Procedimentos para o armazenamento de sementes de Poncirus trifoliata (L.) Raf.
FITOTECNIA
Procedimentos para o armazenamento de sementes de Poncirus trifoliata (L.)
Raf.1
Methodology for seed storage of Poncirus trifoliata (L.) Raf.
Roberto Pedroso de OliveiraI; Walkyria Bueno ScivittaroII; Elizete Beatriz
RadmannIII
IEng. Agr., D.S., Pesquisador da Embrapa Clima Temperado, Cx.P. 406, 96001-970,
Pelotas, RS. Bolsista do CNPq. Tel. (53) 275 8100. E-mail:
rpedroso@cpact.embrapa.br
IIEng. Agr., D.S., Pesquisador da Embrapa Clima Temperado. Tel. (53) 275 8100.
E-mail: wbscivit@cpact.embrapa.br
IIIBolsista DTI do CNPq. Tel. (53) 275 8100. E-mail: eradmann@hotmail.com
INTRODUÇÃO
Frutas cítricas para o consumo in natura têm sido demandadas em diversos
países, inclusive no Brasil (Agrianual, 2003). O Estado do Rio Grande do Sul
dispõe de extensas áreas com condições de solo e de clima propícias à
citricultura e potencialmente adequadas para a produção de frutos com a
coloração acentuada exigida pelo mercado (Oliveira et al., 2001). Em
decorrência disso, vários programas governamentais têm sido implementados no
Estado para fomentar o desenvolvimento dessa alternativa agrícola.
Atualmente, a legislação do Rio Grande do Sul exige que as mudas certificadas
de citros sejam produzidas em ambientes protegidos contra vetores de doenças
(Secretaria da Agricultura e do Abastecimento, 1998), denominados de viveiros-
telado. Para maximizar a utilização da infra-estrutura dos viveiros é
necessário dispor-se de metodologia que possibilite a conservação das sementes
dos porta-enxertos, permitindo a realização de semeaduras durante todo o ano e
reduzindo as perdas de sementes, as quais apresentam um custo elevado.
O 'Trifoliata' [Poncirus trifoliata (L.) Raf.] é o principal porta-enxerto
utilizado no Rio Grande do Sul, principalmente por sua maior tolerância ao frio
e por conferir alta qualidade à fruta (Oliveira et al., 2001). Além disso, é
resistente à gomose de Phytophthora e ao vírus da tristeza, muito embora seja
suscetível ao viróide do exocorte e à clorose de ferro em solos calcários e com
pH igual ou superior a neutralidade (Castle, 1987).
As sementes de 'Trifoliata' e de seus híbridos são mais sensíveis ao
armazenamento do que a dos demais porta-enxertos utilizados na produção de
mudas de citros (Mumford & Panggabean, 1982; Saipari et al., 1998), podendo
ser consideradas recalcitrantes. Normalmente, quando armazenadas sob condições
naturais, apresentam uma perda significativa do poder germinativo em poucos
dias (Button et al., 1971).
Diversos métodos têm sido propostos para o armazenamento de sementes de
'Trifoliata', destacando-se o tratamento físico com água quente, a secagem, o
tratamento químico com fungicidas e a redução da temperatura do ambiente de
estocagem (Koller et al., 1993). Esses fundamentam-se na redução da atividade
metabólica da semente e da velocidade de multiplicação dos microrganismos
contaminantes (Barbedo & Bilia, 1998). A despeito de já se dispor de
informações sobre o assunto, muitas dúvidas persistem sobre os procedimentos
mais adequados para a conservação das sementes por um período prolongado.
Este trabalho teve por objetivo estabelecer uma metodologia eficiente, prática
e econômica para a conservação de sementes do porta-enxerto 'Trifoliata'.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi realizado, sob condições de laboratório, no período de abril
a dezembro de 2002, em Pelotas, RS. As sementes de Poncirus trifoliata (L.)
Raf. seleção Davis A foram removidas de frutos completamente maduros, colhidos
no final do mês de março do mesmo ano. A remoção da muscilagem foi realizada
manualmente, por meio da lavagem das sementes com água corrente. Após, essas
foram secas à sombra, sobre papel-toalha, por 72 horas.
Na seqüência, aplicaram-se às sementes dois pré-tratamentos: a) químico, que
consistiu na aplicação de Benomyl, na concentração de 1,5 g i.a kg-1 de
sementes; b) térmico-químico, compreendendo a imersão das sementes em água a
52oC, por 10 minutos, sob agitação constante, seguida da aplicação de Benomyl,
em concentração igual a do tratamento anterior. As sementes oriundas de ambos
os pré-tratamentos foram selecionadas, eliminando-se as aparentemente mal
formadas e as danificadas, distribuídas em grupos de 10 e acondicionadas em
sacos de papel manteiga (10 cm x 10 cm).
Após, procedeu-se ao armazenamento das sementes, que variou quanto às condições
de temperatura e de umidade relativa do ar, segundo os tratamentos: a) ambiente
- estocagem em sala escura sob condições de temperatura e de umidade relativa
do ar não controladas; b) geladeira - temperatura de 8oC e umidade relativa do
ar de 60%; c) dessecador - temperatura não controlada e umidade relativa do ar
de 16%; d) dessecador em geladeira - temperatura de 8oC e umidade relativa do
ar de 16%; e) câmara fria - temperatura de 4oC e umidade relativa do ar de 70%.
No tempo zero e a cada 30 dias, durante oito meses, foram realizados testes de
germinação das sementes. Para tanto, inicialmente, removeu-se de forma manual o
tegumento das sementes, sendo, cada grupo de 10 sementes, disposto em saco
plástico transparente com dimensões de 10 cm x 12 cm, contendo papel de filtro
esterilizado em autoclave. Este foi umedecido com água destilada previamente
esterilizada. Em seguida, as sementes, nos respectivos sacos plásticos, foram
colocadas em câmara de germinação a 25oC, na ausência de luz. O porcentual de
germinação foi avaliado, semanalmente, durante 40 dias, considerando-se
germinada as plântulas com desenvolvimento da parte aérea e sistema radicular.
Os tratamentos foram dispostos em delineamento inteiramente ao acaso em
parcelas subdivididas com três repetições, considerando-se como parcelas as
combinações dos fatores pré-tratamento e condições de armazenamento das
sementes e como subparcelas, o tempo de armazenamento destas. As unidades
experimentais foram constituídas por grupos de 10 sementes, dispostas em sacos
de papel manteiga. Para a análise de variância, os dados foram transformados
para arco seno de (X/100)1/2.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Independentemente do tempo e das condições de armazenamento das sementes de
'Trifoliata', a germinação ocorreu, em sua maioria, do quinto ao trigésimo dia
após o início do teste de germinação.
Sob condições de temperatura e umidade do ar não controladas, as sementes de
'Trifoliata' apresentaram perda da viabilidade após 30 dias de armazenamento.
Button et al. (1971) também haviam verificado este fato após 28 dias e, por
isso, as sementes desse cultivar podem ser classificadas como recalcitrantes.
No presente trabalho, não houve efeito significativo do pré-tratamento das
sementes na porcentagem de germinação, ao longo do tempo de armazenamento
(Tabela_1), sendo, portanto, desnecessário o emprego da imersão das sementes em
água a 52oC por 10 minutos. O uso exclusivo do tratamento químico foi
suficiente para controlar o desenvolvimento de microrganismos. Também não se
verificou dormência das sementes de 'Trifoliata', para a qual o tratamento
térmico teria importância (Koller et al., 1993).
Os resultados da análise de variância indicaram efeito significativo para os
fatores tempo e condições de armazenamento. Conforme esperado, quanto maior o
tempo de armazenamento, menor a viabilidade das sementes. O armazenamento em
câmara fria foi o método mais eficiente na conservação das sementes de
'Trifoliata' (Tabela_2). Independentemente do tempo de armazenamento, obteve-se
uma porcentagem média de 47,9% de germinação, por volta de nove vezes maior do
que quando armazenada em geladeira. Além disso, foi o tratamento que
possibilitou o maior tempo de armazenamento, sendo este de sete meses (Koller
et al., 1993).
Em função dos resultados obtidos, observa-se que a redução da temperatura do
ambiente de conservação é um dos fatores determinantes na conservação das
sementes. Isto ocorre por proporcionar diminuição da atividade metabólica que
se processa na semente e da velocidade de multiplicação de microrganismos.
Platt & Opitz (1973), Eshuys (1974) e Mumford & Panggabean (1982) já
haviam recomendado o uso de temperaturas de 2oC a 7oC para conservação de
sementes de 'Trifoliata'. Koller et al. (1993) conseguiram conservar sementes
de 'Trifoliata', com germinação entre 75% e 80%, por um período de até um ano,
sob temperaturas de 2oC a 5oC.
Outro fator fundamental para a conservação de sementes de 'Trifoliata' consiste
no nível de umidade do ar existente no ambiente de armazenamento (Koller et al.
1993). Por isso, são observadas diferenças significativas em experimentos de
vários autores, utilizando mesma temperatura. Segundo Saipari et al. (1998), as
sementes de 'Trifoliata' apresentam, em média, 52% de umidade no momento da
colheita e 25% após a secagem ao ar. Estas são tão recalcitrantes, que Mumford
& Panggabean (1982) observaram perda de 5% do poder germinativo
simplesmente em decorrência do processo de secagem ao ar.
No presente trabalho, as sementes sempre foram mantidas em saquinhos que
permitiram trocas de umidade da semente com o ambiente em que foram
armazenadas. Portanto, o armazenamento em geladeira e câmara fria foi realizado
em alta umidade, respectivamente a 60% e 70%, enquanto que em dessecador, em
baixa umidade (16%). A perda completa do poder germinativo das sementes
armazenadas em dessecador em apenas 30 dias (Tabela_2) pode ser atribuída à
sensibilidade das sementes de 'Trifoliata' à diminuição da umidade. Saipari et
al. (1998) também observaram perda do poder germinativo de sementes desse
cultivar ao serem secas em ambiente com sílica a 9% de umidade relativa do ar.
Segundo Nakagawa & Honjo (1979), as sementes de 'Trifoliata' somente
germinam quando mantidas a uma umidade superior a 20%, sendo ideal secar as
sementes até 28% (Koller et al., 1993). Outros porta-enxertos de citros, com
sementes menos recalcitrantes, como os limoeiros verdadeiros, o 'Cravo', o
'Galego' e o 'Rugoso Nacional' apresentam tolerância para menor umidade das
sementes para o armazenamento (6% a 8%) (Mumford & Panggabean, 1982). Desta
forma, existe um nível crítico de umidade para cada espécie, que precisa ser
melhor estudado, no qual o conteúdo de água é suficiente para proporcionar as
reações metabólicas essenciais à manutenção da viabilidade das sementes e para
evitar o desenvolvimento de microrganismos.
Em geral, durante o armazenamento, as sementes apresentaram um progressivo
ressecamento do tegumento, que passou a apresentar trincas, havendo
desprendimento do embrião ao se remover o tegumento, principalmente naquelas
armazenadas em dessecador. Esses sintomas são evidências da perda de umidade
pelas sementes. Esse comportamento aconteceu somente nos últimos meses das
sementes armazenadas em câmara fria. As sementes com essas características
apodreceram durante o teste de germinação.
Os resultados obtidos permitiram ampliar o tempo de armazenamento de sementes
de 'Trifoliata', porém, existe a necessidade de maiores estudos nessa linha de
pesquisa, principalmente no que se refere ao estabelecimento de níveis de
tolerância das sementes à perda de umidade e à baixa temperatura.
CONCLUSÕES
1) Não há efeito do pré-tratamento térmico na conservação das sementes.
2) As sementes devem ser armazenadas em câmara fria.