Perfil nutricional das famílias da vila tecnológica no município de Ribeirão
Preto
RELATO DE EXPERIÊNCIA
PRÁTICAS CUIDATIVAS
Perfil nutricional das famílias da vila tecnológica no município de Ribeirão
Preto
Maria das Graçãs Carvalho FerrianiI; Rosane Pilot Pessa RibeiroII; Moacyr Lobo
da Costa JuniorIII; Graziela Vieira Bassan dos SantosIV; Marta Neves Campanelli
Marçãl VieiraIV; Juliana da Silva CamargoV; Daniela VieiraV
IProfª Dra. Titular do Depto. de Enfermagem Materno-lnfantil e Saúde Pública da
Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
IIProf- Dra. do Depto. de Enfermagem Materno-lnfantil e Saúde Pública da Escola
de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
IIIProf. Dr. do Depto. de Enfermagem Materno-lnfantil e Saúde Pública da Escola
de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
IVNutricionista Doutoranda da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da
Universidade de São Paulo
VAlunas da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo
INTRODUÇÃO
O problema de carência nutricional no Brasil atinge 32 milhões de brasileiros,
número equivalente a 22% da população do país ou 9 milhões de famílias. Tais
dados não se explicam pela disponibilidade interna de alimentos ou fatores
econômicos isoladamente, mas tem raízes multissetoriais. O poder aquisitivo e
certos aspectos de produção, colheita, armazenamento e transporte de alimentos,
além certamente de hábitos alimentares inadequados, são fatores envolvidos na
alta prevalência de carência nutricional.
Em contraste com esses dados de desnutrição por várias formas, a obesidade
atinge mais de 5% das crianças menores de 5 anos, mesmo em famílias de baixa
renda nas regiões Sul e Sudeste. A partir dos 18 anos de idade, o sobrepeso e a
obesidade tornam-se cada vez mais freqüentes: cerca de 32% dos brasileiros
adultos apresentam algum grau de excesso de peso (Oliveira, 1996)
Diante desses dados, tudo indica que a situação nutricional da população vem
sofrendo mudanças, por um lado, com evidente diminuição das taxas de
desnutrição, e por outro lado, com o aumento da obesidade associada ao aumento
da morbi-mortalidade pelas doenças crônico-degenerativas (hipertensão
arterial, dislipidemia, neoplasias malignas, diabete mélitus), ligadas direta
ou indiretamente a exposição a determinados nutrientes.
Considerando todos estes aspectos, justifica-se o nosso interesse em estudar o
estado nutricional das famílias de um bairro da periferia de Ribeirão Preto,
que fazem parte do"Projeto de Vigilância em Saúde das Famílias da Vila
Tecnológica"coordenado pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP e
Secretaria Municipal da Saúde de Ribeirão Preto, com vistas a subsidiar a
Implantação de um Sistema de Vigilância Alimentar Nutricional.
Sendo assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar o estado nutricional das
famílias residentes na Vila Tecnológica do município de Ribeirão Preto.
METODOLOGIA
A pesquisa foi realizada no bairro "Vila Tecnológica", e tem como sede para o
desenvolvimento do projeto de"Vigilância em Saúde das Famílias da Vila
Tecnológica", a Casa da Saúde, implantada em 1997, que é uma Unidade de Atenção
Primária à Saúde (APS) ligada à Secretaria Municipal da Saúde, situada ao oeste
da cidade. Conta com uma enfermeira, uma auxiliar de enfermagem e uma auxiliar
de serviço. As atividades desenvolvidas na Casa da Saúde voltam-se para a
prevenção de doenças e promoção da saúde.
A Casa da Saúde situa-se estrategicamente dentro de um espaço denominado Rua
das Tecnologias1, espaço este sob a coordenação da Secretaria da Cidadania e
Desenvolvimento Social do município, onde são desenvolvidas ações de caráter
educativo e de promoção social, principalmente com crianças e adolescentes de
toda a região.
A pesquisa foi realizada com 106 famílias cadastradas na Casa de Saúde, que
residem no bairro da Vila Tecnológica, correspondendo a um contingente de 471
pessoas. As famílias receberam inicialmente orientação sobre o estudo e foram
agendadas para aferição do peso e da estatura, através de aerograma, na Casa da
Saúde.
Considerando que um número expressivo de famílias não compareceu ao local, foi
efetuada a visita domiciliar para coleta de dados que se realizou no período de
agosto de 1998 a janeiro de 1999.
A medida de peso foi obtida utilizando balança antropométrica (marca FILIZOLA)
portátil, com capacidade de 150kg e escala com divisões em quilogramas e 100
gramas. A altura foi obtida com uma régua de madeira graduada em centímetros. A
coleta de dados foi realizada por duas alunas de graduação do curso de
enfermagem sendo os dados anotados em impresso próprio. Utilizamos um veículo
oficial com motorista da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto-USP para
transporte das mesmas até o local de estudo.
Após o levantamento dos dados antropométricos foi efetuada a classificação do
estado nutricional por grupos etários. O estudo fez uso das variáveis peso,
altura, sexo e idade, utilizando-se para a faixa etária até 10 anos, os três
indicadores: peso por idade (P/I), isto é, a relação entre o peso de referência
por altura e altura por idade (A/I), relação entre a altura observada e a
altura de referência por idade. Os dados peso, altura, sexo, idade foram
digitados no software EPI INFO, no qual calculou-se os escores Z, sendo
posteriormente transferidos para o Diagnutri (Goulart, Basques, 1991) que
calculou a distribuição de freqüência dos escores Z observados na amostra em
estudo. Para a faixa etária acima de 10 anos até 18 anos foi utilizado o Indice
de Massa Corporal (IMC) para adolescentes de acordo com dados obtidos da
"National Health and Nutrition Examination Survey" (WHO, 1995).
Para os adultos foi utilizado o IMC em relação à idade expresso pela obtenção
do cálculo do peso dividido pela altura ao quadrado, comparado com a
classificação seguida porBray(1996).
RESULTADOS
Os dados coletados podem ser apresentados e analisados sob dois prismas
distintos: a família como unidade de análise ou considerando-se o indivíduo.
Com relação às famílias, podemos visualizar na Quadro_1 que, das 106 famílias
existentes, 101 (99%) foram contatadas, sendo que em 08 delas não foi possível
fazer a avaliação nutricional em nenhum de seus membros.
![](/img/revistas/reben/nspe/a30qua01.jpg)
Outro ponto a destacar é que, nas 93 famílias em que foi realizada a avaliação
nutricional, observam-se- em 08 famílias ninguém apresentou problemas
relacionados à nutrição, tendo sido todas as pessoas examinadas e em 10
famílias, não se constatou nenhum problema nutricional, porém, nem todos os
familiares foram examinados. Portanto, nas 75 famílias restantes, o que
corresponde a 71% das famílias existentes na Vila tecnológica, ou 81% das
famílias onde foram examinadas pelo menos uma pessoa, em todas elas, observou-
se pelo menos um membro com problema nutricional.
No que concerne ao número de pessoas, nas 101 famílias que participaram do
estudo há um contingente de 471 pessoas, sendo que dessas, 98 não foram
avaliadas quanto ao seu estado nutricional, em decorrência de vários fatores.
Em relação às 373 pessoas que foram avaliadas, constatou-se que 217 (58%)
destas apresentaram valores normais de peso e altura. Entretanto, 156 (42%)
pessoas apresentaram algum agravo nutricional, sendo 54 (15%) pessoas
desnutridas e 102 (27%) obesas. Do contingente de indivíduos desnutridos, 31
deles (42,6%) são crianças de 0 a 9 anos e dos 102 obesos, 23 deles (20,9%)
são adolescentes entre 10 e 19 anos e 64 (30,4%) são adultos, prevalecendo os
do sexo feminino (61,7%).
É importante ressaltar que os resultados da pesquisa indicam que em cada 05
famílias, 04 apresentam problemas nutricionais.
Comparando-se os dados da presente pesquisa com a literatura, observa-se que
estes não são tão diferentes, entretanto, há necessidade de se conhecer o
consumo alimentar das famílias pesquisadas, a forma de aquisição de alimentos e
dados de morbidade por faixa etária.
Em Ribeirão Preto, uma pesquisa realizada porSantos citado porPereira (1995),
em quatro bairros da cidade, verificou que a prevalência de adultos com peso
até 30% acima do ideal foi de 48% e, o de mais de 30% acima do ideal foi de
17,7%. Outro estudo, realizado em Ribeirão Preto por Santos, (1997) com pré-
escolares, esta encontrou 17,4% de crianças com desnutrição moderada ou grave.
A prevalência de obesidade foi de 10,2%, ou seja, crianças que apresentaram
relação de peso para altura acima de 2 escores Z.
A obesidade e a desnutrição têm sido vistas como problemas mundiais de saúde
pública e que também necessitam de atenção por parte dos governos e dos
profissionais de saúde.
O estado de saúde e nutrição depende da forma como as crianças e seus
familiares estão inseridos na sociedade e a qualidade do ambiente vivenciado
por elas. Estes aspectos deverão ser analisados ao se discutir desnutrição e
sobrepeso ou obesidade.
Outro aspecto relevante é o acesso à educação que contribui sobre maneira para
o estado de saúde e nutrição dos indivíduos, em conjunto com outros fatores do
meio social, permitindo a melhoria das condições de vida de trabalho, de renda
e consequentemente, possibilitando o acesso à alimentação.
Monteiro et al. (1995), refletem sobre a transição nutricional no Brasil e
concluem que esta determinará a definição de prioridades e estratégias de ação
de Saúde Pública, fazendo com que o país incorpore de vez a prevenção e o
controle das doenças crônicas degenerativas, elaborando ações de educação em
alimentação e nutrição que alcancem eficazmente todos os estratos econômicos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados da pesquisa possibilitaram conhecer o estado nutricional dessas
famílias, embora, uma análise mais aprofundada seja necessária para conclusão
deste estudo. Entretanto, constatou-se que estas famílias apresentam também uma
polarização em seu quadro nutricional convivendo com duas realidades:
desnutrição infantil e obesidade na fase adulta. Desta forma são necessárias
algumas medidas para que se possa reverter tal quadro.
Considerando a nossa proposta de "Implantação de um Sistema de Vigilância
Nutricional Familiar, pretende-se:
- realização de visita domiciliar por amostragem para levantar dados sobre
consumo alimentar das famílias e formas de aquisição de alimentos (compra,
doação, produção doméstica, dentre outros);
- análise dos resultados da avaliação do estado nutricional e do inquérito
alimentar associando aos dados de morbidade já levantados em outra instância
com vistas a subsidiar o plano de orientação alimentar e nutricional às
famílias.
- elaborar proposta de um sistema de vigilância alimentar e nutricional que
envolva:
- programas de educação alimentar (casa da saúde, escolas, creches, UBS, dentre
outros);
- suplementação alimentar para grupo de risco (lactantes, pré-escolares,
adolescentes, gestantes, idosos e indivíduos enfermos);
- programas de abastecimento alimentar e de vigilância sanitária de alimentos.
- programa de acompanhamento do estado nutricional da população.