Foco no cliente: ferramenta essencial na gestão por competência em enfermagem
INTRODUÇÃO
O conceito de gestão por competências refere-se a um modelo avançado para o
gerenciamento de pessoas, atribuindo diferentes elementos a determinadas
competências(1). A sua evolução ocorre em três dimensões distintas: os
conhecimentos, as habilidades e as atitudes(2). O saber agir e agir de modo
responsável, implica em mobiliar, integrar, transferir conhecimentos, recursos
e habilidades, que agreguem valor econômico à organização e valor social ao
individuo(3).
Muito se tem falado e escrito sobre competências organizacionais e
profissionais como ferramenta essencial com o advento da era globalizada de
informações no mercado competitivo. Tudo isto ocorre da mesma forma na área de
saúde. Refere-se a uma nova ferramenta, um modelo avançado para o gerenciamento
de pessoas, atribuindo diferentes elementos a determinadas competências(2). A
competência para a realização de uma tarefa, significa ter conhecimento,
habilidade e atitudes, compatíveis com o desempenho dela e ser capaz de colocar
esse potencial em prática, sempre que for necessário. No entanto, pode-se dizer
que o conhecimento é o que as pessoas sabem; habilidades, o que elas fazem, e
atitudes, o que elas são. Atitude representa a vontade de fazer as coisas.
Habilidade representa o saber fazer, o como fazer. Conhecimento representa o
saber. Oportunidade representa as chances que podemos ou devemos perceber.
Resultado representa o bom desempenho. Aplicando-se em gestão de enfermagem,
são ferramentas que deverão ser desenvolvidas e focadas ao cuidado do Paciente
e seus familiares, sendo uma das competências importantes da liderança do
Enfermeiro. Uma vez que, o sistema de gestão, do qual tanto se fala na era
contemporânea, apenas mostra as oportunidades, quem toma as decisões e
implementa as ações necessárias são os donos do conhecimento e esses donos,
para assistência de enfermagem, são os profissionais Enfermeiros, cujo o
cuidado é o núcleo da competência. Quando falamos do cuidado na assistência de
enfermagem, imediatamente focamos nosso pensamento na relação enfermagem -
doente - organização de saúde(4).
O foco no cliente pode ser entendido como o conjunto de atribuições, atividades
e processos desenvolvidos pelas diversas áreas para atingir objetivos que
seriam no caso as expectativas, a satisfação ou o encantamento do cliente. Como
expectativa podem-se caracterizar necessidades importantes dos clientes ou das
demais partes interessadas, em relação à organização, que normalmente não são
explicitadas. Habitualmente, o cliente espera que o serviço/produto possua
características específicas que atendam e superem o seu desejo, que ultrapassem
e resultem no além do imaginado.
Para Lobos(5), "a chave da gestão em serviços consiste em descobrir, primeiro,
o tipo de serviço predominante e, depois, implantar a melhor forma de gerenciá-
lo. Além de se estar preparado para mudar esta ordem de coisas assim que o
mercado o requer".
O autor salienta que cada dia que passa, em campo de conhecimento específico,
denominado gestão de serviço, torna-se imprescindível. Ocorre, no entanto, que
as organizações de serviços não são todas iguais. Há um lado que concentra toda
a parte da sua energia e recursos na produção de 'bens', exigindo pouco
envolvimento ao cliente. Nelas prevalecem os serviços não humanos, e, de outro
lado, as que dependem fundamentalmente de serviços socialmente orientados, que
envolve a pessoa do cliente. São os serviços humanos e assistenciais(5-6).
Entende-se que a gestão em Enfermagem seja um conjunto de atividades gerenciais
e assistenciais, caracterizadas pelo exercício da liderança, de tal modo que a
influência atinja todos os liderados. Isto ocorre desde a realização dos
procedimentos técnicos, na elaboração de critérios de qualidade nas principais
decisões tomadas, nas linhas de comunicação e nas formas de conduzir as equipes
em todos os níveis de Enfermagem. As ações baseadas no conjunto de orientações
que devem ser focadas ao cliente na instituição, ao paciente e seus familiares,
como por exemplo: a missão, a visão, valores, a cultura, as estratégias, as
políticas, os códigos de conduta, a ética dentre outros interligados e com foco
sempre direcionado às necessidades e satisfação do cliente.
As declarações de visão, missão, negócio e valores comparti-lhados na
organização como considera Barret(7), "constroem confiança e criam comunidade,
ou seja, se relacionam a níveis de consciência corporativa a um público
específico".
Atualmente, apesar das organizações estarem preocupadas em se voltarem para o
cliente, a sua cultura ainda não está orientada para este foco.
Nos serviços de saúde as queixas e reclamações ainda são vistas como
aborrecimento ou custo improdutivo, e aquele que reclama leva a pecha de
criador de caso, seja ele paciente ou familiar queixoso.
A maior parte das instituições não trata de forma eficaz as reclamações
recebidas porque o cliente ainda é visto como um mal necessário. Talvez isto
aconteça por causa da pouca concorrência que tais organizações têm nas regiões
distantes das capitais. Por serem únicas detém o poder e neste caso o cliente
tem pouca opção na escolha organizacional, sem chance de utilizar-se do direito
da livre escolha da instituição e do profissional de sua confiança. Assim,
muitas vezes, o cliente é legado a segundo plano.
Atualmente, há incentivo para o cliente não mais aceitar situações impostas por
um sistema político, econômico e organizacional, por vezes considerado arcaico
e desatualizado. A participação das políticas públicas através dos fóruns e
conselhos de saúde, acesso à vigilância sanitária, o novo Código de Proteção e
Defesa do Consumidor, a Proteção e Defesa do Consumidor-Procon e a mídia são a
prova de que esta situação está mudando. Devido a inúmeras denúncias, além da
competitividade, os níveis de exigência estão cada vez maiores, num mercado não
monopolista, que disputa dos grandes centros, acirradamente, o usuário deste
sistema atual de saúde no mundo globalizado(8).
O novo desafio para as organizações que precisam investir na satisfação e
encantamento dos clientes é o ponto chave para garantirem a sua sobrevivência.
Segundo padrões de qualidade e produtividade, muitas vezes requeridos pela
natureza do trabalho e entregues na organização de seu desempenho, a enfermagem
agrega valores sociais aos recursos humanos e econômicos das organizações
conforme define Dutra, e tudo isso deverá ser o foco principal para a equipe de
enfermagem que tem como meta prestar a melhor assistência.
Neste sentido, os programas de melhoria de qualidade, os processos de
acreditação e as certificações, a educação permanente e continuada estão
favorecendo sempre mais a implantação de ferramentas, que valorizam o foco no
cliente.
COMPETÊNCIA FOCADA NO CLIENTE É UMA DAS FERRAMENTAS NO DESENPENHO DA LIDERANÇA
DO ENFERMEIRO
Procurar compreender o cliente e direcionar todas as ações que envolvem os
profissionais enfermeiros representa sempre um grande desafio para as
organizações de saúde(9).
A liderança de Enfermagem que visa esta competência, toda a equipe deverá estar
compromissada com o cliente. As ferramentas, que mobilizam os conhecimentos
(saber), habilidades (fazer), e atitudes (querer), todas são necessárias ao
desempenho de atividades ou funções do cotidiano.
As reclamações são um dos meios mais diretos e eficazes de os pacientes ou
clientes internos e externos informarem que há espaço para melhoria. Essas
informações podem ser usadas como ferramenta estratégica, para gerar melhoria
no processo da entrega das competências realizadas pelo enfermeiro.
O cliente paciente e familiar que reclama deve ser visto como parceiro da nossa
organização, pois são pessoas interessadas no aprimoramento e ansiosas para que
os gestores captem rapidamente as mudanças de interesse do usuário do sistema
de saúde, trazendo melhoria e conforto para os clientes e benefícios para a
instituição. Os que reclamam e são bem tratados podem tornar-se aliados capazes
de identificar práticas internas, que criam entraves para o bom desempenho da
instituição.
O autor ainda ressalta que a cada 100 reclamações formais, há um potencial de
dois mil clientes da área de serviços insatisfeitos. Um cliente insatisfeito
conta para uma média de oito a dez pessoas sobre o mau atendimento recebido e
um em cada cinco chega a contar para vinte pessoas. Freqüentemente há notícias
em jornais sobre reclamação da longa espera no atendimento solicitado, no caso
de uma medicação para aliviar a dor, ou da demora para passar em consulta(10).
Há reclamações e sugestões enviadas para vários serviços e departamentos do
hospital, cujos instrumentos de avaliação sobre a sua assistência são
respondidos pelos usuários da organização. Estes são alguns dos indicadores
para o gestor de Enfermagem utilizar-se delas, podendo assim estabelecer como
meta a redução de reclamação em seu setor. Neste contexto deve-se tomar cuidado
para que a equipe de Enfermagem não oculte as informações. Isto poderá induzir
a mascarar números só para cumprimento da meta, podendo assim camuflar
problemas.
Outro empecilho é limitar canais de acesso para queixas ou exigir que a
reclamação seja formalizada por escrito ou pessoalmente, ou em um determinado
horário, o que desestimula os reclamantes. Neste caso, o enfermeiro deve atuar
criativamente para transformar a equipe como aliada e parceira, solidária,
promovendo a comunicação fluente, de fácil acesso e eficaz, focada nos
clientes.
Neste aspecto, o gestor de Enfermagem deve se colocar como o líder inspirador
de sua equipe para alcançar as metas estabelecidas no compromisso da melhoria
da assistência, uma vez que competência de liderança abrange o desenvolvimento
organizacional dos recursos humanos e a excelência no atendimento dos clientes.
Para tal busca-se a motivação, a criatividade, o entusiasmo, a participação, o
envolvimento e o comprometimento da equipe, baseados nas competências
individuais e essenciais. Esta é uma tarefa indelegável da gestão do
enfermeiro, pois são as pessoas (equipe) que fazem a qualidade acontecer e os
clientes se encantarem. Trata-se aqui da questão da autonomia do enfermeiro no
envolvimento da sua gestão.
O 'poder agir': a chamada competência essencial ou competência organizacional,
construída a partir da história da organização, cultura, sistema de valores,
combinação de saberes individuais e coletivos, métodos de aquisição, gestão e
desenvolvimento de pessoal, tecnologias e métodos de produção transmitidos de
maneira formal e informal, sistema gerencial, ativos materiais e financeiros,
alcançando um desempenho seguro e econômico, transformado em empowerment
(2,11).
O querer agir: competência individual, investimento que deve ser feito para os
recursos humanos em todos os níveis organizacionais, munindo as pessoas de
informações para que elas se disponham a participar das decisões importantes da
instituição(12).
A gestão por competência traz à tona atributos pessoais e comportamentais dos
recursos humanos(13). Assim, os gestores enfermeiros, como líderes, devem
desenvolver e procurar sempre mais usar da criatividade para trabalhar a
atitude, o bom senso, a ética e a linguagem não verbal(14).
As frases prontas em tom de chavões não contentam o cliente insatisfeito, assim
como as típicas desculpas: "são normas da Instituição", "foi falha do sistema,
estamos com equipe reduzida, funcionários em licença, crise econômica mundial e
outras".
Deve-se despertar em toda a equipe a responsabilidade e a efetiva preocupação
com o paciente e a família. Habilidades e atitudes de atenção, conforto,
cortesia, bom humor, simpatia, sorriso, comunicação adequada são essenciais. A
equipe da assistência de Enfermagem precisa estar convencida do valor de seu
trabalho e do poder que tem em mãos para obter resultado efetivo na
assistência, fruto do bom atendimento aos clientes.
É muito importante um trabalho integrado com os profissionais, chamados de
pontos de equilíbrio dentro da organização, principalmente com os serviços
essenciais (administração, Enfermagem e medicina) considerados o tripé da
organização hospitalar(9). Acreditamos que as organizações dirigidas pelos três
gestores - administrador, médico e enfermeiro - que trabalham inter-
relacionados numa escala hierárquica em mesmo nível, garantem a meta da
excelência organizacional com foco no cliente, a qualidade na assistência e a
satisfação dos usuários(9).
Agrega-se a este contexto a educação da equipe. É necessário identificar as
habilidades, centralizadas nas relações humanas para direcionar o treinamento
com foco aos clientes. Se os colaboradores falham e por falta de conhecimento
do fato, a organização perde a oportunidade de solucionar a questão, a chance
do fato transformar- se numa reclamação ou pendência em um órgão de defesa do
consumidor, com danos à imagem organizacional é enorme, acrescidos a isto
prejuízos às vezes irreparáveis em termos financeiros, patrimoniais e éticos
(15).
Uma solução pode ser a implantação do ouvidor/ombudsman ou SAC-Serviço de
Atendimento ao Cliente, como geralmente se encontra nas empresas(16). Este
serviço, como mencionado anteriormente, poderá auxiliar o gestor enfermeiro na
administração das reclamações, podendo servir como ferramentas nas mudanças
estratégicas focadas no cliente. É uma oportunidade para a organização aprender
com os clientes e ouvir opiniões ainda ignoradas sobre seus serviços. No campo
da saúde, ainda se utiliza pouco este recurso.
Na competência gerencial o enfermeiro é quem poderá dar esta diferenciação na
liderança de sua equipe, mostrando-se ágil na tomada de decisões sobre as
mudanças sugeridas pelos pacientes, clientes internos e externos. Tal processo
deverá resultar em soluções permanentes e não específicas para o caso reclamado
(17).
Parafraseando um ditado muito conhecido e utilizado que perpassa séculos: Errar
é humano, corrigir é divino, permanecer no erro é ignorância, e repetir o erro
é incompetência!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
"Os pacientes e seus familiares parecem, na maioria das vezes, desconhecer seus
direitos, as informações que deveriam receber durante sua internação
hospitalar, mostrando-se pouco questionadores. Por outro lado a equipe de
Enfermagem parece mostrar-se incomodada quando o doente e sua família
reivindicam seus direitos e muitos profissionais ainda rotulam os pacientes e
seus acompanhantes, por vezes, "de cliente chato, poli queixoso"(18).
Até que ponto os usuários têm direito à informação, a serviços de qualidade e à
manifestação de seus interesses? "Assim, viabilizar e potencializar a
participação dos usuários é ação transformadora, que terá que ser motivada,
envolvendo um processo de capacitação e formação permanente dos atores,
clientes da assistência de saúde, bem como a produção de metodologia apropriada
a essa participação"(19).
Os programas de qualidade, os setores de educação continuada dos serviços de
saúde, juntamente com seus gestores, têm a responsabilidade de acolher o
cliente diferenciando-o como usuário em potencial, e como tal, superar suas
expectativas, promovendo seu encantamento e sua fidelização. "Fidelizar
clientes é uma das conquistas mais importantes para se manter boa performance.
É essencial manter-se atento a tudo o que acontece na organização e
principalmente ao que possa interessar aos clientes, porque é a partir da
satisfação das necessidades deles que se chega ao sucesso da assistência(16).
Por outro lado, percebe-se quando o contrário ocorre. Há mudança do contexto da
abordagem quando as organizações deixam de ter foco somente nos recursos
materiais para focarem seus clientes(8). Estas mudanças levaram as organizações
a descobrirem que precisam ir mais a fundo para perceberem o que o cliente de
fato quer. Significa estar muito atento, penetrar fundo nas expectativas e
aspirações, identificar precisamente o que os usuários necessitam e precisam,
para satisfazerem ou superarem suas expectativas, assegurando o encantamento,
algo que não é fácil, pois aquilo que é bom para a organização muitas vezes não
é o melhor para o cliente.
Deve-se notificar que muitas situações conflituosas, informações mal
direcionadas podem ser caracterizadas como desrespeito, falta de compreensão,
falta de ética aos direitos do paciente e sua família, falta de inclusão social
como cidadão, além da comumente, decorrente falta de recursos humanos para o
atendimento nas instituições de saúde(7,19).
Além disso, as instituições têm justificado o quadro reduzido da equipe, na
área da enfermagem, como medida de economia hospitalar ou contenção de
despesas, permanecendo um aparente silêncio, aceitação e muitas vezes
conformismo dos enfermeiros que lideram essas organizações(14).
Nunca é demais lembrar que é possível encantar os clientes se também as equipes
estiverem encantadas e motivadas. Neste contexto é imprescindível o
envolvimento e a integração de toda a equipe organizacional, tendo como retorno
desafiador a entrega efetiva e diferenciada desta competência essencial(1-
3,12). Para isso é preciso um trabalho inovador que possa adaptar-se às
mudanças observadas e atualizadas no dia-a-dia, em que o enfoque passa ser o
cliente, a semelhante busca da qualidade, com satisfação e excelência no
atendimento e na assistência às suas necessidades. As ações não voltadas para o
cliente levam o enfermeiro a perder o foco mais importante na sua liderança que
são o cuidar, o observar e o humanizar(20).