Atitudes de enfermeiros frente as habilidades de identificação para ajudar o
paciente alcoolista
INTRODUÇÃO
Globalmente, o álcool está entre os mais importantes fatores de risco para
deficiências, morbidade e mortalidade da população e o alcoolismo configura-se
como uma das dez doenças mais incapacitantes em todo o mundo(1). Além disso, o
consumo do álcool está associado a uma variedade de consequências sanitárias e
sociais adversas. Existindo evidências dos efeitos nocivos do álcool sobre
muitas enfermidades, como a cirrose hepática, enfermidades mentais, vários
tipos de câncer, pancreatite e acometimentos fetais na gestação, relacionando-
se, ainda, estreitamente com acontecimentos de efeitos sociais adversos, como
mortes e acidentes por dirigir embriagado, aumento da agressividade, rupturas
familiares e redução da produtividade(2).
No Brasil, o II levantamento domiciliar sobre o uso de drogas psicotrópicas(3)
apontou que o uso de álcool pela população atinge uma porcentagem de 74,6%. O
mesmo levantamento indicou que a estimativa de dependentes de bebidas
alcoólicas no país é de 12,3%, ou seja, mais de 20 milhões de pessoas.
Considerados esses percentuais e as diversas consequências dessa problemática
para a saúde dos indivíduos e da população é possível entender as elevadas
taxas de pacientes com problemas relacionados ao álcool e alcoolismo ocupando
leitos de unidades clínicas, cirúrgicas ou de emergência de hospitais gerais do
país(4-5), a isso, deve-se aliar o fato de que na maioria das vezes chegam a
essas unidades pacientes que já se encontram em um estado avançado da doença,
uma vez que não se constituíram alvo de medidas preventivas em outros níveis de
atenção à saúde(6).
Nas unidades hospitalares, é provável que o maior contato do paciente
alcoolista no período de internação ocorra com o enfermeiro e sua equipe.
Assim, as atitudes que o profissional apresentar frente ao mesmo poderão afetar
diretamente o curso do tratamento subsequente, uma vez que as atitudes e
percepções do enfermeiro a respeito do paciente influenciam na resposta ao
tratamento, tanto em desordens orgânicas como psíquicas(7). Além disso, quando
se trata de assistir pacientes com problemas relacionados às substâncias
psicoativas três fatores são fundamentais para o exercício da enfermagem nesse
contexto, quais sejam: atitudes positivas, conhecimentos específicos sobre a
doença e suas peculiaridades e o desenvolvimento de habilidades para atuação
com essa clientela(8).
A revisão da literatura tem mostrado que cuidar de pacientes com problemas
relacionados ao álcool e outras drogas nem sempre constitui tarefa fácil para o
enfermeiro. Atitudes negativas frente a essa clientela, pouco preparo e falta
de conhecimentos e habilidades adequadas para prestar cuidado a esses pacientes
são frequentemente apontados como explicação para essa situação(9). No entanto
apesar da magnitude desse problema para a enfermagem, no Brasil o mesmo só
começou a despertar interesse dos pesquisadores no final de 1990, o que
ocasionou uma lacuna no conhecimento sobre a temática até então. Fato que não
se observa na literatura internacional em que os estudos datam de mais de três
décadas(8).
Estudo(10) objetivando identificar as atitudes de enfermeiras de um hospital
norte americano, evidenciou que as mesmas acreditavam que: fatores emocionais
são importantes causas do alcoolismo; o alcoolista é incapaz de controlar sua
ingestão alcoólica; bebedores sociais podem ser alcoolistas, e que o álcool é
capaz de causar dependência. Esses mesmos enfermeiros estavam ainda menos
dispostos a crer que: o alcoolista não quer se recuperar e que são pessoas
fracas. Pesquisa(11) realizada para identificar as atitudes de enfermeiros
frente ao cuidado de pacientes alcoolistas, constatou que as atitudes em
relação aos mesmos influenciaram significativamente no atendimento clínico a
esses pacientes. Essa pesquisa encontrou ainda associação significativa entre o
relato de auto eficácia do profissional e as atitudes positivas frente ao
paciente.
Estudo realizado entre enfermeiros suecos(12), para avaliar mudanças nas
atitudes frente a prevenção relacionada ao álcool entre os mesmos, encontrou
que mais de 60% dos participantes esperavam que os pacientes reagissem
negativamente quando questionados sobre seus hábitos alcoólicos. Após um ano de
rastreamento e intervenções frente ao problema, apenas 10% dos enfermeiros
relataram experiência de reações negativas dos pacientes. Além disso, a maioria
deles considerou fácil e muito fácil manejar esse tipo de paciente revelando
atitudes positivas frente ao mesmo. Estudo conduzido em Hong Kong(13)
identificou as atitudes de enfermeiros de sala de emergência frente ao paciente
alcoolista evidenciando que esses profissionais tendiam a apresentar atitudes
negativas frente os doentes alcoólicos. Os autores concluíram ainda falta de
habilidades e conhecimentos dos enfermeiros no que se refere ao tema álcool e
alcoolismo.
No Brasil alguns estudos vêm sendo desenvolvidos sobre o tema, sobretudo a
partir do início da década de 2000(14-17). Pesquisa(14), que verificou as
atitudes de enfermeiros de um hospital geral brasileiro, quanto à sua
disposição para o tratamento ou punição de pacientes alcoolistas, evidenciou
que os participantes consideravam o alcoolismo uma doença e acreditavam que
esses pacientes deveriam receber tratamento médico e consulta psiquiátrica. Os
autores concluíram que os enfermeiros acreditavam que os alcoolistas tratavam-
se de pessoas fisicamente doentes, devendo submeter-se a tratamento médico.
Pesquisa(15) realizada com 370 enfermeiros e estudantes de enfermagem
brasileiros, constatou que os mesmos percebiam os alcoolistas como doentes e se
sentiam recompensados no trabalho com esses pacientes, referente às habilidades
para manejar com êxito os problemas do alcoolista, prevaleceram as atitudes
neutras e os enfermeiros se percebiam pouco aptos para prestar ajuda a esses
pacientes. Outro estudo brasileiro(16), encontrou sentimentos de embaraço e
desconforto dos enfermeiros ao trabalhar com pessoas que têm problemas com a
bebida, esses enfermeiros revelaram ainda que preferiam não trabalhar com
alcoolistas e que tinham dificuldade em falar sobre o problema com esses
pacientes.
Pesquisa(17), que verificou as atitudes de 196 enfermeiros frente ao álcool e
ao alcoolismo, evidenciou que os enfermeiros consideravam as bebidas alcoólicas
prejudiciais a saúde e que beber com moderação oferece riscos ao indivíduo. Os
resultados desse estudo revelaram ainda, que os enfermeiros apresentavam
dificuldade na aceitação do beber como um direito da pessoa. Estudo(18) com
objetivo conhecer as concepções e as de atitudes de enfermeiros de serviços de
atenção primária à saúde frente ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista,
concluiu que não existiam diferenças significativas entre as atitudes desses
enfermeiros, quando comparadas aos resultados encontrados entre enfermeiros de
serviços hospitalares, esse estudo evidenciou ainda que os enfermeiros eram
permissivos ao uso moderado do álcool, no entanto rejeitavam o alcoolismo,
concebendo-o como uma doença que pode ser fatal e tendiam a associá-lo à
vontade da pessoa, revelando a influência do conceito moral em suas concepções
e atitudes.
Considerando os dados epidemiológicos sobre a prevalência dos problemas
relacionados ao álcool e ao alcoolismo na população brasileira, o que repercute
no aumento da demanda de internações em unidades de hospitais gerais em razão
dessa problemática, e que as atitudes e habilidades do enfermeiro constituem
elementos capazes de interferir no cuidado a essa clientela. Este estudo
objetiva verificar as atitudes de enfermeiros de um hospital geral frente às
habilidades de identificação para ajudar os pacientes alcoolistas. Segundo
teorias clássicas(19), atitudes são definidas como predisposições para
responder a determinada classe de estímulos com certa classe de respostas,
desse modo, uma atitude pode ser definida como uma predisposição adquirida e
duradoura para agir sempre do mesmo modo diante de uma determinada classe de
objetos, ou um persistente estado mental e/ou neural de prontidão para reagir
diante de uma determinada classe de objetos não como eles são, mas sim como são
concebidos.
METODOLOGIA
Tratou-se de um estudo descritivo-exploratório sobre as atitudes de um grupo de
enfermeiros de um hospital geral frente às habilidades de identificação para
ajudar os pacientes alcoolistas. A amostra do estudo constituiu-se de 171
enfermeiros alocados em dezoito unidades de internação de um hospital
universitário de Ribeirão Preto (SP).
O instrumento de coleta de dados foi a subescala III "Inclinação para
identificar e habilidades para ajudar pacientes alcoolistas" que compõe a
Escala The Seaman Mannello Nurse's attitudes toward alcohol and alcoholism
Scale. Esta escala foi desenvolvida e validada nos Estados Unidos da América
(19) e já foi utilizada no Brasil(15), sendo composta de 30 itens, divididos em
cinco subescalas, trata-se de um instrumento específico para mensurar atitudes
de enfermeiros frente ao álcool e ao alcoolismo.
A subescala III da Seaman Mannello Nurse's attitudes toward alcohol and
alcoholism Scale é composta por seis itens dos quais quatro (Alcoolistas não
estão interessados em sua própria felicidade; Alcoolistas respeitam seus
familiares; Os alcoolistas querem parar de beber e a maior parte dos
alcoolistas não gosta de ser alcoolista) referem-se às atitudes relativas ao
paciente alcoolista, e os demais (Os alcoolistas que não obedecem às instruções
dos enfermeiros devem apesar disso ser tratados e eu posso ajudar o paciente
alcoolista independente do fato dele parar ou não de beber), avaliam as
atitudes frente às habilidades de identificação para ajudar tais pacientes.
Conforme as autoras da escala (19), enfermeiros com altos escores nessa
subescala tendem a ver o alcoolista como cidadão que pode ser ajudado a retomar
uma vida normal, além disso, esses profissionais são propensos a acreditar que
o alcoolista quer ser curado e o enfermeiro pode ajudá-lo a atingir esse
propósito. Os enfermeiros que apresentam escores baixos tendem a acreditar que
alcoolistas são egoístas e não querem ser ajudados. Esses profissionais estão
propensos a considerar que, caso o paciente não tente parar de beber o
enfermeiro não deve ajudá-lo.
Os dados foram coletados nos locais de trabalho dos sujeitos, para isso, o
instrumento com um questionário de informações sócio-demográficas foi entregue
em envelope lacrado e foi solicitado que não se identificassem nos
questionários a fim de garantir sua privacidade. Cada uma das seis questões que
compõe a subescala III podia ser respondida por meio de uma escala do tipo
likert de cinco pontos, na qual os enfermeiros deveriam expressar sua opinião
sobre cada afirmação de acordo com o seguinte esquema: (1= Discordo totalmente;
2 = Discordo; 3 = indiferente; 4 = Concordo; 5 = Concordo totalmente). O tempo
de preenchimento dos questionários não ultrapassou 20 minutos.
Para a análise dos dados construiu-se um banco de dados no EPINFO, programa da
Organização Mundial da Saúde (OMS), de domínio público, que possibilitou
realizar uma análise descritiva das informações sócio-demográficas da população
estudada, bem como das respostas dadas à subescala III, inclinação para
identificar e habilidades para ajudar pacientes alcoolistas. Nesta última,
atribuiu-se um e dois pontos para categorias de respostas desfavoráveis ao
item; três para categorias intermediárias e quatro e cinco pontos para
categorias favoráveis.
O cálculo dos escores mínimo e máximo que poderiam ser obtidos nessa subescala,
seis e trinta pontos respectivamente, resultou em um ponto médio da escala
igual a dezoito. Após estabelecer o ponto médio, os resultados obtidos foram
interpretados de acordo com as definições operacionais propostas pelas autoras
da escala(20). Dessa forma, escores inferiores ao ponto médio (18), foram
considerados indicativos de atitude negativas e os escores superiores a esse
valor foram interpretados como indicativo de atitude positiva. A média geral
dos escores obtida pelos enfermeiros na subescala III foi determinada pela
análise dos dados em conjunto no programa EPINFO. Para apresentação dos
resultados optou-se por agrupar as alternativas, concordo muito, concordo,
indiferente, discordo e discordo muito, em três alternativas: concordo;
indiferente; e discordo, o que possibilitou maior consistência à análise.
Os aspectos éticos observados na realização dessa pesquisa foram à aprovação
do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, e a
assinatura do Termo de Consentimento Livre Esclarecido pelos sujeitos que
participaram do estudo.
RESULTADOS
Caracterização dos sujeitos
Os sujeitos do estudo caracterizaram-se como indivíduos do sexo feminino (88%),
com idade média de 32 anos, solteiros, formados entre um e cinco anos (46%).
Quanto à posição no serviço de enfermagem da instituição, cinco (2,9 %) eram
diretoras de seção; quinze (8,8%), enfermeiros chefes; dois (1,2%) enfermeiros
encarregados e 149 (87,1%) denominaram-se enfermeiros de turno. Do total da
amostra, 51% revelou já ter tido experiência profissional com alcoolistas em
suas unidades de trabalho.
As atitudes frente às habilidades de identificação para ajudar os pacientes
alcoolistas
Os quatro primeiros itens da subescala III tratam das atitudes dos enfermeiros
no que se refere a como identificam esse paciente: 01 - alcoolistas não estão
interessados em sua própria felicidade; 02 - alcoolistas respeitam seus
familiares; 03 - Os alcoolistas querem parar de beber e 04 - A maior parte dos
alcoolistas não gosta de ser alcoolista. Os resultados obtidos nesses itens
evidenciaram que 66% desses enfermeiros não endossam a ideia de que o
alcoolista é um indivíduo que não se interessa pela própria felicidade,
resultado consistente com aquele observado no item seguinte em que 48,5% dos
entrevistados concordaram que a maioria dos alcoolistas não gostam de ser como
são. Quando avaliam o fato do alcoolista ser uma pessoa que deseja parar de
beber, mais da metade dos enfermeiros (52%), respondeu ser indiferente a esse
item, demonstrando que não estavam bem certos dessa determinação por parte do
paciente. Relacionado às questões familiares 66% dos enfermeiros identificaram
o alcoolista como alguém que não respeita seus familiares.
Os resultados observados frente aos itens que avaliam as atitudes dos
enfermeiros com relação à identificação do alcoolista, indicam que o mesmo é
identificado por esses enfermeiros como uma pessoa que está interessada na
própria felicidade e que não gosta de ser como é, no entanto, acreditam que o
alcoolista não respeita seus familiares, e não apresentam uma atitude definida
com relação ao fato de o alcoolista querer parar de beber.
Os dois itens seguintes da subescala III Inclinação para identificar:
habilidade para ajudar pacientes alcoolistas: 05 - Os Alcoolistas que não
obedecem às instruções dos enfermeiros devem apesar disso ser tratados; 06 - Eu
posso ajudar o paciente alcoolista independente do fato dele parar ou não de
beber, referem-se às atitudes do enfermeiro no que diz respeito às habilidades
para ajudar o paciente. De acordo com os resultados obtidos, os enfermeiros do
estudo apresentam atitudes positivas no que se refere às habilidades para
ajudar essa clientela, o que pode ser evidenciado quando se analisa a
distribuição das respostas dos enfermeiros frente aos dois itens que avaliam
suas atitudes frente a essa dimensão. Para 88,3% dos enfermeiros do estudo,
mesmo que o alcoolista desobedeça às instruções dos mesmos, devem ser tratados
(Tabela_1). Quanto a continuar ajudando o paciente alcoolista mesmo que este
não consiga manter-se abstêmio, 67,8% dos enfermeiros do estudo mostraram-se
favoráveis a esse item.
A análise em conjunto dos escores obtidos pela amostra do estudo resultou numa
média geral de 20,17. Esse resultado é consistente com os verificados na
análise individual dos itens onde evidenciou-se o predomínio de concordância
dos sujeitos com os itens positivos da subescala e de discordância com os itens
negativos, confirmando a tendência de atitudes positivas dos enfermeiros frente
ás habilidades de identificação para ajudar o alcoolista, pois, a média
observada é superior àquela estabelecida como ponto de corte para avaliação das
atitudes, conforme ilustram os dados do Quadro_1.
DISCUSSÃO
Os resultados do presente estudo refletem as atitudes de um grupo de
enfermeiros de um hospital geral frente às habilidades de identificação desses
profissionais para ajudar o paciente alcoolista e têm implicações para a
assistência de enfermagem a essa população, visto que o enfermeiro desempenha
importante papel no tratamento do paciente alcoolista(21), pois este encontra-
se frequentemente sob seus cuidados em unidades hospitalares, quer pelo
alcoolismo propriamente dito, quer pelas patologias dele decorrentes(8).
A média geral das respostas dadas à subescala III (20,17) revela que os
enfermeiros do estudo() tendem a apresentar atitudes positivas frente às
habilidades de identificação para ajudar pacientes alcoolistas. Segundo as
autoras do instrumento(20), este resultado indica que esse grupo de enfermeiros
tende a ver o alcoolista como um cidadão, que deseja ser curado e, portanto,
merecedor de ajuda do profissional para atingir esse propósito, além disso, os
enfermeiros consideram-se aptos para oferecer tal ajuda. Esses resultados são
considerados satisfatórios, pois, segundo a literatura específica, o fato dos
alcoolistas serem percebidos como cidadãos influencia positivamente no modo
como o enfermeiro irá atuar com esse indivíduo. Assim o profissional com esse
tipo de percepção tenderá a aceitar o alcoolista como alguém que padece de uma
doença, concebendo-o como doente, procurando estabelecer com ele uma relação de
ajuda, sem cobranças e punições, auxiliando-o a atingir seus propósitos de
recuperação(14) em detrimento de posturas rígidas e punitivas. Por outro lado,
ao apresentar essa atitude, o enfermeiro poderá contribuir para aliviar a
desesperança, culpa e desânimo do paciente auxiliando-o a aceitar melhor o
tratamento(12).
No que se refere à identificação do paciente alcoolista, os enfermeiros deste
estudo identificam-no como um indivíduo que se interessa pela própria
felicidade. O resultado demonstra atitudes mais positivas dos enfermeiros do
que o encontrado em estudos semelhantes(15) no qual o percentual de enfermeiros
favoráveis à questão não atingiu 40%, ou em outros(8), em que os enfermeiros
consideravam o alcoolista como alguém que só estava interessado em curtir a
vida, sem se preocupar com o que aconteceria depois. Os enfermeiros ainda
identificaram o alcoolista como uma pessoa que não respeita seus familiares,
resultado que é consistente com outros estudos(15). Esta concepção pode estar
alicerçada no conhecimento das repercussões sociais do uso prejudicial do
álcool, divulgadas cotidianamente pelos meios de comunicação e reforçadas na
literatura(2) que evidencia serem cada vez mais evidentes em contextos nos
quais o álcool se faz presente, tal como o aumento da agressividade, o que
acarreta, dentre outros, no aumento da violência doméstica, situações de
conflitos interpessoais e rupturas familiares. Ainda a esse respeito, ao pensar
que o alcoolista não respeita seus familiares, autores(22) argumentam que essa
atitude parece estar impregnada pela explicação do alcoolismo visto como um
desvio moral, com a compreensão de que um adicto só valoriza a substância que
usa, o que pode em última análise denotar desrespeito com as pessoas com as
quais convive.
Quanto às habilidades de identificação para ajudar o paciente alcoolista, os
enfermeiros do estudo demonstram ser favoráveis a ajudá-lo, por acreditarem que
mesmo que o alcoolista não consiga interromper o uso do álcool e não siga as
orientações dadas pelos mesmos, devem seguir sendo assistidos, o que parece
demonstrar que se sentem importantes e capazes de auxiliar no tratamento dessas
pessoas. Esse resultado é consistente com outros estudos(14) ao verificar que
os enfermeiros mostravam-se favoráveis ao tratamento do alcoolista. No entanto,
se comparado com outras pesquisas(22), observa-se que os enfermeiros desse
estudo apresentaram atitudes mais favoráveis, pois, estudo prévio que avaliou
as concepções e atitudes de enfermeiros(18) frente ao álcool, ao alcoolismo e
ao alcoolista, encontrou que os profissionais demonstravam descrédito com
relação a ajudar esses pacientes, tendendo a ser pessimistas diante do
prognóstico do alcoolista e considerando-os como casos perdidos em algumas
situações.
Ao avaliarem o fato do alcoolista querer parar de beber e não gostar de ser
como é, foram encontrados percentuais significativos de sujeitos que não
possuíam opinião formada sobre o assunto, 52% e 34,1% respectivamente, o que
pode indicar dificuldade desses sujeitos expressarem suas reais concepções
sobre essas questões, preferindo() então, colocarem-se em posições
intermediárias. O resultado é consistente com a literatura(22) em que se
observou não haver conformidade entre os enfermeiros em relação ao fato do
alcoolista desejar abandonar o uso do álcool. A dificuldade para posicionar-se
a favor ou contra as questões que envolvem a vontade e/ou o querer do
alcoolista, talvez se explique pelo fato do modelo moral de explicação para o
alcoolismo, no qual os indivíduos são considerados responsáveis tanto pelo
início e desenvolvimento do problema como pelas suas soluções(23), ainda
exercer forte influência nas concepções e atitudes de enfermeiros (15-18) e
profissionais da saúde de um modo geral(24), o que pode gerar atitudes ambíguas
ou conflitantes no enfermeiro.
Atitudes conflitantes devem ser reavaliadas pelo profissional pois, embora as
habilidades técnicas para trabalhar com dependentes químicos, nesse caso o
alcoolista, contribuam significativamente, não garantem uma assistência
adequada a essa população. É necessário, também, existirem atitudes realmente
positivas, desprovidas de preconceitos, o que passa pelo reconhecimento das
mesmas e pela superação da influência do modelo moral nas atitudes, o que
significa, dentre outros, acreditar que interromper o uso do álcool não depende
exclusivamente da opção pessoal do alcoolista ou de sua vontade.
A superação desses conflitos nas atitudes desses profissionais só ocorrerá,
conforme já bem citado na literatura(12,14-18), quando for dada maior atenção à
formação desses profissionais, incluindo nos currículos de graduação e pós-
graduação conteúdos sobre o tema, no sentido de prepará-los para o
enfrentamento da questão, visto que a assistência a esse tipo de clientela
prescinde da tríade conhecimento, habilidades e atitudes, e desconsiderar
qualquer desses três fatores inevitavelmente repercutirá no tipo de assistência
de enfermagem que será prestada ao paciente alcoolista.
Esse estudo possui várias limitações, dentre elas, foi realizado com uma
amostra de um único hospital e apresenta os resultados obtidos em apenas uma
subescala do instrumento utilizado, sendo assim, não podem ser generalizados.
Além disso, não foram coletados dados sobre o preparo recebido durante a
formação desses profissionais no campo das substâncias psicoativas, o que era
desejável, uma vez que possibilitaria verificar a influência do mesmo sobre as
atitudes aqui apresentadas. No entanto, contribui para o conhecimento a
respeito da temática atitudes de enfermeiros frente às questões relacionadas ao
álcool e ao alcoolismo, sobretudo pela carência de estudos publicados na
literatura nacional sobre a questão, alie-se a isso o fato de trazer avanços
para o conhecimento a medida que apresenta dados que evidenciam tendências de
atitudes positivas dos enfermeiros frente às habilidades de identificação para
ajudar pacientes alcoolistas, demonstrando que os mesmos se reconhecem como
profissionais capazes de ajudar no tratamento dessa clientela, o que abre novas
perspectivas para futuras pesquisas nesse vasto campo ainda pouco explorado
pela enfermagem brasileira.
CONCLUSÕES
Os enfermeiros do estudo apresentaram atitudes positivas frente às habilidades
de identificação para ajudar o paciente alcoolista, pois sentem-se capazes de
ajudar esses indivíduos a se recuperarem, mesmo que os mesmos não sigam suas
instruções e continuem a beber. Essa atitude pode influenciar positivamente na
relação terapêutica entre o enfermeiro e o paciente alcoolista durante o
tratamento. Existe dificuldade por parte dos enfermeiros para se posicionarem
em relação às questões que envolvam o querer do paciente frente ao uso da
bebida alcoólica havendo ambivalência nas atitudes frente à questão, pois,
embora considerem-se capazes de ajudar esses pacientes, não estão convictos de
que os mesmos gostariam de parar de beber, o que em última análise demonstra a
influência do modelo moral nas atitudes dos enfermeiros frente às questões
relacionadas ao álcool e ao alcoolismo. A superação dessa influência, embora
não se constitua tarefa fácil, só será viabilizada quando for dispensada maior
atenção à formação desses profissionais, visto que a mudança de atitudes
prescinde do conhecimento e da aquisição de habilidades.