Interações no ambiente de cuidado: explorando publicações de enfermagem
INTRODUÇÃO
O ambiente de cuidado caracteriza-se como local aglutinador de aspectos
físicos, biológicos, científicos, culturais, sociais, econômicos, entre outros,
em uma teia de relações onde se torna difícil excluir ou isolar partes e que as
"partes exercem ação e inter-retroação contínua"(1), levando ao estabelecimento
de relações de cuidado em situações vitais que envolvem o processo saúde-
doença.
O ser humano constrói suas relações sociais ocupando-se e preocupando-se com
pessoas e coisas a ponto de reconhecer-se como "ser-no-mundo-com-outros" e, com
isto, dedicando-se e inserindo o cuidado em tudo que lhe representa importância
e valor(2). Compreendemos que, para cuidar, o enfermeiro necessita de relações
que estabeleçam proximidade entre os sujeitos e culminem com processos
interativos mútuos, onde o diálogo e o contato são valorizados, sempre
embasados na ética e respeito à condição do ser como sujeito de direitos,
desejos e saberes.
É por meio do processo interativo que o enfermeiro realiza o cuidado, tendo em
vista que as interações constituem o centro da dinâmica que compõem o mundo,
sendo reconhecidas pelo encontro ou influencia entre pessoas, podendo convergir
em estados de inter-relação e interdependência capazes de definir condutas,
atitudes e formas de convívio individual e coletivo(3).
A interação é um processo de percepção e comunicação entre pessoas que se
manifesta por condutas verbais e não verbais dirigidas a um objetivo. Esta
relação se constitui em uma experiência de aprendizagem pelas quais as pessoas
interagem para enfrentar um problema de saúde, para colaborar em sua evolução e
para buscar adaptar-se às situações que envolvem o processo de saúde-doença(4).
Desta forma, compreender as interações que ocorrem no processo de cuidar
demanda reconhecer as particularidades inerentes à subjetividade dos sujeitos,
a multiplicidade de interpretações possíveis pela mente humana, assim como os
sentimentos que estão envolvidos no processo de cuidado. Estes reconhecimentos
demandam ampliar o olhar e estar aberto para a compreensão de fatos e fenômenos
distintos que ocorrem em um mesmo ambiente e permeiam todas as ações de
cuidado.
No entanto, a dinâmica existente entre os envolvidos no cuidado, assim como
seus mecanismos e particularidades "não estão à vista"(5), sendo que, no cerne
das relações, existem ideologias, aproximações, distanciamentos, ideias comuns
e, ao mesmo tempo, discordantes, que se unem e se afastam ao ponto de gerarem
uma 'dança interativa'. Esta relação interativa desenvolve-se na perspectiva de
que o cuidado conjuga vários participantes, que conectados constituem teias
estruturais que compõem e caracterizam o cuidado, identificado por um
"emaranhado de redes inseridas em redes maiores"(6).
A formação de enfermeiros aliada à qualificação dos profissionais nos níveis de
mestrado e doutorado tem sido enriquecida pelos grupos de estudos, que
consistem em locais de permanente processo interativo. Nesta perspectiva o
Grupo de Estudo e Pesquisa em Administração/Gestão em Enfermagem e Saúde
(GEPADES) vem investigando e renovando conhecimentos em enfermagem. Dentre as
várias discussões realizadas nesse grupo, o ambiente de cuidado tem sido objeto
de estudo inserido em um projeto de pesquisa intitulado "Concepções de sistema
organizacional de saúde e enfermagem pelo olhar da complexidade das práticas
dos serviços de saúde em ambientes mais saudáveis". Junto a esta temática
surgiram alguns questionamentos tais como: Qual a dimensão da interação no
ambiente de cuidado? O que a enfermagem e outras ciências têm produzido de
conhecimento a cerca das interações no sistema de cuidado?
Estes questionamentos motivaram a busca de conhecimentos nas publicações de
enfermagem, resultando nas discussões aqui apresentadas. Assim, este estudo tem
como objetivo apreender a temática das interações no ambiente de cuidado a
partir de publicações em periódicos de enfermagem.
Fundamentado nessas assertivas é que se justifica o presente estudo, posto que
é preciso compreender a dinâmica existente no processo interativo de cuidar em
saúde e Enfermagem para que seja possível redimensionar o cuidado e o ambiente,
adequando-os às demandas e necessidades de saúde, assim como das organizações
de serviços, aliando tais necessidades aos avanços científicos e tecnológicos
na busca por melhores práticas para o cuidar em saúde.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, efetuada por meio de busca em
periódicos da área de enfermagem, quais sejam: Revista Texto & Contexto
Enfermagem, Revista Brasileira de Enfermagem, Revista Gaúcha de Enfermagem e
Revista Latino Americana de Enfermagem. O estudo privilegiou a análise
qualitativa dos dados, levando-se em consideração que a pesquisa bibliográfica
é aquela "desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído
principalmente de livros e artigos", e utiliza as "contribuições dos diversos
autores sobre determinado assunto"(7).
Para a coleta de dados, fez-se um recorte temporal dos anos de publicações das
revistas restringindo-se ao período de 2000 a 2007, por considerar que as
publicações do referido período seriam mais facilmente localizadas, inclusive,
disponíveis em meio eletrônico. O outro recorte foi em relação aos periódicos,
escolhidos intencionalmente, levando-se em consideração o aceso e
disponibilidade dos mesmos pelos pesquisadores. Nesse sentido foram
selecionadas quatro revistas brasileiras de enfermagem, de circulação
internacional. O acesso às revistas foi facilitado, pois estão disponibilizadas
em formato impresso em biblioteca pública e também em formato digital na rede
mundial de computadores.
De posse dos volumes e números, as revistas foram separadas por ano, para, em
seguida, ser iniciada a leitura e identificação dos textos de interesse para o
estudo. Para a coleta de dados foi utilizada a leitura de todos os títulos,
resumos e descritores buscando extrair aqueles que traziam a temática das
interações no cuidado em saúde e enfermagem. Caso a análise desse elemento não
fosse suficiente para a seleção do artigo, pois na maioria das vezes, o
processo interativo não estava exposto de forma clara e sim implicitamente
colocado no texto, foi realizada leitura exploratória do artigo na sua
totalidade.
O critério utilizado para inclusão do artigo no banco de dados da pesquisa
centrou-se na condição de apresentar, mesmo que de forma indireta, aspectos que
permeavam a interação no processo saúde-doença. Isto é, em alguns textos, a
interação emergiu a partir da análise e discussão dos autores, muito embora o
termo não fizesse parte do título e/ou dos resumos.
Além da temática da interação foram identificados alguns dados considerados
importantes como: titulação dos autores, modalidade do artigo e significados de
interação construídos a partir dos textos. A coleta de dados foi efetuada
durante o ano de 2008, sendo que fizeram parte do acervo bibliográfico 2.548
artigos, dos quais 331 foram selecionados para compor esta pesquisa.
Após a leitura e seleção dos artigos, foi iniciada a etapa de análise baseada
nos pressupostos da Análise Temática, que "consiste em descobrir os núcleos de
sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou frequência signifiquem
alguma coisa para o objetivo analítico visado"(8). Para Minayo(8), a noção de
Tema, está ligada a uma afirmação a respeito de determinado assunto e pode ser
apresentada por uma palavra, frase ou resumo. A operacionalização do estudo
seguiu as três etapas da Análise Temática. A primeira etapa ou de Pré-Análise
consistiu na leitura exaustiva dos artigos (leitura flutuante), seguida da
organização do material (Constituição do Corpus) e a formulação de hipóteses. A
segunda etapa compreendeu a exploração do material, que consistiu na
codificação dos dados brutos. Por último, foi realizado o tratamento dos
resultados e interpretação apresentados em unidades temáticas.
A análise e interpretação dos dados permitiu o reconhecimento de estruturas de
relevância, convergindo na identificação de códigos primários e famílias de
códigos que permitiram a construção de cinco unidades temáticas, apresentadas
com partes textuais.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A avaliação dos artigos selecionados permitiu o reconhecimento do perfil das
pessoas que escrevem, sendo a maioria deles doutores e mestres (Tabela_1).
Outro fator importante foi identificar que a maioria (78.6%) dos estudos
publicados são pesquisas, seguidos de 10.6% de relatos de experiência, 5.7% de
reflexões teóricas, 1.8% de estudos de revisão, 1.8% são estudos de caso e 1.5%
dos estudos são ensaios teóricos.
![](/img/revistas/reben/v64n3/a24tab01.jpg)
As relações entre os seres são consideradas complexas, pois são "a um só tempo
acêntricas, policêntricas e cêntricas"(9), se auto regulam visando um cuidado
participativo e transformador. Produzir conhecimento acerca destas relações
torna-se tão complexo quanto o fenômeno do qual decorrem, sendo tal dificuldade
motivada pela multiplicidade de reações que o ser humano desenvolve em suas
relações sócio-afetivo-político e culturais e pela forma com que regula suas
ações, reações e interações no mundo em que vive.
Assim, de 2.548 artigos que compunham o acervo bibliográfico desta pesquisa,
apenas 331 desvelaram as características do ser humano como ser gregário e em
constante interação com o mundo que o cerca, neste caso o ambiente de cuidado e
seus constituintes. Tais artigos foram capazes de mostrar o ser humano como ser
singular, que tenta conceber a articulação, a identidade e a diferença de todos
os aspectos envolvidos no cuidado, culminando no estabelecimento de
conhecimentos que fortalecem as ações em saúde e Enfermagem(10). As unidades
temáticas que emergiram da análise dos dados estão expostas a seguir.
Unidade temática 1: Atitude de interação
A interação no ambiente de cuidado nos artigos analisados se traduz em atitudes
realizadas para promover, manter ou recuperar a saúde. Com destaque para a
comunicação efetiva e solidária, que possibilita demonstrar interesse, atenção,
sentimentos e possibilidades. Expressa por meio de sorrisos, conversas,
brincadeiras, esclarecimentos sobre os procedimentos, orientações e estímulos
para o autocuidado, que favorecem o alívio das sensações de medo, dor,
preocupação, angústia e pânico. A comunicação viabiliza uma relação dialógica
ao acolher a palavra do outro, oportunizando a escuta, a troca de informações e
a demonstração de disponibilidade.
Outra estratégia explicitada nos estudos é a linguagem não verbal, sendo
expressa com o emprego do silêncio, do toque, do afago, dentre outros atos que
se complementam para que a comunicação aconteça de forma terapêutica e eficaz.
Assim, a comunicação não verbal pode complementar a informação verbal,
oferecendo indícios sobre emoções ou mesmo controlar/regular os relacionamentos
(11), como demonstram os achados a seguir:
Processo de aproximação entre pessoas que demonstram sentimentos
mútuos de empatia, compreensão, cumplicidade, afeto e respeito(12).
Pelo diálogo vivido os seres buscam compreender o dito e o não dito
na inter-relação. Assim, entende-se que o dialógico no ser-com-o-
outro lança um novo olhar, uma nova possibilidade de ser, saber e
fazer, de uma nova percepção de encontro de cuidado em Enfermagem
(13).
Nas atitudes de interação também ocorrem ações que estimulam a aproximação do
outro numa relação intersubjetiva como ao colocar-se à disposição e importar-se
com cliente, valorizando seus sentimentos, sua subjetividade, sua
individualidade e sua autonomia. Atitudes estas exemplificadas nos estudos
selecionados em ações como chamar o indivíduo pelo nome e observar
acontecimentos cotidianos que passam com o mesmo, evidenciando, desta forma que
o sujeito existe como pessoa e possui identidade distinta dos demais.
A atitude de interação também pode ser expressa pela forma com que a equipe de
enfermagem e interdisciplinar exerce ações sustentadas na flexibilidade, na
capacidade de adequação de condutas às demandas individuais, no compromisso
ético e na valorização dos espaços do sujeito no processo assistencial.
No tocante aos valores e sentimentos é vislumbrado o amor, a amizade, a
afetividade, a empatia, a confiança, a credibilidade, a responsabilidade, o
respeito ao outro, a privacidade e a compreensão das diferenças como
ferramentas importantes no processo interativo e que favorecem o exercício da
sensibilidade.
Em relação ao trabalho da Enfermagem propriamente dito, são referenciados como
instrumentos de interação as atividades lúdicas, a interdisciplinaridade, o
trabalho em equipe, a ação reflexiva e criativa dos profissionais, a visita de
enfermagem, a habilidade de negociação, troca e reciprocidade na busca de
relações éticas e interpessoais.
Unidade temática 2: O processo interativo e suas finalidades
As interações entre os seres são as bases para a construção do cuidado de
Enfermagem, ora voltado para o indivíduo, ora para os grupos de pessoas, mas
sempre concebendo "o social como uma condição humana fundamental, pois o ser
humano não vive senão em relação com o outro"(10).
O processo interativo tem por finalidade favorecer o encontro entre pessoas e o
estabelecimento de vinculo entre profissional, paciente e sua família
cuidadora. Desta forma a interação evita o distanciamento afetivo e minimiza o
isolamento dos clientes bem como o estresse emocional e o medo, ampliando o
autoconhecimento, a autoaceitação e a reflexão crítica.
A interação e o diálogo permitem estabelecer e atingir objetivos em comum, que
propiciam a troca de experiências e conhecimentos, momentos de reflexão,
compartilhamento de ideias e decisões, culminando no enriquecimento mútuo e
transformação dos envolvidos visando qualificar o atendimento. Ainda, objetiva
resgatar o valor da pessoa humana, entendendo as diferenças e respeitando as
peculiaridades individuais, evidenciando no movimento da interação enfermeiro-
cliente uma oportunidade para a humanização do cuidado.
A interação também é vislumbrada como um processo agregador, pois viabiliza o
trabalho em equipe, a inclusão da família no contexto de atenção à saúde, tanto
no acesso aos serviços como na participação nos procedimentos enquanto
acompanhante, como ilustram as seguintes falas:
Através do relacionamento, pode-se estabelecer vínculos que
potencializem o healing, que tragam sentido para a existência, que
transcendam o físico, conectando o mundo interior dos seres, numa
relação transpessoal(14).
[...] a comunidade em geral é favorecida através dos conhecimentos
repassados mediante atividades desenvolvidas pelo grupo(15).
O contato interativo entre pessoas que sofrem dos mesmos problemas é uma forma
de inclusão e estruturação de redes de suporte, enriquecendo o cuidado e
permitindo o estabelecimento de novas formas de cuidar por meio da troca de
vivências, experiências, aprendizados e sentimentos.
Desta forma, a interação no ambiente de cuidado é em síntese: um processo de
inter-retro-ação contínuo entre todos os envolvidos no cuidado, tendo como
objetivo mutuo a atenção às necessidades humanas em sua totalidade, sendo
utilizada como ferramenta do cuidado e estabelecida pela relação horizontal e
dialógica entre os seres, permeada pela prática comunicativa e relacional que
culmina com o cuidado em saúde e enfermagem.
Unidade temática 3: Cuidado mediado e ampliado pelo processo interativo
O cuidado foi vislumbrado como resultado de múltiplas interações, sendo
subjetivo e indo ao encontro às necessidades individuais, fato que em muitas
ocasiões o torna pouco visível ou concreto, bem como tornando sua definição
mais ampla e maior do que determinados conceitos, mensurações ou medidas. O
cuidado está dissolvido nas ações e emoções compartilhadas e construídas com o
outro em um processo interacional mutuo(16).
Corroborando este pensamento, o cuidado de enfermagem é reconhecido como
relacional, recíproco, alicerçado na ação solidária, comprometido e igualitário
entre profissionais e pacientes, permitindo o entrelaçamento de atitudes e
interações orientadas para a abertura de espaço em direção a dimensão objetiva
e sensível do cuidado. As falas, a seguir, ressaltam o processo interacional do
cuidado.
Constitui-se em um conjunto de relações entre sujeitos, em um sistema
operante que, em suas relações internas com seus componentes e em
suas relações com o ambiente externo, é capaz de se auto-organizar,
de se auto determinar, pressupondo rupturas e superações(17).
A enfermagem mantém uma contínua convivência com os clientes, de modo
que isso possibilita grandes oportunidades de interação(18).
Assim, o cuidado é ampliado pelo processo de interação, quando apresenta
diálogo, troca de informações, experiências e sentimentos(19). Apenas por meio
da articulação das ações e interações entre os participantes do cuidado, é
iniciado o caminhar para o trabalho que atende às necessidades
multidimensionais dos indivíduos, resgatando a visão holística do ser humano em
sua integralidade e totalidade, culminando num cuidado humanizado.
Unidade temática 4: Interação prejudicada
O ambiente de trabalho deveria ser um local que proporciona o desenvolvimento
de relações humanas sustentáveis, favorecendo o estabelecimento de inter-
relação entre atitudes e conhecimentos que proporcionam "decisões
compartilhadas, aproximações não convencionais e convívios entre diferentes"
(19).
Porém é comum a verificação de ocorrência de situações de conflito no ambiente
de cuidado, sendo que estas relações entre ordem/desordem/auto-organização
ocorrem conferindo estado de equilíbrio dinâmico e tornando necessário o
estabelecimento de movimentos em direção a coexistência sem a exclusão e a
convivência harmoniosa em uma mesma realidade(1), como ilustram os achados a
seguir:
O que se encontrou foram os profissionais distantes da atenção direta
e nas ocasiões em que ela se caracterizava era através de um modo
negativo de ser/ estar com o outro(20).
A falta de informações e instruções adequadas e necessárias, no
decorrer do trabalho de parto e do parto, é percebida pelas pacientes
como descaso, provocando nelas o sentimento de indignação, pois se
sentem abandonadas e desrespeitadas(21).
Nesta perspectiva, foram evidenciados nos dados formas de interação
prejudicada, como, por exemplo, o uso de poder nas relações interpessoais por
parte de enfermeiros e médicos na execução de suas atividades assistenciais bem
como nos relacionamentos com os demais membros da equipe, acompanhantes e
clientes Foi exposto ainda que o uso da linguagem é fator de distanciamento e
exclusão, quando empregada de forma codificada pelos profissionais, sendo
barreira à comunicação democrática.
No entanto, há como contra ponto o acúmulo de funções para o enfermeiro, o
surgimento de dificuldades pessoais e estabelecimento de momentos de ausência e
fragilidades nos vínculos com a equipe, o que oportunizada situações de
conflitos entre os membros da equipe de enfermagem, acompanhantes e pacientes.
No que tange às dificuldades na execução do trabalho, estão incluídas: excesso
de burocracia, salário incompatível com a responsabilidade, descrição das
rotinas como fator negativo devido à inflexibilidade, gasto excessivo de tempo
com o gerenciamento da unidade, sentimento de angústia e estresse devido às más
condições de trabalho, causadas pela falta de recursos materiais e humanos, bem
como aparente descompromisso com a execução do trabalho por membros da equipe
evidenciado pelo elevado absenteísmo.
No tocante às dificuldades nas interações profissional/paciente é expresso o
medo de contágio pelas doenças, o rodízio de profissionais, a confusão no
reconhecimento da atuação de cada profissional, bem como, clientes e familiares
insatisfeitos e desgastados com os serviços de saúde.
A condição de desordem crescente- interação prejudicada - torna possível surgir
do ser uno, isolado do convívio e da interação, levando ao afastamento que
culmina com a negligência, desconforto e descuidado consigo e com os demais
componentes do ciclo vital. Cuidar em saúde demanda empregá-lo em adequada
quantidade, não sobrepor ações mecanizadas e rotineiras às de afeto e atenção,
já que, justamente, o "equilíbrio dinâmico"(2) favorece a obtenção de
resultados terapêuticos satisfatórios nos mais diversos cenários em saúde.
Assim, o processo de viver e interagir deve transcender as diversas
dificuldades de relacionamento, inclusive as formas de poder e de dominação,
pois a teia da vida consiste em "redes dentro de redes", ou seja, não há acima
ou abaixo, e sim, redes inseridas dentro de outras(6).
Unidade temática 5: Interação como instrumento de gestão e formação do sistema
de saúde
A Enfermagem desempenha um papel fundamental no processo assistencial e
gerencial dos serviços em saúde. Além da demanda tecnológica que vem sendo
incorporada ao cotidiano da profissão, há uma preocupação com os aspectos
relacionados ao ambiente de trabalho. Assim, os dados revelam que o grande
desafio de quem gerencia o cuidado é utilizar as relações como forma de
tecnologia, Visando satisfazer as necessidades dos indivíduos ao mesmo tempo em
que valoriza os trabalhadores e os usuários.
Evidenciou-se que as reuniões em equipe tem sido um instrumento adequado para
discutir coletivamente as questões de interesse comum, oportunizando a abertura
para críticas bem como amplia o compartilhamento de poder no processo
decisório. O exercício da gestão baseada em relações horizontais com os membros
da equipe minimiza o autoritarismo, favorecendo liderança participativa, a
experimentação da corresponsabilidade e do pró-atividade por todos, em busca da
prática efetiva das ações em saúde.
O sistema de saúde é constituído por um conjunto de componentes em uma teia
viva, dinâmica, repleta de particularidades e peculiaridades que o distinguem
de máquinas ou de conjuntos tecnológicos. "A máquina pode ser controlada; de
acordo com a compreensão sistêmica da vida, o sistema vivo só pode ser
perturbado"(22), ou seja, o sistema de saúde é extremamente complexo e se
"auto-eco-organiza" em um conjunto onde não há uma verdade absolutamente certa,
mas contínuo diálogo com a incerteza(1), como demonstram as seguintes falas:
O sistema de cuidado em saúde se configura por movimentos/ondulações
de relações, interações e associações em estruturas e propriedades de
processos auto-eco-organizadores de dimensões variadas de cuidado(23:
469).
[...] a interdisciplinaridade faz com que profissionais com objetivos
comuns solidarizem-se com os outros sujeitos permitindo uma autonomia
que integre os componentes da decisão, do desenvolvimento de
capacidades, da criatividade, da auto determinação mas, antes de
tudo, do pluralismo que marca o nosso tempo(24:330).
Assim, o sistema de saúde é apontado como uma organização multidimensional
composta por todos os constituintes do cuidado envolvidos em um nível
interacional mais amplo. Tem a perspectiva do exercício do trabalho com metas,
visando a multi e interdisciplinaridade, a possibilidade de novas alianças com
o paciente, a promoção de ações mais solidárias, terapêuticas e culturalmente
centradas no sistema familiar de cuidados.
Ainda revelam o desejo da construção de relações mais harmônicas e humanas
valorizando o sujeito trabalhador e o ser cuidado, considerando o contexto
sócio-cultural do cliente e o uso da comunicação efetiva na abordagem
educativa, preconizando a não realização de julgamentos nas relações de
cuidado.
CONCLUSÕES
A partir dos textos publicados, produto de investigação e de reflexão, a
interação é apresentada como elemento essencial do cuidado associada às
características como empatia, respeito, responsabilidade, ética, compaixão,
relação de ajuda, comunicação e compreensão. Os vários contextos, concepções e
dimensões do processo interativo apresentados nos artigos, às vezes explícita,
outras implicitamente, demonstram que os enfermeiros têm contemplado a
interação como elemento essencial para o cuidado e como preocupação para a
pesquisa.
Todos os textos afirmam que o cuidado existe com a interação em atitudes
éticas, de respeito, de responsabilidade e de sensibilidade fundamentada na
abertura ao diálogo. Além disto, também trazem o cuidado como processo
interativo ou trabalho em equipe, caracterizado pelo diálogo de iguais e pela
horizontalidade de saberes. A interação é ainda apresentada pela qualidade dos
encontros enfermeiro-sujeito, enfermeiro-equipe e enfermeiro-instituição, fato
que contribui para a satisfação do usuário e para o alcance de resultados
positivos para o plano terapêutico.
Estas constatações revelam que as interações constituem o cerne do cuidado
sendo objeto-produto das ações em saúde, estabelecidas por meio de formas de
comunicação que possibilitam o desenvolvimento das relações e interações que
culminam no agir em saúde e enfermagem.