Avaliação do crescimento e desenvolvimento de crianças institucionalizadas
INTRODUÇÃO
O crescimento e desenvolvimento da criança é o principal indicador de suas
condições de saúde. Assim, o Ministério da Saúde prioriza seu acompanhamento
desde o nascimento até os dez anos de idade na atenção básica, por meio da
consulta de puericultura, buscando detectar precocemente alterações no
crescimento e desenvolvimento da criança para evitar complicações(1).
O crescimento, de um modo geral, é considerado como aumento do tamanho
corporal, que cessa com o término do aumento em altura. Assim, para avaliar o
crescimento infantil é preciso realizar a mensuração e o acompanhamento das
medidas antropométricas da criança, tais como: peso, estatura, perímetro
cefálico e torácico, relacionando-os entre si(1).
Em relação ao desenvolvimento, pode ser entendido como mudança e expansão
graduais; progresso dos estágios mais simples aos mais avançados de
complexidade; surgimento e expansão das capacidades do indivíduo por meio do
crescimento, da maturidade e do aprendizado(2).
Diante da interferência do ambiente de vivência da criança no crescimento e
desenvolvimento infantil, a avaliação das crianças institucionalizadas deve ser
sistemática e periódica. Tal fato destaca-se no Brasil, por haver um grande
número de crianças abandonadas pelos pais, vivendo institucionalizadas em
abrigos.
Uma pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada que seguiu
as orientações do Comitê de Reordenamento da Rede Nacional de Abrigos para
Infância e Adolescência buscou conhecer a situação de abrigos beneficiados com
recursos do governo federal. Foram estudados cerca de 590 abrigos na rede
nacional, e a maioria absoluta das crianças abrigadas tem família (86,7%), cujo
motivo mais citado da institucionalização foi a pobreza (24,2%), tendo se
destacado também outros motivos: abandono (18,9%), violência doméstica (11,7%),
dependência química dos pais e responsáveis incluindo o alcoolismo (11,4%),
moradores de rua (7%) e orfandade (5%)(3).
O ambiente institucional geralmente não oferece condições propícias para o
pleno desenvolvimento de crianças, por uma série de razões, dentre as quais se
podem citar a privação de contato íntimo com a família, elevado número de
crianças por cuidadora, dificultando a estimulação do seu desenvolvimento e um
elevado número de crianças por abrigo, acarretando em menor qualidade no
cuidado e no estabelecimento de laços afetivos(4-5).
Diante dessas considerações, busca-se responder aos seguintes questionamentos:
o crescimento das crianças institucionalizadas está de acordo com os parâmetros
do Ministério da Saúde? O desenvolvimento das crianças institucionalizadas
condiz com os marcos de desenvolvimento infantil propostos pelo Ministério da
Saúde?
Portanto, objetivou-se com este estudo avaliar o crescimento e desenvolvimento
de crianças institucionalizadas, de 0 a 6 anos, comparando com os parâmetros
propostos pelo Ministério da Saúde.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo descritivo, transversal e de natureza quantitativa,
realizado em um abrigo da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social do
Governo do Estado do Ceará. A população foi constituída por 81 crianças, que
residiam em tal instituição durante o período da pesquisa. A amostra foi
composta por todas as crianças que atenderam aos seguintes critérios de
inclusão: estar na faixa etária de 0 a 6 anos e não ser portadora de alterações
físicas, tais como: distúrbios neurológicos, mentais, visuais, endócrinos ou
auditivos, dentre outros que interfiram no crescimento e desenvolvimento
infantil. Atenderam a esses critérios 44 crianças.
Dentre as crianças que não atenderam os critérios de inclusão, vinte
apresentaram distúrbios neurológicos, seis eram portadores de malformações
congênitas, uma apresentava neoplasia cerebral, oito ultrapassaram a faixa
etária estabelecida e duas não possuíam data de nascimento conhecida.
A coleta de dados foi realizada nos meses de março e abril de 2011 por meio do
preenchimento de um instrumento semiestruturado elaborado para consulta aos
prontuários e preenchido pelos pesquisadores; e por meio da realização do exame
físico na criança. Cada criança foi avaliada no consultório médico da própria
instituição, quanto ao crescimento e desenvolvimento infantil (peso,
comprimento, perímetro cefálico, perímetro torácico, marcos do desenvolvimento
infantil), além dos reflexos primitivos em crianças menores de um ano. Os
resultados foram analisados de forma descritiva e apresentados por meio de
tabelas, fundamentados na literatura pertinente.
O estudo respeitou os princípios da resolução nº 196/1996, da Comissão Nacional
de Saúde(6). Para tanto, foi solicitado autorização da Diretora da instituição
para o desenvolvimento do estudo, a qual assinou o Termo de Fiel Depositário e
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, tendo em vista que a mesma é
responsável por todas as crianças do abrigo. Após, o projeto de pesquisa foi
encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará,
que recebeu parecer favorável para seu desenvolvimento, conforme Protocolo nº
283/10.
RESULTADOS
Foram analisadas ao todo 44 crianças abrigadas, na faixa etária de 0 a 6 anos,
que não eram portadoras de alterações físicas, pois as mesmas poderiam
interferir diretamente em seu crescimento e desenvolvimento.
Conforme mostra a tabela_1, predominaram as seguintes características na
amostra: sexo masculino (59,1%); faixa etária entre 24 a 72 meses (56,8%); e
tempo de abrigamento superior a um ano (72,7%).
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As causas mais frequentes foram dependência química dos genitores (36,36%) e o
abandono (31,81%). Esses dados comprovam que essas crianças são oriundas de uma
camada frágil da população e que vivenciaram situações de risco para o seu
crescimento e desenvolvimento físico, mental e social. Acredita-se que essas
crianças viviam em ambientes inapropriados, marcados pela violência e
negligência de seus cuidados.
Avaliação do crescimento das crianças
Abordando a relação peso/idade, percebeu-se que a maioria (61,4%) estava na
faixa de normalidade nutricional, seguida pelas crianças que estavam com peso
baixo (20,4%). Apenas 4,5% das crianças foram classificadas como de peso muito
baixo e 2,3% foram incluídas na faixa de sobrepeso.
As crianças que se encontraram no percentil de normalidade nutricional também
apresentaram normalidade estatural. Diante disso, percebe-se que o ambiente
institucional oferece condições propícias para o crescimento das crianças, o
que pode ser evidenciado pelo fato de haver o oferecimento de dieta balanceada
e completa em nutrientes nesse local.
De acordo com a tabela_4, pode-se visualizar que 72,7% das crianças
apresentaram altura dentro dos limites esperados. Entretanto, foi evidenciada
estatura baixa para a idade em 27,3% das crianças, a qual prevaleceu na fase
pré-escolar.
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Com relação ao percentil peso/estatura, constatou-se que grande parte das
crianças encontrou-se na faixa de normalidade, totalizando 84%. Contudo, 11,4%
das crianças encontraram-se na faixa de sobrepeso e 4,6% na faixa de
desnutrição aguda.
Observou-se que das 37 crianças que se encontrara na faixa de normalidade no
percentil peso/estatura, 11 apresentaram também déficit estatural, o que
permite afirmar que pode estar havendo uma adequação do peso dessas crianças
para uma estatura que não é normal. É preciso que haja uma assistência adequada
a essas crianças, buscando corrigir os motivos que não estão sendo favoráveis
ao seu crescimento linear.
Avaliação do desenvolvimento das crianças
Dentro dos aspectos avaliados do desenvolvimento infantil, têm-se os marcos de
desenvolvimentos como aspectos a serem avaliados, os quais segundo o Ministério
da Saúde, para cada intervalo de idade estabelecido, são atribuídos marcos,
cada um abordando fatores maturativos, psicomotores, sociais e psíquicos(1),
conforme descritos a seguir:
* Crianças de 0 a 1 mês: Na instituição não havia nenhuma criança nessa
faixa etária, assim os reflexos presentes nesse período não foram
avaliados.
* Crianças de 1 a 2 meses: Havia duas crianças na faixa etária de 1 a 2
meses, as quais foram avaliadas quanto aos seguintes marcos:
- Fixa e acompanha objetos em seu campo visual e colocada de bruços,
levanta a cabeça momentaneamente: as duas crianças responderam
positivamente a esses marcos, observando atentamente os objetos
coloridos, conseguiram levantar a cabeça por instantes quando
posicionadas de bruços.
- Arrulha e sorri espontaneamente: as duas crianças não arrulhavam
espontaneamente e nem com estímulos, porém responderam ao sorriso,
olhando atentamente para a examinadora.
- Começa a diferenciar dia e noite: somente uma das crianças demonstrou
permanecer mais acordada e disposta durante o dia, a outra criança
permaneceu sonolenta logo após a avaliação.
* Crianças de 3 a 4 meses: Apenas uma criança avaliada apresentava a faixa
etária de 3 a 4 meses, sendo avaliada quanto aos seguintes marcos:
- Postura: passa da posição lateral para a linha média: a criança
apresentou esse marco, trocava de posição várias vezes, foi ativa nos
movimentos.
- Colocada de bruços, levanta e sustenta a cabeça apoiando-se no
antebraço: a criança demonstrou essa habilidade.
- Emite sons, balbucia: não houve emissão de sons ou balbucios,
apenas sorriso e olhar atento para o observador.
- Conta com a ajuda de outra pessoa, mas não fica passiva: esse marco
não foi encontrado, visto que o lactente permaneceu passivo durante
toda a avaliação.
-Crianças de 5 a 6 meses: Também somente uma criança avaliada
apresentava a faixa etária de 5 a 6 meses, a qual respondeu
positivamente a todos os marcos de sua faixa etária, como estão
citados a seguir:
- Rola da posição supina para prona: o lactente movimentou-se
ativamente tanto no berço quanto no chão.
- Levantada pelos braços, ajuda com o corpo: a criança não se manteve
passiva quando levantada.
- Vira a cabeça na direção de uma voz ou objeto sonoro: mostrou-se
atenta à fala do examinador, e também aos barulhos provocados com
brinquedos.
- Reconhece quando se dirigem a ela: ao chamá-la olhava logo em
seguida, apresentando sorrisos e expressões faciais de satisfação.
* Crianças de 7 a 9 meses: Na faixa etária de 7 a 9 meses, duas crianças
encontravam-se nessas idades, as quais foram avaliadas quanto aos
seguintes marcos:
- Senta-se sem apoio: as duas crianças já sentavam sem apoio e
conseguiam arrastar-se. Uma delas tinha 8 meses de idade e se
colocava de pé com apoio.
- Segura e transfere objetos de uma mão para a outra: elas
demonstraram curiosidade com os objetos ao redor, esforçando-se para
pegá-los, transferindo-os de uma mão para a outra.
- Responde diferentemente a pessoas familiares ou a estranhos:
nenhuma das duas respondeu diferentemente a estranhos. Ao chegar uma
pessoa desconhecida para elas, logo respondiam com sorrisos.
- Imita pequenos gestos ou brincadeiras: apenas uma criança imitava
gestos e brincadeiras, a outra apenas olhava e sorria, mas não
conseguia reproduzi-los.
* Crianças de 10 a 12 meses: Havia três crianças na faixa etária de 10 a 12
meses, as quais foram avaliadas quanto aos seguintes marcos:
- Arrasta-se ou engatinha: as três crianças arrastavam-se,
engatinhavam e se colocavam de pé quando apoiadas sobre móveis ou
pessoas.
- Pega objetos usando o polegar e o indicador: também quanto a esse
marco todas responderam positivamente.
- Emprega pelo menos uma palavra com sentido: nenhuma criança
pronunciava qualquer palavra com sentido, apenas diziam sílabas,
apontavam para o que queriam e balbuciavam.
- Faz gestos com a mão e a cabeça (tchau, não, bate palmas, etc):
todas as três crianças gesticulavam quando estimuladas.
* Crianças de 13 a 18 meses: Havia quatro crianças na faixa etária de 13 a
18 meses, as quais foram avaliadas quanto aos seguintes marcos:
- Anda sozinha, raramente cai: apenas uma criança não andava.
- Tira sozinha qualquer peça do vestuário: apenas uma criança
demonstrou essa habilidade.
- Combina pelo menos duas ou três palavras: somente uma criança
pronunciava cerca de duas palavras, as outras não falavam qualquer
palavra.
- Distancia-se da mãe sem perdê-la de vista: nesse caso foram
consideradas como mãe as cuidadoras. Todas as crianças distanciavam-
se das cuidadoras, mas sempre olhando em busca delas.
* Crianças de 19 meses a 2 anos: Havia cinco crianças na faixa etária de 19
meses a 2 anos, as quais foram avaliadas quanto os seguintes marcos:
- Leva os alimentos à boca, com sua própria mão: foi percebido que
todas elas demonstraram essa habilidade.
- Corre e/ou sobe degraus baixos: todas as crianças movimentaram-se
ativamente, correndo, pulando, subindo degraus.
- Aceita a companhia de outras crianças, mas brinca isoladamente:
observou-se que todas as crianças brincavam umas com as outras, e em
instantes brincaram sozinhas também.
- Diz seu próprio nome e nomeia objetos como sendo seu: nenhuma
criança dizia seu próprio nome ou nomeava objetos como sendo seu. Foi
visto que elas pronunciavam palavras como: tia, neném, tchau.
* Crianças de 2 a 3 anos: Havia oito crianças na faixa etária de 2 a 3 anos
de idade, as quais foram avaliadas quanto os seguintes marcos:
- Veste-se com auxílio: somente três crianças apresentaram esse marco.
- Fica sobre um pé, momentaneamente: todas as crianças apresentaram essa
habilidade.
- Usa frases: apenas uma criança usava frases, as outras pronunciavam
palavras isoladas.
- Começa o controle esfincteriano: nenhuma das crianças possuía o
controle dos esfíncteres, todas elas permaneciam durante todo o dia de
fraldas de algodão, sendo percebida a prática de realizarem as
eliminações vesicais e intestinais na própria fralda.
-Crianças de 3 a 4 anos: Havia sete crianças na faixa etária de 3 a 4
anos de idade, as quais foram avaliadas quanto os seguintes marcos:
- Reconhece mais de duas cores: somente uma criança estava com esse
desenvolvimento adequado, pois conseguia distinguir mais de duas cores.
As outras cinco crianças ainda não haviam apresentado esse marco.
- Pula sobre um pé só e brinca com outras crianças: todas as crianças
apresentaram esse marco.
- Imita pessoas da vida cotidiana (pai, mãe, médico): somente três
crianças demonstraram a prática de imitar os cuidadores, colegas,
professores da escola ou funcionários do abrigo.
* Crianças de 4 a 6 anos: A faixa etária de 4 a 6 anos foi a de maior
predomínio nas crianças participantes do estudo, sendo representada por
11 crianças, as quais foram avaliadas quanto aos seguintes marcos:
- Veste-se sozinha: quatro crianças não demonstraram essa habilidade.
- Pula alternadamente com um e outro pé e alterna momentos cooperativos
com agressivos: foram observados esses comportamentos em todas as
crianças.
- Capaz de expressar preferências e ideias próprias: apenas uma criança
demonstrou dificuldade em expressar suas preferências, ela não demonstrou
interesse em falar de suas idéias.
DISCUSSÃO
Como se observa em pesquisa mais completa e recente sobre o assunto, realizada
pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(3), que analisou 626 instituições
de abrigo em todas as regiões brasileiras, a maioria das crianças abrigadas são
do sexo masculino (58,5%), encontram-se após a primeira infância (61,3%) e a
parcela mais significativa está nos abrigos há um período entre dois e cinco
anos.
De acordo com o estudo realizado no abrigo em Fortaleza, e a pesquisa
desenvolvida pelo IPEA(3), pode-se afirmar que os dados são correspondentes,
nos principais pontos analisados: sexo, idade e tempo de institucionalização.
Isso indica que o perfil das crianças abrigadas na instituição em estudo
assemelhou-se com o das diferentes regiões brasileiras.
Mediante esses dados pode-se constatar também uma permanência inadequada dessas
crianças nos abrigos, contrariando as normas do Estatuto da Criança e do
Adolescente(7), o qual afirma ser o abrigo uma medida provisória e excepcional,
utilizável como forma de transição para a colocação em família substituta, não
implicando privação de liberdade.
Uma pesquisa desenvolvida com 127 crianças comprovou que o abrigamento deveria
ser temporário, ocorrendo até que melhores condições fossem oferecidas às
crianças, no leito da família ou nos casos de adoção, já que são fatores de
risco para o seu pleno desenvolvimento psíquico, interferindo assim no seu
crescimento(8).
Em estudo bibliográfico com enfoque nos fatores que interferem no crescimento
de crianças nos primeiros anos, evidenciou-se a importância dos fatores
extrínsecos como variáveis biológicas, fatores socioeconômicos, culturais,
educacionais, entre outros, exerce grande influência para a ocorrência de
déficits nutricionais e estaturais(9).
Resultados semelhantes foram encontrados em estudo que realizou uma avaliação
antropométrica transversal e descritiva em quatro creches de Minas Gerais com
crianças de baixo nível socioeconômico, entre 16 e 82 meses de idade, no qual
se observou que a maioria das crianças apresentou bom estado nutricional. Ou
seja, eram eutróficas e possuíam peso e altura adequados para idade(10).
Porém, destaca-se que houve divergência entre as classificações das crianças
avaliadas no presente estudo quanto ao peso para idade, embora elas habitem em
uma mesma instituição, onde a rotina, a alimentação e os meios de proteção
contra infecções são os mesmos. Esse fato pode ser explicado pelos fatores
intrínsecos ao desenvolvimento, especialmente destacado pela carga genética,
pois, em igual ambiente, o desenvolvimento físico individual depende de fatores
basicamente hereditários. Por outro lado, se tem demonstrado que crianças de
distintas raças mostram curvas de crescimento semelhantes se as condições
ambientais, a alimentação e a proteção contra as infecções são as mesmas(9).
Resultados diferentes foram encontrados no estudo transversal realizado com
1.386 crianças, menores de cinco anos, que residiam com suas famílias no estado
de Alagoas, o qual apresenta os piores indicadores sociais do país; constatando
a prevalência de déficits estaturais entre as crianças estudadas(11).
Em contrapartida, o estudo transversal que avaliaram 33 crianças pré-escolares
menores de 6 anos em uma creche do Rio de Janeiro constatou que nenhuma delas
apresentou déficit pôndero-estatural e a sua maioria pertencia também à classe
econômica desfavorável(12).
As diferenças entre o presente estudo e o realizado no estado de Alagoas(11)
permitem afirmar que as crianças abrigadas apresentaram índices de estatura
superiores aos das crianças que participaram da pesquisa citada e que vivem com
suas famílias, porém em condições sócio-econômicas desfavoráveis. Já no estudo
em uma creche do Rio de Janeiro(12) não houve alterações estaturais nas
crianças pertencentes, em sua maioria, à classe desfavorável, o que comprova
que o crescimento é influenciado por múltiplos fatores e que a influência
ambiental sobre ele é variável.
De acordo com a observação dos marcos do desenvolvimento propostos pelo
Ministério da Saúde(1), nas crianças abrigadas, foi verificado que em todas as
faixas etárias, exceto entre 5 a 6 meses; pelo menos um marco não foi
alcançado. Houve predomínio de déficits nos marcos sociais e psíquicos em todas
as outras faixas etárias, pois entre as 44 crianças estudadas, 29 apresentaram
pelo menos um desses marcos ausente. Já em relação aos marcos maturativos, 14
crianças demonstraram déficits, elas estavam na faixa etária de 2 a 6 anos. E
quanto aos marcos psicomotores, apenas 3 crianças apresentaram dificuldades, e
estavam entre 13 a 18 meses.
Resultados semelhantes foram encontrados no estudo transversal realizado em um
abrigo da cidade de São Paulo com crianças de 2 a 6 anos de idade, através do
qual foram analisadas habilidades funcionais de autocuidado, mobilidade e
função social. Foi observado enquanto as habilidades motoras não tiveram
déficits importantes, a função social foi significativamente mais prejudicada
(13).
Em contrapartida, um estudo longitudinal, realizado com crianças de 0 a 6 anos
que frequentavam 3 creches da cidade de São Paulo, avaliou as habilidades na
área de linguagem e pessoal-social, o qual foi observado um desenvolvimento
positivo no aspecto social, já na área da linguagem não houve progressos
significativos ao longo das avaliações(14).
Percebe-se que a capacidade de interagir com o meio externo, de comunicar-se e
de realizar tarefas que exigem raciocínio, que competem ao domínio social,
estão prejudicadas nas crianças abrigadas, o que implica na necessidade de
maior atenção nesses aspectos, que são fundamentais para o seu desenvolvimento.
O contrário ocorreu na pesquisa realizada nas três creches da cidade de São
Paulo que não apresentou déficits na socialização, pois as crianças viviam em
família(14).
Sabe-se que as interações sociais e o ambiente familiar no qual a criança está
inserida podem incentivar ou limitar tanto a aquisição de habilidades quanto a
independência funcional. A qualidade das interações sociais nos abrigos
necessita de transformações, visto que são notáveis os prejuízos no
desenvolvimento dessas crianças, como o atraso na linguagem, que é influenciado
pelas relações estabelecidas com as crianças(15).
Pode-se constatar o quanto é importante para o desenvolvimento psíquico e
social da criança a qualidade das relações estabelecidas com as pessoas que a
cercam. Em um abrigo não há a presença materna ou paterna no cotidiano das
crianças que lá vivem, e as pessoas que mais se aproximam dessa função são os
cuidadores, que permanecem a maior parte do tempo com elas, participando
efetivamente de todas as atividades, como alimentação, higiene, sono, lazer.
Infelizmente, nos abrigos a relação entre a criança e o cuidador, torna-se,
muitas vezes, despersonalizada, seja pela grande quantidade de crianças a serem
cuidadas por cada um, ou pela própria falta de estímulos desse para com sua
profissão.
Ainda em relação ao desenvolvimento psíquico, um estudo etnográfico realizado
em um abrigo para crianças e adolescentes de 0 a 14 anos no interior de São
Paulo comprova que a carência de relações afetivas e profundas entre as
crianças institucionalizadas e seus cuidadores dificulta o estabelecimento de
referências para seu desenvolvimento psíquico, sendo essa uma das causas para o
seu desenvolvimento deficitário(16).
Os resultados quanto à linguagem das crianças foi semelhante ao estudo
realizado em São Paulo(13), em que se constatou ser comum encontrar crianças
maiores de dois anos ainda emitindo apenas sons sem formar palavras.
Outro estudo que analisou o desenvolvimento de crianças entre 6 e 44 meses de
idade em uma creche de São Paulo para famílias de baixa renda, demonstrou que a
presença de fatores de risco psicossocial do ambiente em que as crianças viviam
estava relacionada aos fatores de linguagem das crianças analisadas. À medida
que os cuidadores, por problemas emocionais, não estão disponíveis para
fornecer estímulos verbais para o desenvolvimento do vocabulário da criança, há
um prejuízo no desenvolvimento da fala(17).
É de extrema importância que as dificuldades apresentadas pelas crianças quanto
ao vocabulário, sejam trabalhadas pela equipe multiprofissional.
CONCLUSÕES
Foi percebido que a maioria das crianças apresentou o crescimento satisfatório
comparando com os padrões adotados pelo Mistério da Saúde. No entanto, o
desenvolvimento dessas crianças, em sua maioria apresentou atrasos importantes
nos fatores sociais e psíquicos, dentre eles destaca-se a linguagem, já que
houve déficit significativo desse domínio em todas as faixas etárias.
Somente realizando o acompanhamento do crescimento de maneira contínua será
possível analisar as curvas dos gráficos de crescimento, se estão descendentes
ou ascendentes, se estão indicando sinais de desnutrição ou de sobrepeso,
permitindo também que haja uma ação preventiva eficaz.
No que se refere ao desenvolvimento infantil, é preciso que as crianças sejam
assistidas continuadamente, de forma a trabalhar em seus sinais de atraso em
quaisquer aspectos, já que a alteração em um deles pode interferir ao longo de
suas vidas. Esse acompanhamento periódico das crianças permite que os
profissionais da saúde realizem estratégias para favorecer o desenvolvimento
neuro-psico-motor infantil.
Esse estudo possibilitou que houvesse uma reflexão sobre a maneira como as
crianças residentes de abrigos estão sendo assistidas pela equipe de saúde,
tornando-se necessário realizar o acompanhamento do crescimento e
desenvolvimento dessas crianças, a fim de intervir sobre as alterações
encontradas e de continuar esse processo de maneira regular.
Portanto, ressalta-se a importância da equipe de enfermagem durante o
acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil, no contexto da
atenção primária à saúde, ao desempenhar ações para identificar precocemente
alterações de saúde, direcionando as intervenções para a criação e
implementação de estratégias de prevenção de doenças, manutenção e promoção da
saúde, conforme as reais necessidades das crianças.