O processo de mudança na educação de enfermagem nos cenários uni:
potencialidades e desafios
1 Introdução
O presente estudo configura-se como um recorte dos resultados da pesquisa Os
Projetos UNI como cenário de novas experiências na transformação da educação de
enfermagem1 desenvolvido por pesquisadores do Núcleo de Estudos e Pesquisas
sobre Ensino e Prática de Enfermagem - NUPEPE da Universidade Federal de Minas
Gerais.
Buscamos, no âmbito deste estudo, analisar o processo de mudança na educação de
enfermagem, vivenciado em 4 instituições brasileiras que desenvolveram o
Projeto UNI - Uma Nova Iniciativa na Educação dos Profissionais de Saúde, um
programa político-pedagógico que desde o início da década de 90 incentivou a
construção de inovações na formação dos profissionais de saúde em parceria com
os serviços de saúde e com a comunidade.
O Projeto UNI trazia uma proposta para as instituições de ensino e serviço e
seus atores de abandonarem o paradigma existente na sociedade capitalista, onde
os profissionais são educados para atender as necessidades relativas ao lucro e
à acumulação de capital, para priorizar o carenciamento humano, as necessidades
de saúde da população e a melhoria dos ambientes sanitários, comprometendo-se a
formar profissionais dispostos a zelar pela qualidade de vida em sua
totalidade, não abandonando a valorização dada à construção dialética do
processo saúde-doença(1).
Atualmente, o Projeto UNI vem sendo desenvolvido por 23 instituições de ensino
superior na América Latina, sendo 4 no Brasil: Universidade Estadual de
Londrina, Faculdade de Medicina de Marília, Universidade Federal da Bahia e
Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Os cursos de enfermagem destas 4
instituições constituíram os cenários da pesquisa.
Acreditamos que demonstrar os avanços e obstáculos da mudança curricular,
vivenciados pelas instituições, contribui para uma reflexão analítica e crítica
sobre a transformação na educação de enfermagem, evidenciando lições a seguir e
desafios a superar rumo à implantação das Diretrizes Curriculares.
2 O Contexto da Mudança
As mudanças fazem parte da própria humanidade: o homem vive em constantes
mutações e em cada mudança ele passa por transformações que lhe conferem nova
valorização, novo sentido, novas maneiras de pensar e de agir / interagir com o
mundo e com os outros.
Os fatos, as idéias, os fenômenos podem se alterar tanto de forma gradual e
imperceptível quanto global e estrondosa, fazendo com que a grande preocupação
atual não seja tanto a constatação de problemas, o desejo ou a rapidez das
mudanças, mas a possibilidade do ser humano gerenciar o processo de mudança
através da intervenção social planejada, auto-sustentada e direcionada(2).
As mudanças no mundo ocorrem em torno do desenvolvimento tecnológico,
apontando-se que "a modernidade significa o desafio que o futuro acena
para as novas gerações, em particular seus traços científicos e
tecnológicos"(3:20). Assim, apreende-se que esta nova geração, incluindo
os futuros profissionais de enfermagem, deverá atender aos novos modelos
tecnológicos de produção no campo saúde, priorizando demandas e necessidades do
setor, rompendo com o modelo de organização tecnológica que valoriza mais a
doença para a construção de competências que o torne capaz de compreender e
atuar sobre as histórias de vida das pessoas e de suas interações sociais,
culturais e econômicas.
As demandas e necessidades que orientam as mudanças na formação do pessoal de
enfermagem são determinadas pelas transformações no mundo do trabalho, pelas
crescentes demandas por uma melhor atenção à saúde, pela vigilância à saúde e
pelas críticas ao modelo de ensino tradicional, sustentado nas teorias
centradas em conteúdos e objetivos pedagógicos.
A mudança na formação dos profissionais de saúde encontra sua maior dificuldade
na matriz flexneriana a partir da qual foram conformados e organizados os
cursos da área de saúde, no início do século XX. Neste modelo, o currículo é
concebido e apropriado pelos professores como uma soma e supervalorização de
conteúdos organizados em disciplinas, com excessiva cobertura e abrangência de
informações, onde uma disciplina não se articula nem se relaciona com as outras
e onde as experiências práticas não se relacionam com as teorias que as
sustentam(4,5).
A superação das dificuldades do ensino fragmentado cresce em importância para a
sociedade e para os sujeitos envolvidos no processo educativo como condição
concreta para o enfrentamento da complexidade no campo da saúde. No entanto, na
busca das soluções a seus problemas, pode-se agir de modo a reforçar a ótica do
homem-máquina e a visão simplificada de mundo. Para que supere tal ótica, a
própria educação deve assumir um paradigma teórico-metodológico que admita
contradições, ambigüidades, que aceite conviver com a incerteza e os seus
méritos, que consiga ordenar e fazer sentido do caos e da complexidade, sem
tirar-lhe a dinâmica, sem artificializá-la e simplificá-la(6).
Vivenciamos, no contexto da educação em enfermagem, o movimento de implantação
das Diretrizes Curriculares - DC - que representam uma estratégia fundamental
para atender as necessidades e demandas na formação dos profissionais de
enfermagem. As DC constituem-se em um instrumento norteador do processo de
construção dos Projetos Políticos Pedagógicos das Escolas e devem fornecer as
bases filosóficas, conceituais, políticas e metodológicas do processo de
formação dos enfermeiros.
Implantar as Diretrizes implica em promover mudanças no âmbito educacional que
passa a exigir da escola a criação de espaços e mecanismos para a reflexão e
tomada de decisão coletiva. Estes espaços devem ser detonadores de dispositivos
capazes de mover docentes, estudantes e profissionais do serviço para novas
possibilidades. O movimento de transformação requer, ademais, a disponibilidade
de tecnologias, uma decisão política e institucional e o estabelecimento de
estratégias para a construção das mudanças que devem ter como intencionalidade
novos modos de aprender e de assistir / cuidar.
Assim, este estudo justifica-se pela importância de reconhecer e disseminar
experiências de mudança institucional, na qual a inovação curricular é uma ação
estratégica, demonstrando os avanços e desafios no processo de mudança os quais
podem ser tomados na identificação das dimensões facilitadoras na implantação
das Diretrizes Curriculares.
3 Metodologia
Aceitando o caráter dialético do processo de transformação, na qual está
travada a luta entre os diferentes modelos de ensino, sustentados em diferentes
concepções, optamos por adotar uma abordagem qualitativa ancorada no
referencial teórico-metodológico do Materialismo Histórico-Dialético - MHD(7).
A escolha do MHD como referencial revela uma crença no processo de movimento
que existe permanentemente na sociedade, bem como na construção histórica e na
capacidade de transformação e de superação das contradições através da práxis.
Para captarmos a realidade foram utilizados dados de fonte primária coletados
através da realização de um Grupo Focal - GF -(8,9) em cada cenário, com
duração de três horas e participação, de 27 docentes, 8 discentes, 8
profissionais do serviço e 7 pessoas da comunidade. As falas foram gravadas e
transcritas e posteriormente passaram por análise do discurso(10). Na
apresentação dos resultados deixamos registrados em itálico as Expressões
Chaves (ECH´s), partes ou fragmentos das falas dos sujeitos, contínuos ou
descontínuos que expressam a essência do discurso ou a teoria subjacente,
identificadas por uma letra C e um número (1, 2, 3 ou 4) que indica,
aleatoriamente, os cenários da pesquisa. Os dados de fonte secundária foram
obtidos de relatórios e documentos disponibilizados pelas instituições-cenário
da pesquisa e que subsidiaram a compreensão do fenômeno da mudança na formação
dos enfermeiros em cada uma das instituições.
Antes de iniciarmos a coleta em campo, o projeto de pesquisa foi aprovado no
Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais - COEP / HC
/ UFMG, seguindo as normatizações presentes na Resolução 196/96 da Comissão
Nacional de Ética em Pesquisas. Da mesma forma, as falas dos depoentes foram
gravadas após a concordância e assinatura do Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido.
Procuramos descrever o movimento de mudança na formação das escolas, apontando
os consensos e os dissensos nos achados que caracterizam os pontos comuns do
pensamento e prática dos sujeitos ou a singularidade do processo de mudança em
cada cenário.
4 Analisando a Mudança
Para a análise dos dados orientamo-nos pela caracterização do processo de
mudança em 3 planos: inovação, reforma e transformação(11). O primeiro plano é
a inovação, descrita como pontual, localizada, particular e parcial. No segundo
plano a reforma atinge as relações sociais e o estabelecimento de novos
critérios de convivência entre os sujeitos / atores envolvidos, incluindo,
entre esses, os usuários dos serviços e pessoas da comunidade. O terceiro plano
engloba todo o contexto e a própria sociedade com o reconhecimento da
interdependência entre as mudanças e a reorganização do modelo assistencial,
levando à construção de novos paradigmas e de determinantes histórico-sociais.
Este plano está voltado para a substituição da prática hegemônica e "o
desenvolvimento e utilização de tecnologia apropriada, da articulação
biopsicossocial, da intersetorialidade, a superação da dissociação entre estudo
e trabalho e o controle social." (11:11)
Ao analisar os dados apresentados pelas escolas, buscamos correlacioná-los às
caracterizações do processo de mudança, sem a intenção, contudo, de classificar
e padronizar as escolas. Assim, ao percebermos o movimento de construção de
novos modelos no ensino da enfermagem, a partir dos dados, procuramos descrever
os pontos marcantes do movimento de mudança e que poderiam ser tomados como os
que determinam ou caracterizam o processo como de inovação, de reforma ou de
transformação.
Percebemos que os 4 cenários estão em movimento_de_mudança dos seus modelos de
ensino, com maior ou menor grau, caracterizando as etapas do processo de
mudança. Os sujeitos descrevem o processo de mudança como algo gradual e
contínuo. Afirmam que têm duas palavras que caracterizam muito o curso, que
são: movimento e dinamicidade (C1). Os participantes do GF reconhecem que é
preciso tempo para ser absorvido o dinamismo dos processos de mudança pelos
sujeitos e pelas instituições e para identificar as questões a serem inovadas
em um contínuo processo de pensar e agir, pois não é da noite para o dia que a
gente vai deixar uma prática antiga para adotar uma nova (C1), e a
transformação realmente é uma coisa muito lenta(C3).
Apesar disso, foram relatados avanços significativos, principalmente no que se
refere à iniciativa de se buscar um modelo de ensino que supera a racionalidade
técnica, ao adotar uma proposta crítico-reflexiva, mudando a forma de pensar, a
forma de conversar com o aluno, a forma no trabalho hospitalar(C1). Os
participantes do GF descrevem que as transformações ocorreram não só na sua
visão pedagógica, curricular, mas também no pensamento das pessoas que fazem o
curso(C3).
Considerando a riqueza, as múltiplas culturas institucionais e a consistência
dos modelos hegemônicos, podemos inferir que os processos de mudança devem
responder às características do contexto, da história e da correlação das
forças específicas, sem deixar de considerar que há limitações e dificuldades
para se processarem tais mudanças. Apreendemos que é fundamental mapear os
fatores que facilitam os processos de mudança e potencializá-los e os fatores
que os obstacularizam, no sentido de superá-los através de ações estratégicas.
É consenso entre os participantes que a mudança traz consigo sofrimento e medo
e envolve resistências e conflitos. Os participantes dos GF relataram que esse
caminhar tem muitos conflitos, muitas dificuldades, muitas angústias(C1), pois
os sujeitos têm temor de dar o passo e ao mesmo tempo querem promover as
mudanças(C4).
Existe um grupo de docentes que faz resistência a novas práticas que, segundo
os participantes do GF deve ser creditado ao medo do novo e de perder espaços
ou conteúdos nas suas disciplinas. Ao mesmo tempo, os sujeitos vivem conflitos
ao perceberem que suas práticas já não são coerentes com as exigências do mundo
moderno.
Conflito pode ser entendido como emergência de confrontos entre sujeitos
sociais portadores de diferentes projetos, objetivos ou perspectivas. Além dos
conflitos referentes à contradição capital e trabalho, há conflitos decorrentes
de dilemas como disciplina organizacional versus especialização profissional e,
além dos conflitos explícitos, existe a microconflitividadedos sujeitos sociais
com alta capacidade de resistência(11).
Assim, evidenciamos que a adoção de um novo paradigma educacional envolve
resistências e conflitos. Conflito pelo confronto de distintas e, às vezes,
contraditórias concepções e as resistências que emergem do dilema de
posicionar-se diante de uma ou outra concepção ou de construir uma própria.
Isso pode ser percebido no estudo quando os participantes dos GF apontam a
necessidade de mudança nos modelos de ensino sustentados nos modelos
assistenciais que incorporam o paradigma da produção social da saúde.
Contraditoriamente, os participantes, especialmente os docentes, relatam a
preocupação marcante com a questão das técnicas no ensino da enfermagem.
Reconhecem a dificuldade que apresentam em trabalhar com as metodologias ativas
de ensino e implementar a interdisciplinaridade na construção da articulação do
conhecimento, prevalecendo, portanto, nos seus processos de trabalho o agir
pautado na atomização e na fragmentação do conhecimento, o que não confere ao
cuidado o seu caráter de integralidade.
Neste sentido, apreendemos que o processo de mudança é complexo e para que
ocorra é preciso que os atores e os coletivos das escolas tomem consciência
dessa necessidade, e que tenham força interior suficiente para abandonar velhos
hábitos e enfrentar o medo do desconhecido. Assim, pode-se inferir que todo
processo de mudança traz consigo uma certa ansiedade, o que contribui para a
superação dos conflitos. O processo constitui-se, portanto, de idas e vindas em
um movimento dinâmico e complexo com sucessivas aproximações que permitem ou
permitirão uma nova qualidade no processo ensino-aprendizagem. Portanto, deve
estar sustentado em ações estratégicas baseadas em relações horizontais e na
criação de espaços participativos e de reflexão crítica.
Desta forma, compreendemos que a adoção de uma concepção crítico-reflexiva
facilita a implementação de um cuidar consoante e congruente com o rompimento
do modelo hegemônico centrado na doença, para construir um pensar, um fazer e
um ser sustentado na produção social do processo saúde-doença.
É possível captar que a partir da superação de resistências e de conflitos se
construa a participação dos docentes, dos estudantes, dos profissionais de
serviço e da comunidade que é requerida em efetivo processo de mudança.
Uma das estratégias utilizadas nos 4 cenários para se concretizar a mudança foi
a capacitação dos atores envolvidos. Nos discursos dos participantes dos GF foi
captado que a realização de assessorias e consultorias externas foi um fator
que promoveu discussões e permitiu uma maior compreensão do processo de mudança
pois, em geral, os sujeitos apresentam vontade de mudar, mas não valorizam sua
experiência(C4).
Entretanto, os participantes do GF apontam que é necessário maior investimento
e sensibilização para que os docentes e estudantes possam de fato compreender e
implementar as mudanças. Ademais, emerge nos discursos a existência de entraves
institucionais que dificultam a operacionalização de novas propostas.
No cenário 1, a busca da mudança se deu pela incorporação das diretrizes do
Projeto UNI nas discussões coletivas e na capacitação dos docentes e dos
profissionais do serviço como ação estratégica.
Os documentos fornecidos pelo cenário 2 revelam que o ideário do Projeto UNI
foi incorporado à proposta de mudança curricular, impulsionando a adoção de um
novo referencial teórico metodológico no curso e, conseqüentemente,
potencializou o movimento de mudança. Neste cenário foram vivenciados momentos
institucionais peculiares que representaram entraves à mudança, imprimindo
maior lentidão ao processo por aumentar a burocracia na efetivação das
propostas.
No cenário 3, a presença das idéias do Projeto UNI é reiteradamente citada como
fator facilitador do processo de mudança, uma vez que proporcionou oportunidade
de discussões quanto à forma do fazer e o fazer diferente(C3). É citado pelos
participantes o efeito positivo da ênfase dada ao coletivo e social e o
estímulo na pesquisa e na aquisição de equipamentos(C3). Assim, os
participantes reconhecem a influência dos pressupostos do Projeto UNI porque o
processo ensino-aprendizagem exige a incorporação de novas tecnologias e isso
só está ocorrendo porque esses alunos estão bebendo de alguma experiência do
UNI(C3).Entretanto, neste cenário, os participantes do GF referem a tímida
inserção do curso de enfermagem nas atividades do Projeto, justificadas em
parte pela falta de envolvimento de alguns docentes e pela restrição das
atividades em determinada área geopolítica da cidade.
No cenário 4, os participantes apontam como fator propulsor das mudanças a
contribuição do Projeto UNI, permitindo o envolvimento da universidade com a
comunidade e o serviço, um incremento bastante grande na questão de formação e
da integração docente-assistencial(C4).As mudanças referidas no cenário 4
voltam-se à transformação na formação acadêmica de maneira que o estudante
formado possa ser um sujeito autônomo da sua aprendizagem(C4). Concebem que as
mudanças estão ocorrendo não somente nas ações e relações dos estudantes e
docentes e apontam que não basta mudar a grade curricular, o projeto
pedagógico, é preciso a transformação do referencial(C4).
Os dados obtidos permitiram reconhecer que as escolas que participam do Projeto
UNI contaram com apoio técnico e financeiro de um programa de inovação do
ensino que propiciou um trabalho conjunto entre as carreiras de Medicina e
Enfermagem em todas as instituições, e de Odontologia, Nutrição e Farmácia em
algumas. Este fator parece de muita importância, como mecanismo que permite a
ampliação das discussões sobre os processos de inovação, criando novos espaços
e movimentos dentro das instituições.
O apoio financeiro foi reconhecido pelos participantes dos GF como um fator
positivo para a circulação de idéias e de novos conhecimentos, realização de
eventos de capacitação, consultoria, aquisição de equipamentos e produção de
material educacional. Outro aspecto apontado como decisivo para energizar as
mudanças, foi a parceria com a comunidade, o que proporcionou a abertura de um
espaço de participação e inserção dos atores para pensarem e agirem sobre a
realidade social.
Apesar de podermos identificar pontos positivos no processo de mudança nos 4
cenários, há lacunas que ainda precisam ser preenchidas para se concretizar a
superação do desafio_às_mudanças dos modelos tradicionais de ensino. Sem a
pretensão de tratá-los como semelhantes ou emparelhados, pode-se indicar que
independente do grau de avanço que cada instituição cenário do estudo
apresenta, existem elementos presentes em todos que podem ser compreendidos
como dificultadores das mudanças.
No cenário 1, os participantes do GF apontam como dificuldades a questão do
recorte do conhecimento e questões relacionadas á avaliação(C1).Explicitam a
necessidade de se aprimorar os modelos avaliativos do processo ensino
aprendizagem e da própria instituição. Reconhecem a necessidade de assessorias
mais pontuais para concretizar o novo modelo de ensino.
No cenário 2, os participantes apontam a necessidade de maior contigente de
docentes para trabalhar no currículo integrado(C2)e a capacitação dos docentes,
estudantes e profissionais de serviço para apoiarem e implementarem o processo
de mudança.
No cenário 3, os participantes do GF assinalam que está havendo muitas
dificuldades: entre aluno e professor, departamento e serviço, rede de serviço,
ensino de saúde e comunidade(C3). Foi citada pelos participantes do GF a
necessidade de maior capacitação dos atores (docentes, estudantes e
profissionais do serviço) para refletirem e promoverem o processo de mudança,
uma vez que a maior dificuldade apontada nos discursos é a resistência ao
movimento de mudança.
No cenário 4, os participantes ainda não conseguem visualizar mudanças efetivas
no ensino e afirmam que as pessoas têm as frases feitas dessa mudança(C4), mas
não conseguem perceber, na realidade, este entrosamento político e social e
esse engajamento como sujeitos da mudança(C4).
Ao associar a análise dos documentos fornecidos pelas instituições e os
discursos dos sujeitos, podemos inferir que a inovação, a reforma ou a
transformação ocorreram em maior ou menor grau, conforme a direcionalidade
político-pedagógica e administrativa que cada instituição imprime ao processo
de mudança, descrevendo o que tem sido feito com vistas à construção de
propostas pedagógicas potencializadas pela adesão de docentes, estudantes,
profissionais de serviço e representantes da população.
Podemos, assim, afirmar que dos 4 cenários, 2 (Cenário 3 e 4) estão na etapa de
reforma e 2 (Cenário 1 e 2) fizeram mudanças substanciais com configuração dos
seus Projetos Políticos-Pedagógicos sustentados em novos paradigmas de saúde e
de educação, caracterizando a transformação em curso.
Ademais, os resultados condizem com as afirmações de que a implementação do PPP
não ocorre somente por ter sido aprovado nas instâncias burocráticas das
instituições, mas há que se valorizar seu caráter processual, onde as tensões
entre o velho e o novo estarão convivendo e se contrapondo a todo momento,
avançando nas inovações que se tornarem possíveis de se viabilizar na prática
educativa e da atenção à saúde(12).
Reconhecemos que a busca por este processo é incipiente e que necessita de um
maior suporte teórico, metodológico, de incentivo institucional, incluindo o
financeiro. Contudo, o esforço realizado pelas 4 Escolas representa uma nova
atitude pedagógica de adoção de um princípio fundamental para os processos de
transformação das práticas institucionais no campo da formação dos
profissionais de enfermagem.
Neste processo devemos considerar, também, que o rompimento com velhas práticas
é feito através de movimentos que, somados, podem se constituir em mudanças
significativas, ciente de que "o novo, contudo, não é necessariamente
melhor que o velho, que o antigo: depende de uma direção, de uma orientação
ético-política, de uma filosofia que embase a inovação." (13:231)
Assim, as experiências das escolas cenários da pesquisa podem ser tomadas como
exemplos de iniciativas na reorientação da formação profissional, ancorada em
referenciais educativos e assistenciais, sustentados em princípios crítico-
reflexivos e da participação ativa dos sujeitos na construção do processo de
mudança.
5 Considerações Finais
No âmbito deste estudo, podemos afirmar que o processo de mudança, dinâmico e
complexo, é influenciado pelas condições e contextos de cada instituição, mas
de modo geral apresentam experiências de uma nova subjetivação dos docentes e
estudantes tendo como conseqüência mais valiosa a construção de sujeitos
capazes de transformar-se e de transformar o ambiente acadêmico e da atenção à
saúde, no sentido de validar e implementar modelos baseados em referencias
críticos e reflexivos.
A adoção, pelas Escolas, de novas metodologias gerou resistências e conflitos
devido ao receio de romper com o paradigma tradicional da educação. Entretanto,
os participantes dos GF afirmam a necessidade de mudança, uma vez que as
práticas tradicionais não são coerentes com as exigências do mundo do trabalho
e com a realidade do setor saúde do País. Aponta-se a superação das
resistências e dos conflitos, utilizando-se a negociação, a pactuação e a
indução, para viabilizar a participação coletiva no processo de mudança da
educação de enfermagem.
Concluimos que a integração entre os diferentes atores nos cenários de ensino e
de atenção faz-se necessária como um sinalizador dos rumos a serem seguidos na
transformação da formação e exige a adoção de metodologias ativas de
aprendizagem e dos enfoques interdisciplinar e multiprofissional que considere
o aluno como sujeito social na construção do conhecimento.
Um elemento fundamental para o movimento de mudança institucional, identificado
no estudo, é a sustentabilidade do processo permanente e de contínuo
aprofundamento das transformações. A sustentabilidade deve considerar os
aspectos institucionais, incluindo as alterações político-administrativas, as
normas e regulamentos do controle e avaliação institucional e do processo
ensino-aprendizagem. É necessário, também, garantir a capacitação de atores
institucionais - docentes, discentes, profissionais do serviço - para a
condução das transformações. Nos cenários da pesquisa, essa capacitação
potencializou as competências na condução das transformações no sentido de
garantir a coerência entre o projetado e o construído, respaldando-se na ação /
reflexão / ação e na revisão contínua dos conceitos e dos métodos empregados.
No movimento de mudança há que se considerar, ademais, a complexidade do
processo e o fato de ocorrerem em terrenos de interesses múltiplos e da
imprevisibilidade. Seu desenvolvimento e sustentabilidade dependeram e dependem
da capacidade de intervenção e da mobilização dos diferentes atores e segmentos
institucionais. Compreender a dinâmica e a profundidade do processo de mudança
na educação de enfermagem, respeitando as potencialidades e os desafios é
aceitar que "mudar é difícil mas é possível e urgente."