Reprodução do pessegueiro: efeito genético, ambiental e de manejo das plantas
REVISÃO
Reprodução do pessegueiro: efeito genético, ambiental e de manejo das plantas1
Peach reproduction: genetic, environment, and cultural practices effect
Gilmar Antônio NavaI; Gilmar Arduino Bettio MarodinII; Rinaldo Pires dos
SantosIII
IEng. Agr. Dr., Professor da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus
de Dois Vizinhos - e-mail: gilmarnava@utfpr.edu.br
IIEng. Agr. Dr., Professor do Dep. Horticultura e Silvicultura, Faculdade de
Agronomia, UFRGS, Porto Alegre-RS
IIIBiólogo, Dr. Professor do Departamento de Botânica, Instituto de
Biociências, UFRGS, Porto Alegre-RS
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RESUMO
Há uma grande carência de pesquisas e literatura no Brasil sobre a reprodução
do pessegueiro. A presente revisão de literatura aborda e confronta inúmeros
resultados de pesquisas acerca dos principais fatores envolvidos na reprodução
dessa frutífera, com o intuito de subsidiar futuras pesquisas que visam ao
melhor entendimento e/ou à solução de problemas associados à sua reprodução.
Através da presente revisão, foi possível verificar que o processo de fixação
de frutos se mostra complexo para algumas cultivares, sendo dependente da
passagem, com êxito, por cada estádio fenológico. Com isso, a habilidade dos
técnicos e produtores em integrar os fatores porta-enxerto, cultivar, ambiente
e manejo das plantas é crucial para o sucesso no cultivo dessa espécie
frutífera.
Termos para indexação:reprodução, pessegueiro, genética, ambiente, manejo.
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ABSTRACT
In Brazil there is a great lack of studies and literature about the peach
reproduction. The present review discusses a lot of research results regarding
the main factors involved in the reproduction of this species, and it has the
intention to help future researches that aims to understand or to resolve the
problems associated with the reproduction of the peach tree. By this review it
was possible to verify that the process of fruit set is complex for some
cultivars and highly dependent on each phenological stage. The ability of the
professionals and producers to integrate the factors rootstocks, variety,
environment and adequate cultural practices is very important for a successful
peach tree production.
Index terms: reproduction, peach, genetic, environment, cultural practices.
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INTRODUÇÃO
O coeficiente de herdabilidade para produtividade em pessegueiros é da ordem de
0,08 (Hansche, 1986), ou seja, de 8%. Este fator demonstra que o sucesso na
frutificação e produção dessa espécie é dependente, sobretudo, das condições de
manejo e de ambiente circundante do pomar.Assim sendo, a frutificação e a
produção da maioria das plantas frutíferas temperadas, incluindo o pessegueiro,
estão associadas, num primeiro momento, ao desenvolvimento adequado das gemas
florais. Com isso, os manejos nutricional e fitossanitário das plantas após a
colheita, bem como condições ambientais adequadas para superação da dormência
das plantas são fundamentais. Num segundo momento, condições meteorológicas
favoráveis para a abertura das gemas, polinização e fecundação das flores são
cruciais.
Problemas de "fixação" de frutos não são muito comuns em pessegueiros. De
maneira geral, a frutificação é abundante, havendo necessidade de realização de
raleio intenso, para promover o desenvolvimento satisfatório de um número
adequado de frutos por planta, que é variável principalmente em função da
idade, porte e do estado nutricional das plantas. Entretanto, nos últimos anos,
algumas cultivares de pessegueiros, nectarineiras e ameixeiras vêm apresentando
baixa frutificação e/ou irregularidade de produção, em distintos locais da
região Sul do Brasil. Dentre elas, podem ser citadas as cultivares de
pessegueiro Granada e Riograndense (Nava, 2007).
Na cultivar de pessegueiro Granada, vêm-se observando, na maioria dos anos,
baixas taxas de frutificação efetiva. Este fenômeno já foi constatado na região
produtora de Pelotas-RS e, principalmente, em pomares comerciais na região
metropolitana de Porto Alegre-RS. Nos anos de baixa produção, ocorre um pequeno
percentual de fixação de frutos, mesmo as plantas florescendo abundantemente e
apresentando flores com morfologia externa aparentemente normal (Nava, 2007).
Esse problema foi motivo de recente investigação (Nava, 2007), que vivenciou
dificuldades para encontrar bibliografia específica para dar suporte ao estudo,
fator que motivou o mesmo a publicar essa revisão de literatura. Nesta revisão
de literatura, abordam-se os principais fatores envolvidos na reprodução do
pessegueiro, através do confrontamento e discussão de inúmeros resultados de
pesquisas obtidos no Brasil e no exterior, com o intuito de subsidiar futuras
pesquisas que visem ao melhor entendimento e/ou a solução de problemas
associados à reprodução do pessegueiro, além de outras frutíferas.
DESENVOLVIMENTO DAS GEMAS FLORAIS
As etapas que conduzem à formação das flores do pessegueiro são: indução,
iniciação ou diferenciação floral, desenvolvimento floral e maturação dos
gametas.
A indução floral no pessegueiro inicia-se no verão, depois de uma etapa de
intenso crescimento vegetativo (monet & Bastard, 1970). Caracterizase por
mudanças metabólicas, que induzem a diferenciação das gemas do estádio
vegetativo ao reprodutivo (Jraidi, 1983).
A iniciação ou diferenciação floral é caracterizada por modificações
morfológicas do meristema apical caulinar, o que se transforma
irreversivelmente em um meristema apical floral (monet & Bastard, 1970).
Nas condições climáticas do Brasil, essa etapa ocorre entre dezembro e janeiro
(Barbosa, 1990), dependendo da região. No Sul do Brasil, a diferenciação
morfológica do órgão floral inicia-se, em geral, em meados do verão (janeiro-
fevereiro) (Sachs & Campos, 1998).
Muitos fatores interferem na formação das gemas florais, entre os quais a
relação carbono/ nitrogênio (C/N), o balanço hormonal, o estado nutricional, as
condições ambientais, a idade e o manejo das plantas (Childers, 1983). Para
Ryugo (1988), os principais fatores são: poda, a combinação porta-enxerto/copa,
a adubação nitrogenada e o arqueamento de ramos.
Segundo Brown (1958), longos períodos de estresse hídrico promoveram redução do
número de gemas florais em damasqueiros cv. Royal, atraso no período de
diferenciação e desenvolvimento das gemas florais. Por sua vez,ALBURQUERQUE et
al. (2003) observaram que o desenvolvimento de gemas florais de damasqueiro não
foi afetado por deficiência no suprimento de água, no outono e inverno. Estudo
realizado com o pessegueiro 'Granada' sob estufa mostrou que, em condições de
potenciais matriciais de água no solo, na ordem de -0,09 mPa, a 20cm de
profundidade, o desenvolvimento final das gemas florais e a frutificação não
foram afetados (Nava, 2007).
Temperaturas superiores a 25ºC também são prejudiciais na diferenciação das
gemas florais de pessegueiros. Durante a iniciação floral, os primórdios são
tolerantes a temperaturas moderadas. Duran>te o lento crescimento do primórdio
floral (período de dormência de gemas), os primórdios possuem alta
sensibilidade a temperaturas moderadas. Na etapa de rápido crescimento dos
primórdios florais, sob temperatura moderada, os primórdios possuem alta
sensibilidade às baixas temperaturas (monet & Bastard, 1971).
MORFOLOGIA FLORAL E EMBRIOLOGIA DO PESSEGUEIRO
As flores do pessegueiro são perfeitas, completas, períginas e, geralmente, com
um único pistilo, com um ovário, pubescente, súpero e unicarpelar. o androceu,
formado por 30 estames ou mais, está protegido por um perianto composto por um
cálice com cinco sépalas e uma corola com cinco pétalas arranjadas
alternadamente, na maioria das cultivares. os filetes dos estames são longos e
delgados, suportando anteras tetrasporangiadas de coloração amarelada a
amarelo-avermelhada (Sachs & Campos, 1998).
Na maioria das espécies do gênero Prunus,é comum haver diferenciação e
desenvolvimento de dois óvulos anátropos no interior do ovário. Um deles,
normalmente o secundário, aborta algum tempo depois da polinização, ocorrendo
somente a fecundação da oosfera do óvulo primário (Pimenta & Polito, 1982;
Sachs & Campos, 1998).
O saco embrionário (ou gametófito feminino) do tipo Polygonum, monospórico, é
formado a partir de uma única célula haploide da tétrade de megásporos
originada da meiose da célula-mãe de megásporo. Esse megásporo viável, após
três mitoses acitocinéticas sucessivas, origina uma célula com oito núcleos
(saco embrionário imaturo). Com a polarização e celularização, três dos oito
núcleos organizam-se no polo micropilar, formando as duas sinérgides e uma
oosfera, três núcleos migram para a extremidade oposta (polo calazal),
constituindo as três antípodas. os dois núcleos restantes (núcleos polares)
formam a célula média binucleada, central. o conjunto do saco embrionário, no
interior do nucelo, recoberto por dois tegumentos, acrescido de tecidos da
calaza e funículo, forma o óvulo ou rudimento seminal dessa espécie (Mariath et
al., 2003).
Os micrósporos, que originarão os grãos de pólen (gametófitos masculinos), são
formados no interior das anteras tetrasporangiadas. A deiscência das anteras é
rimosa, com dois estômios longitudinais por antera. Ao alcançarem a superfície
do estigma, os grãos de pólen sofrem hidratação e formam o tubo polínico,
através dos tecidos do estilete, até o óvulo, liberando duas células
espermáticas (gametas masculinos) para o processo de dupla fecundação. Um dos
gametas funde-se com a oosfera, originando o zigoto e o futuro embrião
zigótico. o outro gameta une-se aos núcleos polares, originando o endosperma
triploide (ou embrião xenofítico), o qual acumulará grande quantidade de
substâncias de reserva (Mariath et al., 2003).
FLORESCIMENTO
O florescimento é desencadeado por condições ambientais favoráveis, sobretudo
de temperatura, após as gemas florais passarem por um período de horas de frio
hibernal, e por fatores endógenos das plantas, principalmente associados ao
balanço nutricional e hormonal (Faust, 1989). o efeito da temperatura,
entretanto, é ambíguo. Primeiramente, o requerimento varietal das plantas por
frio, que é determinado geneticamente, deve ser satisfeito para,
posteriormente, a elevação da temperatura ser decisiva no florescimento.
Variações na época de florescimento podem ser resultantes da combinação da
intensidade da dormência das gemas e da velocidade de aquecimento do ar (Szabó
& Nyéki, 2000). Dados obtidos em 2004 com o pessegueiro 'Granada'mostraram
que a plena floração das plantas sob temperaturas diurnas acima de 25ºC (sob
estufa) foi antecipada em 10 dias em relação às plantas sob céu aberto, sob
temperaturas diurnas abaixo de 25ºC (Nava, 2007).
A duração do período de florescimento também é afetada pela temperatura. Em
regiões com inverno ameno e com florescimento precoce das plantas, a taxa de
aquecimento do ar é geralmente baixa. Consequentemente, o período de
florescimento é maior, em relação a cultivares que florescem em regiões com
inverno mais tardio (Szabó & Nyéki, 2000).
Segundo Sherman & lyrene (1998), em regiões de clima temperado
característico, o florescimento de pessegueiros normalmente ocorre entre 7 e 14
dias antes da brotação. Nas condições de clima temperado ameno, que são
encontradas nas principais regiões produtoras de pêssego do Sul e Sudeste do
Brasil, nem sempre isso é verdadeiro. Silveira (2003) verificou que cultivares
de pessegueiro de baixo requerimento de frio (abaixo de 300 horas), entre elas
Rio grandense, Granada, maciel e Esmeralda, na média dos anos, apresentam
brotação antes da floração. Já com o pessegueiro 'Granada' na Depressão Central
do RS, Nava (2007) verificou em plantas sob ambiente natural da região (céu
aberto) que o início de florescimento ocorreu 9 e 2 dias antes do início da
brotação em 2004 e 2005, respectivamente.
FIXAÇÃO DE FRUTOS ("FRUIT SET")
O conhecimento do processo de frutificação de uma espécie, bem como dos demais
fatores interrelacionados, é extremamente importante no discernimento de
algumas práticas culturais, como poda, raleio de frutos, uso de fertilizantes e
de reguladores de crescimento. As estimativas de colheita, bem como do tamanho
final dos frutos, estão intimamente relacionadas com as características de
frutificação da espécie (Westwood, 1978) e com a intensidade de raleio de
frutos.
Em geral, nas frutíferas de caroço, altas taxas de frutificação são esperadas
quando a floração coincide com dias ensolarados, amenos e secos (Szabó &
Nyéki, 2000). Ao avaliar uma coleção de cultivares de pessegueiro, esses
autores observaram que a frutificação variou de 13,5 a 83,2 %, de acordo com a
região e época de florescimento.
Em relação à definição do percentual de fixação de frutos, o período mais
importante de abscisão de flores e frutos ocorre, geralmente, nas primeiras
quatro semanas após a antese de pessegueiros (Harrold, 1935) e de damasqueiros
(Rodrigo & Herrero, 2002b). A abscisão de flores de pessegueiros nas
primeiras duas semanas após a antese deve-se à falta de polinização (Harrold,
1935) ou de fecundação (Sedgley & Griffin, 1989).
No entanto, a macho-esterilidade (Garcia et al., 1988; Lillecrapp et al.,
1999), a falta de receptividade estigmática (Egea et al., 1991; Egea &
Burgos, 1992), bem como o desenvolvimento anormal do saco embrionário
(Guerriero et al., 1985;ALBURQUERQUE et al., 2002) e a degeneração dos óvulos
(Burgos & Egea, 1994; Burgos et al., 1995; Lillecrapp et al., 1999) têm
sido relacionados como causas de frutificação irregular do pessegueiro.
Para Furukawa & Bukovac (1989), estresses nutricionais e ambientais,
particularmente durante o desenvolvimento inicial dos frutos, são fatores
comprovadamente importantes para a falta de sustentação do desenvolvimento do
embrião e, consequentemente, do fruto. Predisposição genética para uma alta
proporção de sacos embrionários, com desenvolvimento anormal ou degeneração
precoce dos mesmos, foi sugerida como sendo a causa da baixa frutificação em
pereiras 'Comice' (Jaumien, 1968, citado por Thompson & liu, 1973) e em
macieiras 'Delicious' (Hartman & Howlett, 1954, citados por Thompson &
liu, 1973).
Por outro lado, segundo Radice et al. (2003), a baixa produção do pessegueiro,
entre outras espécies, está associada a desordens genéticas durante a
microsporogênese. Nesse sentido, dados obtidos com o pessegueiro 'Granada' na
Depressão Central do Rio Grande do Sul comprovaram a ocorrência de desordens
durante a formação dos grãos de pólen, bem como atraso no desenvolvimento
ovular.
GRAU DE FERTILIDADE DAS PLANTAS
O pessegueiro é considerado uma espécie autocompatível (Szabó et al., 2000).
Segundo Szabó & Nyéki (2000), a taxa de fecundação em flores da maioria das
cultivares de pessegueiro situa-se entre 75 a 100 %. No entanto, esterilidades
masculina e feminina têm sido encontradas independentemente em damasqueiros
(Burgos & Egea, 1994) e em outras espécies frutíferas (Sedgley &
Griffin, 1989), sendo, em geral, atribuídas às condições adversas de ambiente
(Lillecrapp et al., 1999).
Para Szabó et al. (2000) e Szabó & Nyéki(2000), sob condições de
autopolinização, os pessegueiros são: autoestéreis, quando a frutificação é
nula; parcialmente autoférteis, com 0 a 10 % de frutificação; autoférteis, com
10 a 20 % de frutificação; altamente autoférteis, com mais de 20 % de
frutificação.
No mesmo estudo, Szabó & Nyéki (2000) observaram que a autofertilidade de
pessegueiros para mercado in naturae para industrialização foi muito similar.
os mesmos autores observaram também que, em algumas cultivares, dependendo do
ano, a taxa de autopolinização foi abaixo de 10 %, considerada inferior ao
padrão para essa espécie.
Com base nessas classificações, os dados obtidos com o pessegueiro 'Granada',
que apresentou frutificação entre 0 e 5,59%, dependendo do ano e da condição
térmica a que as plantas foram submetidas, indicam ser esta uma cultivar
parcialmente autofértil, padrões reprodutivo e produtivo estes governados pelos
fatores genético e ambiental, principalmente associados à temperatura..
INFLUÊNCIA DO AMBIENTE
Para Tromp & Borsboom (1994), a temperatura é um dos elementos mais
importantes na determinação da frutificação efetiva das frutíferas perenes.
Segundo Williams (1965), por retardarem a abscisão das folhas, as altas
temperaturas no outono aumentam o conteúdo de carboidratos nas gemas florais e,
consequentemente, promovem floração e frutificação adequadas. A temperatura,
durante o verão e outono, pode também afetar a longevidade do óvulo e a
frutificação efetiva na primavera (monet & Bastard, 1971).
A temperatura do ar exerce papel fundamental na entrada e na saída das gemas
das frutíferas temperadas da dormência (para endo e ecodormência). Em regiões
de inverno ameno, em que a quantidade de frio não satisfaz o requerimento para
a superação da dormência, as frutíferas de clima temperado, sobretudo as
espécies e cultivares de maior requerimento de frio hibernal, sofrem "síndrome
da dormência prolongada" (Rageau, 2002), levando à ocorrência de brotação e
florescimento "erráticos", caracterizados por baixa taxa de brotação e
florescimento heterogêneo (leite, 2005; monet & Bastard, 1971), conduzindo
a baixa taxa de frutificação das plantas.
Altas temperaturas no período de pré-floração/ floração podem reduzir a taxa de
germinação dos grãos de pólen, suprimir o desenvolvimento do saco embrionário e
induzir a degeneração precoce do saco embrionário de damasqueiros, após a
antese. o período efetivo de polinização (PEP) também pode ser
consideravelmente encurtado devido à falta de sincronismo no desenvolvimento
dos esporângios (microsporângios, nas anteras, e nucelo, no óvulo)
(ALBURQUERQUE et al., 2000; Rodrigo & Herrero, 2002a).
Rodrigo & Herrero (2002a) observaram que o aumento da temperatura na pré-
floração e floração, através da utilização de sacos de polietileno junto às
gemas florais, acelerou e reduziu o período de floração e, consequentemente,
reduziu a frutificação efetiva de damasqueiros. os autores observaram que a
aceleração do desenvolvimento floral externo, pela elevação da temperatura, não
foi acompanhada pelo avanço do desenvolvimento do pistilo. Esta falta de
sincronismo resultou na abertura prematura de flores, gerando pistilos pouco
desenvolvidos e com baixa capacidade de frutificação.
Em estudos com pessegueiros e nectarineiras, em casa de vegetação, Erez et al.
(2000) verificaram que altas temperaturas na pré-floração e floração retardaram
a frutificação e favoreceram o crescimento vegetativo, não permitindo
frutificação quando as plantas foram submetidas a temperaturas entre 21 e G. A.
NAVA et al. 29ºC. Para Kozai et al. (2004), a frutificação efetiva de
pessegueiros também foi significativamente reduzida com o aumento da
temperatura, sendo que acima de 25ºC a mesma raramente ocorreu. Esses dados
corroboram os obtidos com o pessegueiro 'Granada' (Nava, 2007), que observou
que a frutificação efetiva dessa cultivar foi significativamente reduzida pelas
elevadas temperaturas diurnas (acima de 25ºC) durante o período de pré-floração
e floração. As elevadas temperaturas promoveram degeneração dos grãos de pólen
e atraso no desenvolvimento do saco embrionário, inviabilizando a fecundação da
maioria das flores.
Erez et al. (1998) observaram que as altas temperaturas no período de
florescimento (acima de 25ºC durante o dia e/ou acima de 18ºC durante a noite)
reduziram consideravelmente a frutificação de pessegueiros. A frutificação de
pessegueiros também foi sensivelmente reduzida sob temperaturas noturnas
superiores a 14 ou 15ºC (Edwards, 1990), as quais parecem promover
desenvolvimento anormal do saco embrionário em pessegueiros (Kozai et al.,
2004). Tal constatação deve ser objetivo de futuros estudos com as cultivares
plantadas que vêm apresentando problemas de frutificação, a exemplo do
'Granada' e do 'Rio grandense', nas diversas regiões produtoras dessa fruta no
Brasil, uma vez que não há estudos aprofundados nessa linha de pesquisa com
pessegueiros no Brasil (Nava, 2007).
Além da temperatura, segundo BALDINI (1992), chuvas persistentes podem lavar o
estigma e causar a morte dos grãos de pólen, pelo excesso de hidratação. De
acordo com Gradziel & Weinbaum (1999), a elevada umidade do ar e o excesso
de precipitação reduzem a deiscência das anteras e, consequentemente, a
liberação dos grãos de pólen, limitando o processo de polinização e a
consequente fixação de frutos. Segundo os mesmos autores, estes fatores podem
causar falhas na polinização, por acelerar o desenvolvimento de doenças nas
flores.
Segundo Rodrigo & Herrero (2002a), existem modelos matemáticos para
condições de pomares que estabelecem uma clara correlação entre a temperatura
na pré-floração e a produção. Entretanto, os mecanismos que levam a estas
relações ainda não estão totalmente esclarecidos. De acordo com os mesmos
autores, para o gênero Prunus, as informações sobre o efeito das temperaturas
na pré-floração são escassas e contraditórias. Segundo Sedgley & Griffin
(1989), um dos motivos para a divergência de resultados pode ser a condução de
inúmeros experimentos com plantas frutíferas em vasos, condição esta que não
reflete o padrão de resposta de plantas adultas nas condições de pomares.
Porta-enxerto
Há muito tempo se conhece a importância agronômica do porta-enxerto sobre a
produção e a qualidade dos frutos. No entanto, pouco se sabe sobre a influência
dos mesmos frente aos fatores do clima, principalmente sobre a fisiologia
reprodutiva do pessegueiro, sobretudo no Brasil. Esse fator remete-nos à grande
necessidade de ampliar pesquisas básicas nessa área, sobretudo em função das
mudanças climáticas globais que vêm ocorrendo e da necessidade de ampliação das
fronteiras das principais regiões produtoras dessa fruta, para suprir uma
demanda crescente de consumo.
Em estudo com o pessegueiro 'Granada', Nava (2007) verificou a existência de
grande variabilidade de plantas no pomar, ou seja, plantas com diferentes
vigores e hábitos de crescimento, bem como de produção. logo, este fator
demonstra que
O porta-enxerto exerce efeito marcante sobre o grau de adaptação climática da
cultivar copa, bem como sobre as diferentes respostas fisiológicas frente às
condições ambientais adversas (de baixo acúmulo e de irregularidade nas
temperaturas hibernais, de déficit hídrico no verão e outono, e de respostas às
elevadas temperaturas durante a pré-floração e floração, entre outras).
Assim, o grau de sensibilidade a esses fatores, imposto pelo porta-enxerto,
deve afetar o desenvolvimento floral e a formação dos gametas sexuais, variando
o padrão produtivo das cultivares entre os anos de cultivo. Estudos feitos por
Pejkic (1969), citado por Thompson & liu (1973), comprovaram que a
ameixeira 'Pozegaca', de pé-franco, apresentou 155% a mais de sacos
embrionários normais, comparado com aquelas enxertadas sob o porta-enxerto
mirabolano.
Estado nutricional e acúmulo de reservas nas plantas
Um adequado estado nutricional das flores aumenta a frutificação efetiva da
maioria das espécies frutíferas (Williams, 1965), sendo que a competição
nutricional também está frequentemente associada aos baixos níveis de
frutificação em diversas espécies frutíferas. A competição por nutrientes
durante a diferenciação das gemas florais gera flores mal-formadas, afetando
negativamente a frutificação (Crossa-Raynaud et al., 1985).
O nitrogênio é o elemento mineral de maior importância na nutrição do
pessegueiro. Do total requerido pela espécie, em torno de 25 % é absorvido
pelas plantas da colheita até o repouso vegetativo (Soing & mandrin, 1993,
citados por Rombolá et al., 2000). Neste período, o elemento é utilizado para a
formação de reservas, sobretudo nas raízes. A aplicação de nitrogênio, antes da
formação de frutos, é desaconselhável por promover resultados pouco eficientes
na fixação de frutos (Rombolá et al., 2000).
Em macieiras, a aplicação de nitrogênio no verão refletiu em aumento da
longevidade do óvulo nas flores no ciclo posterior (Tromp & Borsboom,
1994), bem como no período efetivo de polinização (PEP) (Williams,
1965).Ainsuficiente disponibilidade de nitrogênio, ou a competição nutricional,
pode também provocar abortamento de ovários (BALDINI, 1992). Williams (1965)
observou que aplicações de nitrogênio no verão produziram flores com o dobro de
chance de serem fertilizadas, em relação à testemunha. Este padrão também foi
verificado por George & Nissen (1992), em que a aplicação de nitrogênio, no
final do verão, aumentou em 48% a frutificação de pessegueiros 'Flordaprince'.
O boro é um nutriente que raramente se encontra em níveis baixos ou em
deficiência em pomares. Sintomas de deficiência são mais frequentes em
macieiras, ameixeiras e em pereiras. Também foram observados, com menor
frequência, em cerejeiras e pessegueiros (Bennett, 1996). Entretanto, o boro
aumenta a germinação dos grãos de pólen in vitro. Recentemente, verificou-se
que a aplicação deste elemento aumentou também a germinação, in vivo,do pólen,
bem como o crescimento do tubo polínico (Nyomora et al., 2000). Por outro lado,
segundo Bennett (1996), a formação de gemas florais e a "fixação" de frutos são
reduzidas quando se verifica toxidez por este elemento.
Os níveis críticos, em que é possível verificar sintomas de deficiência e
toxicidade de boro em folhas de pessegueiros, se situam entre 18 e 100 ppm,
respectivamente, sendo que o nível foliar ideal deste elemento se situa entre
20 e 80 ppm, dependendo da cultivar (Bennett, 1996). Também para Basso &
Suzuki (2001), níveis foliares de boro acima de 93 ppm são considerados
excessivos para pessegueiros, nectarineiras e ameixeiras.
De acordo com Hanson & Breen (1985), a aplicação foliar de boro em
ameixeiras europeias (Prunus domestical.), que apresentavam níveis foliares
adequados deste elemento (35ppm), aumentou a frutificação efetiva das plantas.
Por outro lado, a aplicação de 2 kg.ha-1de boro via solo ou 0,4 % de ácido
bórico, na floração, não teve efeito na frutificação efetiva de ameixeiras
(Wojcik et al., 1998). Chaplin et al. (1977) sugerem que o requerimento de boro
para a obtenção de uma boa frutificação nessa espécie nem sempre está
correlacionado ao nível deste elemento, para a nutrição geral da planta.
Resultados obtidos com o pessegueiro 'Granada', na Depressão Central do RS (não
publicados), comprovaram que a aplicação de 220 mg.l-1de boro, na forma de
bórax, durante a floração, aumentou a produção das plantas e que a aplicação
simultânea de 0,25% CH + 0,8% om, no início de inchamento das gemas, e de 340
mg.l-1de boro, na forma de ácido bórico, na plena floração, promoveu a maior
produção de frutos.
O desenvolvimento das flores no gênero Prunus,do início de abertura das gemas
até o início da frutificação, não depende da fotossíntese foliar. Segundo
loescher et al. (1990), os carboidratos previamente armazenados no ciclo
anterior são a principal fonte de reserva nutricional para manter as fases
iniciais do desenvolvimento reprodutivo nas espécies do gênero. As reservas de
amido desempenham um importante papel no processo produtivo (Herrero &
Hormanza, 1996), pois influenciam no desenvolvimento das estruturas ovulares e
no desenvolvimento do embrião (Arbeloa & Herrero, 1991).
O desfolhamento precoce, seja por motivos ambientais e nutricionais, seja
fitossanitários, geralmente reduz o nível de carboidratos das plantas, afetando
a frutificação das mesmas. Couvillon & lloyd (1978) e lloyd & Firth
(1990) observaram um prolongamento da duração do período de florescimento de
pessegueiros quando o desfolhamento ocorreu no final do verão ou no início do
outono. Gao et al. (2002) verificaram redução no conteúdo de carboidratos nas
gemas florais, redução da viabilidade do pólen, bem como prolongamento do
período de florescimento e redução da taxa de frutificação efetiva em
pessegueiros que sofreram desfolhamento precoce no verão.
O desfolhamento precoce é um problema comum nas principais regiões produtoras
de pêssego no Sul e Sudeste do Brasil. Normalmente, está associado ao ataque de
ferrugem, de ácaros, ao déficit hídrico ou, ainda, pela interação de ambos os
fatores. Pesquisas básicas que expliquem em que eventos fisiológicos e
bioquímicos o desfolhamento precoce atua, são carentes no Brasil com essa
frutífera. Segundo Wolukau et al. (2004), o adequado estado nutricional das
gemas florais pode superar o efeito das altas temperaturas na floração pelo
prolongamento do tempo de receptividade do pistilo. Além disso, proporciona a
formação de gemas e estruturas florais mais desenvolvidas, aumentando a chance
de fecundação das flores.
Polinização e fecundação
Os processos de polinização e fecundação são os mais importantes elos da cadeia
reprodutiva de uma planta. Assim, o conhecimento dos fatores que possam afetá-
los constitui aspectos que devem ser conhecidos para o entendimento das causas
da baixa frutificação efetiva e, em alguns casos, para o planejamento de novas
práticas de manejo do pomar que a incremente (medeiros, 1979).
Na maioria das angiospermas, no momento da dispersão, os grãos de pólen maduros
são estruturas desidratadas. Durante a polinização compatível, os grãos de
pólen sofrem adesão na superfície estigmática e são reconhecidos pelos tecidos
do pistilo, reidratando-se posteriormente pela aquisição de água do exsudato
estilar ou das células papilares do estigma. No interior do ovário, o tubo
polínico descarrega os dois gametas masculinos no saco embrionário, onde ocorre
a dupla fecundação (Gaude & mcCormick, 1999).
Nas frutíferas de caroço, a frutificação efetiva depende do sucesso da
fecundação da oosfera no interior do óvulo (Westwood, 1978; Thompson & liu,
1973) e do desenvolvimento da semente (marshall, 1919, citado por Thompson
& liu, 1973). Segundo Gaude & mcCormick (1999), uma complexa interação
célula-célula é necessária para a conclusão destes eventos. logo, para que a
fecundação ocorra, as flores devem ter sacos embrionários desenvolvidos, em
plena coordenação com o tempo de receptividade do estigma, com a taxa de
crescimento do tubo polínico e com a longevidade do óvulo (Thompson & liu,
1973). De acordo com os mesmos autores, tanto fatores genéticos como ambientais
podem perturbar esses processos e reduzir a frutificação.
A polinização do pessegueiro ocorre com maior eficiência na presença de vento e
insetos. No entanto, devido à predominância da autopolinização entre flores de
uma mesma planta, não há necessidade estrita de polinização cruzada ou alogamia
(Barbosa, 1990). De acordo com Nyéki et al. (1998), estimase que a alogamia em
pessegueiro é de 5 a 33%, sendo altamente variável de ano para ano e entre
cultivares.
Avaliando uma coleção de pessegueiros, Szabó & Nyéki (2000) observaram, em
geral, maior taxa de frutificação em flores com polinização aberta, com
simultaneidade de autopolinização (autogamia) e polinização cruzada (alogamia),
do que em flores isoladas (somente com autopolinização). No entanto, em flores
isoladas e polinizadas manualmente com pólen da mesma cultivar, a produção de
frutos foi, em geral, maior do que em flores mantidas em polinização aberta. Em
algumas cultivares de pessegueiros, mantidas em coleções de frutíferas de
caroço, a alogamia é responsável por taxas de frutificação de até 70 a 90%
(Szabó & Nyéki, 2000).
De acordo com Nyéki et al. (1998), para cultivares de pessegueiros autoférteis
instáveis em produção, faz-se necessário o plantio de outras, intercaladas,
para melhorar a frutificação das mesmas. Diversos estudos também vêm
demonstrando o efeito benéfico da polinização complementar realizada por
abelhas no aumento da frutificação efetiva de pessegueiros e nectarineiras
(Nyéki et al., 1998; Nyéki et al., 2000).
O período efetivo de polinização (PEP) tem sido um bom parâmetro para
identificar fatores que limitam a frutificação de inúmeras espécies. Ele é
definido como a longevidade do óvulo menos o tempo necessário para o tubo
polínico alcançar o óvulo. Três são os principais fatores determinantes do PEP:
receptividade estigmática, desenvolvimento do tubo polínico e longevidade do
óvulo (Sanzol & Herrero, 2001).
Uma causa comum da baixa frutificação é o total insucesso da polinização,
quando os óvulos estão supermaduros ou senescentes na antese (Stösser &
Anvari, 1983). A longevidade do óvulo (Sanzol & Herrero, 2001) e a
viabilidade do saco embrionário (Williams, 1970) desempenham um papel decisivo
no PEP, bem como na determinação da fertilidade e frutificação das frutíferas.
Segundo Sanzol & Herrero (2001), a temperatura, a qualidade da flor e os
tratamentos químicos podem afetar o período efetivo de polinização (PEP) em
plantas frutíferas. Thompson & liu (1973) citam trabalhos com macieiras que
mostram que condições inadequadas de manejo cultural, refletidas pelo reduzido
vigor das plantas e flores, em função dos baixos níveis de nitrogênio no solo,
causaram supressão do desenvolvimento normal do saco embrionário e redução da
longevidade do óvulo, bem como redução do período de receptividade do estigma e
do crescimento do tubo polínico.
De acordo com Williams (1970), as temperaturas elevadas (acima de 25ºC) durante
a antese aceleram o crescimento do tubo polínico, afetando o período efetivo de
polinização (PEP). Por outro lado, segundo o mesmo autor, temperaturas
pósantese nesses níveis diminuem o período receptivo do estigma, podendo
limitar a polinização. Em geral, baixas temperaturas durante o florescimento
reduzem o crescimento do tubo polínico, mas estendem o PEP, por aumentar o
tempo de vida do óvulo (Tromp &Borsboom, 1994).
Receptividade do estigma
A receptividade estigmática avalia a habilidade do estigma em permitir a
germinação do gametófito masculino ou grão de pólen (Sanzol & Herrero,
2001). Em flores de pessegueiro, o início da receptividade estigmática é
mediado pela degeneração das papilas do estigma, concomitantemente com a
produção de secreção (Herrero & Arbeloa, 1989). Esta secreção parece estar
relacionada com os processos de reconhecimento e hidratação dos grãos de pólen
(Herrero, 1992). o término da receptividade do estigma tem sido associado com a
degeneração do estigma em damasqueiros (Egea & Burgos, 1992).
O atraso da maturação do estigma pode limitar o PEP (Herrero, 1983). Porém,
mais frequentemente, é a degeneração precoce do estigma que limita o PEP
(Sanzol & Herrero, 2001). De acordo com Williams (1970), as temperaturas
acima de 25ºC, após a antese, diminuem o período receptivo do estigma, podendo
limitar a polinização.
A aplicação de fungicidas também pode causar falhas no processo de polinização
e reduzir a fecundação das flores, por provocar danos na superfí pelos
fungicidas foram o colapso das papilas do estigma e o aumento da produção de
exsudatos, que levaram à perda da superfície disponível para adesão, hidratação
e germinação dos grãos de pólen e, consequentemente, a uma baixa frutificação
(Weiguang et al., 2003). Nessa mesma espécie, os fungicidas Captan e
Azoxystrobin provocaram grande efeito inibitório sobre a germinação dos grãos
de pólen no estigma. Por outro lado, a germinação do pólen não foi
significativamente afetada pela aplicação dos fungicidas Propiconazole e
Benomyl. Efeitos inibitórios intermediários foram observados com aplicações dos
fungicidas Ziram, Cyprodinil, maneb, Thiophanato-metílico, Iprodione e
myclobutanil (Weiguang et al., 2003).
Desenvolvimento do tubo polínico
O desenvolvimento do tubo polínico é altamente variável entre as espécies
(martinez-Tellez & Crossa-Raynaud, 1982), entre cultivares (Egea et al.,
1991), origem do pólen (Guerrero-Prieto et al., 1985), estado nutricional da
flor (Nyomora et al., 2000) e condições ambientais (Jeffries et al., 1982).
De acordo com Herrero & Arbeloa (1989), como a maturação do pistilo ocorre
basipetalmente, o atraso no crescimento do tubo polínico, observado em
pessegueiro, parece ter como causa a imaturidade do ovário na antese. Óvulos
inviáveis manifestam um padrão anormal no tubo polínico, influenciando
negativamente na eficácia da fase progâmica da fecundação, em função da
aceleração do envelhecimento dos óvulos, que perdem a sua viabilidade,
sobretudo se ocorrerem altas temperaturas durante o florescimento (Cerovic
& Ruzic, 1992).Assim, plantas que possuem óvulos subdesenvolvidos falham na
atração do tubo polínico (Sansol & Herrero, 2001).
Esporogênese e gametogênese
Segundo Reiser & Fischer (1993), perturbações durante a meiose resultam em
mutações que causam esterilidade dos gametófitos masculinos e femininos de
diversas espécies frutíferas. Em função disso, o entendimento do
desenvolvimento de irregularidades durante os processos de formação dos gametas
é fundamental para o sucesso do melhoramento genético no futuro, evitando que
sejam recomendadas cultivares pouco ou totalmente improdutivas, bem como para
orientar pesquisas que visem a avaliar problemas quanto ao desempenho
reprodutivo de determinadas espécies e cultivares.
A microsporogênese no pessegueiro inicia-se no inverno, e a meiose (formação
dos micrósporos, sucedida pela microgametogênese, com formação dos gametas
masculinos) ocorre por ocasião do inchamento da gema. Seu término é marcado
pela formação das tétrades de micrósporos, entre meados de junho e final de
julho, dependendo da cultivar (Raseira & Quezada, 2003).
Durante a formação dos microsporângios, as células do tecido arquesporial,
envolvidas pelo tapete, ocupam a região mais interna dos microsporângios e
multiplicam-se por mitoses sucessivas, durante 15-20 dias, para formar um
maciço de tecido esporogênico, composto por células-mãe de micrósporos,
diploides. Na meiose, cada célula-mãe origina quatro células haploides, os
micrósporos, organizados em configuração tetraédrica, separados por calose.
Cerca de duas semanas após a meiose, o tapete entra em senescência e a
organização dos micrósporos em tétrades se desfaz, com a dissolução da calose,
liberando quatro micrósporos no interior da cavidade locular, preenchida por
líquidos. Cada micrósporo apresenta forma triangular, quando em seção ao longo
do plano equatorial (ou em vista polar), característica da espécie. Algum tempo
depois, porém, antes da antese, os quatro lóculos (dos quatro microsporângios)
de cada antera reduzem-se a dois, com dissolução do septo em cada teca, e as
células do endotécio e conectivo desidratam-se, permitindo a deiscência das
anteras e a dispersão do pólen (martinez-Tellez, 1981). No entanto, durante o
processo de microsporogênese, diversas irregularidades têm sido mencionadas
como possíveis causas das variações no grau de fertilidade floral, resultando
em variabilidade de germinação do pólen in vivoe in vitro(Cerovic & Ruzic,
1992). Segundo Szabó & Nyéki (2000), a maioria das cultivares de
pessegueiro desenvolvem flores com regularidade no desenvolvimento estaminal,
com anteras contendo pólen funcional. No entanto, segundo BALDINI (1992),
algumas cultivares possuem esterilidade morfológica, com falta ou deficiência
no desenvolvimento dos estames.
Diversas cultivares de pessegueiros são autoestéreis (Szabó et al., 2000;
mclaren & Fraser, 1996) ou "macho-estéreis" (Szabó et al., 2000), as quais
apresentam ausência de grãos de pólen normais e funcionais (Szabó & Nyéki,
2000), podendo essas, de acordo com a cultivar, produzir anteras de tamanho
menor que o normal e com baixa quantidade de grãos de pólen (Szabó et al.,
1996). De acordo com Szabó & Nyéki (2000), as cultivares de pessegueiros
"macho-estéreis" são também facilmente reconhecidas pelas suas anteras de
coloração pálida, contendo poucos grãos de pólen, de tamanho menor que o padrão
normal. No Brasil, pode-se citar, entre outras cultivares de pessegueiro
"macho-estéreis", a 'Baronesa', que não apresenta formação de pólen (Centelhas-
Quezada et al., 2000), sendo, portanto, dependente de polinização cruzada.
Em relação à produção de pólen, os pessegueiros mais adaptados ao clima
subtropical chegam a produzir de 1.000 a 2.000 grãos de pólen por antera e até
80.000 grãos de pólen por flor (Barbosa et al., 1989). No entanto, segundo
Bassols (1980), a produção e a germinação do pólen do pessegueiro não são
constantes ao longo dos anos. De acordo com Kozai et al. (2004), altas
temperaturas na pré-floração possuem grande influência na quantidade de pólen
produzida, podendo, dependendo da intensidade, causar esterilidade dos grãos.
Dados obtidos com o pessegueiro 'Granada', nas safras de 2004 e 2005, mostraram
que o número de grãos de pólen por antera variou entre 91 e 643, dependendo do
ano e da condição térmica a que as plantas foram submetidas, ficando muito
abaixo do potencial de produção de pólen da espécie e dos níveis encontrados
por (Barbosa et al., 1989), corroborando a informação de Bassols (1980).
Raseira (2005) -informação pessoal também obteve, na safra de 2005 com o
pessegueiro 'okinawa' destinado à produção de caroços, de 200 a 400 grãos de
pólen por antera, considerando uma baixa produção para a espécie.
A elevação das temperaturas diurnas do ar no interior da estufa (acima de 25ºC)
promoveu, na média dos dois anos estudados, redução significativa da produção
de pólen viável. Esse fator atuou de forma prejudicial durante a meiose
polínica e/ou promoveu degeneração dos micrósporos (grãos de pólen) após a sua
formação e liberação nos lóculos (Nava, 2007).
De acordo com a cultivar, a viabilidade do pólen do pessegueiro varia de 70-
95%, quando bem conservados ou recém-extraídos das anteras, sob condições de
laboratório (Barbosa et al., 1989). Segundo Barbosa (1990) e Raseira
(comunicação pessoal, 2004), a viabilidade dos grãos de pólen de pessegueiros,
desde que armazenados em ambiente frio e seco, pode ser mantida por vários
meses. Entretanto, a viabilidade dos grãos de pólen do pessegueiro pode ser
influenciada por diversos fatores internos, como o estado nutricional da planta
(Williams, 1970), e fatores externos, como temperatura e grau de hidratação dos
mesmos (martinez-Tellez, 1981).
De acordo com Sukhvibul et al. (2000), o efeito da temperatura na germinação de
grãos de pólen é inconsistente e pode variar entre espécies e entre as
cultivares da mesma espécie. No entanto, Weinbaum et al. (1984) observaram, em
pessegueiros, um pico de germinação do pólen a 20ºC, mas que se manteve
relativamente alta mesmo a 28 ou 30ºC. Para Kozai et al. (2004), a inibição da
fecundação em pessegueiros sob temperaturas acima de 25ºC não é devida à
reduzida viabilidade do pólen.
Dados obtidos com o pessegueiro 'Granada', nas safras de 2004 e 2005, mostraram
que a viabilidade dos grãos de pólen foi baixa, ficando entre 0,67% e 50,53% e
entre 0 e 5,68% nas temperaturas de germinação in vitrode 20 e 25ºC,
respectivamente, dependendo do ano e das condições térmicas a que as plantas
foram submetidas. As temperaturas elevadas (acima de 25ºC) durante a pré-
floração e floração reduziram significativamente a viabilidade do pólen,
consequência, em grande parte, do elevado percentual de grãos de pólen
degenerados ou abortivos na sua constituição morfológica (Nava, 2007).
Em relação aos gametas femininos, a formação de um saco embrionário normal e
funcional está intimamente relacionada com a regularidade durante a
megasporogênese e megagametogênese (Cerovic & micic, 1999). Embora a
ocorrência de atraso no desenvolvimento do saco embrionário e o abortamento de
óvulos sejam aspectos muito importantes do processo de reprodução sexual em
plantas superiores, o seu estudo tem sido frequentemente negligenciado (Pimenta
& Polito, 1982; Furokawa & Bukovac, 1989) e pouco descrito como causa
da baixa frutificação das frutíferas (Furokawa & Bukovac, 1989). Segundo
Rodrigo & Herrero (1998), o óvulo primário é o maior e o mais desenvolvido,
possuindo maior chance de ser fecundado (Rodrigo e Herrero, 1998; ALBURQUERQUE
et al., 2002). No entanto, segundo ALBURQUERQUE et al. (2002), o
desenvolvimento dos óvulos na antese é variável entre as espécies e entre as
cultivares da mesma espécie.
Sacos embrionários maduros na antese foram ocasionalmente encontrados na
maioria das cultivares de damasqueiros (Burgos & Egea, 1994; Egea &
Burgos, 1994; Egea & Burgos, 1998). Em cerejeira-azeda (Prunus cerasusl.),
Furukawa & Bukovac (1989) observaram que óvulos com saco embrionário
imaturo na antese não foram viáveis ou funcionais. Para os mesmos autores,
óvulos funcionais (ou potencialmente funcionais) são aqueles que apresentam
saco embrionário com mais de quatro núcleos na antese (sacos embrionários
imaturos). Por outro lado, ALBURQUERQUE et al. (2000) consideraram óvulos
viáveis apenas os que apresentavam saco embrionário completo e alongado (com
oito núcleos e sete células). Óvulos viáveis são também caracterizados por
altos níveis de amido, nos tegumentos e nucelo, fonte potencial para o
suplemento de açúcares (Pimenta & Polito, 1982).
Para Egea & Burgos (1998), a má-formação dos óvulos em flores de
damasqueiros consiste de um nucelo (megasporângio) não completamente coberto
pelos tegumentos, bem como sacos embrionários alongados, porém desprovidos de
núcleos. outras anomalias, como óvulos pequenos e esféricos, unidos e
subdesenvolvidos, com nucelo anormal ou incompletamente protegido pelos
tegumentos, também estão associadas à esterilidade nesta espécie (Lillecrapp et
al., 1999).
Segundo Ishida et al. (1979), citados por Kozai et al. (2004), em pessegueiros,
as flores sob condições naturais levaram, geralmente, cinco dias a partir da
antese para alcançarem o estágio de maturidade completa do saco embrionário. De
acordo com ALBURQUERQUE et al. (2000), 2.000 graus-hora de desenvolvimento pós-
antese correspondem a um tempo suficiente para o desenvolvimento dos óvulos do
estádio de quatro núcleos (saco embrionário imaturo) até a sua completa
maturidade.
A taxa de crescimento do ovário (Rodrigo & Herrero, 2002b), do óvulo
primário (Rodrigo & Herrero, 1998) e do saco embrionário (Rodrigo &
Herrero, 1998; Sharman, 1997), do estádio pré ao pós-polinização, pode ocorrer
na ausência da polinização, como parte integrante de um programa temporal de
desenvolvimento, controlado geneticamente, a exemplo do que ocorre em flores de
cerejeira-azeda e de pessegueiro (Ishida et al., 1979, citados por Kozai et
al., 2004) e de damasqueiros (ALBURQUERQUE et al., 2000).
No entanto, de acordo com Sharman (1997), a polinização em algumas espécies do
gênero Prunus, a exemplo do damasqueiro, autorregularia o desenvolvimento do
óvulo e do gametófito feminino, bem como a sua maturação, preparando-o para ser
fecundado. Nestes casos, a polinização atuaria, primeiramente, como
coordenadora do desenvolvimento do gametófito feminino.
Segundo ALBURQUERQUE et al. (2000), a falta de fecundação dos óvulos que
alcançam a maturidade tardiamente, provavelmente, é devida à degeneração do
gametófito masculino, que tem vida limitada. o mesmo autor sugere que este
problema ocorre devido à falta de sincronismo entre o tempo necessário para o
saco embrionário terminar o seu desenvolvimento e o tempo de vida útil do tubo
polínico, sobretudo sob altas temperaturas.
Por outro lado, Pimenta & Polito (1983) observaram que um significativo
atraso no desenvolvimento do saco embrionário na antese não afetou a
frutificação efetiva em amendoeiras (Prunus dulcis). ALBURQUERQUE et al. (2000)
observaram que a taxa de crescimento do tubo polínico reduziu muito ou
paralisou totalmente, logo após a polinização, até os estágios finais de
diferenciação do saco embrionário, voltando a crescer normalmente após o
término deste evento.
De acordo com Lillecrapp et al. (1999) e Pimenta & Polito (1982), enquanto
o desenvolvimento incompleto das estruturas ovulares e do saco embrionário
parece ter uma base genética, a degeneração e o abortamento do óvulo parecem
ser de origem ambiental (Lillecrapp et al., 1999), podendo explicar os
resultados variáveis de frutificação em função de cultivar, localização do
pomar e ano de cultivo.
ALBURQUERQUE et al. (2000) observaram em várias cultivares de damasqueiros, de
alto requerimento de frio, boa proporção de óvulos funcionais, mesmo estas não
tendo o seu requerimento de frio satisfeito. Por outro lado, Egea e Burgos
(1998) observaram um padrão contrário em duas cultivares de damasqueiros de
alto requerimento em frio, que tiveram um pequeno atraso no desenvolvimento dos
seus óvulos, mesmo tendo elas sido completamente satisfeitas em frio,
contribuindo com a hipótese de Lillecrapp et al. (1999).
Com relação à temperatura durante o florescimento, Beppu et al. (2001) não
observaram diferenças no estádio de maturidade ou desenvolvimento dos óvulos em
flores em antese de damasqueiros mantidos a 15ºC e a 25ºC. Segundo Egea &
Burgos (1998), altas temperaturas na pré-floração somente induziram um leve
atraso na maturidade dos óvulos, não gerando evidências concretas de estarem
relacionadas com a baixa frutificação das plantas de damasqueiros. Resultados
obtidos com o pessegueiro 'Granada' (Nava, 2007) corroboram Egea & Burgos
(1998). Para Nava (2007), apesar de as elevadas temperaturas (acima de 25ºC) na
pré-floração e floração terem contribuído com o inadequado desenvolvimento dos
óvulos e com a baixa frutificação do pessegueiro 'Granada', o fator genético
parece estar contribuindo de forma decisiva para esses resultados.
Quanto aos aspectos nutricionais das plantas, as reservas de amido no óvulo
primário decrescem após a fecundação e parecem desempenhar importante papel na
nutrição do saco embrionário. Em pessegueiro, o decréscimo no conteúdo de amido
da epiderme nucelar tem sido relatado como indicador de desenvolvimento e
alongamento do saco embrionário (Arbeloa & Herrero, 1991).
Em relação à degeneração dos óvulos, no gênero Prunus,este evento está
correlacionado ao acúmulo de calose e depleção das reservas de amido, numa
sequência de eventos pouco clara (Rodrigo & Herrero, 1998). Segundo esses
autores, em damasqueiros, a degeneração do óvulo secundário ocorre antes da
fecundação do óvulo primário e é independente da polinização. Segundo Cerovic
& micic (1999), em cerejeira-azeda, tanto a falta de homologia entre
cromossomos irmãos durante a meiose, quanto o efeito do ambiente podem resultar
na degeneração precoce do saco embrionário.
Para Thompson & liu (1973), a degeneração e o abortamento de óvulos têm
sido correlacionados a vários fatores, entre os quais, temperatura elevada e
reduzida atividade de divisão celular no tecido nucelar (Williams, 1965). A
aplicação de reguladores de crescimento, geralmente o ácido giberélico,
normalmente aumenta a senescência ovular em damasqueiros (Egea & Burgos,
1998). Além disso, BALDINI (1992) salienta também que a fertilidade ovular é
negativamente afetada pelo uso de fungicidas na pré-floração e floração. Alguns
sinais do abortamento dos óvulos tornam-se evidentes quatro dias após a
polinização. Eles incluem a paralisação do seu crescimento, seguida da
separação dos tegumentos do tecido nucelar. Em torno do sexto dia após a
polinização, a separação dos tegumentos torna-se mais avançada, e as células do
tecido nucelar tornam-se murchas e colapsadas (Pimenta & Polito, 1982).
CONCLUSÃO
Através dessa revisão bibliográfica, foi possível verificar que o processo de
fixação de frutos do pessegueiro, que aparentemente é simples, mostrase
bastante complexo e altamente dependente da passagem, com êxito, por cada
estádio fenológico. Por isso, a habilidade dos técnicos e produtores em
integrar os fatores porta-enxerto, cultivar, ambiente e manejo adequado das
plantas é crucial para o sucesso ou fracasso no cultivo dessa espécie
frutífera.