Estiolamento da planta matriz e uso de ácido indolbutírico no enraizamento de
estacas de goiabeiras
Estiolamento da planta matriz e uso de ácido indolbutírico no enraizamento de
estacas de goiabeiras1
Stock plant shading and indolbutyric acid in the rooting of Psidium guajava L.
Walter Henrique da Costa JrI; João Alexio Scarpare FilhoII; Débora Costa
BastosIII
IEng. Agr. MSc. FMC, Campinas ' SP. whcosta@uol.com.br
IIEng. Agr. Professor Associado do Departamento de Produção Vegetal, USP/ESALQ,
Caixa Postal 9, CEP 13418-900, Piracicaba, SP. jascarpa@carpa.ciagri.usp.br
IIIEngª. Agrª. Doutoranda em Fitotecnia, Departamento de Produção Vegetal, USP/
ESALQ, Caixa Postal 9, CEP 13418-900, Piracicaba, SP. dcbastos@esalq.usp.br
INTRODUÇÃO
Com o desenvolvimento de sistemas de nebulização, tornou-se possível enraizar
estacas que antes eram consideradas muito difíceis ou impossíveis de enraizar,
como as de goiabeira. Para isso utilizam-se estacas de ramos com madeira
parcialmente madura e que possuam folhas. Este tipo de estaca, com madeira
ainda não lignificada, geralmente enraíza com maior rapidez, porém requer
equipamentos apropriados e melhor controle dos fatores que afetam a formação de
raízes adventícias. O controle destes fatores, associados à utilização de
técnicas como, aplicação exógena de auxinas sintéticas e estiolamento de ramos,
podem aumentar a capacidade de enraizamento de estacas caulinares de espécies
como a goiabeira.
O efeito da aplicação exógena de auxinas sintéticas no enraizamento de estacas
de goiabeira foi estudado por diversos autores. Pereira et al. (1991),
estudando o efeito do AIB em estacas de goiabeira Rica e Paluma, observaram a
ação positiva da auxina na precocidade da iniciação radicular e no maior número
de raízes. Kersten & Ibañez (1993) obtiveram resultados superiores com a
utilização de AIB em imersão rápida, em estacas de goiabeira Kumagai, quando
comparadas com a não utilização desta auxina.
A aplicação de auxina na base das estacas promove o enraizamento até uma
determinada concentração, a partir da qual o efeito passa a ser inibitório
(Hartmann et al., 1990). Bacarin et al. (1994) constataram, na cultivar Rica,
que na aplicação de AIB em imersão lenta, a concentração de 100 mg.L-
1 proporcionou maior porcentagem de enraizamento que 200 mg.L-1.
O comportamento de estacas de uma mesma espécie pode não ser o mesmo, pois as
diferenças muitas vezes ocorrem entre cultivares. Tavares et al. (1995)
verificaram que estacas retiradas de goiabeiras que produziam frutos vermelhos
apresentavam enraizamento superior, quando comparadas com as de polpa branca.
No estudo do enraizamento de estacas, técnicas como o estiolamento de ramos
podem ser aplicadas com a finalidade de induzir a formação de raízes. Os ramos
estiolados apresentam diferenças anatômicas que podem favorecer o aparecimento
de primórdios radiculares, assim como uma maior quantidade de células
parenquimáticas e a diminuição das barreiras mecânicas. Além disso, pode
favorecer a ação da auxina, uma vez que torna os tecidos mais sensíveis à ação
deste regulador de crescimento (Hartmann et al., 1990). Figueiredo et al.
(1995) utilizaram o estiolamento em partes dos ramos de estacas de goiabeira
serrana (Feijoa sellowianaBerg.) durante 60 dias, obtendo um incremento
significativo na porcentagem de estacas enraizadas. Observaram também um efeito
fitotóxico na aplicação de AIB, uma vez que a porcentagem de enraizamento
decresceu com o aumento da aplicação da auxina. Os autores atribuíram este fato
à elevação da auxina endógena dos tecidos, provocada pelo estiolamento.
Resultados semelhantes foram encontrados por Voltolini & Fachinello (1997),
em estacas de araçazeiro amarelo (Psidium cattleyanum Sabine) retiradas de
plantas matrizes sob sombreamento de 30, 50 e 70%.
Heller et al. (1994) constataram que o sombreamento moderado das plantas
matrizes, da ordem de 50%, proporcionou 90% de enraizamento de estacas da
ornamental Coleonema aspalathoides, enquanto que estacas oriundas de matrizes
em condições normais de luminosidade apresentaram 30% de enraizamento.
Verificaram também que aumentando o sombreamento, 75 e 87,5%, apresentaram
resultados inferiores devido a menor quantidade de carboidratos nas estacas
proporcionada pela diminuição na atividade fotossintética.
O objetivo do presente trabalho foi verificar o efeito do estiolamento da
planta matriz e sua interação com a utilização de AIB no enraizamento de duas
cultivares de goiabeira.
MATERIAL E MÉTODOS
As estacas foram obtidas de plantas matrizes das goiabeiras Rica e Kumagai, de
5 anos de idade, que estão localizadas na área experimental do Departamento de
Produção Vegetal da ESALQ/USP, em Piracicaba (SP). Durante o período de
enraizamento (verão), as estacas foram mantidas em casa de vegetação sob
nebulização intermitente, no Núcleo de Produção de Mudas da CATI, em Tietê
(SP).
As plantas matrizes foram submetidas pelo período de 14 meses em condições de
30% e 50% de sombreamento e em pleno sol. Após esse período foram coletados
ramos semilenhosos (sub apicais), com "madeira verde", sem brotações
laterais. À partir de segmentos destes ramos, contendo três nós e um par de
folhas inteiras, foram preparadas estacas, de cerca de 20 cm de comprimento e
0,8 cm de diâmetro. Em seguida, foram submetidas ao tratamento com ácido
indolbutírico nas concentrações de 0 e 2000 mg. L-1, aplicadas em imersão
rápida, por um período de 5 segundos. As soluções foram obtidas mediante a
diluição do AIB em álcool 50%. Utilizaram-se bandejas plásticas, medindo 46,0
cm x 9,0 cm x 28,0 cm, preenchidas com o substrato vermiculita de grânulos
médios, no qual foram colocadas as estacas. Cada bandeja conteve 3 repetições,
de diferentes tratamentos, dispostas a acaso, sendo que cada parcela foi
composta por 10 estacas. Adotou-se o delineamento estatístico de blocos ao
acaso, em fatorial 2 x 3, onde os fatores estudados foram concentração de AIB,
em dois níveis (0 e 2000 mg.L-1), e sombreamento, em três níveis (0, 30 e 50%).
Após 60 dias, avaliou-se a porcentagem de estacas enraizadas, o número de
raízes por estaca, a porcentagem de estacas mortas e de estacas com gemas
brotadas. Para efeito da análise estatística, os dados em porcentagem foram
transformados em arco seno (x/100)1/2 e os demais em (x+0,5)1/2.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Verifica-se (Tabela_1) que as cultivares de goiabeira Rica e Kumagai possuem
diferentes capacidades de enraizamento. Observa-se no tratamento controle (0
mg.L-1 de AIB e 0% de sombreamento) as porcentagens de enraizamento de 60% para
Rica e 14,94% para Kumagai. Pode-se classificar Rica como uma cultivar mais
fácil de enraizar que Kumagai. Este resultado concorda com o encontrado por
Tavares et al. (1995), que verificaram que estacas de goiabeiras que produziam
frutos vermelhos apresentaram enraizamento superior, quando comparados com as
de polpa branca.
Pode-se verificar também que quando se utilizou as estacas retiradas de plantas
submetidas ao sombreamento, estas apresentaram comportamento diferenciado
daquelas cujas plantas matrizes encontravam-se a pleno sol. Para as cultivares
Rica e Kumagai, os melhores resultados foram obtidos com estacas de plantas
sombreadas em 30%, obtendo-se respectivamente 89,71 e 71,09% de enraizamento.
O melhor desempenho dessas estacas pode estar relacionado às maiores
concentrações de auxinas endógenas nos ramos, provocada pelo sombreamento
(Hartmann et. al., 1990; Voltolini & Fachinello, 1997).
O sombreamento de 50%, sem a utilização de AIB, influenciou de forma diferente
as cultivares. Para a cultivar Kumagai, goiabeira que naturalmente apresenta
maior dificuldade de enraizamento de estacas (Gonzales & Schimidt, 1992), o
sombreamento apresentou resultado significativamente superior ao controle, não
apresentando diferença estatística significativa entre 30% e 50% de
sombreamento. No entanto, para a cultivar Rica, 50% de sombreamento
proporcionou um resultado intermediário, não diferindo estatisticamente dos
outros tratamentos.
A aplicação de AIB, na concentração de 2000 mg.L-1, aumentou a porcentagem de
enraizamento das duas cultivares, quando se utilizou estacas retiradas de
plantas desenvolvidas em pleno sol (Tabela_1). Johnson & Hamilton (1997)
atribuíram o efeito do AIB aos baixos níveis de auxinas endógenas
proporcionados pela fotoinativação e pela ação da AIA oxidase, enzima que
degrada o AIA. Entretanto, quando utilizou-se AIB (2000 mg.L-1) em estacas
retiradas de plantas sombreadas, as cultivares testadas tiveram comportamento
diferentes. Para a cultivar Kumagai, a aplicação de AIB não aumentou a
percentagem de enraizamento em estacas de ramos crescidos em 30 e 50% de
sombreamento. Para esta cultivar, o AIB teve um efeito supressivo nas estacas
estioladas em 50% de sombreamento, ficando significativamente inferior à
percentagem de estacas enraizadas com 30% de sombreamento. De acordo com
Hartmann et al. (1990), o estímulo ao enraizamento ocorre até uma determinada
concentração de auxina, à partir da qual o efeito passa a ser inibitório.
A baixa porcentagem de enraizamento obtido de estacas estioladas em plantas com
50% de sombreamento, teoricamente pode estar relacionada à maior
disponibilidade de auxinas endógenas. Logo, a maior disponibilidade de auxinas
nos tecidos destas estacas, associada à aplicação de 2000 mg.L-1 de AIB, podem
ter proporcionado a diminuição do enraizamento. Resultados semelhantes foram
observados em goiabeira serrana (Figueiredo et al., 1995) e araçazeiro amarelo
(Voltolini & Fachinello, 1997).
Esta teoria porém, não explica os resultados obtidos para a cultivar Rica
(Tabela_1), que com a aplicação de AIB, aumentou o enraizamento de estacas
estioladas com 50% de sombreamento. Isto sugere que outros fatores devem estar
relacionados, além das concentrações de auxinas, na performance de enraizamento
de estacas estioladas.
Portanto, para a cultivar Kumagai, de difícil enraizamento, o sombreamento de
30% nas plantas matrizes mostrou ser o melhor tratamento para aumentar a
porcentagem de estacas enraizadas, enquanto que para a cultivar Rica, de fácil
enraizamento, estacas estioladas com 30% de sombreamento ou aplicação de AIB na
concentração de 2000 mg.L-1 apresentaram os melhores resultados. Estes
resultados são concordantes com Figueiredo et al. (1995) que consideraram
desnecessário a utilização de AIB no enraizamento de estacas estioladas de
goiabeira serrana.
A Tabela_2 apresenta as médias de raízes formadas nas estacas para as duas
cultivares. Verifica-se que para a cultivar Rica, tanto o sombreamento das
plantas matrizes, como a utilização de AIB, favoreceram a formação de um maior
número de raízes. As maiores médias de raízes formadas foram obtidas com
sombreamento de 30 e 50% mais a utilização de AIB. A capacidade do AIB de
estimular a formação de raízes em goiabeira já foi verificada por diversos
autores (Pereira et al., 1991; Kersten & Ibañez, 1993; Bacarin et al.,
1994).
Com relação ao número de raízes formadas em estacas que sofreram estiolamento,
a resposta parece estar relacionada com a espécie ou cultivar. Maynard &
Bassuk (1996) verificaram que em estacas de Carpirus betulus, o número de
raízes formadas aumentou até a utilização de 75% de sombreamento. Os autores
constataram um maior número de fendas no anel de esclerênquima das estacas
estioladas, as quais foram relacionadas ao maior número de raízes formadas. De
outra forma, Voltolini & Fachinello (1997) verificaram que estacas
estioladas de araçazeiro amarelo não apresentaram diferenças significativas com
relação ao número de raízes formadas, quando submetidas ao sombreamento de 0,
30, 50 e 70%. Isto também foi observado na cultivar Kumagai, onde pode-se
constatar que o estiolamento não provocou aumento na média de raízes formadas
(Tabela_2). Nesta cultivar, somente a utilização de AIB teve influência na
quantidade de raízes formadas por estaca.
Nas Figuras_1 e 2 verifica-se que houve diferenças no local de formação de
raízes adventícias entre estacas estioladas e não estioladas, nas duas
cultivares testadas. Nas estacas estioladas, as raízes formaram-se quase que
exclusivamente na região nodal, enquanto que nas estacas retiradas de plantas
crescidas em pleno sol, a formação de raízes ocorreu tanto na região nodal como
na internodal. A não formação de raízes na região internodal de estacas
estioladas, pode estar relacionada à baixa concentração de carboidratos neste
local. Heller et al. (1994) constataram que o sombreamento proporciona
diminuição na atividade fotossintética e consequentemente prejudica a síntese
de carboidratos, influenciando de forma negativa o enraizamento de estacas. A
concentração de raízes formadas na região nodal de estacas estioladas, pode
influenciar na qualidade da muda e consequentemente no desenvolvimento desta no
campo, principalmente com relação à fixação no solo. Portanto, sugere-se que
sejam feitos estudos posteriores para avaliar o desenvolvimento no campo destes
tipos de mudas e seu comportamento com relação à fixação.
A porcentagem de estacas mortas, assim como a de estacas brotadas, não foi
significativa em nenhum dos tratamentos, para nenhuma das cultivares estudadas.
CONCLUSÕES
1) As cultivares testadas possuem diferentes capacidades de enraizamento.
2) Para a cultivar Kumagai, os melhores resultados de enraizamento foram
observados com a utilização de 30% de sombreamento. Para a cultivar Rica, os
melhores resultados de enraizamento foram observados com a utilização de 30% de
sombreamento na planta matriz ou com a aplicação de 2000 mg.L-1 de AIB na
estaca.
3) A utilização de AIB aumentou o número de raízes formadas em estacas de
goiabeira.