Infraestrutura de biossegurança para agentes biológicos em hospitais do sul do
Estado da Bahia, Brasil
INTRODUÇÃO
Em que pesem a ausência de um modelo de avaliação que leve em conta as
características hospitalares enquanto meio seguro de atuação profissional
frente à problemática dos riscos biológicos e, ainda, a conhecida variação
qualitativa das instituições hospitalares nacionais e as suas demandas
específicas, propõe-se, neste estudo, a investigar a dimensão do problema
biossegurança em hospitais. A biossegurança é entendida como o conjunto de
normas e procedimentos considerados seguros e adequados à manutenção da saúde,
em atividades de risco de aquisição de doenças profissionais(1). Antes de uma
disciplina em sentido estrito, um campo de realização de práticas técnicas e
sociais destinadas a conhecer e controlar os riscos que o trabalho em saúde
pode aportar ao meio e à vida. Práticas essas que dependem de uma série de
fatores que incluem elementos conjunturais e estruturais.
Levando-se em conta que se vislumbra, em última instância, a melhoria da
qualidade da assistência prestada, não há como se pensar em melhorar a
qualidade do atendimento, sem melhorar a qualidade do trabalho em saúde no seu
mais amplo sentido. O fornecimento de cuidados de saúde satisfatórios, de
maneira desejável tem obrigatória intersecção com a adoção de medidas de
biossegurança, porque se assim não for, o cuidado poderá ser prestado sob uma
plêiade de riscos para o profissional e, em subsequência, também para o próprio
usuário do serviço de saúde.Por outro lado, as preocupações emergentes com a
biossegurança, e sua inclusão na visão geral da qualidade dos serviços não se
constituem em um significado restrito. Fazem parte de uma tendência mundial,
sustentada por uma mudança de paradigma cultural, pelo que se vem advogando e
promovendo novos padrões de comportamento, diante das questões da preservação
do meio ambiente, da própria vida e das relações externas à comunidade(1).
Observe-se que os campos compre-endidos pela biossegurança e pela gestão de
qualidade estão unidos um ao outro, desde sua origem através do conceito de
boas práticas. As boas práticas dependem de fatores sociais (construção, por
exemplo, de formas de comportamento), fatores pessoais (que incluem valores
individuais atribuídos às práticas pelo sujeito) e fatores ambientais
(estrutura de apoio e tecnologia mínima disponível).
Importante é dar relevância às diversas evidências de que os profissionais
atuantes na área da saúde e, particularmente em hospitais, estão sujeitos a
adquirir infecções,em particular as hepatites B e C, a AIDS e a tuberculose,
especialmente. As primeiras pelas incidências que podem ser consideradas altas
e subnotificadas; a AIDS ainda pelo espectro de doença fatal e a tuberculose,
por suas diversas consequências sobre a vida dos profissionais.
OBJETIVO
Descrever a infraestrutura de biossegurança em hospitais localizados na Região
Sul do Estado da Bahia, Brasil.
METODOLOGIA
A pesquisa constou de estudo descritivo-exploratório empre-endido nos hospitais
localizados na área de abrangência da Sétima Diretoria Regional de Saúde da
Bahia (7ª DIRES). Para tal utilizou-se como unidades elementares de análise, os
hospitais relacionados à citada diretoria, responsável pela supervisão das
ações de saúde de vinte e dois municípios, localizando-se sua sede regional na
cidade de Itabuna. A rede hospitalar em pauta constitui-se de vinte e sete
instituições, nove delas localizadas no município pólo (Itabuna) e as demais
distribuídas uma para cada um dos demais municípios da circunscrição. Foram
visitadas, para fins do estudo, vinte e cinco das vinte e sete instituições
existentes.
Para a análise das estruturas hospitalares relacionadas à biossegurança, foi
utilizado formulário adaptado(2-3), o qual constou, além de dados para
categorização dos hospitais, de questões referentes à estrutura de
biossegurança. O formulário foi aplicado aos enfermeiros dos respectivos grupos
executores de controle de infecção, quando existente, na falta deste ao
presidente da CCIH e, finalmente, não existindo CCIH, ao coordenador de
enfermagem.
Antecedeu a pesquisa sua aprovação pelo comitê de ética e pesquisa da Faculdade
de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, haja vista de tratar-se de
trabalho a ela vinculado. Obteve-se ainda, antes da coleta de dados,
autorização das administrações institucionais envolvidas, para que a coleta de
dados fosse procedida, bem como aquiescência pessoal, por parte dos
respondentes, de termo de consentimento livre e esclarecido.
Para o tratamento dos dados, procedeu-se além de análise da proporção dos itens
considerados para fins do estudo, presentes nos hospitais, à análise das
distinções e similaridades entre hospitais. Essa, de acordo com as subdivisões
segundo porte, vinculação administrativo-financeira, ou seja, se públicos,
privados e filantrópicos, natureza geral ou especializada, e, ainda, segundo o
predomínio da clientela atendida sob o ponto de vista da remuneração pelos
serviços, do corpo clínico do hospital (se aberto e fechado), de sua
caracterização enquanto se prestar ou não a campo formal de ensino de
profissionais da área de saúde e, por fim, do ponto de vista da sua localização
geográfica, se na cidade considerada como pólo regional, Itabuna, ou fora dela.
Complementarmente também analisamos os hospitais segundo subdivisão com ou sem
CCIH e grupo executor de controle de infecção hospitalar.
Para a análise dos efeitos das características hospitalares sobre a ocorrência
de itens concernentes à biossegurança, os hospitais, uma vez agrupados, foram,
a princípio, analisados em relação a cada questão em particular. Para tal,
utilizamos o teste quiquadrado ou exato de Fisher. Ao invés de fixar o nível de
significância para a rejeição da hipótese estatística, optou-se por colocar no
texto o nível de significância da amostra (p valor)(4).
RESULTADOS
Infraestrutura Organizacional - Caracterização das CCIHs e das CIPAs
Dos vinte e cinco hospitais estudados, dezenove (76%) possuiam CCIH e seis
(24%) não dispunham do órgão. Todos os hospitais privados (n=7) tinham
formalmente constituída CCIH, ao passo que nos hospitais públicos(n=12) e
filantrópicos(n=6), elas estavam presentes em 66,7% das instituições. Há também
variação na existência de CCIH nos hospitais quando distribuídos por tamanho:
os dois únicos hospitais de grande porte (100,0%) tinham CCIH, seguidos pelos
de tamanho médio (n=9), 80% e daqueles de pequeno porte (n=14) 72,4%.
Apenas três (15,8%), das dezenove CCIHs, tinham papéis delimitados entre os
seus participantes, nas demais, o enfermeiro assumia as funções inerentes à
Comissão.
As atividades dos enfermeiros nas comissões de controle de infecções
hospitalares demonstram uma concentração nas ações da vigilância epidemiológica
das Ihs, bem como na elaboração de planilhas destinadas à prestação de
informações aos órgãos de direito, a despeito de demais ações como a educação
continuada (somente três CCIHs-15,8%, a referiram) e implementação de
isolamentos (apenas uma CCIH confirmou atuação nessa função). Detectamos ainda
que nove desses mesmos enfermeiros, realizaram treinamento/curso em temas
afetos à biossegurança, sendo que os profissionais foram treinados em maior
proporção nos hospitais privados (57,1% de um total de sete CCIHs), e nos
hospitais filantrópicos (50,0% de um total de quatro CCIHs), a despeito dos
hospitais públicos, cuja percentagem de enfermeiros das respectivas CCIHs
treinados foi de 37,5% de um total de oito. Apenas três, das vinte e cinco
instituições (12,0%), uma de médio porte (filantrópica) e duas de grande porte
(uma pública e uma filantrópica), possuiam grupo executor de controle de
infecção hospitalar. As composições desses mesmos grupos restringiam-se
basicamente ao enfermeiro atuando em dedicação integral (36 horas semanais) e
um médico em dedicação parcial para cada um dos hospitais filantrópicos.
Nenhuma das vinte e cinco instituições estudadas possuía serviço médico
ocupacional ou assemelhado e somente três hospitais (12%) eram dotados de
Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) e em uma dessas CIPAS pelo
menos um de seus membros realizou curso/treinamento em biossegurança.
Presença de normas, treinamentos, registros, rotinas e infra-estrutura física
relativas à biossegurança
No que se refere aos demais itens aqui considerados para a configuração de uma
adequada estrutura de biossegurança, observamos baixos percentuais afirmativos
para a existência de normalizações escritas relativas à biossegurança,
consideradas para fins do estudo nas instituições (Apêndice). Chama a atenção o
fato de vinte e dois hospitais (88,0%) não disporem sequer das normas
concernentes às precauções padrão. Resultado ainda mais modesto ocorreu com as
normas relativas às precauções baseadas na transmissão, ausentes em vinte e
três nosocômios (92,0%). As normas referentes às condutas frente aos casos de
acidentes de profissionais com materiais pérfuro-cortantes, embora presentes em
número maior de instituições que as demais, tinham, também, tímida presença nos
serviços hospitalares (oito instituições -32,0%). Procedido tratamento
estatístico, verificamos diferenças significativas ao nível de 7% de
probabilidade quando estudadas a presença de normas escritas, em seu conjunto,
quando os hospitais são categorizados por porte, com melhores resultados os
hospitais grandes, seguidos pelos de médio e pequeno porte e diferenças ao
nível de 2,0% (p=0,02) entre os hospitais categorizados por vinculação
financeira, com melhores performances para as instituições filantrópicas,
seguidas pelos hospitais privados e, por último, os públicos. Agrupados pela
característica de se constituírem ou não em campo de práticas para atividades
de cursos na área da saúde (n=3 e 22 respectivamente), os hospitais
demonstraram-se com diferenças significativas em nível de 0,4% (p=0,004) para o
conjunto de normas escritas, com melhores resultados para o primeiro grupo.
Verificamos, igualmente, diferença estatisticamente significativa ao nível de
6,0% (p=0,06) para o conjunto de questões quando esses são separados por
localização geográfica, considerada como situados na cidade pólo, Itabuna, ou
fora dela. As instituições aí localizadas apresentaram desempenho melhor do que
aquelas localizadas nos demais municípios.
Ao se analisar a presença de normas escritas nas instituições com e sem CCIH,
não se detectam diferenças estatisticamente significativas. Separados os
hospitais de acordo com a existência de grupo executor de controle de IH
detectamos, contudo, diferenças, com significância estatística ao nível de 1,0%
(p=0,01), com melhor desempenho para os hospitais providos dos respectivos
serviços. Características outras dos hospitais, como ser geral ou especializado
(n=22 e 3, respectivamente), ter corpo clínico aberto ou fechado (n=3 e 22
respectivamente), clientela atendida (n=16) para atendimentos exclusivos ao
SUS; uma somente para pacientes particulares e convênios privados e oito para
todas as fontes de pagamento), não separam os hospitais de forma
estatisticamente significativa para o item aqui apresentado.
Por outro lado, quando se avalia a realização de treinamento de pessoal para as
precauções padrão, verificamos, muito embora com percentuais também modestos,
referência afirmativa em percentual de 40% dos hospitais. O mesmo fenômeno é
observado para as precauções baseadas na transmissão, cujo percentual de
realização de treinamento chega a 36,0%. O preparo de pessoal para triagem
precoce de pacientes suspeitos de tuberculose, em contrapartida, não era
praticado em nenhum dos hospitais estudados.
Não se demonstram, ainda, diferenças estatisticamente significantes dentre os
grupos de hospitais para as questões afetas ao treinamento como um todo, bem
como para os subitens considerados individualmente (precauções padrão,
precauções baseadas na transmissão e triagem precoce de pacientes suspeitos de
tuberculose), ainda que as médias apontem uma ligeira tendência de resultados
pouco mais promissores, pelo menos para as precauções padrão, nos hospitais de
grande e médio porte. O mesmo ocorre ao se analisar o conjunto das questões
atinentes à realização de treinamentos, tomados os hospitais categorizados por
vinculação administrativa financeira, embora haja tendência de melhores
resultados para os hospitais filantrópicos.
Não se diferenciam os hospitais com e sem CCIH, para o item treinamento no seu
conjunto, ainda que os percentuais apontem para uma ligeira tendência de
melhores resultados em favor do primeiro grupo. As instituições agrupadas
segundo a existência ou não de grupo executor de controle de infecção
hospitalar, em contrapartida, diferenciam-se no nível de 6,0% (p=0,06) de
significância estatística, com melhor desempenho para os primeiros quando
analisados os subitens no seu conjunto, e em 5% (p=0,05), quando se analisa
isoladamente a realização de treinamentos para as precauções padrão. As
instituições hospitalares se apresentaram, todavia, de forma diferente com
significância estatística ao nível de 4% (p=0,04), para o conjunto de itens
referentes a treinamento de pessoal para as precauções relativas à
biossegurança, quando separadas pela característica de se constituir ou não em
campo de ensino. Também a realização de treinamentos não ocorre de forma
distinta estatisticamente nos serviços hospitalares quando levadas em conta as
suas características como corpo clínico aberto ou fechado, clientela atendida
(se SUS ou convênio privado e pagamento particular), predomínio da clientela,
bem como sua localização geográfica.
No que diz respeito ao item registros, observamos a ausência de mapa de risco
em todas as instituições, presença de registro de casos de acidentes
ocupacionais com materiais pérfuro-cortantes em sete (28,0%), dos vinte e cinco
hospitais e registro de cobertura da vacinação para hepatite B ausente em 20
(80,0%) dos estabelecimentos. Esses mesmos registros, além de se constituírem
em práticas pouco frequentes nos hospitais estudados ainda ocorrem de forma não
diferenciada nos diversos grupos de hospitais. Exceções feitas às instituições
agrupadas em com e sem grupo executivo de controle de IH, as quais se
apresentam com diferenças estatisticamente significantes ao nível de 4,0%
(p=0,04), detendo melhor resultado o primeiro grupo.
Também a realização/exigência de exame médico admissional é rotina pouco
frequente nas instituições: em sete (28,0%) dos hospitais esta prática era
existente, ao passo que a imunização dos profissionais para hepatite B era
rotina em onze (44,0%) dos serviços. Exames de PPD de profissionais atuantes no
hospital não era realizado em nenhuma das instituições. Na análise individual
de cada uma das questões supramencionadas, detectamos, em contraponto,
diferenças estatisticamente significantes no nível de 7,0% (p=0,07) para o
subitem registro de acidentes com materiais pérfuro-cortantes, quando os
hospitais são caracterizados por tamanho em termos de número de leitos.
Melhores resultados são apresentados pelos hospitais grandes, seguidos dos de
médio e pequeno porte. Também apresentam diferenças estatisticamente
significativas (aqui ao nível de 5,0%- p = 0,05) para o subitem, os hospitais
classificados segundo campo de ensino, com melhores resultados para os que se
prestam às referidas atividades. O mesmo ocorre quando os hospitais são
subdivididos em com e sem grupo executor de I H (1,5% de significância -
p=0,015). Observa-se, adicionalmente, haver diferenças estatisticamente
significantes no nível de 14,0% (p=0,14) quando os hospitais são agrupados
segundo a existência de CCIH.
Os hospitais apresentam-se com diferenças significativas no nível de 3,0%
(p=0,03) para as questões agrupadas, quando são categorizados em constituir-se
ou não em campo de ensino e com e sem grupo executor de controle de infecção
hospitalar, com melhores resultados para os primeiros respectivamente. E,
ainda, no mesmo nível de significância, as instituições classificadas segundo
tipo de atendimento geral ou especializadas, com melhores performances para os
hospitais especializados.
Apesar de não se detectar diferenças estatisticamente significativas, pudemos
verificar também para a referência à rotina de imunização para a hepatite B,
frequência maior do quesito, nos hospitais privados e filantrópicos a despeito
das próprias entidades públicas. Mostraram-se, por outro lado, para o mesmo
item, com resultados mais promissores e com diferenças estatísticas no nível de
3,0% (p=0,03), os hospitais campo de ensino. Também as instituições
classificadas em gerais e especializadas, apresentaram-se com diferenças
estatisticamente significativas, mas ao nível de 7,0% (p=0,07).Nos hospitais
especializados estavam mais presentes rotinas de vacinação para hepatite B do
quadro funcional, quando comparados com os hospitais gerais. Verificam-se, de
igual modo, melhores resultados, com diferenças significativas ao mesmo nível
de 7,0% de significância, para o aspecto relativo à existência de rotinas de
imunização, quando as instituições dispunham de grupo executor de controle de
IH.
Corpo clínico aberto ou fechado, tipo de clientela atendida, presença de CCIH,
localização geográfica das instituições, não distinguem os hospitais para as
variáveis ora analisadas, tanto no que concerne ao seu conjunto, quanto para
cada item tomado individualmente.
Com referência ao tópico em que foram abordadas as questões da instituição de
isolamento para pacientes suspeitos de tuberculose e a existência de infra-
estrutura para isolamentos para doenças transmissíveis, detectamos que o
primeiro item (prática de isolar pacientes suspeitos de tuberculose) foi
referido em dezenove instituições (76,0% dos hospitais), sem distinções
estatisticamente significativas entre os diversos agrupamentos de serviços
hospitalares utilizados para fins do estudo. Por fim, nenhum hospital dispunha
de acomodações para isolamento de pacientes com doenças transmissíveis.
DISCUSSÃO
Sobre a infra-estrutura de biossegurança nos hospitais, inicia-se com a
discussão acerca da situação regional das Comissões de Controle de Infecção
Hospitalar (CCIHs), e das Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPAs),
posta a indubitável importância desses órgãos na conformação de uma adequada
estrutura de biossegurança nos hospitais.
Assim nos chama a atenção a modesta presença dos referidos órgãos nas
instituições estudadas (76,0% no caso das CCIHs), dado este inferior ao de
outras localidades brasileiras(3,5). Por outro lado, verificamos maior
precariedade da presença dos órgãos nos hospitais públicos, instituições que em
tese deveriam servir como agências diferenciadas no que diz respeito ao
controle de infecções e também no referente à uma estruturação mínima de
cuidados à saúde do trabalhador. Situação que pode ser considerada como digna
de nota é a de que além de reduzido, o número de enfermeiros atuantes nas CCIHs
estudadas que tiveram acesso a atualizações relativas ao tema, é ainda
constituído por uma maioria de profissionais atuantes em hospitais privados e
filantrópicos, contrariamente aos próprios hospitais públicos.
Se, de um lado, a situação dos hospitais da região em análise, no que se refere
à organização das CCIHs, não se mostrou das mais promissoras, não é menos
verdade que as CIPAs, praticamente inexistentes (implementadas em apenas três -
12,0% das instituições), também não desfrutem de melhor situação. Conquanto
tenhamos nos limitado à questão da existência de uma noção mínima acerca de
biossegurança por parte de pelo menos um de seus membros, os resultados
mostraram-se pífios. Assim, os dados conjuntos das CCIHs e das poucas CIPAs, as
quais poderiam ter um papel coadjuvante de importância para a implementação e
cobrança de uma estrutura apropriada de proteção contra os riscos biológicos,
demonstram fragilidades que merecem atenção por parte dos formuladores de
políticas intra e extra-institucionais.
No tocante à presença de normas escritas, verificamos resultados pouco
adequados. Uma possibilidade de explicação para a quase ausência de
normalizações sobre as precauções padrão talvez possa ser dada em parte por
constituírem-se boa parte dos hospitais visitados, de pequeno porte (56,0%).
Esses serviços, de acordo com a literatura, apresentam maiores dificuldades em
receber as normas dos órgãos de direito e adaptá-las às suas respectivas
realidades(6). Dado importante, por outro lado, é aquele que mostra que os
hospitais públicos, mais diretamente ligados aos órgãos formuladores de
políticas de prevenção e controle de infecções hospitalares e também de medidas
de biossegurança, apresentam também graves debilidades no que se refere à
presença de normalizações.
Mais alentadora é a constatação de que os hospitais que se prestam a atividades
de ensino apresentem-se com resultados melhores e com diferenças
estatisticamente significativas dos seus congêneres que não se prestam à
aludida atividade. De igual modo, percebemos diferenciação nos hospitais
segundo a existência de grupo executor de controle de IH o que demonstra que
esses órgãos colaboram para uma melhor sistematização das normas afetas à
biossegurança, pelo menos na nossa realidade e em respeito ao item aqui
abordado.
No que tange à presença de normatização por escrito acerca das precauções
baseadas na transmissão podemos afirmar, contudo, que o quadro é ainda mais
precário nas instituições estudadas, independentemente de sua classificação.
Dados de hospitais paulistas mostram 43,0% deles com presença das referidas
normas em contraponto aos resultados aqui detectados de 8,0%, o que demonstra
importante variação regional(3).
No tocante às normalizações escritas relativas ao atendimento de casos de
acidentes de profissionais do hospital com materiais pérfuro-cortantes, por
outro lado, percebemos que um número pouco mais expressivo de hospitais as
tinham (32,0%), se comparados com as relativas às precauções padrão e baseadas
na transmissão, mas ainda assim contingente que pode ser considerado
distanciado do ideal. Esse dado merece atenção levando-se em conta primeiro que
essas normas constituem-se, como de se esperar, em reproduções daquelas
publicadas pelo Ministério da Saúde e, segundo, que elas se encontram mais nos
hospitais filantrópicos (83,3%) do que, mais uma vez, nos próprios hospitais
públicos. Explicação plausível para a praticamente inexistência de
normatizações relativas a condutas frente a acidentes com pérfuro-cortantes nos
hospitais governamentais, talvez seja o fato de que esse agrupamento de
hospitais compreenda, coincidentemente, em sua maioria, na região, conforme já
citado, os pequenos serviços para onde se encaminham os clientes de menor
complexidade, o que pode fazer com que as preocupações com acidentes de
profissionais com objetos pérfuro-cortantes sejam menores. Não devemos perder
de vista, entretanto, que o único hospital público de grande porte e
responsável pelo atendimento de pacientes com demandas mais complexas se
comparados aos dos pequenos nosocômios, não dispunha das referidas
normalizações. Desta forma, no que tange aos hospitais públicos em geral não
podemos deixar de registrar que parece ocorrer alguma lacuna na divulgação das
instruções normativas por parte dos responsáveis técnicos pela área em nível
governamental, posto que teoricamente todas as instituições devem não apenas
tê-las disponíveis, mas também aplicá-las quando indicado e serem
supervisionados pelo poder público quanto à sua aplicação.Não há como negar,
todavia, que os resultados encontrados para o item treinamento parecem
distanciados do que se poderia considerar como alvissareiros. Apenas dez
(40,0%) das instituições estudadas referiram a realização de algum procedimento
de educação em serviço relativo às precauções universais/padrão e nove (36,0%)
para as precauções baseadas na transmissão. Esses mesmos procedimentos, em sua
maioria, dirigidos a enfermeiros e ocupacionais de enfermagem, deixando a
descoberto outras categorias profissionais, dados coincidentes com estudo
nacional levado a efeito há mais de dez anos atrás(7). Treinamentos com vistas
à triagem precoce de pacientes suspeitos de tuberculose, por outro lado, não
foi objeto de educação continuada em nenhum dos hospitais visitados. A mesma
modéstia é verificada quanto ao número de hospitais que se ocupam de registrar
as ocorrências de acidentes de profissionais com materiais pérfuro-cortantes
(28,0%), o que corrobora com a subnotificação dos casos, subnotificação esta
que nos hospitais pequenos e médios pode ocorrer pela errônea crença de que,
nessas instituições, o fato de os pacientes serem supostamente de menor
complexidade, constituem-se em menores riscos para a veiculação de agentes
infecciosos de importância ocupacional. De igual modo, também é frágil o
registro de cobertura vacinal para hepatite B dos trabalha-dores atuantes nas
instituições. Explicação possível para a baixa preocupação nos hospitais com o
registro de cobertura vacinal talvez relacione-se com a dinâmica de vacinação
dos profissionais da saúde no Brasil. Observamos que, em nosso País, o
Ministério da Saúde disponibiliza, gratuitamente, as vacinas para a hepatite B
e o gerenciamento dos referidos imunobiológicos fica a cargo das instâncias das
secretarias municipais de saúde, as quais são demandadas, para a vacinação dos
profissionais, pelas respectivas instituições de saúde. Cumpre às secretarias
registrarem o quantitativo de doses utilizadas para proceder à reposição de seu
estoque. Não cabe a essas últimas, contudo, o controle da situação vacinal dos
empregados de cada hospital. Isto posto, quando analisamos conjuntamente as
informações do modesto número de hospitais que registram a cobertura vacinal
interrogamos se de fato os trabalhadores vem sendo adequadamente imunizados.
Depreende-se, grosso modo, que a questão não se circunscreve, no caso
específico dos hospitais aqui estudados, tanto ao acesso dos profissionais à
vacina propriamente, posto que conforme já citado, esta é oferecida de forma
gratuita pelo poder público, mas numa assistematização de oferta e
acompanhamento, pelo menos no que concerne às instituições enquanto
empregadoras, o que pode remeter à baixa cobertura em áreas de risco,
desorganização e custos adicionais ao Estado.
Referente à existência de rotina de imunização dos profissionais contra a
hepatite B verificamos que somente nove (36,0%) das instituições referem tê-la
e diferenças significativas são detectadas quando os hospitais são
classificados em gerais e especializados, com melhores resultados para os
últimos. Neste caso específico pudemos observar que os hospitais especializados
aqui estudados eram todos voltados para a atenção à mulher, em particular no
seu ciclo gravídico puerperal e à criança. Nossa hipótese é a de que tal
contexto faça com que os profissionais atuantes nessas instituições sejam
naturalmente mais afeitos ao tema vacina, pelo menos as concernentes às
imunizações dos próprios usuários. Supomos que, pela especificidade da
clientela, a lida cotidiana com o assunto por parte dos profissionais
influencie na preocupação também relacionada à vacinação dos próprios
trabalhadores.
Ainda sobre a temática dos registros não foi encontrado em nenhuma das
instituições visitadas mapa de riscos ambientais para a prevenção de acidentes
de trabalho, mesmo nos hospitais de grande porte e naqueles que dispõem de
CIPA. Malgrado os resultados surpreendam pela constatação de suposta
despreocupação nos hospitais de sinalizar, através de recursos gráficos, os
locais, situações e fatores de risco aos agentes biológicos, nos parece
compreensível, posto que a elaboração desses mapas é assunto relativamente
recente nas instituições de saúde.
No que concerne, por outro lado, à realização de exames médicos dos
trabalhadores engajados nas atividades hospitalares, embora obrigatória por lei
(8) , não se constitui em regra na maioria das instituições visitadas.
Referente à realização de PPD periódico em profissionais não reatores
envolvidos na prática assistencial em áreas consideradas de risco para a
tuberculose, observamos que a medida não se constituía em rotina em nenhum dos
hospitais pesquisados, dado esse que ilustra que a problemática da tuberculose
ocupacional não parece fazer parte das preocupações nos serviços visitados.
Embora não tenhamos elementos que permitam comparar a realização dos aludidos
exames em instituições nacionais com vistas a uma programação de prevenção de
tuberculose ocupacional, cumpre-nos lembrar que a doença é prevalente em nosso
meio e vem aumentando sua incidência relacionada ao crescimento do número de
casos de concomitância com o HIV e às dificuldades clínicas, propedêuticas e
terapêuticas.
Verificamos, adicionalmente, que nenhuma das instituições dispunha de infra-
estrutura física específica para a instalação de isolamento de pacientes.
Quadro que demonstra frágil situação dos serviços hospitalares relativa ao
atendimento de pacientes com doenças transmissíveis.
Quadro_1