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BrBRCVHe0034-71672003000200013

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National varietyBr
Year2003
SourceScielo

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A utilização da técnica de videogravação em investigação de enfermagem em saúde da criança PESQUISA

A utilização da técnica de videogravação em investigação de enfermagem em saúde da criança

The use of video recording technique in nursing research on children's health

Utilización de la técnica de videograbación en investigación de enfermería sobre salud del niño

Débora Falleiros de MelloI; Glória Lúcia Alves FigueiredoII;Lucila Castanheira NascimentoI IProfessora do Departamento de Enfermagem Materno Infantil e Saúde Pública da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto ' USP IIEnfermeira e Mestre em Enfermagem em Saúde Pública

1 Introdução A observação sistemática é considerada um dos componentes centrais do processo de produção do conhecimento científico e em algumas situações ela pode ser obtida pela repetição do fenômeno focalizado(1).

As estratégias observacionais foram sendo desenvolvidas ao longo dos anos e os trabalhos iniciais datam das duas primeiras décadas do século XX, em que se destacam o registro cursivo e a amostragem de tempo, estudos esses mais voltados para o comportamento da criança em idade escolar. No Brasil, o uso de estratégias observacionais despontou na década de 70, com a implantação dos primeiros cursos de pós-graduação em psicologia. A partir da década de 80, houve aumento no uso das técnicas de observação no país, sobretudo nas pesquisas relativas ao comportamento humano, sendo o registro contínuo a estratégia mais empregada(2).

Os tipos de estratégias observacionais, de acordo com seus objetivos ou funções, podem ser especificados em três métodos principais: narrativo, amostragem e classificação. O método narrativo descreve os eventos comportamentais tal como eles ocorrem, preservando suas seqüências temporais e proporcionando informações numerosas e detalhadas, englobando as descrições diárias (diários), os registros anedóticos e os registros cursivos. O de amostragem visa obter uma amostra de aspectos selecionados e definidos dos comportamentos do sujeito, incluindo amostragem de tempo, de evento e checklists. O método de classificação quantifica os julgamentos do observador em relação a dimensões específicas dos comportamentos em estudo(2).

Alguns estudos, na área de enfermagem em saúde da criança, têm utilizado a observação para apreender o cuidado à criança, as relações que se estabelecem entre as mães e os profissionais de saúde, como são as práticas cotidianas nos serviços de saúde, entre outros aspectos(3-6). No presente estudo, o objetivo é descrever o percurso realizado na construção de uma pesquisa sobre o atendimento de enfermagem em unidade básica de saúde, discutindo aspectos metodológicos referentes a utilização de videogravação.

2 Videogravação: a observação e o registro O ato de observar é antigo e sempre que são colocadas algumas considerações sobre o tema surgem reflexões sobre o uso de instrumentos auxiliares de trabalho. Independente de sua natureza ou função, seja o telescópio, microscópio, ultrassonografia, áudio ou videogravação, não substituem o pesquisador, o que pode ocorrer é uma extensão ou ampliação. A videogravação reduz a informação sensorial, ao transformar em imagens bidimensionais uma realidade tridimensional, além de adiar o processamento de informação. Sua contribuição para a observação sistematizada e a construção do conhecimento está na repetição da observação(1).

A videogravação contribui para melhorar a precisão ou coerência com que o observador apreende o fenômeno, uma vez que permite a exposição repetida do observador à mesma ocorrência do observado, assim como amplia a possibilidade de o observador repensar o observado, ou seja, amplifica sua capacidade de análise. Ao preservar o fenômeno no tempo, mesmo com redução de informação sensorial, a videogravação economiza tempo de coleta de dados e propicia mais tempo de reflexão(1,2).

Na realização do registro videogravado, o observador é guiado por seu pensamento e pelos objetivos decorrentes dele. O registro envolve um planejamento prévio, definindo se a câmera será fixa ou móvel, se o operador ficará visível ou escondido, qual a freqüência e distribuição temporal das amostras, o tipo de amostragem (focal, de varredura, de episódios, ou situacional), todos esses aspectos devem ser resumidos em onde e quando focar a câmera. Esses aspectos estão ligados ao recorte do fenômeno focalizado e à pergunta colocada pelo pesquisador.

No tocante ao recorte do registro para a análise, o primeiro momento envolve algum grau de rastreamento do registro para a tomada de decisões a respeito de seu recorte em unidades significativas para o objeto de estudo. No fluxo dos eventos registrados, para perceber os momentos que são informativos e que podem ser categorizados, podem ser utilizados recursos de congelamento, reversão, câmera lenta e rápida, contribuindo para garantir a identificação consistente de ocorrências das categorias, permitindo, ainda, que o observador atribua sentido às seqüências de ações(1).

O registro preservado pode, eventualmente, ser utilizado para a análise de questões novas, não previstas no planejamento original. No entanto, essa utilização torna-se limitada, pelo delineamento da observação, como pode também acontecer em registros que não recorrem à gravação. Por outro lado, podem ser apontadas algumas limitações decorrentes, principalmente, das características dos equipamentos utilizados. Uma dessas refere-se ao fato da câmera ter foco limitado, o que obriga o pesquisador a fazer opções de amostragem e de amplitude do campo registrado. A utilização de equipamentos mais sofisticados, com capacidade de permitir transcrições exatas de verbalizações e de integrar registros simultâneos, traz ampliações para a análise.

Para identificar as seqüências de ações, a evolução de interações, focalizando um número maior de indivíduos e uma situação menos estruturada, a primeira pista para o recorte é a percepção, pelo observador, de configurações espaciais criadas pela proximidade entre os indivíduos. Essas relações delimitam, no fluxo de eventos, episódios, que são transcritos em detalhe e analisados em termos da dinâmica das trocas sociais que os compõem(1,7).

3 O desenvolvimento do trabalho de campo A partir da escolha da utilização de videogravação, iniciamos a exploração do trabalho de campo, a fim de delimitar os locais de observação.

Nessa fase exploratória da pesquisa, primeiramente entramos em contato com a Secretaria Municipal de Saúde de Franca ' SP, através das enfermeiras responsáveis pelo Serviço de Enfermagem, fazendo a exposição dos objetivos da pesquisa e solicitando autorização para iniciarmos visitas às Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município. Essas visitas foram realizadas com a finalidade de conhecer aspectos gerais do atendimento à criança, averiguando quais práticas de saúde estavam sendo realizadas. Ao mesmo tempo, encaminhamos o projeto de pesquisa à Comissão de Normas Éticas em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, obtendo parecer favorável. Assim sendo, após esse primeiro contato, selecionamos duas UBS com base nos seguintes critérios de inclusão: ter enfermeiro, auxiliar e técnico de enfermagem; utilizar o sistema de agendamento; ter setor de vacinação; realizar coleta para o teste do pezinho; ter grande demanda de clientes na área de pediatria e possibilitar a utilização de equipamento de filmagem. Compreendemos que esses aspectos conformam um conjunto de situações empíricas com amplas possibilidades de observação referentes ao tema do atendimento de enfermagem no acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da criança em UBS.

A abordagem inicial com as mães foi realizada na área física destinada para sala de espera na unidade de saúde, onde foram explicados, individualmente, os objetivos da pesquisa, dando liberdade para participação e solicitando seu consentimento através de autorização por escrito, tanto das mães como dos membros da equipe de enfermagem.

A observação, através de videogravação, esteve centrada nas atividades de enfermagem realizadas com as crianças agendadas, nas duas UBS escolhidas, e na captação das falas entre os trabalhadores de saúde e as mães e familiares das crianças atendidas. Os setores de observação foram: sala de vacinação, sala de pré e pós-consulta e sala de realização da coleta do teste do pezinho. A finalidade dessa observação foi caracterizar e procurar compreender em que se constitui atualmente o atendimento de enfermagem na atenção básica à saúde da criança, na tentativa de apreender as especificidades do cuidado de enfermagem à criança para além de referências técnicas.

No papel de observador, a identidade do pesquisador e os objetivos do estudo são relatados desde o início e, nessa posição, podemos ter acesso a uma variedade de informações, contudo aceitamos o controle do grupo sobre o que será ou não tornado público pela pesquisa(8). A observação, neste estudo, não foi estruturada a priori, e sim consistiu em uma observação livre, com o objetivo de captar a realidade empírica, através de filmagens em momentos individuais e grupais sobre cenas de atendimentos no cotidiano das duas UBS.

Utilizamos uma câmera fixa sob um tripé, sem operador presente, na maioria dos momentos, em sessões diárias, para registrar o atendimento às crianças menores de 5 anos de idade. As características do ambiente, do momento do atendimento e da demanda de crianças definiram os focos da câmera: a maca, a balança, o armário de medicamentos, a escrivaninha e as cadeiras do trabalhador de saúde e das mães. O número de dias, períodos, duração, horários e locais das filmagens foram determinados pela rotina das UBS e pela observação do pesquisador, assegurando a reincidência de informações e situações empíricas e contemplando o objeto de estudo. A filmagem era interrompida quando não autorizada. A coleta de dados empíricos se deu no mês de março de 2000 e teve a duração de dez dias, subdivididos em dois para a sala de coleta do teste do pezinho, quatro para as salas de pré e pós-consulta e quatro para a sala de vacinação. O total da observação através das filmagens foi de quarenta horas.

Para a análise das atividades observadas, utilizamos a transcrição integral do registro das falas, identificando gestos, comportamentos, habilidades para com a criança e a mãe ou acompanhante. Também foi possível apreender as seqüências das ações e a interação entre os trabalhadores de saúde e a clientela. Após o registro minucioso do vídeo transcrito, foram selecionados, no fluxo de eventos, os momentos mais significativos para a análise do atendimento de enfermagem à criança. Nesta investigação, a transcrição detalhada e a inspeção qualitativa repetida permitiram descrever o ambiente de atendimento, os indivíduos que prestavam a assistência, os instrumentos de trabalho, a utilização das salas e, principalmente, o enfoque da comunicação e das relações estabelecidas, aspectos esses de extrema importância para o estudo e reflexão da atenção à saúde da criança.

4 Considerações finais Neste estudo, foi possível exemplificar vários aspectos sobre o registro em vídeo, enfatizando a característica de preservação do registro no tempo, a possibilidade de retornar ao material repensando, elaborando e reelaborando temas que compõem e enriquecem a análise. Por outro lado, podem ser apontadas algumas limitações, decorrentes, principalmente, das características do equipamento utilizado, referindo-se ao fato da câmera ter foco limitado, tendo o pesquisador que fazer opções de amostragem e de amplitude do campo registrado, ou o equipamento ter reduzida qualidade de registro do som, impedindo transcrições exatas de verbalizações. Conhecer as relações que se estabelecem entre a clientela, no caso as mães e crianças, e os serviços de saúde traz possibilidades para repensar e transformar as práticas de saúde na perspectiva da atenção integral à criança. Nas diversas estratégias para utilização de registros em vídeo é importante enfatizar a necessidade de coerência entre objetivos específicos do estudo e a seleção de procedimentos adequados de registro, transcrição e análise.

Particularmente, nesta tentativa de apreender as especificidades do atendimento de enfermagem à criança em Unidade Básica de Saúde, o exame do conjunto das filmagens permitiu captar o encadeamento das ações, comunicações e episódios de trocas sociais que compunham a assistência.


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