Papel social e paradigmas da pesquisa qualitativa de enfermagem
INTRODUÇÃO
A abrangência e totalidade da prática de enfermagem merece questionamento,
discussão e análise, bem como a submissão a regras da demonstração e das provas
(1). Neste processo, entendemos que o cuidado, prática genética da enfermagem
(2), precisa ser compreendido na perspectiva não linear, mas, sim, de forma
subjetiva, uma vez que o ato de cuidar se manifesta entre seres humanos. Nesse
sentido, destacamos que a pesquisa qualitativa tem uma visão idealista,
subjetivista e interpretativa da realidade, possibilitando uma visão
compreensiva das relações que se estabelecem durante as situações de encontro/
interação em que palavras, gestos, arte, e vários fatores simbólicos se
entrelaçam e permitem ser interpretados de forma singular e particular(3).
Desde as últimas décadas do século passado, as pesquisas qualitativas têm sido
largamente utilizadas pela enfermagem. Ano a ano tem aumentando o interesse por
pesquisa qualitativa, cujos resultados tornam claro o obscuro, dão nuances,
particularidades e emoção ao objeto de estudo(4).
A pesquisa qualitativa propicia ao pesquisador captar o modo como os seres
humanos pensam, agem e reagem diante de questões focalizadas; proporciona o
conhecimento da dinâmica e estrutura da situação sob estudo, do ponto de vista
de quem a vivencia; possibilita compreender fenômenos complexos e únicos;
contribui para melhor compreensão da distância entre a prática e o
conhecimento, ajuda na percepção dos sentimentos, dos valores, das atitudes e
dos temores das pessoas ao explicar suas ações diante de um problema ou
situação(4). Assim sendo, o pesquisador qualitativo deve atender às seguintes
qualidades: sensibilidade acurada, idéia, imaginação e habilidade técnica(4).
Desta maneira, fazer pesquisa qualitativa é uma tarefa árdua, exige esforço,
seriedade, dedicação, custo, capacidade de abstração e reflexão teórica, além
de competência analítica e compromisso ético para cumprir com seu papel social.
A pesquisa em tela tem como objetivos: identificar temas emergentes nas
pesquisas qualitativas publicadas em periódico de enfermagem; correlacionar os
temas com a produção do conhecimento da enfermagem; refletir sobre o papel
social das pesquisas qualitativas analisadas.
MÉTODO
Tratou-se de pesquisa bibliográfica, tendo por base artigos publicados na
Revista Brasileira de Enfermagem, o mais antigo periódico de circulação
nacional produzido pela Enfermagem brasileira, com renomados pesquisadores da
profissão em seu corpo editorial e de consultores.
A delimitação temporal utilizada para a coleta de dados foi de 2005 a 2008, de
forma aleatória e compreendeu 24 fascículos, presentes na base de dados Scielo,
totalizando 300 pesquisas identificadas nos sumários e resumos. Deste total, 10
artigos não foram passíveis de identificação no que diz respeito ao tipo de
estudo; 115 foram identificados como pesquisas quantitativas; 2 estudos quase
como experimentais, 5 quanti-qualitativos e 173 estudos qualitativos.
Os artigos selecionados como pesquisas qualitativas foram examinados em suas
formas, idéias, interpretações e diretivas que indicam o conhecimento
produzido, e a análise qualitativa ocorreu em dois momentos: no primeiro,
realizou-se uma leitura dos resumos e textos na íntegra a fim de identificar
pontos de inflexão e discernimentos como palavras chaves (descritores),
temário, tipo teórico de estudo, resultados encontrados e recomendações,
critérios que nortearam o agrupamento de mais de 528 palavras. No segundo
momento, houve o refinamento da análise por meio do agrupamento, que apontou
para temas em suas correlações e em suas maiores expressões. Desta análise
emergiram as seguintes categorias: formação em enfermagem, áreas de atuação,
base/fundamentos/concepções de cuidado de enfermagem e assuntos profissionais.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O processo de categorização possibilitou a identificação dos temas
desenvolvidos nas pesquisas qualitativas, bem como as expressões mais citadas,
apresentadas no Quadro 1.
Formação em enfermagem
A formação do profissional de enfermagem foi o tema mais expressivo nas
pesquisas qualitativas examinadas, e, igualmente apontada na perspectiva do
docente, do discente, nas políticas de formação de recursos humanos, nas
práticas pedagógicas, nos níveis de formação, na capacitação profissional e na
educação em saúde.
No que diz respeito à dimensão das políticas de formação de recursos humanos,
os temas enfocados foram: diretrizes curriculares (contexto, mudanças e
perspectivas), competências, pesquisa e diferentes áreas de atuação.
Com relação às práticas pedagógicas, o que foi mencionado nas pesquisas dizia
respeito à finalidade e função da avaliação na formação de enfermeiros. Em
referência aos níveis de formação, enfocaram-se as diferentes categorias:
auxiliar, técnico, graduação, pós-graduação stricto sensu e lato sensu,
formação docente e o ensino de pós-graduação em saúde.
Quanto à capacitação profissional nos diferentes contextos considerou-se o
processo de capacitação do enfermeiro em Unidade de Terapia Intensiva (UTI),
Curso de Especialização em Projetos Assistenciais de Enfermagem - Espensul,
educação à distância sobre cardioversão e desfibrilação, práticas educativas de
trabalhadores de saúde, vivências de graduandos de enfermagem e educação
continuada.
Na educação em saúde foram abordados temas sobre entendimento e práticas
educativas, saúde sexual, competências do enfermeiro para atuar como educador
em saúde, manejo das crises de asma nos pacientes (conhecimento e impacto),
formação em saúde na saúde ambiental (resíduos sólidos), interfaces conceituais
da educação em saúde, e concepção em saúde sobre o aspecto do itinerário
terapêutico adotado por adultos (condutas de saúde).
Áreas de atuação
Encontrou-se nas pesquisas temas voltados para a prática profissional, tanto
nas especialidades quanto nas demandas de políticas públicas. Há que se
destacar que dentro das especialidades distingui-se a obstetrícia, o
planejamento e gestão, pediatria e saúde mental. Nas demandas de políticas
públicas encontraram-se temas sobre saúde da família, da mulher, ocupacional e
Programa de Saúde da Família (PSF).
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A especialidade Obstetrícia abarcou temas sobre amamentação entre trabalhadoras
e estudantes, aleitamento e práticas das mulheres com problemas mamários,
fatores que levam ao desmame; o ensino de comportamento de parturiente,
trabalho de parto, mãe adolescente, gravidez na adolescência, gravidez,
gestantes e puérperas com Imunodeficiência humana (HIV); mitos e tabus da
maternidade, episiotomia na visão das mulheres; o processo de enfermagem sob a
ótica da enfermagem; construção do cuidado das parteiras tradicionais;
transmissão vertical do HIV em maternidade, e gestante HIV e sua não adesão na
profilaxia pré-natal.
A especialidade Planejamento e Gestão englobou dimensionamento de pessoal,
gerenciamento no PSF, em unidades de hemodiálise, indicadores subjetivos de
qualidade, avaliação de centro de atendimento e indicadores para avaliação de
qualidade do gerenciamento de recursos humanos em enfermagem.
Com relação à Pediatria, os temas encontrados foram: holding, neonato, criança
e adolescentes hospitalizados pais de prematuro em UTI Neo, pais e familiares
no Transplante de Medula Óssea (TMO), percepção materna quanto ao apoio social
recebido no cuidado a crianças prematuras no domicílio, e criança com fribose
cística.
Referente à Saúde Mental foram abordados os seguintes aspectos: saúde mental no
PSF, grupos de acompanhamento a portadores e família de doentes mentais, a
loucura percebida por alunos e egressos da graduação e terapias utilizadas por
hospital catarinense.
As Demandas das políticas públicas foram temas significativos e apontam as
diretrizes nacionais referentes à saúde da mulher, família e o programa de
saúde da família. No que tange à Saúde da Família os temas abordados foram:
pais de crianças e adolescentes hospitalizados, cuidados paliativos
domiciliares, vivencia do transplante cardíaco, apoio social durante a expansão
da família, envelhecimento, mulheres com câncer (Ca) invasivo de colo uterino,
suporte familiar e o significado de família para casais homossexuais.
Na especialidade Saúde da Mulher foram encontrados temas referentes ao
planejamento familiar, à contracepção, climatério, menopausa corporeidade,
aborto, Ca (mudanças no relacionamento com familiares, cônjuge e amigos),
mulheres com HIV/ AIDS, construção social da sexualidade brasileira, e
sentimentos e expectativas das mulheres acerca da citologia oncótica,
Com relação à Saúde ocupacional, o enfoque foi para riscos ocupacionais,
acidentes com materiais biológicos, exposição à radiação ionizante, prevenção
de riscos no ambiente de trabalho e Lesões por Esforço Repetitivo (LER) e
Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT).
No Programa Saúde da Família, encontraram-se: estratégias gerenciais,
conhecimento gerencial do enfermeiro, percepção do Agente Comunitário em Saúde
sobre família saudável, qualidade da atenção ao pré-natal na Estratégia Saúde
da Família (ESF), processo de ascensão ao gerenciamento do território da ESF e
concepções da equipe sobre visita domiciliar.
Bases/fundamentos/concepções de cuidado de enfermagem
Os temas enfocados nesta categoria foram os instrumentos de cuidado, conceitos,
comportamentos e significados de cuidado, perspectivas teóricas e representação
social. Com relação aos Instrumentos de Cuidado, os assuntos abordados foram:
comunicação verbal e não verbal, terapêutica, instrumentos básicos de
enfermagem, terapias complementares (toque, biodança, técnicas corporais,
grupos de gestantes, pesquisas (métodos e técnicas, instrumentos e novas
tecnologias), tecnologias leves e Diagnósticos de Enfermagem. Quanto aos
conceitos encontraram-se temas sobre cuidados primários, integrais e
integralidade no cuidado.
No que tange aos Comportamentos e significados de cuidado os temas enfocados
foram acolhimento, atenção, presença física, significados das dimensões de
cuidado em unidade de emergência. Nas Perspectivas teóricas foram abordados
Teorias de Enfermagem como Oren, Paterson e Ziderad, e humanização.
Referente às Representações sociais, os temas encontrados abrangeram aspectos
de mulheres com hipertensão arterial, direitos dos usuários nos casos de
infecção hospitalar, a infecção hospitalar e os profissionais de enfermagem e
de saúde, o cuidar de doente mental no domicílio, implicações legais da
infecção hospitalar e seu controle, e também com relação aos adolescentes no
pegar, ficar e namorar.
Assuntos profissionais
Os temas encontrados nas pesquisas analisadas permeiam a Ética, a História da
Enfermagem e a dimensão sócio-política da profissão. Referente à Ética, os
temas nas pesquisas foram valores sociais, alteridade, cuidado de si,
construção do conhecimento na graduação de Enfermagem, Bioética, e
posicionamento do profissional sobre a autonomia do paciente terminal,
No que diz respeito à História da Enfermagem, encontrou-se a gênese de
enfermagem hospitalar, enfermagem obstétrica, organização de práticas
hospitalares (determinantes), análise do Jornal da Associação Brasileira de
Enfermagem (ABEn), raízes da enfermagem pré-institucionalização em Recife,
reorganização da escola profissional de enfermeiros(as), enfermeiras do
exército brasileiro na II guerra, sindicalismo em Goiás de 1982 a 2004, e
fragilidades da história de enfermagem do Rio Grande do Sul a partir da década
de 50.
Quanto à dimensão sócio-política da profissão, foram abordados temas sobre
autonomia, papel profissional, liderança nas questões de saúde, visibilidade
profissional, identidade profissional, saberes e verdades acerca da enfermagem
nos discursos de alunos ingressantes, motivação, valorização, significado do
trabalho, processos, sistematização, metodologia assistencial, aspectos sócio-
políticos, e o cuidar no processo de trabalho do enfermeiro na visão docente.
A correlação das categorias e os padrões de conhecimento da enfermagem
O processo de construção do conhecimento na Enfermagem historicamente vem se
desenvolvendo de múltiplas maneiras. Entretanto, ressalta-se que o conjunto
deste serve para fundamentar a prática de Enfermagem, uma vez que possui em sua
constituição diferentes padrões, formas e estruturas que servem como horizontes
de expectativas, e exemplificam modos característicos de pensar a respeito de
seus fenômenos(5). Assim, a consolidação deste conhecimento na produção e
ampliação do conhecimento, tem se dado mediante o entrelaçamento dos padrões
empírico, ético, estético, desconhecer e sócio-político(5-7).
O padrão empírico ou conhecimento científico caracteriza-se por ser organizado
sistematicamente em leis teóricas e gerais com o propósito de descrever,
explicar e predizer fenômenos de interesse especial para a Enfermagem, deriva
da pesquisa e é considerado fonte inicial do conhecimento da enfermagem.
O que abrange o padrão ético é o conhecimento moral da enfermagem e tem como
norte a responsabilidade, o julgamento sobre o que é bom ou não, se deve ou não
ser realizado, e requer do profissional a clareza e conhecimento dos princípios
éticos da sociedade e da profissão(8).
Quanto ao padrão estético que compreende a arte da enfermagem, ele está visível
na ação do cuidar e se manifesta por meio da interação entre o enfermeiro e o
indivíduo que está sob seus cuidados, de modo a possibilitar uma compreensão do
significado em uma expressão subjetiva, única e particular, pois esse padrão é
expresso através de ações, comportamentos, atitudes, condutas e ação recíproca
da enfermagem com as pessoas(8).
O padrão desconhecer é o reconhecimento do enfermeiro em perceber que não
conhece a subjetividade do outro, do seu mundo, e permite-se abrir, estar
autenticamente presente, descobrindo e estabelecendo uma interconexão com a
incógnita do outro e sua vida. O enfermeiro sai de si, deixando seus valores e
crenças em suspensão, e compartilha os sistema de crenças, as histórias do
outro numa comunhão intersubjetiva(6).
No que se refere ao padrão sócio-político, este conhecimento propicia ao
enfermeiro uma percepção do contexto no qual o cuidado e a enfermagem estão
localizados, e leva a questionamentos sobre a sua prática, a profissão e as
políticas de saúde. Pode ser concebido em dois níveis: o contexto sóciopolítico
das pessoas (paciente e enfermeiro), e o da enfermagem, enquanto prática
profissional, proporcionando uma percepção do enfermeiro, da sociedade e das
políticas públicas.
As categorias encontradas a partir de pesquisas qualitativas produzidas e
publicadas em periódico nacional, têm relação com os padrões de conhecimento,
pois ao analisarmos sua composição, muitos dos temas podem estabelecer uma
ligação direta com os modelos de conhecimento estudados pela enfermagem
mundial, e, na medida em que realizamos esta comparação, cria-se a
possibilidade de perceber o papel social do conhecimento produzido.
A categoria formação de enfermagem relaciona-se aos padrões de conhecimento
científico e sóciopolítico. Com relação ao primeiro, justifica-se com os
aspectos mencionados nas pesquisas que contribuem para esclarecer e construir
conhecimento na área de educação em enfermagem. Ao padrão sociopolítico
relacionam-se dois sub-temas: dimensão das políticas na formação de recursos
humanos e educação em saúde.
Destaca-se que as diretrizes curriculares são imposições nacionais
determinantes da formação profissional. Já as práticas de educação em saúde
podem contribuir para a enfermagem e prover domínio crítico dentro do meio
social, de modo a afetar a vida das pessoas.
A categoria áreas de atuação correlaciona-se com o padrão sociopolítico,
conhecimento científico e desconhecer. O padrão sociopolítico pode ser
encontrado nos temas sobre as demandas das políticas públicas nos programas
saúde da mulher, família, ocupacional e do PSF. Portanto, ao produzir pesquisas
que abarcam esta temática, a enfermagem pode refletir a política em dois
níveis: a interna (das pessoas ser humano e enfermeira) e externa (da
enfermagem como prática profissional), pois o primeiro nível considera o
interesse na identidade cultural, e este influencia a compreensão das pessoas
sobre saúde, causas das doenças, linguagem, identidade e conexão com o país. O
segundo refuta os fundamentos estruturais do meio social, da política,
economia, e analisa como afeta a vida das pessoas e das comunidades.
No padrão do conhecimento científico, as pesquisas desenvolvidas apontam o
interesse e o compromisso com o crescimento e desenvolvimento do saber da
enfermagem, aspectos que têm preocupado as enfermeiras, como as especialidades
em que há uma atuação marcante da categoria, ou como atender os aspectos
epidemiológicos, sociais e de maior necessidade de investimento em cuidados de
enfermagem e de saúde. O padrão desconhecer nas áreas de atuação de enfermagem
aponta o quanto ainda a profissão precisa crescer e aperfeiçoar sua atuação
profissional.
A categoria Bases/fundamentos/concepções de cuidado expressa como a enfermagem
pode e tem melhorado as questões filosóficas e existenciais da profissão, para
ter um sustentáculo de suas ações com corpo de conhecimento que caminha para a
solidez. Os padrões do conhecimento na produção mostram os aspectos éticos,
estéticos e o desconhecer.
O padrão ético está presente nas pesquisas ao considerar os comportamentos e
significados do cuidado. O estético aprecia os instrumentos de cuidado e é um
aspecto característico do cuidado de enfermagem. O desconhecer aparece com um
número significativo de trabalhos fundamentados no referencial teórico das
representações sociais, numa possibilidade de compreensão de como os seres
humanos apreendem suas experiências, para, a partir desta, oferecer um cuidado
de enfermagem com significado.
A categoria assuntos profissionais associa-se ao padrão ético e sociopolítico.
A ética é percebida nos valores sociais, na alteridade, no cuidado de si e
outros que manifestam o compromisso da enfermagem com a vida e com o ser
humano. O padrão sociopolítico aparece nos temas referentes à história da
enfermagem e na dimensão sóciopolítica da profissão. No primeiro, tenta
elucidar o caminhar da profissão, uma vez que somos resultantes de um passado
remoto e distante, e nas questões do segundo, considera a autonomia, o papel
profissional, a liderança, motivação e outros que apontam o quanto a categoria
tem se comprometido com seu próprio desenvolvimento.
É interessante mencionar que os padrões de conhecimento são dinâmicos,
multidimensionais, e nem sempre é possível identificar as categorias utilizando
somente um padrão porquanto aparecem entrelaçados. É preciso aceitar que o
conhecimento produzido nunca poderá explicar o inexplicável e o não conhecido
dos pacientes, enfermeiras, relacionamentos, cuidado, processo saúde-doença e
questões sócio políticas(8).
Papel social das pesquisas qualitativas: breve reflexão
Considerando que a formação em enfermagem foi um dos temas mais evidenciados,
podemos visualizar a importância do papel social deste tipo de pesquisa, visto
que nela pode preponderar o desenvolvimento das atividades docentes em
diferentes níveis, e incitar mudanças na readequação de suas atribuições. Há
uma possibilidade de reflexão por parte dos docentes em relação à sua prática
que influenciará a formação discente, e, em última instância, a qualidade do
cuidado oferecido à população.
Com relação às áreas de atuação obstetrícia e planejamento e gestão, podemos
destacar que o papel social da enfermagem com relação ao nascimento é uma
situação que vem se perpetuando ao longo da história da profissão. O
planejamento e gestão têm marcado a nossa presença no sistema de saúde,
apontando, neste contexto, um papel social que está em processo de
desenvolvimento e consolidação.
No que diz respeito às demandas públicas, a enfermagem tem atuado de maneira
significativa na operacionalização de programas governamentais em suas diversas
instâncias. Especificamente no Programa Saúde da Mulher, a profissão, em função
da questão de gênero, tem contribuído consubstancialmente ao longo da sua
construção histórica. No PSF, a nossa atuação e contribuição tem sido na
tecitura e fortalecimento das equipes de saúde, de modo a articular o cuidado
ao indivíduo, família e comunidade.
A Enfermagem, ao transubstanciar bases teóricas para sua vivência, transforma e
fortalece o ato de cuidar em situações da trajetória existencial do ser humano,
com foco na proteção e promoção da vida. Esta experiência ratifica
permanentemente o papel social da profissão, propiciando um processo de
reconstrução e reafirmação com a sociedade, porque tem não apenas a missão e a
capacidade de resolver problemas mediante uma prática humana, ética e
solidária, mas detém a aceitação pública.
Ao estabelecer a relação entre as categorias encontradas e os padrões de
conhecimento, observamos que, por um lado sobressai o conhecimento
sóciopolítico, e por outro, um equilíbrio entre os padrões conhecimento
cientifico, ético e desconhecer.
Com relação ao equilíbrio encontrado entre os temas e padrões de conhecimento
científico, ético e desconhecer, podemos apreender que é uma característica da
pesquisa qualitativa, visto que favorece um aprofundamento do significado das
crenças e valores dos seres humanos, bem como de suas ações e relações,
possibilitando, desta forma, uma fundamentação diferenciada para o cuidado de
enfermagem.
O conhecimento sóciopolítico aparece nos temas estudados como um amplo contexto
do processo de cuidar, que inclui o processo organizacional, cultural e
político que influenciam paciente, família, enfermeiro, outros profissionais da
saúde, a profissão e diversas estruturas que envolvem o cuidado.
Os temas encontrados justapostos ao padrão de conhecimento dominante mostram o
interesse da enfermagem pela identidade cultural. Esta influencia a compreensão
de cada uma das pessoas sobre saúde, a causa das doenças, linguagem, identidade
e a conexão com o país, e apontam um domínio crítico dentro da profissão, no
que se refere aos fundamentos estruturais do meio social, da política e da
economia, e analisam como este domínio afeta a saúde das pessoas e das
comunidades.
O papel social da enfermagem reflete a dimensão sociopolítica da profissão ao
mostrar o compromisso com a vida e o cuidado em sua multidimensionalidade e
complexidade, além de situar o enfermeiro num contexto em que a profissão e o
cuidado em saúde estão entrelaçados e localizados, de modo a gerar inquietações
e questionamentos que englobam uma multiplicidade de questões como a história e
a ética. O aspecto tratado aborda o ser do enfermeiro e a expressão da
enfermagem, traz a possibilidade de mudanças significativas na dimensão pessoal
e profissional, e, por fim, reflete no outro enquanto ser cuidado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa qualitativa nos estudos analisados aponta um olhar diferenciado para
a prática da enfermagem, uma vez que expande suas perspectivas ao considerar a
complexidade e diversidade do ser humano. Ao possibilitar visualizar o
invisível no visível, mediante a percepção da subjetividade do outro, consegue-
se compreender os fenômenos de interesse para a profissão que ajudarão na
ampliação e construção do conhecimento, assim como fortalecerão o seu papel
social.
Compreender os padrões fundamentais do conhecimento de enfermagem significa a
possibilidade de aumentar a consciência sobre a complexidade e diversidade do
conhecimento, e, neste caso, de justapor ao papel social das pesquisas
qualitativas.
Outra questão que merece ser enfatizada é a identificação da dimensão política
da produção examinada, considerando o período, início do Século XXI. Talvez
isso tenha ocorrido em função do periódico analisado pertencer à ABEn, e, de
certa, maneira, explicitar sua agenda e lutas em prol da profissão; outro
aspecto é o amadurecimento da profissão em relação às questões sociais
intrínsecas que fazem parte do seu corpo social, e as extrínsecas que são as
demandas da sociedade. Isso significa que não basta simplesmente pesquisar. É
preciso ter clareza sobre o que pesquisar, para que e para quem servirá o
conhecimento produzido, e projetar qual será seu impacto para a sociedade. Isso
tudo reafirma o compromisso ético e o papel social da pesquisa qualitativa na
enfermagem. Assim, a pesquisa em tela, mostra que merece ser destacada a
amplitude e importância de temas enfocados, visto que apontam o compromisso da
categoria com a produção do conhecimento.