Produtividade da soja no cerrado influenciada pelas fontes de enxofre
FITOTECNIA
Produtividade da soja no cerrado influenciada pelas fontes de enxofre1
Soybean grain yield in cerrado region influenced by sulphur sources
Dirceu Luiz BrochI; Paulo Sergio PavinatoII, *; Jean Carlo PossenttiII; Thomas
Newton MartinIII; Erci Marcos Del QuiquiIV
IFundação MS para pesquisa e difusão de tecnologias agropecuárias, Maracajú-MS,
Brasil, dirceu.fms@cooagri.coop.br
IIUniversidade Tecnológica Federal do Paraná, Campus Dois Vizinhos, Dois
Vizinhos-PR, Brasil, pavinato@utfpr.edu.br, jpossentti@utfpr.edu.br
IIIDepartamento de Fitotecnia, Universidade Federal de Santa Maria, Santa
Maria-RS, Brasil, martin.ufsm@gmail.com
IVCentro de Ciências Agrárias, Universidade Estadual de Maringá, Umuarama-PR,
Brasil, ercimarcos@hotmail.com
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RESUMO
O enxofre é um componente de proteínas e aminoácidos em plantas, sendo exigido
em boa quantidade por leguminosas, pelo alto acúmulo de proteínas nessas
espécies. Com isso, este trabalho teve por objetivo verificar a influência de
diferentes fontes de enxofre sobre a produtividade de grãos na cultura da soja.
O experimento foi instalado na área experimental da Fundação MS, em Maracajú,
MS, em três anos consecutivos no delineamento de blocos ao acaso, com quatro
repetições, submetidas à análise de variância conjunta. Foram implantadas as
cultivares BRS-133 (2002/03 e 2003/04) e CD 202 (2004/05). Como tratamento
foram avaliados: as adições de enxofre na forma de superfosfato simples, MAP
sulfurado + Sulfurgran, Sulfurgran, enxofre elementar, gesso granulado, Fosmag
509M6, gesso agrícola a lanço e testemunha, sem a aplicação. A soja responde à
aplicação de enxofre em solos das regiões do cerrado brasileiro, sendo
necessária, na maioria das vezes, a fertilização com este nutriente para
obtenção de altas produtividades. A grande maioria das fontes de enxofre
utilizadas foi eficiente em fornecer este nutriente para a soja, com destaque
para a aplicação de MAP Sulfurado + Sulfurgran, Formag 509M6 e gesso agrícola a
lanço, que promoveram as melhores produtividades de grãos. O enxofre elementar
não foi eficiente em disponibilizar S para a cultura.
Palavras-chave - Soja. Plantas-efeito do enxofre. Cerrado brasileiro.
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ABSTRACT
Sulphur is a component of protein and aminoacids in plants, being required in
an expressive amount by leguminous, as function of high protein levels in these
plants. Then, this work aimed to verify the influence of different sulphur
sources on soybean grain yield. The experiment was carried out at the
experimental area of Fundação MS, Maracajú, MS, in three consecutive years in a
randomized block design with four replications, submitted to variance analysis
of group experiments. The cultivars used were BRS-133 (2002/03 and 2003/04) and
CD 202 (2004/05). As treatments, it was evaluated the application of sulfur as
Simple Superphosphate, MAP sulphured + Sulfurgran, Sulfurgran, elemental
sulphur, granulated gypsum, Fosmag 509M6, agricultural gypsum throwed on
surface, and a witness without application. Soybean crop answer is positive to
soil applied sulphur in Brazilian cerrado soils, in most of the time to obtain
higher grain yield. Most of S sources were efficient to provide this nutrient
for soybean, highlighting the applications of MAP Sulphured + Sulfurgran,
Formag 509M6 and agricultural gypsum, that promoted the highest soybean grain
yield. Elemental sulphur was not efficient to provide available S for the crop.
Key words - Soybean. Plants-sulphur effect. Brazilian cerrado.
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Introdução
As exigências de enxofre (S) pelas culturas variam muito de acordo com a
espécie e com a produtividade esperada. No grupo das culturas de média/alta
exigência incluem-se as leguminosas, que, de um modo geral, são mais exigentes
que as gramíneas, em função de seu teor mais elevado de proteínas (ALVAREZ et
al., 2007; RHEINHEIMER et al., 2005). Em função disso, a soja é uma cultura
exigente neste nutriente, e há possibilidade de resposta à adubação com S,
especialmente em áreas de cerrado.
A deficiência de S pode ser observada em algumas regiões do Brasil,
especialmente em solos sob cerrado, em razão da baixa fertilidade do solo,
associada à pequena quantidade de MO, ao aumento da exportação de S pelos
grãos, causados por produtividades elevadas, e à lixiviação de sulfato,
acentuada pela aplicação de calcário e fósforo (RHEINHEIMER et al., 2005; VITTI
et al., 2007).
Resultados de pesquisa com S não são muito freqüentes no Brasil, pois para se
conseguir isolar o efeito deste nutriente é preciso trabalhar com produtos
puros, e muitas vezes o S é ou foi aplicado nas áreas cultivadas via
fertilizantes compostos, como nutriente secundário, caso dos sulfatos e
superfosfatos simples. Resultados obtidos por Rheinheimer et al. (2005)
evidenciaram que o uso de doses de SO4-2 de até 60 kg ha-1, via superfosfato
simples, não afetam a produtividade das culturas, as quais foram cultivadas na
seqüência nabo forrageiro/milho/trigo/soja/canola/milho. Resultados semelhantes
foram observados por Osório Filho et al. (2007) com os tratamentos citados
anteriormente, não havendo resposta da soja a doses de fertilizantes
sulfatados.
O superfosfato simples é um fertilizante de rápida solubilidade e com teor de
12% de S-SO4-2 na sua composição, disponibilizando facilmente para as culturas,
já outras fontes, como o S elementar, precisam sofrer algumas reações de
oxidação no solo para ficarem disponíveis, sendo transformados em SO4-2. Pois,
segundo Horowitz e Meurer (2006), as plantas somente conseguem absorver o S
elementar aplicado no solo depois de sua oxidação a sulfato, oxidação esta
catalisada por enzimas produzidas principalmente por microrganismos.
O gesso agrícola é uma importante fonte de enxofre às culturas. Nogueira e Melo
(2003) verificaram que os teores de S disponível (SO4-2) na camada de 0 a 20 cm
do solo aumentaram com a aplicação de gesso, porém houve deslocamento desse S
em profundidade no perfil, ficando pouco efeito residual nesta camada para os
anos seguintes. De acordo com os autores, isso ocorre em função da alta
solubilidade do sulfato, sendo que altas precipitações podem promover a
lixiviação deste nutriente para camadas mais profundas, ou até sair do sistema
explorado pelas raízes. Ainda, concluíram que as doses de gesso agrícola não
influenciaram a produtividade da soja, em Latossolo Vermelho de Jaboticabal,
SP.
Ainda não existe uma referência no que diz respeito à dose ideal de S para as
culturas. De acordo com EMBRAPA (2003), a recomendação para a cultura da soja,
para a região Central do Brasil, é de 15 kg para cada 1.000 kg de grãos
produzidos. Neste sentido, como há carência de pesquisas que abordem a
utilização do S na cultura da soja, realizou-se este trabalho com o objetivo de
verificar a influência de diferentes fontes de enxofre sobre a produtividade de
grãos na cultura da soja.
Material e métodos
O presente trabalho foi conduzido durante três anos agrícolas consecutivos,
2002/2003, 2003/2004 e 2004/2005, na área experimental da Fundação MS, em
Maracajú, Mato Grosso do Sul, em um Latossolo Vermelho Distroférrico de textura
argilosa (EMBRAPA, 1999). A área utilizada estava há cinco anos sob sistema de
plantio direto, em resteva de milheto. As características químicas e
granulométricas do solo estão apresentadas na Tabela_1. Pelos dados, constata-
se que o solo é bastante argiloso, com teor médio de MO na camada superficial,
e com teor de S considerado abaixo do ideal para a soja, que seria de 10 mg dm-
3, conforme CQFS RS/SC (2004).
A semeadura foi realizada na primeira quinzena de novembro, para os três anos
consecutivos. A precipitação pluviométrica acumulada no período de cultivo, ou
seja, de novembro a março de cada ano agrícola, foi de 735; 737 e 713 mm para
os anos 2002/2003, 2003/2004 e 2004/2005, respectivamente. No entanto, no
último ano agrícola, as precipitações nos meses de fevereiro (76 mm) e março
(35 mm) foram bem abaixo da média dos últimos 10 anos, de 155 e 103 mm,
respectivamente, o que reduziu a produtividade média da soja (FUNDAÇÃO MS,
2005). A temperatura média para a região é de 25 ºC para o período de cultivo,
sendo que a média das mínimas ocorre no mês de novembro (19,5 ºC), enquanto que
a média das máximas ocorre em março (31,8 ºC).
Antecipando ao primeiro ano de implantação, aplicou-se 2,5 t ha-1 de calcário
dolomítico e 250 kg ha-1 de superfosfato triplo, a lanço, três meses antes da
semeadura, objetivando elevar a saturação para 70% e corrigir a deficiência de
P na camada de 0 a 20 cm, que estava em 5 mg dm-3, considerado muito baixo
(RAIJ et al., 1997). Devido ao K estar baixo no solo (CQFS RS/SC, 2004),
aplicou-se em cobertura 200 kg ha-1 de KCl em área total, no primeiro ano de
condução do experimento.
A cultivar semeada nas duas primeiras safras foi a BRS-133 e na terceira safra
foi a CD-202, todas tratadas com 150 g L-1 de Carbendazim + 300 g L-1 de
Thiram, na dose de 100 mL do produto para cada 100 kg de sementes. As sementes
também foram inoculadas com 300 mL de inoculante líquido a cada 50 kg de
sementes, na semeadura de todas as safras. Também foram aplicados os
micronutrientes cobalto (Co) e molibdênio (Mo) via semente, nas doses e formas
recomendadas pelos fabricantes dos produtos. O boro foi aplicado no solo, na
dose de 15 kg ha-1 do produto comercial Granubor®, em cobertura somente no
primeiro ano de cultivo, juntamente com o KCl.
As unidades experimentais foram compostas por parcelas de 27 metros quadrados
com 5 fileiras de 12 m de comprimento e espaçamento de 0,45 m entre fileiras,
no delineamento experimental de blocos casualizados, com quatro repetições. A
área útil da parcela foi composta das três fileiras centrais, com quatro metros
de comprimento, totalizando 5,4 metros quadrados. Os tratamentos foram
constituídos de sete diferentes fontes de S e uma testemunha (TAB._2). Nos
tratamentos, desde o dois (Superfosfato simples) até o sete (Fosmag 509 M6)
aplicou-se o S no sulco de semeadura, e no tratamento oito (Gesso agrícola), o
produto foi aplicado a lanço logo antes da semeadura. Os demais nutrientes que
compõem cada produto utilizado nas formulações foram balanceados com fontes
puras de fertilizantes, para isolar o feito do S na produtividade da cultura.
Esses tratamentos foram aplicados somente no primeiro ano de cultivo, sendo
avaliados, no segundo e terceiro ano, o efeito residual desses produtos.
Após a colheita o material foi trilhado, as impurezas descontadas e a umidade
corrigida para 13%. Inicialmente, para cada um dos anos aplicou-se a análise de
resíduo conforme Martin e Storck (2008). Realizou-se a análise de variância
conjunta, com o auxílio do software de análise estatística Genes (CRUZ, 2001) e
o teste de comparação múltipla de médias foi o de Skott-Knott ao nível de 1% de
significância de erro.
Resultados e discussão
Verificou-se que as pressuposições do modelo matemático não foram violadas em
nenhum dos anos avaliados, conferindo assim qualidade experimental para a
realização da análise de variância (MARTIN; STORCK, 2008). Verificou-se pelo
teste do F máximo que a relação entre o maior e o menor valor do quadrado médio
do resíduo entre os diferentes anos foi de 1,72, o que indica que os anos podem
ser analisados conjuntamente. A Tabela_3 apresenta resumo da análise de
variância com as respectivas fontes de variação e quadrados médios com os
respectivos níveis mínimos de significância.
A precisão experimental está apresentada por meio do coeficiente de variação,
que não foi superior a 6,19 (TAB._4), indicando que o experimento apresentou
uma elevada qualidade tanto na avaliação nos diferentes anos quanto pela
análise conjunta (CV = 5,60). Carvalho et al. (2003) citam que coeficientes de
variação aceitáveis para a variável produtividade de grãos de soja podem chegar
a até 16%.
Ao longo dos três anos de cultivo, a cultivar BRS 133 foi mais responsiva ao
enxofre (2002/2003 e 2003/2004) que a cultivar CD 202 (2004/2005) quando se
considera a média dos anos (TAB._4). No entanto, a limitada disponibilidade de
água no período final do ciclo para o ano agrícola 2004/2005 pode ter sido a
principal causa da menor produtividade média, conforme citado na metodologia do
trabalho, pois foi de 3462,4 e 3365,6 kg ha-1 para os dois primeiros anos de
cultivo, respectivamente, enquanto que no terceiro ano de cultivo a produção
foi de 2743,3 kg ha-1.
A produtividade de grãos foi maior nos tratamentos MAP + Sulfurgran (3), Fosmag
509M6 (7) Gesso agrícola à lanço (8), Gesso granulado (6), Sulfurgran (4) e
Superfosfato simples (2), sendo a resposta em valor absoluto decrescente nesta
ordem, mas todos os tratamentos apresentaram produtividade média dos três anos
superior a 3100 kg ha-1. Isso evidencia que a aplicação de enxofre em formas
solúveis está sendo eficiente em disponibilizar este nutriente para as
culturas, uma vez que a quantidade de S aplicada foi semelhante. O tratamento
com enxofre elementar (5) foi inferior aos demais e não diferiu da testemunha
(1), evidenciando ser uma fonte ineficaz de fornecimento deste nutriente à
soja, para essas condições experimentais.
Originalmente, os solos do cerrado brasileiro são pobres em nutrientes e em
matéria orgânica. O solo da área experimental, um Latossolo Vermelho,
apresentava média a baixa fertilidade, sendo muito responsivos à aplicação de
S. Por outro lado, Nogueira e Mello (2003) não obtiveram resultado com a
aplicação de gesso em um solo arenoso com baixa fertilidade (apenas 2,2% de
MO), da região de Jaboticabal, SP. Os autores verificaram que a aplicação de
gesso agrícola causou aumento temporário nos teores de S-sulfato nas amostras
de solo, mas este aumento foi sem efeito residual de um ano para outro na
camada de 0 a 20 cm, confirmando a alta mobilidade desse íon no perfil do solo.
Essa mobilidade é confirmada no trabalho de Neis et al. (2010), onde foi
observado aumento na disponibilidade de sulfato na camada de 20-40 cm quando
comparado com camadas acima (5-10 e 10-20 cm), mas as doses de enxofre
aplicadas não promoveram aumento na produtividade da soja.
Embora possa não haver resposta à aplicação de S em muitas áreas cultivadas
pelo Brasil, é preciso ficar atento ao que acontece no solo, em função do S
apresentar rápido deslocamento ao longo do perfil em profundidade, dando
atenção especial para que a disponibilidade do elemento não possa se tornar
limitante aos próximos cultivos. Nos dados obtidos após os três anos de
experimento, em 2005 (TAB._1), pode-se observar que a fertilidade do solo, de
um modo geral, melhorou na área cultivada até a profundidade avaliada (0 a 40
cm), com elevação nos teores disponíveis de P, K, Ca, Mg e também da saturação
por bases. Isso ocorreu em função da correção inicial da área e pela ciclagem
de nutrientes via MO, mantendo os nutrientes no sistema. Com relação ao S
também houve aumento na disponibilidade dele no solo. É possível se detectar
que houve deslocamento de S no perfil do solo, pois a disponibilidade é
superior na camada de 20-40 cm em relação a 0-20 cm. Conhecendo o comportamento
deste nutriente no solo, é de se esperar que a disponibilidade seja maior ainda
nas camadas mais profundas, não avaliadas aqui.
Avaliando as alterações químicas do solo e a resposta da cultura da soja ao
calcário e gesso aplicados na implantação do sistema de plantio direto em solo
argiloso da região de Ponta Grossa, PR, Caires et al. (2003) concluíram que não
houve resposta da soja, em três cultivos consecutivos. Os autores verificaram
que a aplicação de gesso agrícola, associada ou não à calagem, na superfície ou
com incorporação, não foi uma estratégia interessante para o estabelecimento da
soja no sistema plantio direto, por não ocasionar melhoria na disponibilização
de nutrientes e na distribuição radicular no perfil do solo, não afetando a
produção de grãos, em estudos relacionando à aplicação de S via solo e via
foliar. Já, Vitti et al. (2007) indicam que a aplicação de S via foliar aumenta
a produção de grãos em soja, semelhantemente ao que ocorre com a aplicação de S
no solo. Porém, as mesmas produtividades foram observadas quando se aplicou 20
kg ha-1 de S no solo ou 6 kg ha-1 via foliar, onde a eficiência da aplicação de
S via foliar, com base no conteúdo de proteína solúvel total, foi superior a da
aplicação via solo. Portanto, a avaliação da eficiência da fertilização com
enxofre é um ponto que ainda precisa de estudos, a fim de melhorar o
aproveitamento deste e de outros nutrientes pelas culturas.
Conclusões
1. A cultura da soja responde à aplicação de fontes solúveis de enxofre, mas a
resposta normalmente se limita a solos pobres neste nutriente;
2. A grande maioria das fontes de S utilizadas foi eficiente em fornecer este
nutriente para a soja, porém o enxofre elementar não foi eficiente em
disponibilizar S para a cultura.