Práticas de cuidado ao idoso indígena - atuação dos profissionais de saúde
INTRODUÇÃO
O crescimento da população idosa, definida como aquela a partir dos 60 anos de
idade, é um fenômeno mundial e também pode ser observado na população indígena
brasileira, visto que em 2000 havia cerca de 61 mil idosos indígenas e em 2010
este número passou para 72 mil idosos indígenas(1). Tal avanço vem sendo
conquistado em decorrência dos investimentos em saúde, saneamento básico,
moradia, educação e demais ações voltadas para esta parcela populacional(2).
O cenário da velhice que se delineia exige que as práticas de cuidado com o
idoso indígena sejam melhor qualificadas e com maior resolutividade, pois,
independente de cor, raça e etnia, o envelhecimento ocasiona limitações
fisiológicas, incapacidade funcional, além de maior vulnerabilidade ao
aparecimento de doenças crônicas(3-4). A assistência dos profissionais de saúde
deve ser permeada por situações que contribuam para preparar o idoso indígena a
enfrentar as limitações que poderão apresentar no decorrer da vida, de maneira
que as práticas estejam pautadas em estratégias que o conduzam para uma velhice
bem sucedida.
Para isso, torna-se necessário que os profissionais de saúde levem em
consideração tanto os aspectos científicos quanto os culturais que permeiam o
cuidado do idoso indígena, uma vez que o cuidado cultural permite a construção
de um plano de cuidados único e congruente ao contexto cultural do idoso e as
suas reais necessidades, havendo maior eficácia na abordagem ao idoso e nos
cuidados realizados(5). Considera-se que o processo de viver dos indivíduos é
único e percebido de maneira singular e que as raízes do comportamento perante
as situações, a grande maioria, têm base em suas crenças pessoais e nos fatores
históricos e culturais, sendo necessário um cuidado gerontológico atrelado à
diversidade e universalidade do cuidado cultural(6).
Tendo em vista tais argumentos, pesquisas que fomentem as ações de cuidado aos
idosos indígenas são de extrema relevância para a melhoria das condições de
saúde desta parcela populacional. No entanto, tanto na literatura nacional
quanto internacional poucos são os estudos referentes ao cuidado profissional
com a população indígena, principalmente quando estes se referem à população
indígena idosa, não tendo sido identificado até o momento referências que
enfoquem o cuidado aos indígenas com 60 anos ou mais.
Diante da lacuna de conhecimento sobre o cuidado profissional realizado com o
idoso indígena e acreditando que, ao compreender como os profissionais de saúde
cuidam desta população, pode-se contribuir com os indivíduos que trabalham ou
venham a trabalhar nesse cenário, oferecendo-lhes subsídios para ampliar as
possibilidades de cuidar nesse espaço de novos saberes e fazeres e, assim,
melhorar as condições de saúde desses idosos, é que se justifica esta pesquisa,
cujo objetivo foi de compreender as práticas de cuidado dos profissionais de
saúde que assistem os idosos Kaingang.
METODOLOGIA
Trata-se de um estudo descritivo de abordagem qualitativa apoiada no
referencial metodológico da etnografia. A etnografia consiste na descrição
detalhada dos padrões de comportamento regido por regras culturais específicas
de uma determinada sociedade ou grupo(7).
O estudo foi realizado na Terra Indígena Faxinal (TIF), localizada na região
centro-sul do Estado do Paraná, Brasil, a qual possui cerca de 600 indígenas
residentes, todos da etnia Kaingang. A Unidade Básica de Saúde Faxinal (UBS)
foi um espaço importante no cenário da pesquisa. Fundada em 2003, encontra-se
no centro da TIF e divide-se em doze ambientes: recepção, consultório
odontológico, consultório médico, sala de vacinação, sala para administração de
medicamentos e nebulização, farmácia para dispensação e estoque de
medicamentos, cozinha, escritório administrativo, sala para curativos,
lavanderia e dois banheiros. O funcionamento da UBS é diurno, de segunda a
sexta-feira, das oito às 17 horas.
Os sujeitos foram dez profissionais de saúde que trabalham nesta UBS, o que
configura uma equipe multidisciplinar da atenção primária à saúde indígena
(EMSI), especificamente: um enfermeiro, um médico, um dentista, um auxiliar de
enfermagem, um técnico de enfermagem, um motorista da Secretaria Especial de
Saúde Indígena (SESAI) e quatro agentes indígenas de saúde (AIS). Elencaram-se
também quatro informantes-chave: três homens e uma mulher, com idades entre 33
e 68 anos. A mulher, funcionária da TIF, trabalhava cerca de 20 anos no
escritório da Fundação Nacional do Índio - FUNAI. Dos três homens informantes-
chave, apenas um era indígena, nascido na própria TIF e participante do elenco
de professores da língua nativa da comunidade Kaingang por mais de cinco anos.
Quanto aos não indígenas, um também trabalhou na TIF há cerca de 31 anos e
residiu por diversos anos ali, o que fez dele um indivíduo de referência para
comunidade Kaingang; o outro homem tinha 22 anos de convivência com os índios
Kaingang dessa TI, contribuindo assim com informações relevantes. A seleção
destes indivíduos foi primordial para o delineamento da pesquisa, visto que
tais experiências contribuíram para auxiliar nas estratégias de abordagem da
coleta de dados e aproximação com a equipe de saúde, além da compreensão dos
achados, aprofundando os conhecimentos da cultura e a visão de mundo do cenário
estudado.
Os dados foram coletados no período de novembro de 2010 a fevereiro de 2012,
por meio de oito momentos de trabalho de campo na TIF com permanência de
aproximadamente sete dias cada período. Utilizou-se como técnicas de coleta de
dados a observação participante e entrevistas, além do diário de campo como
fonte de registro dos dados.
A observação participante se fez presente em atividades dos profissionais de
saúde, como os atendimentos médico, odontológico e de enfermagem, as rotinas de
acolhimento, organização do serviço, além do acompanhamento do deslocamento dos
idosos indígenas da UBS aos hospitais de referência, assim como o trajeto
inverso. Os pesquisadores também participaram e observaram eventos como torneio
de futebol, celebração de missas e cerimônia funeral indígena, que tiveram o
envolvimento dos profissionais pesquisados.
Quanto às entrevistas, sete foram realizadas dentro da UBS, em sala reservada,
e as demais por meio de visita domiciliar em que a condução destas foi
determinada pelo contexto de cada indivíduo e pela oportunidade de aproximação
e diálogo surgido no proceder da coleta de dados. As questões norteadoras no
decorrer deste estudo foram: Quais são as práticas de cuidado que os
profissionais de saúde realizam para os idosos Kaingang? Como estas práticas de
cuidado são realizadas pelos profissionais de saúde aos idosos Kaingang? As
entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas na íntegra.
Para análise dos dados utilizou-se a proposta de Leininger na Teoria da
Diversidade e Universalidade do cuidado cultural, que versa sobre a leitura de
tais informações captadas de forma a identificar as divergências e
convergências de comportamentos e afirmações que são categorizados conforme a
identificação de padrões recorrentes, sendo também considerado na análise o
significado estrutural dos achados, assim como o contexto das situações(8).
O estudo foi aprovado pelo Comitê Nacional de Ética em Pesquisa sob o parecer
nº 760/2010. Foram levados em consideração todos os preceitos éticos exigidos
pela Resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde – Ministério da Saúde,
de modo que, após explicação dos objetivos e da forma de participação, os
profissionais que aceitaram participar assinaram o termo de consentimento livre
e esclarecido em duas vias. Para a diferenciação dos sujeitos da pesquisa,
assim como para a preservação de sua identidade, foram utilizados códigos, em
que os profissionais de saúde foram referenciados com a letra 'P' e os
informantes-chave com as letras 'ICH', seguidas de numeral arábico (P1 a P10) e
(ICH1 a ICH4).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A idade dos profissionais variou de 22 a 67 anos com média de 37,6 anos. Metade
era do sexo masculino, oito casados e cinco tinham filhos. Em relação à
escolaridade, três tinham ensino superior completo, sendo estes, médico,
enfermeiro e odontólogo; dois possuíam curso profissionalizante de auxiliar e
técnico em enfermagem; dois com ensino médio completo; um com ensino médio
incompleto e dois com ensino fundamental completo. O tempo de formação
acadêmica variou de um a 40 anos.
O vínculo empregatício dos profissionais da equipe multiprofissional de saúde
indígena (EMSI) teve média de 6,8 anos, com mínimo de cinco meses e máximo de
28 anos de trabalho na TIF. Quanto à carga horária, nove cumprem 40 horas
semanais de trabalho e apenas o médico atende no período da tarde com 20 horas
semanais. Referentes à experiência profissional, sete atuam exclusivamente na
TIF, sendo para três profissionais o primeiro emprego, os demais possuíam
experiência, entretanto, apenas experiência em área hospitalar com população
não indígena, tendo somente dois profissionais que já trabalharam com outras
populações indígenas.
A forma de contratação destes profissionais acontece por meio de uma empresa
privada que realiza a contratação dos recursos humanos da Secretaria Especial
de Saúde Indígena (SESAI), através de processo seletivo envolvendo análise de
currículo. Após a aprovação deste processo, o profissional ainda deve ser
aprovado pelo conselho local de saúde da terra indígena, composto pelas
lideranças indígenas e uma parcela da equipe de saúde local. Isso demonstra a
organização política dos índios, que adquiriram o poder compartilhado de
decisão em saúde (FIRMO et al., 2011)(9). Este trâmite é realizado com todos os
profissionais, exceto com os agentes indígenas de saúde, no qual é a liderança
da TIF, em específico o cacique, que determina qual indivíduo ocupará o cargo.
Mesmo sendo uma das vertentes da Política Nacional da População Indígena a
capacitação dos recursos humanos com vistas para a atuação em contextos
interculturais, através de cursos de atualização, aperfeiçoamento,
especialização(10), apenas dois profissionais de saúde tiveram algum preparo
específico quando foram admitidos, além de todos os membros da equipe
mencionarem a ausência da educação continuada por mais de um ano. As
capacitações ocorridas reportavam apenas as questões técnicas, como atualização
de vacinas, curativos, entre outros, não havendo nenhuma abordagem até o
momento referente ao cuidado transcultural.
Quanto aos idosos, residia na TIF 28 indivíduos com 60 anos ou mais. Tinham
média de idade de 72,9 anos com idade máxima de 101, e faixa etária
predominante de 60 a 69 anos. Todos eram analfabetos e falavam seu idioma
tradicional, o Kaingang, no entanto, cerca de dezessete idosos eram bilíngues,
sendo também capazes de se comunicarem em português. Em sua maioria, os idosos
viviam com companheiros e mantinham suas atividades laborais na confecção de
artesanatos, apesar de receberem aposentadoria, fato este que contribui na
preservação da autonomia e independência dos idosos indígenas(11). Dentre os
idosos, duas pessoas tinham comprometimento na realização de atividades de
autocuidado. Destacaram-se como principais problemas de saúde desta parcela
populacional as doenças respiratórias, desnutrição e problemas visuais como a
catarata.
A convivência com o trabalho desta equipe profissional na assistência prestada
a esses idosos permitiu a construção de duas categorias temáticas: Entre o
científico e o popular: permeando o cuidado profissional ao idoso Kaingang;
Caminhos criativos: diversidade das estratégias para a realização do cuidado ao
idoso indígena, as quais serão descritas a seguir.
ENTRE O CIENTÍFICO E O POPULAR: PERMEANDO O CUIDADO PROFISSIONAL AO IDOSO
KAINGANG
Dentre as atividades desenvolvidas pela EMSI estudada, observa-se que os
profissionais de saúde utilizam no processo de cuidado os serviços disponíveis
da UBS, tanto para os idosos, quanto para toda população Kaingang. Estes
cuidados remetem a medicação, imunização, realização de curativos, exames
laboratoriais e nebulização. Todavia, o que se destaca da medicina ocidental
(10), assim considerada, são os medicamentos que apresentam ampla utilização
nas práticas curativas.
Na rotina de atendimento da UBS, após a consulta médica, o idoso é encaminhado
à sala de medicação, a receita é registrada em um livro constando: medicação
prescrita, dose, via de administração, horário, duração do tratamento e
responsável pela administração. Posteriormente ao preenchimento, é iniciado o
tratamento medicamentoso.
A gente administra a medicação de todos os indígenas, e,
principalmente, dos idosos. Neste atendimento com a medicação, os
índios vêm aqui, tomam a medicação e vão embora. Isso é feito quantas
vezes for preciso. (P10)
Indiferente se for criança, adulto ou idoso a gente faz a medicação.
O médico prescreve e logo realizamos a administração. Mas, se os
índios precisarem de outras doses eles retornam à UBS para receber as
outras doses da medicação, pois não levam para casa os medicamentos.
(P9)
Considerando a alta incidência de automedicação entre os Kaingang, os
profissionais de saúde da TIF centralizaram a administração dos medicamentos na
UBS, sendo solicitado ao indígena que compareça diariamente ao serviço,
conforme os horários prescritos para a medicação. Destaca-se pela equipe, que
este cuidado em centralizar a medicação na UBS além de diminuir os equívocos na
ingestão dos fármacos pelos indígenas, favorece maior acompanhamento da
evolução clínica dos casos. Estudo realizado em uma aldeia em Santa Catarina
com índios Guarani também identifica excesso de medicamento em domicílio, com
possível automedicação errônea entre os indígenas pesquisados(12).
Os medicamentos constituem uma das tecnologias biomédicas mais difundidas,
sendo demandados e utilizados globalmente. Na população indígena a questão não
se difere, pois em busca de uma boa e rápida resposta terapêutica, o recurso
medicamentoso vem sendo utilizado pela sua eficácia curativa, seja pelo serviço
de saúde ou mesmo pelos próprios índios através da automedicação(12).
No entanto, é necessário que os profissionais de saúde incentivem e valorizem
as terapêuticas tradicionais(10,13), com vistas a realizar uma articulação do
saber popular ao saber científico, obtendo a promoção do uso racional dos
medicamentos básicos. Neste sentido, encontrou-se que os profissionais de saúde
além de realizarem o tratamento medicamentoso aos idosos, utilizam algumas
práticas de cuidado da cultura Kaingang, como o uso de chás e fitoterápicos.
Esses dias tínhamos um idoso com abscesso no pescoço, o AIS ensinou a
colocar folha da batata doce. Esquenta na panela a folha com água,
põe depois ela quente no local do processo inflamatório para ocorrer
à supuração. O AIS ensinou a fazer, foi lá pegou do quintal a folha,
trouxe e fez o procedimento! Isso nos ajudou, porque estávamos sem
médico e entramos com medicação só para febre. Então eles (AIS) podem
realizar esta prática, porque é algo de conhecimento dos índios e
fazem uso desse saber em situações como esta. (P1)
É feito chás, essas coisas da cultura deles, só quando os AIS sabem e
querem fazer, porque a gente não faz. (P7)
A Política Nacional da População Indígena estabelece o reconhecimento da
diversidade social e cultural dos povos indígenas, além da consideração e
estimulação dos seus sistemas tradicionais de saúde, como atos imprescindíveis
na execução de ações de prevenção, promoção e educação do sistema profissional
de saúde(10). A equipe de saúde deve valorizar e articular as práticas
tradicionais de saúde desses povos, os quais envolvem, por exemplo, o uso de
plantas medicinais e outras ações de cuidado no tratamento, pautando-se assim
em uma assistência de abordagem transcultural.
O AIS aparece como profissional essencial para a execução e articulação dos
cuidados tradicionais da população, uma vez que este indivíduo faz parte da
tradição cultural, conhecendo os costumes, valores, mitos e ritos da população
assistida, lembrando que um dos critérios para a admissão ao cargo de agente é
obrigatoriamente ser indígena e residente na aldeia que trabalha(10). De tal
modo, o AIS é um membro da comunidade que atua como mediador entre os saberes
tradicionais e os conhecimentos e recursos das ciências de saúde ocidental
(10,14).
Embora os demais profissionais de saúde não executem cuidados que se
fundamentam nos saberes populares, seja pela barreira advinda da formação
acadêmica e/ou mesmo pelo desconhecimento que os limita a ter aptidão para
realizar esta articulação com as práticas indígenas, visto que não receberam
capacitações voltadas para a questão cultural, observou que estes não
interrompem a intervenção dos AIS, ao contrário, os estimulam para a realização
das práticas tradicionais Kaingang, bem como, a utilização de tais
conhecimentos pelos idosos indígenas também não é imposta e nem criticada por
eles. Esta atitude realça o desempenho dos profissionais para a manutenção da
cultura, sendo inclusive uma ação apontada como cuidado junto aos idosos
Kaingang a não interferência de seus costumes.
Eles têm as culturas deles de desgastar os dentes, eles afinam os
dentes. Isso eu não posso interferir, não posso falar que eles não
devem fazer isso, faz parte da cultura, não é bom para saúde bucal,
mas é parte da cultura, e a partir do momento que eu mudar isso,
começar a por na cabeça deles, que não pode fazer isso, eu vou
interferir em seus costumes. (P4)
Os idosos fazem fogo dentro de casa, as crianças coitadinhas já estão
respirando fumaça, o cheiro é impregnável. Mas, não posso fazer nada,
quando eles vêm aqui eu faço a inalação, falo também que prejudica,
mas não posso obrigá-los a tirar à fumaça da vida deles, pois é a
cultura. Vou fazer o quê? (P2)
Preservar a cultura é essencial para a relação dos profissionais com o grupo
indígena, cujo respeito em manter os valores tradicionais no processo de
cuidado colabora na repercussão de pensamentos positivos relacionados ao não
julgamento e pré-conceitos dos profissionais de saúde sobre tais costumes
étnicos(8). Dessa forma, este fato pode justificar a longa permanência da
maioria dos profissionais de saúde da TIF, no qual o cuidado de preservar a
cultura origina benefícios entre o vínculo do sistema profissional com os
Kaingang.
Os cuidados higiênicos com o corpo, especialmente o banho, foram mencionados
como ações realizadas pela EMSI. Atribui-se o banho como cuidado prestado na
UBS devido à limitação da capacidade funcional de alguns idosos, bem como a
carência de infraestrutura das residências que não possuem banheiros e,
consequente, ausência de duchas.
Foi dado banho nela (idosa) aqui a semana toda, não tem banheiro na
casa dela, e ela queria muito tomar banho [...] Ficou até mais feliz,
disse que aliviou as dores depois do banho [...] O banho que eles
tomam aqui na UBS é fundamental porque além de gostarem muito, ainda
existem as limitações que impossibilitam de tomar banho sozinho. (P1)
O banho consiste em uma atividade de vida diária, que propicia a higiene
pessoal através da remoção de suor, oleosidade e microorganismos da pele, bem
como contribuição para eliminação de odores desagradáveis, diminuição do
potencial de infecções, estimulação da circulação, sensação refrescante,
relaxamento e melhora da autoimagem, fundamentais para a saúde do indivíduo
(15). Por sua vez, para os Kaingang, o banho além de proporcionar a leveza e
melhora da autoimagem é uma prática que influencia no fortalecimento do corpo,
já que se utiliza a maior fonte da natureza, a água. Por acreditarem nesta
influência, o banho é visto como uma prática terapêutica, uma vez que ocorre o
fortalecimento das duas partes que formam o ser Kaingang, o hã (corpo físico) e
o Kumbã (espírito)(11,16). Algumas ervas medicinais podem ser componentes
acrescidos à água no banho, situações em que julgam ocorrer a intensificação
deste fortalecimento entre o hã e o Kumbã(16).
Observa-se o quanto os aspectos culturais estão envolvidos no ambiente de
trabalho em saúde indígena, o que exige dos profissionais o conhecimento da
cultura Kaingang para a prestação de uma assistência congruente, visto que a
partir deste conhecimento o profissional consegue moldar suas ações e conduzir
o cuidado sob uma visão de mundo mútua, despindo de julgamentos e impasses que
advêm da limitação de informação quando não se conhece a cultura. Na etnia
Pankararu, em Pernambuco, um estudo com o objetivo de identificar as ações que
os indígenas priorizam como necessárias para a promoção da saúde revelou que
esta população prefere profissionais de saúde com formação diferenciada, que
articula os saberes científicos e populares no desenvolvimento de propostas e
ações de saúde, embasadas no diagnóstico epidemiológico e social da realidade
de saúde desse grupo, sem desrespeitar seus princípios culturais e crenças(17).
A alimentação também foi evidenciada como um cuidado fundamental do ser humano,
com especial atenção ao idoso, já que se reporta a necessidade básica da
espécie para sua manutenção. No entanto, observa-se uma interface entre a
preocupação dos profissionais de saúde perante os hábitos alimentares dos
idosos Kaingang e a valorização da permanência destes hábitos:
Os mais novos nem tanto, só que com os velhos, às vezes temos que
comprar comida que estão habituados a ingerir e mandar para o
hospital, porque eles não gostam das refeições oferecidas durante as
internações hospitalares, principalmente sopa. (P2)
Sempre que eles (idosos) vêm na UBS, costumo pesar, medir, porque a
alimentação é complicada [...] a maioria dos idosos estão abaixo do
peso. Aqui a gente faz o que pode. (P6)
Os hábitos alimentares são aprendidos no início da vida, por isso, o tipo de
alimento consumido é influenciado por variáveis culturais(15). Na cultura
Kaingang, alimentos como fubá, quirera (milho triturado, utilizado no preparo
de pratos e na alimentação de animais), feijão e carne, em especial o dorso do
frango e a carne do porco, associados à mandioca compõem a alimentação básica
desta população(11), consistindo uma alimentação rica em amidos e carboidratos,
além de grande quantidade de gordura devido à banha de porco utilizada para o
preparo destes alimentos.
Estudo realizado na própria TIF com o objetivo de conhecer como as famílias
cuidam dos idosos Kaingang encontrou que a alimentação se fez presente no
processo de cuidar, cuja preservação dos hábitos alimentares da cultura
tradicional era feito apenas pelos idosos, sendo que os mais novos possuíam
divergências desses hábitos(11). Esta preservação dos hábitos alimentares dos
idosos também foi evidente no cuidado realizado pelos profissionais de saúde no
presente estudo, no entanto, a inserção dos alimentos habituais do idoso no
processo de cuidado profissional constituiu, não apenas no intuito de manter a
cultura, mas de proporcionar a melhoria da evolução clínica e o andamento da
assistência, visto que a ausência alimentar pode ocasionar prejuízos
irreparáveis na saúde do indivíduo(18).
A preocupação dos profissionais de saúde com o estado nutricional destes idosos
é evidente, principalmente no que se refere à desnutrição. A equipe de saúde
realiza monitoramento do índice de massa corpórea (IMC) dos idosos da TIF, uma
vez que associado ao tipo de alimentação consumida pela população, tem-se a
ingestão excessiva de bebidas alcoólicas. O uso de bebidas alcoólicas entre as
famílias de idosos Kaingang acarreta piora do estado de saúde da maioria dos
indígenas mais velhos, como doenças hepáticas e desnutrição(11,16).
Dessa forma, ter a alimentação como ações de cuidado vai ao encontro da
premissa de que cuidar é manter a vida, satisfazendo às necessidades
indispensáveis para tal e que se manifestam de maneiras diversas(18). Portanto,
alimentar e manter a higiene são cuidados que garantem a vida dos sujeitos e
seu bem-estar(11).
Os resultados benéficos na saúde do idoso evidentemente se reportam às condutas
que versam os cuidados, logo, as ações profissionais fazem parte da melhoria da
qualidade da assistência e, consequente, satisfação do indivíduo. Assim, torna-
se essencial pensar na produção de cuidados e práticas humanizadoras para a
prestação da assistência ao idoso indígena. Da mesma forma, os profissionais de
saúde apresentaram manifestações de afeto como práticas de cuidado, no intuito
de promover uma assistência mais acolhedora.
Às vezes eu converso com eles e é em um aperto de mão, um sorriso, um
abraço, uma história nova que me contam que eu presto atenção, tudo
isso, que dá um toque a mais sabe, a gente vai pegando amor por
trabalhar aqui, é um carinho verdadeiro por eles! (P1)
Eu gosto de acompanhar o pessoal velho, a gente aprende muito com
eles [...] Tenho muito carinho pelos mais antigos. (P5)
Promover condições que favoreçam a expressão da afetividade gera no idoso a
chance de sentir-se apoiado, fortalecido, tanto para se relacionar melhor com a
equipe que cuida dele quanto com a família que o ampara(19). Como parte da
assistência ao idoso, a equipe de saúde deve estar atenta a uma série de
alterações físicas, psicológicas e sociais que normalmente ocorrem nessas
pessoas e que justificam um cuidado diferenciado, com a inserção, sobretudo, de
ações que transpassam condutas tecnicistas. Somado a esses aspectos, observa-se
uma relação de respeito aos mais velhos na cultura indígena pelos profissionais
de saúde atuantes na TIF, visto que a assistência gerada é fundamentada em
troca de experiências de vida, havendo respeito mútuo entre profissional e
idoso.
Acredita-se que através de uma relação empática, haja uma assistência
humanizada e maior comprometimento com o cuidado tanto para aquele que o
executa, quanto para aquele que o recebe, pois se torna possível estabelecer
vínculos importantes para a integralidade da assistência(19). Contudo, o
cuidado exige uma interlocução de fatores e compromissos aqui demonstrados pela
medicação e o uso de plantas medicinais como forma de manutenção da cultura
Kaingang, ou ainda a significação do banho que transpassa a compreensão da
ciência enquanto ato de cuidado com o corpo, e a alimentação que demonstrou
suas especificidades e necessidades, associadas à presença de respeito e afeto
integram um cuidado mais humanizado e resolutivo para a saúde dos idosos
indígenas.
CAMINHOS CRIATIVOS: DIVERSIDADE DAS ESTRATÉGIAS PARA A REALIZAÇÃO DO CUIDADO AO
IDOSO INDÍGENA
Os profissionais de saúde utilizam estratégias que colaboram para a
contemplação dos cuidados realizados aos idosos Kaingang. Dentre estas
estratégias, a aproximação com os idosos a partir da participação dos
profissionais em atividades corriqueiras da vida da população Kaingang,
sobressaiu como elemento essencial no que refere ao acesso dos idosos no
serviço de saúde.
Procuro participar mais da vida deles, venho jogar bola, participo de
festas, bailes. Os mais velhos gostam de tomar mate, então às vezes,
venho e fico tomando chimarrão com eles a tarde toda, principalmente
no final de semana. Faço parte da vida deles e eles também fazem
parte da minha, por isso é importante esta relação, mesmo porque,
primeiro tem que conquistar a confiança deles, começar a ter
intimidade, e partir daí, começam confiar mais em nós. Hoje, percebo
que quando peço para virem aqui na UBS, não tem rejeição, eles vêm
porque realmente confiam mais em mim. (P3)
A Estratégia Saúde da Família (ESF) tem como um de seus princípios a inserção
da equipe na comunidade, a fim de conhecer e valorizar o contexto do grupo
assistido. Para isso, é importante que o profissional de saúde tenha bom
relacionamento e diálogo com a comunidade, havendo respeito mútuo(9). Os
vínculos estabelecidos entre profissional de saúde e clientes possibilitam o
fortalecimento da confiança nos serviços de saúde, pois os indivíduos passam a
ter maior aproximação com o serviço e, consequente, maior informação e
orientação sobre as condutas profissionais, o que também favorece a satisfação
com a assistência prestada(20).
A confiança dos idosos Kaingang quanto à assistência realizada pelos
profissionais de saúde, conta com uma figura essencial capaz de influenciar na
detenção de tal credibilidade, o cacique, sendo ele autoridade máxima do grupo
indígena, responsável pela organização da comunidade e elaboração de códigos
morais dentro do território da aldeia. Cientes desta organização Kaingang e,
como em qualquer outro local da aldeia, a autoridade do cacique também se faz
presente na UBS, os profissionais de saúde tentam efetivar uma relação de
parceria com a liderança da TI, através do bom relacionamento e a participação
deste personagem no processo de comunicação com indígenas.
A gente tenta sempre ter um bom relacionamento com o cacique, porque
ele é o principal representante da população indígena e também
autoridade máxima na Terra Indígena. (P8)
Por existir uma parceria entre os profissionais e a autoridade da comunidade
indígena, a equipe de saúde consegue apontar argumentos convincentes aos idosos
indígenas sobre a importância do acompanhamento realizado pelo serviço de
saúde, uma vez que, observa-se o grande valor do cacique para a população
Kaingang. Esta estratégia de parceria da equipe com as lideranças da TIF
acontece especialmente em casos que algum indígena se recusa, sem
justificativa, a aderir alguma recomendação dos profissionais, como por
exemplo, participação dos idosos nas campanhas de imunização contra influenza,
realização de exames citopatológicos e mamografias. Nestes casos, ocorre a
intervenção do cacique, o qual é comunicado e a partir dessa situação trabalha
em prol da execução do atendimento ao índio, podendo inclusive estabelecer
alguma punição àqueles que desacatarem sua orientação.
A comunicação entre o líder e a comunidade geralmente acontece por meio de um
alto-falante. Fixado em uma árvore próxima a UBS, este meio de comunicação
também é utilizado para transmitir anúncios como a pesagem do programa do bolsa
família, campanhas de imunização, entre outras ações da equipe de saúde.
Geralmente, os avisos são realizados pelo cacique na língua nativa, fato este
que contribui para facilitar o entendimento dos mais velhos sobre as
informações relatadas. A participação do cacique neste contexto de interlocução
com a comunidade contribui para o fortalecimento do vínculo entre equipe e
liderança, valorizando o papel deste membro Kaingang no processo da assistência
em saúde.
Embora haja aceitação da população indígena quanto ao trabalho desenvolvido
pelo serviço de saúde, seja pela aproximação do profissional ou através da
confiabilidade dada pelo cacique no atendimento realizado na UBS, os
profissionais de saúde também contam com outras estratégias fundamentais para o
desenvolvimento do cuidado ao idoso indígena.
Os índios têm muito medo, se assustam demais, tive que começar
atender sem touca, máscara, sem nada. Não coloco óculos, para não
assusta-los, tento ser mais natural possível. Mas, mesmo assim, às
vezes os idosos se assustam. (P3)
Nós tentamos ser o mais simples possível, não usamos jaleco
justamente porque eles têm muito medo, parece uma barreira, como se o
jaleco branco transmitisse imposição. Então quando evitamos o uso
desses materiais, percebemos que contribui para que venham tranquilos
à UBS [...] principalmente os índios de mais idade não gostam do
jaleco. (P7)
Repadronizar a assistência conforme a cultura da população assistida confirma
um cuidado pautado na abordagem transcultural, respeitando as crenças e valores
dos indivíduos que o recebem(8). A efetivação dos cuidados é completada por
intermédio do AIS, que contribui para o diálogo dos profissionais com a
população, principalmente com os idosos que muitas vezes têm dificuldade na
linguagem, por falarem apenas o idioma materno, o Kaingang.
O AIS tem que estar junto para poder conversar, perguntar, saber o
que está acontecendo, porque eles (idosos) não sabem transmitir para
gente o que está acontecendo. Já em Kaingang eles conseguem expressar
o que sentem e o AIS age como um tradutor [...] Agente indígena é
tipo o porta voz da comunidade, porque os índios mais antigos quase
não conversam em português. (P4)
Geralmente os idosos fazem os chás em casa e a gente fica sabendo
porque eles contam para os AIS e estes nos con-tam. Os AIS nos passam
o que os indígenas fazem e isso ajuda bastante. (P1)
Os AIS são responsáveis pelo elo da comunidade com a equipe, exercendo o papel
de interlocutor da situação, no qual, seu desempenho é fundamental para
funcionalidade do serviço, visto que sua função é ampla(10,14), envolvendo
ações que favorecem a comunicação entre a comunidade e a equipe da saúde, além
de contribuir para educação e orientação sobre cuidados de saúde, levando
informações sobre o sistema de saúde e seu funcionamento para a população,
assim como, trazendo informações da população para o serviço de saúde.
A visita domiciliar é uma ferramenta fundamental para a obtenção de
informações, pois proporciona maior aproximação com a realidade, constituindo
uma oportunidade para identificar as reais necessidades de cada idoso
assistido, possibilitando a reflexão e a revisão das próprias ações
profissionais na busca de repadronizações do cuidado(21).
Por haver uma lacuna no quadro quantitativo dos profissionais de saúde
pesquisados, em diversos momentos observou-se que a maioria das atividades
assistenciais aos idosos indígenas eram realizadas na UBS, por outro lado,
conscientes sobre a relevância das visitas domiciliares, os profissionais
tentam suprir esta limitação através da realização de rodas de conversas
informais quando a demanda na UBS é pequena, no intuito de captarem informações
sobre a dinâmica social, completando a visão de mundo referente à comunidade
Kaingang e suas necessidades relacionadas à saúde.
As estratégias de cuidado também se reportaram às atividades gerenciais da UBS.
Para estimular os demais profissionais na realização do cuidado em momentos
inoportunos, o coordenador da equipe propõe a utilização de banco de horas, de
forma a negociar as horas extras realizadas pela equipe em ocasiões em que não
estão sendo remunerados, como por exemplo, finais de semana, feriados ou
horários após a jornada de trabalho, possibilitando a compensação dessas horas
trabalhadas em folgas quando os profissionais precisarem.
Os agentes de saúde ganham horas de folga quando acompanham os
indígenas nos finais de semana ou em horários em que não estão
trabalhando, como a noite [...] Os demais também recebem horas a
folgar, a gente negocia e eles folgam no dia que pedirem e estiver
tranquilo aqui na UBS [...] Os profissionais gostam bastante deste
banco de horas, pois quando precisam faltar no serviço por alguma
questão, já possuem horas trabalhadas não precisando pagá-las. (P2)
Nos finais de semana quando a UBS encontra-se fechada, a população indígena
busca o AIS que realiza os trâmites necessários para o atendimento da
assistência. Notou-se que o enfermeiro orienta os AIS para realizarem a conduta
adequada quando se deparam com situações em que os idosos necessitem de
atendimento profissional nos finais de semana, assim, ao perceberem sinais e
sintomas que indicam alterações térmicas e/ou pressóricas ou outras alterações
relevantes, os AIS comunicam o motorista indígena que permanece com o veículo
de condução dentro da TIF, e realizam o encaminhamento do idoso para o serviço
de saúde referência na cidade de Cândido de Abreu.
Atualmente, existem dois AIS que trabalham na TIF, um homem e uma mulher. Por
serem de sexos opostos a escolha do acompanhamento é definida pelo indígena que
será encaminhado, pois se for do sexo masculino e tiver necessidade de
permanência no hospital o AIS homem deverá acompanhá-lo. Este planejamento do
cuidado é determinado pelo enfermeiro que proporciona aos próprios AIS a
decisão de escolha pela escala de plantão, favorecendo a maior satisfação dos
profissionais para realizarem a assistência em saúde.
A autonomia do profissional perante as condutas que serão realizadas por ele
próprio, bem como a flexibilidade sobre sua atuação, são elementos que
fundamentam uma administração eficaz, contribuindo para a satisfação
profissional e consequente melhora do atendimento em saúde(20-21). Esta questão
foi vista nesta categoria, uma vez que se observa negociação e articulação
interna dos profissionais de saúde em busca da melhoria das condições de
trabalho para conseguirem prestar uma assistência com maior qualidade, com
inserção das estratégias para ampliar o acesso dos idosos ao serviço de saúde
presente na TI e a permanência destes no cuidado, almejando assim, uma
assistência congruente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo permitiu conhecer e analisar as práticas de cuidado que o sistema
profissional de saúde realiza aos idosos Kaingang. Frente ao que foi proposto,
evidenciou que os cuidados realizados pelos profissionais de saúde aos idosos
Kaingang tiveram a imersão de dois mundos distintos: o saber científico e o
saber popular. O primeiro saber remete aos cuidados como medicação, exames
laboratoriais, vacinação, nebulização e realização de curativos, e o segundo, a
utilização de plantas medicinais. Notou-se, ainda, que o banho, alimentação e
manifestações de afeto como cuidados para o idoso Kaingang que tiveram
evidentemente, a influência de significados de ambos os saberes mencionados.
A organização do serviço pautada na transculturalidade se mostrou como
estratégia importante para a congruência e execução dos cuidados. Neste
sentido, o AIS foi o membro da equipe que se destacou na prestação do cuidado,
uma vez que este profissional se reporta como elo entre a equipe e idosos
indígenas, contribuindo para o acesso do serviço de saúde, além da própria
execução dos cuidados tradicionais da cultura. A parceria com a liderança da
comunidade, o cacique, também se fez como fator positivo nas estratégias para
as práticas de cuidado, bem como, a participação de atividades como torneios de
futebol, datas festivas e rodas de conversas informais foram evidenciadas como
mecanismos de aproximação e possível fortalecimento do vínculo entre
profissional e idoso.
Percebe-se, portanto, uma inter-relação entre os cuidados e suas estratégias,
pois as práticas de cuidado mencionadas poderiam não ser tão bem conduzidas se
os profissionais de saúde não realizassem estas estratégias. A partir desse
contexto, destaca-se a presença da enfermagem, principalmente do enfermeiro,
que em seu papel profissional, assume a competência da gerência do serviço de
saúde e, ao mesmo tempo, da realização do cuidado. A enfermagem elabora
estratégias que realçam os cuidados e os transformam em ações que contemplam
maior qualidade na saúde da população estudada, sendo capaz de focalizar ritos,
mitos e diversidade cultural que permeiam o cuidado destes indígenas,
juntamente com os avanços terapêuticos da saúde, potencializando a assistência
ofertada.
A atuação da equipe de saúde se dá por meio de uma abordagem transcultural, com
uma assistência que valoriza a diversidade de crenças e culturas da localidade,
e ao mesmo tempo, visa à relevância da inserção dos avanços da ciência para
melhoria da condição da saúde, pois se utiliza de estratégias convincentes que
permitam os idosos aderirem a estes cuidados. Tal evidência demonstra o quão se
faz necessária a troca permanente de conhecimentos entre equipe de saúde e
comunidade indígena idosa, respeitada por suas experiências de vida. Para esta
efetivação de uma abordagem transcultural o aprendizado precisa ser mútuo, no
qual todos aprendem, se transformam e se renovam no respeito ao outro e na
valorização do ser humano em suas especificidades étnicas e culturais. Para
tanto, é evidenciado como primordial a formação e preparação dos profissionais
de saúde, com ênfase mais uma vez no papel do enfermeiro, enquanto membro da
equipe de saúde indígena, para uma atuação que articule nas ações gerenciais,
assistenciais e em seu papel educativo, o diálogo e a participação na
construção compartilhada do cuidado à população idosa indígena.
Por se tratar de uma pesquisa que envolve uma pequena parcela de profissionais
de saúde que trabalham com os idosos indígenas, sugerem-se mais estudos sobre a
temática, uma vez que as práticas de cuidado são essenciais para a melhoria das
condições de saúde da população assistida, além de ser nítido que estes
profissionais desempenham um trabalho complexo, em contexto de valores e
especificidades culturais na assistência ao idoso indígena.