, uma vez que a
identificação de áreas cultivadas com maçã através de imagens do Landsat,
especialmente em lavouras novas, é pouco confiável (Provesi et al., 1986).
Também foi verificada a possibilidade de realizar-se as etapas de
geoprocessamento, utilizando um aplicativo de domínio público, com um breve
treinamento para os técnicos da Empresa Pomifrai Fruticultura S/A.
MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo está localizada em parte do município de Fraiburgo, no Oeste
do Estado de Santa Catarina, na região do vale do Rio do Peixe e compreende a
Fazenda Rio Verde, de propriedade da Empresa Pomifrai Fruticultura S/A
(POMIFRAI). Informações detalhadas sobre o município, clima e solos podem ser
obtidas em Braga (1995), cujo trabalho se encontra disponível na Internet
<http://www.eps.ufsc.br/teses/braga/>. A Fazenda Rio Verde tem cerca de 1.010
ha, sendo que, aproximadamente, 340 ha são de pomáceas. Os pomares de maçã da
POMIFRAI estão divididos em cinco setores, onde o setor 5 corresponde à Fazenda
Rio Verde. Os setores, por sua vez, estão divididos em parcelas identificadas
por três algarismos, onde o primeiro algarismo se refere ao setor e os dois
seguintes à parcela. Cada parcela é dividida em subparcelas denominadas de
quadras. Na quadra, as informações de número de plantas, espaçamento, ano de
plantio, variedade, entre outras, podem ser obtidas. Para a empresa, é
importante associar as atividades de manejo e gerenciamento à quadra.
Para realizar as etapas de geoprocessamento e processamento de imagens, foi
escolhido o aplicativo SPRING, que é um SIG com funções de processamento de
imagens, análise espacial, modelagem numérica de terreno e consulta a bancos de
dados espaciais (Câmara et al., 1996). Este aplicativo é de domínio público e
encontra-se disponível na Internet (http://www.dpi.inpe.br/spring.html).
Para a obtenção dos limites das quadras, utilizou-se um GPS de navegação modelo
Garmin II Plus dotado de um cabo e antena com suporte magnético a fim de fixar
a antena fora do veículo, possibilitando melhor captação do sinal dos
satélites. Cada quadra foi contornada através de uma viatura (Toyota), obtendo-
se os pontos com as coordenadas geográficas (waypoints) ao longo da trajetória.
Foram anotados os números inicial e final dos waypoints de cada quadra para
posterior associação dos pontos com as respectivas quadras. O GPS armazena até
500 waypoints, que foram transferidos para um computador na sede da empresa. Os
arquivos dos waypoints, vindos do GPS em formato ASCII, foram transformados em
arquivos compatíveis com o SPRING para gerar o plano de informação no SIG,
contendo os limites contínuos das quadras.
As imagens do satélite foram previamente selecionadas através do catálogo de
imagens Landsat 5 e 7 da Divisão de Geração de Imagens do INPE, disponível na
Internet <http://www.dgi.inpe.br>. A escolha foi feita com base na
disponibilidade de imagens livres de cobertura de nuvem em duas épocas
distintas verão e inverno a fim de permitir uma melhor discriminação dos alvos
em função da sua resposta espectral diferenciada nestes dois períodos. As
imagens selecionadas foram do sensor ETM+ do satélite Landsat-7 da órbita 221 e
ponto 79, adquiridas em 07 de janeiro de 2000 e 05 de agosto de 2001 (Figura
1). Estas imagens foram registradas com auxílio da carta topográfica na escala
de 1:100.000 de Leblon Régis (Folha SG-22-Z-A-IV) do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). Posteriormente, as imagens foram restauradas
para a resolução espacial de 5 x 5 metros.
As classes de uso e ocupação do solo mapeadas a partir das imagens do satélite
foram: açude, banhado, mato, capoeira, lavoura, reflorestamento e outros. Um
trabalho a campo feito pelos técnicos da POMIFRAI auxiliou na identificação das
classes, especialmente as de capoeira e banhado, que nem sempre são bem
definidas nas imagens. O tratamento das imagens foi feito, utilizando-se dos
procedimentos de segmentação e de classificação não supervisionada,
implementados no SPRING; seguido de uma interpretação visual das imagens na
tela do computador através do procedimento de edição matricial. Um mapa (plano
de informação temático) contendo as classes e as suas respectivas áreas em
hectares, foi gerado.
Um breve treinamento de dois dias sobre o uso do aplicativo SPRING para fins de
gerenciamento das atividades agrícolas na Fazenda Rio Verde, em um SIG, foi
proporcionado a três técnicos da POMIFRAI ao final das atividades acima
descritas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Um total de 1860 waypoints foram capturados para 201 quadras, ou seja, uma
média de 9,2 pontos por quadra. Estes pontos foram coletados em dois dias e
meio de trabalho a campo. Descontando o tempo de traslado para a área,
obtiveram-se em média 90 pontos por hora, ou seja, foram levantadas
aproximadamente 10 quadras por hora. Os limites contínuos gerados a partir
destes waypoints no SPRING permitiram obter os valores da área em hectares de
cada quadra. O tamanho das quadras de maçã na fazenda variou de 0,14 a 5,14 ha
pelo GPS e de 0,14 ha a 5,32 ha pelo espaçamento (área ocupada por cada planta
multiplicado pelo número de plantas por quadra). Foi observada uma boa
correlação (r=0,97) entre a área estimada pelo GPS e a área estimada pelo
espaçamento (Figura_2). Em 17 quadras, foi observado que o GPS subestimou a
área das quadras em mais de 10% do valor da área estimada pelo espaçamento. Em
53 quadras, o GPS superestimou a área das quadras em mais de 10%, quando
comparado com a área estimada pelo espaçamento, e superestimou em 3,4% o valor
total das quadras de maçã, quando comparado com o estimado pelo espaçamento. É
de esperar-se que a área do GPS apresente um valor pouco superior à área
estimada pelo espaçamento, pois a obtenção dos waypoints foi feito, contornando
as quadras pelo lado de fora e nem sempre foi possível acompanhar exatamente o
posicionamento das plantas que definem as quadras. Uma verificação a campo
seria recomendável para identificar as causas das diferenças superiores a 10%.
O levantamento dos limites através do GPS de navegação mostrou ser ágil e de
baixo custo quando comparado com os demais levantamentos disponíveis, tais
como: GPS diferencial, topográfico, fotografia aérea restituída, imagem de
satélite de alta resolução, entre outros. Com o uso do GPS diferencial (DGPS),
seria possível obter um resultado bem superior e que se faz necessário para
certas aplicações (Gomes, 2001). Todavia, para a presente aplicação, pode-se
afirmar que o GPS de navegação é uma ferramenta suficientemente precisa para
obter o plano de informação com os limites das quadras de maçã, cujo ajuste
sobre uma imagem do Landsat-7 é apresentado na Figura_3.
Após a geração deste plano de informação, foi criado um banco de dados no
SPRING, associando-se as informações contidas numa planilha eletrônica ao dado
espacial, ou seja, ao limite de cada quadra (Figura_4).
A Figura_5 apresenta o mapa de uso e ocupação do solo gerado a partir das
imagens do Landsat-7 para os temas banhado, capoeira, mato, reflorestamento,
lavoura com cultura temporária, açude; e do GPS para o tema fruticultura. A
Fazenda Rio Verde está dividida em sete glebas conforme é apresentado na Figura
5. A Tabela_1 apresenta os valores da área em hectares para os temas por gleba
e total.
CONCLUSÕES
Foi observado um bom ajuste do plano de informação dos limites das quadras de
maçã sobre a imagem do satélite Landsat-7, indicando ser viável o uso do GPS de
navegação no levantamento do limite das quadras de maçã. Além disso, o
procedimento de obtenção dos waypoints é simples e rápido. As imagens do
satélite Landsat-7 foram úteis no levantamento temático do uso e ocupação do
solo, fornecendo a distribuição espacial e a área de cada tema. O aplicativo
SPRING, de domínio público, permitiu realizar todas as atividades de
processamento de imagem, banco de dados e Sistema de Informações Geográficas
utilizadas neste trabalho.