Influência das características sociodemográficas e clínicas no impacto da
doença em valvopatas
INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas, as doenças crônicas têm desempenhado um importante papel
na morbimortalidade da população mundial atingindo a população idosa e jovens
em idade produtiva(1). Dentre as doenças crônicas, destacam-se as doenças
cardiovasculares (DCV) que representam um grande número de internações, são a
maior causa de óbito em todo o país e também uma das afecções que acarretam
maior ônus ao sistema de saúde(2).
No conjunto das DCV, as valvopatias representam uma doença em evolução,
resultante de diversos fatores, incluindo o aumento das valvopatias de origem
degenerativa, decorrente do envelhecimento da população e daquelas de origem
reumática(3).
A prevalência da doença cardíaca valvar, embora em menor magnitude quando
comparada à prevalência das demais DCV, representa uma das principais fontes de
assistência médica e consumo de recursos em saúde(3). Apesar da elevada
ocorrência da valvopatia no Brasil, dados sobre sua real prevalência e perfil
clínico ainda são escassos(2).
A convivência com uma doença crônica como a valvopatia, com os sintomas por ela
ocasionados e com o estigma que uma doença cardíaca pode representar, resulta
em comprometimento físico, psicológico e social, uma vez que este paciente
convive com a possibilidade de uma nova descompensação ou piora de sua condição
clínica a despeito do tratamento adequado(4-5). Sendo assim, a assistência a
esses pacientes deve incluir, além de cuidados relacionados aos aspectos
biológicos, aqueles relacionados às variáveis psicossociais, considerando
especialmente sua autopercepção de saúde(5-6).
A autopercepção em saúde se refere à interpretação pelo indivíduo das
experiências de saúde com base em seu conhecimento e nas informações que possui
a respeito. Esse julgamento é frequentemente influenciado pela sua própria
experiência e pelas normas sociais e culturais(6). Além disso, estudos sugerem
que variáveis não relacionadas à doença, como baixo nível sócio-econômico
(caracterizado pelo total de anos de estudo, pela atividade desempenhada e pela
renda) e aspectos comportamentais, como tabagismo, etilismo e uso de drogas
ilícitas também influenciam o conceito de percepção de saúde(7).
Kusumota(8) relata que as variáveis como idade, gênero, escolaridade, presença
de comorbidades, dentre outras, constituem fatores importantes na determinação
do impacto da doença em pacientes com doença crônica.
Assim, considerando a importância em aprofundar no conhecimento a respeito do
impacto da valvopatia no cotidiano, este estudo teve como objetivos analisar as
características sociodemográficas e clínicas dos pacientes com valvopatia e
verificar a influência dessas variáveis no impacto da valvopatia no cotidiano
desses pacientes. Os achados deste estudo fornecem subsídios para o
desenvolvimento de intervenções de enfermagem com vistas à redução do impacto
da doença no cotidiano do valvopata em atendimento ambulatorial.
MÉTODO
Trata-se de um estudo do tipo exploratório realizado em um ambulatório
especializado em cardiologia de um hospital universitário de grande porte do
interior do estado de São Paulo.
Fizeram parte deste estudo 86 pacientes com valvopatia mitral e/ou aórtica, de
ambos os sexos, com idade igual ou superior a 18 anos, submetidos ao tratamento
clínico e/ou cirúrgico em seguimento ambulatorial no referido serviço. Foram
excluídos os pacientes que apresentaram incapacidade para comunicação verbal
oral efetiva.
Como o presente trabalho constitui um recorte de estudo pregresso cujo objetivo
foi validar o IDCV junto à pacientes com valvopatia em seguimento ambulatorial
(9), o tamanho da amostra foi estimado de acordo com o recomendado para estudos
de validação, isto é, 100 participantes(10). No entanto, devido às perdas na
etapa de coleta de dados, a amostra final foi composta por 86 pacientes.
Os dados foram coletados por meio de entrevista presencial realizada de forma
individual pela pesquisadora para obtenção dos dados sociodemográficos e
clínicos e por contato telefônico para aplicação do IDCV, como especificado a
seguir:
* Primeira etapa: constituiu na abordagem inicial do paciente e
esclarecimentos sobre os objetivos do estudo e obtenção da concordância
do paciente em participar do estudo por meio da assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O paciente foi instruído que a
participação no estudo envolveria a aplicação de um questionário por meio
de contato telefônico. Após o consentimento, foi empregado o método de
registro de dados disponíveis para obtenção de informações no prontuário
hospitalar que permitiram a caracterização sociodemográfica e clínica dos
participantes estudados. Em seguida, por meio da técnica de entrevista
estruturada, foram obtidos os dados sociodemográficos e clínicos não
disponíveis no prontuário hospitalar.
* Segunda etapa: foi aplicado o IDCV por meio de contato telefônico aos
participantes que concordaram em participar da pesquisa na primeira
etapa. Foram criteriosamente seguidas as recomendações da literatura para
coleta de dados por meio de contato telefônico. Nesse sentido, o estudo
de Costa et al.((11)) apontou para a invariabilidade no desempenho de
escalas utilizadas em diferentes grupos de aplicação - presencial ou por
telefone, sugerindo que o contato telefônico é uma estratégia confiável
para obtenção de dados comparada à aplicação presencial, além de ser
efetiva, de baixo custo e acessível.
Instrumento de caracterização sociodemográfica e clínica
Utilizado para levantamento das informações de interesse para delinear o perfil
sociodemográfico e clínico dos participantes, o instrumento foi desenvolvido
por Mendez et al.(12), composto de perguntas abertas e fechadas, dividido em
dois grandes itens:
* Caracterização Sociodemográfica: permite o levantamento de dados, como:
idade, sexo, raça, escolaridade, situação conjugal, com quem mora,
vínculo empregatí-cio, renda mensal individual e familiar e procedência.
* Caracterização clínica: levantamento de dados, como: diagnóstico médico,
tipo de tratamento, tempo decorrido desde o diagnóstico da doença valvar,
sinais e sintomas do último mês e medicamentos em uso.
Instrumento para mensuração do Impacto da Doença no Cotidiano do Valvopata
(IDCV)
Instrumento desenvolvido e validado por Padilha et al.(9,13) com o objetivo de
avaliar o impacto da valvopatia nas atividades de vida diária do paciente. O
IDCV é composto por duas escalas, sendo que a primeira mede as percepções
relativas ao impacto da doença. Será solicitado ao paciente que responda cada
item por meio de uma escala Likert de cinco pontos, que variam desde (!)
discordo totalmente a (5) concordo totalmente. A segunda escala mede a
avaliação que o sujeito faz sobre cada consequência da valvopatia mencionada na
primeira escala (quer ela ocorra ou não em sua vida), solicitando-se que o
participante situe a sua avaliação para uma escala tipo Likert, cujas respostas
variam desde (!) muito ruim a (5) muito bom. Os itens estão distribuídos em
quatro domínios: Impacto físico da doença - sintomas (itens 11, 12 e 13),
Impacto da doença nas atividades cotidianas (5, 7, 9, 10 e 14), Impacto social
e emocional da doença (itens 2, 3, 4 e 6) e Adaptação à doença (1 e 8). Para
determinar o escore final do IDCV, todos os itens da parte B foram invertidos.
Os itens 1, 5 e 8 da Parte A, que correspondem às percepções relacionadas ao
impacto favorável, também tiveram seus escores invertidos. O escore de cada
item corresponde ao produto dos escores obtidos nas Partes A e B do IDCV,
podendo gerar um escore mínimo de 1 e máximo de 25 para cada afirmativa
avaliada. Quanto mais próximo de 1 o escore, menor o impacto percebido pelo
sujeito em relação a uma dada crença e quanto mais próximo de 25 mais intenso é
o impacto. Para o cálculo final da medida do impacto é feita a soma de todos os
produtos obtidos. O escore final do instrumento pode variar de 14 a 350; quanto
menor o escore, menos o paciente percebe o impacto das consequências negativas
da doença em sua vida e não avalia como ruim essas consequências, caso ocorram
(ou seja, menor o impacto da doença); quanto maior o escore significa que o
paciente reconhece a ocorrência das consequências negativas da doença em sua
vida e que essas consequências são, de fato, interpretadas como negativas (isto
é, maior o impacto da doença nas atividades de vida diária). No estudo que
originou o instrumento foi constatada consistência interna satisfatória para o
IDCV total por meio do coeficiente alfa de Cronbach (α = 0,86). Os demais
domínios também mostram evidências de consistência interna satisfatória -
impacto Físico da Doença - Sintomas (α= 0,71); impacto da Doença nas Atividades
Cotidianas (α = 0,79); impacto Social e Emocional da Doença (a = 0,72)(9,13). O
domínio Adaptação à Doença, a exemplo de outros estudos que avaliaram as
propriedades psicométricas desse instrumento(9,13-15), não mostrou evidências
de confiabilidade (α = -0,008). No presente estudo, foi constatado alfa de
Cronbach = 0,86 para o escore total do IDCV.
Análises dos dados
Os dados coletados foram inseridos em uma planilha eletrônica (software Excel,
2003) e transferidos para o programa SAS - System for Windows (Statistical
Analysis System), versão 8.2, para as seguintes análises:
* Descritiva: com confecção de tabelas de frequência, medidas de posição
(média, mediana, mínima e máxima) e dispersão (desvio-padrão) para dados
do instrumento de caracterização sociodemográfica e clínica e para os
escores do IDCV.
* De confiabilidade: com emprego do coeficiente alfa de Cronbach para
estimar a consistência interna do IDCV, ou seja, a homogeneidade ou
acurácia de seus itens. Foi estabelecido como evidência de consistência
interna satisfatória, valor do coeficiente alfa de Cronbach > 0,70.
* De regressão linear múltipla: com critério de Stepwise, para testar
influência das variáveis sociodemográficas e clinicas no impacto da
doença, avaliado pelo IDCV.
Foi adotado como nível de significância p < 0,05.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de uma universidade do
interior do estado de São Paulo, por meio de adendo ao parecer de aprovação de
estudo pregesso desenvolvido pelo nosso grupo de pesquisa(13). Todos os
pacientes arrolados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
RESULTADOS
Caracterização sociodemográfica e clínica
Participaram do estudo 86 sujeitos, cujas características sociodemográficas são
apresentadas na Tabela_1.
Tabela 1 Características sociodemográficas e clínicas dos pacientes com
valvopatia em seguimento ambulatorial em hospital universitário (N = 86),
Campinas, São Paulo, Brasil, 2012
Variáveis sociodemográficas % Média (dp)Mediana Variação
Sexo
Feminino 58,1
Raça
Branco 59,0
Idade (em anos) 52,7(12,9) 54,0 18-77
Escolaridade (em anos, n = 79) 6,4(3,2) 5,0 0,5-18
Situação Conjugal
Casado 55,8
Desquitado/Divorciado 12,8
Amasiado 11,6
Viúvo 11,6
Solteiro 8,1
Com quem mora
Com o cônjuge e filhos 41,9
Com o cônjuge 22,1
Outros 30,2
Sozinho 5,8
Vínculo empregatício
Inativo 47,7
Ativo 34,9
Do lar 17,4
Renda Individual (SM, n = 64) 1,9(1,2) 1,6 0,3-8,0
Renda familiar (SM, n = 85) 2,9(1,9) 2,3 0,4-9,6
Procedência
Região Metropolitana de Campinas 54,6
Campinas 23,3
Outras cidades do Estado de São Paulo19,8
Outros Estados 2,3
Diagnóstico clínico
Lesão única 37,2
Dupla lesão 31,4
Tipo de valvopatia
Insuficiência mitral 59,3
Estenose mitral 50,0
Insuficiência aórtica 47,7
Estenose aórtica 34,9
Sintomas
Fadiga 52,5
Dispnéia 50,0
Taquicardia 47,7
Precordialgia 43,0
Síncope 39,5
Edema 37,2
Tratamento
Clínico e cirúrgico 71,3
Clínico 25,6
Tempo de tratamento (em anos) 14,1(12,6) 10,0 5,0-20,0
Número de medicamentos em uso 4,4(2,1) 4,0 0-10
Notas: Desvio padrão;
salário mínimo de R$622,00, Brasil, 2012.
Constatou-se que pouco mais da metade da amostra era constituída por mulheres
(58,1%), cor branca (59%), média de idade de 52,7 (12,9) anos, casados (55,8%),
que viviam com cônjuge e filhos (41,9%), com tempo médio de estudo de 6,4 (3,2)
anos inativos (47,7%), com renda média individual mensal de 1,9 (1,2) salários
mínimos (SM) e renda familiar mensal média de 2,9 (1,9) SM. A maioria (54,6%)
era procedente da região metropolitana de Campinas, 23,3% eram provenientes da
cidade de Campinas, 19,8% de outras cidades do estado de São Paulo e 2,3% de
outros estados.
Considerando o diagnóstico clínico, 37,2% dos pacientes apresentavam uma única
lesão em um único aparelho valvar e 31,4% apresentavam dupla lesão. A fadiga
(52,5%) e a dispneia (50%) foram os sintomas mais frequentemente relatados. O
tempo médio desde o início do tratamento foi de 14,1 (12,6) anos. A maioria dos
participantes (71,3%) fazia tratamento clínico e haviam sido submetidos a
tratamento cirúrgico; consumiam em média 4,4 (dp = 2,1) tipos de medicamentos
ao dia.
Influência das variáveis sociodemográficas e clínicas no impacto da doença nas
atividades de vida diária
Os resultados da análise de regressão linear múltipla, com critério de seleção
de variáveis Stepwise - utilizada para verificar a influência das variáveis
sociodemográficas e clínicas no impacto da doença avaliado pelo IDCV total e
domínios, estão apresentados na Tabela_2.
Tabela 2 Análises de regressão linear múltipla utilizada para testar a
influência das variáveis sociodemográficas e clínicas na percepção do impacto
da doença nas atividades de vida diária do paciente com valvopatia (N = 86),
Campinas, São Paulo, Brasil, 2012
Variável dependente Variável independenteValor de p
Escolaridade 0,0458
Impacto Físico - Sintomas Dispneia 0,0007
Uso de diurético 0,0248
Lipotimia 0,0001
Impacto Atividades Cotidianas Palpitação 0,0187
Escolaridade 0,0012
Impacto Social e Emocional Palpitação 0,0033
Uso de diurético 0,0112
Idade 0,0027
Adaptação à Doença Palpitação 0,0003
Lipotimia 0,0073
Uso de diurético 0,0005
IDCV - Total Precordialgia 0,0027
Palpitação 0,0097
Os dados evidenciaram que a escolaridade e a idade foram as variáveis
sociodemográficas que influenciaram o impacto da valvopatia nas atividades de
vida diária dessas pessoas. A escolaridade influenciou o impacto em dois
domínios - Impacto Físico - Sintomas (valor de p= 0,0458) e no domínio Impacto
Social e Emocional (valor de p = 0,0012). A idade, por sua vez, influenciou o
domínio Adaptação à Doença.
O impacto da doença foi ainda influenciado por variáveis clínicas - os sintomas
relacionados à valvopatia (dispneia, palpitação, precordialgia e lipotimia) e
uso do diurético.
A percepção de palpitação autorrelatada pelo paciente influenciou o IDCV total
e três dos seus domínios - Impacto nas Atividades Cotidianas (valor de p
<0,0001), Impacto Social e Emocional da doença (valor de p = 0,0033) e o
domínio Adaptação à Doença (valor de p = 0,0003).
Da mesma forma, o uso de diurético influenciou os domínios Impacto Físico-
Sintomas (valor de p = 0,0248), Impacto Social e Emocional (valor de p =
0,0112) e o escore total (valor de p = 0,0005).
Verificou-se que o IDCV total foi influenciado pela presença dos sintomas -
precordialgia (valor de p= 0,0027), palpitação (valor de p= 0,0097) e pelo uso
de diurético (valor de p= 0,0005).
DISCUSSÃO
Este estudo buscou analisar as características sociodemográficas e clínicas dos
pacientes com valvopatia e verificar a influência dessas variáveis no impacto
da valvopatia no cotidiano desses pacientes. Os principais achados evidenciaram
que o impacto da doença nesse grupo de pacientes foi influenciado pelas
características sociodemográficas, como: idade, escolaridade e pelas variáveis
clínicas - sintomas (dispneia, palpitação, lipotimia e precordilagia) e uso de
diurético.
No que se refere às características sociodemográficas do grupo estudado, a
composição da amostra estudada mostrou que as variáveis sexo e idade
comprovaram as evidências apontadas por outros estudos em relação à valvopatia
- predomínio do sexo feminino, com a faixa etária oscilando de 18 a 75 anos
(9,13). A escolaridade e situação socioeconômica no grupo estudado reflete a
maioria da população atendida em hospital universitário, que presta assistência
à saúde por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), predominantemente formada por
sujeitos com baixa escolaridade e nível socioeconômico inferior. Resultados
semelhantes foram encontrados em estudos desenvolvidos com pacientes cardíacos
atendidos no mesmo hospital(9,13-17).
Constatou-se que 47,7 (41/86) dos entrevistados eram inativos, ou seja,
recebiam benefício de auxílio-doença, eram aposentados por invalidez ou tempo
de serviço ou ainda encontravam-se desempregados. Nesse grupo da variável
situação trabalhista, parece possível afirmar que a manifestação clínica da
valvopatia pode ter contribuído para retirar precocemente o sujeito da vida
produtiva, com consequências negativas para o indivíduo e para a sociedade.
No que se refere ao diagnóstico, 59,3% dos participantes possuíam diagnóstico
de insuficiência mitral e 50% de estenose mitral. O acometimento da valva
mitral tem grande incidência na população brasileira, diferentemente de países
mais desenvolvidos, sendo a febre reumática a principal etiologia das
valvopatias em nosso meio, responsável por até 70% dos casos(18).
A terapêutica medicamentosa nas valvopatias tem como objetivo controlar
consequências e prevenir complicações. Os grupos farmacológicos aplicáveis à
valvopatia são: digitálicos, betabloqueadores, diuréticos, vasodilatadores,
antiarrítmicos e anticoagulantes(3,5). Neste estudo verificou-se que todos os
pacientes faziam uso da terapêutica medicamentosa. Em pesquisa no prontuário,
foi verificado o uso dos seguintes grupos farmacológicos: digitálicos,
diuréticos, vasodilatadores (IECA) e anticoagulantes, portanto, classes de
drogas consonantes com o que tem sido preconizado na literatura.
Os pacientes valvopatas caracterizam-se por apresentar sinais e sintomas, como:
dispneia, fadiga, síncope, edema, precordialgia e palpitação que se manifestam
cotidianamente e de maneira progressiva com a evolução da afecção o que leva os
pacientes a procurarem atendimento médico em função da piora progressiva de
seus sintomas físicos, geralmente fadiga e dispneia(3-5-18). No presente
estudo, constatou-se que 80,2% dos pacientes apresentavam pelo menos um sintoma
descrito pela literatura, sendo os mais prevalentes a fadiga (53,5%) e a
dispneia (50%), corroborando com os achados de estudos pregressos.
Os resultados deste estudo sugerem que variáveis sociodemográficas como a
escolaridade e a idade influenciam a percepção do impacto da doença. A relação
entre a escolaridade e a percepção que o paciente tem sobre sua doença também
foi identificada em estudo pregresso, no qual foi observada a influência do
nível de escolaridade sobre a existência de crenças inadequadas, de maneira que
os participantes com mais de quatro anos de escolaridade relataram mais crenças
inadequadas(19).
A literatura tem demonstrado, nos últimos anos, uma preocupação com associação
entre o nível de escolaridade e variáveis clínicas e psicossociais, sendo
sugerida uma correlação entre elas, ou seja, quanto menor a escolaridade, pior
a evolução clínica e menos favoráveis são os resultados de variáveis
psicossociais (crenças, atitudes ou percepção da doença). Esses achados
corroboram com os do estudo de Reis e Glashan(19), desenvolvido com
hipertensos, no qual foi observado que pacientes com maior nível de
escolaridade também eram os mais esclarecidos quanto à gravidade da hipertensão
arterial.
Do mesmo modo, a presença ou não de sintomas parece ser importante não somente
para avaliar a evolução clínica do indivíduo, mas também para auxiliar na
compreensão do impacto resultante da doença e do tratamento em sua vida. A
sintomatologia influenciou a percepção do sujeito sobre o impacto da doença
relacionado às atividades de vida diária, aos fatores sociais e emocionais e
aos físicos e relacionados à adaptação à condição de vida. Assim, acredita-se
que a sintomatologia deva ser abordada do ponto de vista clínico, como uma
evidência de melhora ou piora da condição clínica ou para avaliação da
efetividade do tratamento instituído e, principalmente, na ótica do sujeito,
avaliando as repercussões nas atividades de vida diária e especialmente
auxiliando o paciente no desenvolvimento de estratégias de prevenção, de alívio
e/ou de enfrentamento dos sintomas.
Os resultados deste estudo demonstraram que o uso de diurético influenciou a
percepção de impacto no que se refere aos aspectos social, emocional e físicos
- sintomas, o que pode ser atribuído ao fato desse medicamento se relacionar
com o alívio da dispneia e do edema de membros inferiores, sintomas frequentes
em valvopatas que comprometem significativamente o seu cotidiano pelas
restrições no desenvolvimento das atividades de vida diária.
Outro aspecto associado ao tratamento com diurético se refere ao incômodo
causado por seu uso que, embora proporcione alívio dos sintomas, pode causar
restrições na vida destes pacientes uma vez que aumenta o volume urinário, fato
que pode interferir ou impedir que o paciente frequente locais onde não haja
facilidade de acesso ao banheiro. É frequente o relato de dificuldade de
conciliar a tomada do medicamento com a manutenção das atividades de trabalho
e/ou de lazer.
Constitui limitação deste estudo, a inclusão na amostra de pacientes clínicos e
cirúrgicos, cuja percepção do impacto da doença nas atividades de vida diária
pode diferir pelo tipo de tratamento instituído, embora o tempo médio de
tratamento (14,1 anos) e a mediana (10 anos) apontem para a convivência por
longo período com a doença e suas repercussões clínicas.
Assim, os resultados obtidos referentes à influência das variáveis
sociodemográficas e clínicas na percepção do impacto da doença são fundamentais
para o planejamento da assistência/ações de enfermagem voltadas para esta
clientela. Esse conhecimento possibilita ao enfermeiro elaborar estratégias que
visem controlar ou reduzir os predi-tores de um pior impacto da doença e/ou,
como direcionar ações específicas para aqueles mais vulneráveis a um pior
impacto, como aqueles com baixa escolaridade.
CONCLUSÃO
Os achados deste estudo evidenciam que o grupo estudado caracteriza-se pelo
baixo nível socioeconômico representado por baixa escolaridade e baixa renda. O
impacto percebido pela doença foi influenciado por variáveis socio-
demográficas, como idade e escolaridade e por variáveis clínicas, como a
presença ou não de sintomas e o tratamento com diuréticos. Considera-se,
portanto, que o conhecimento sobre as características sociodemográficas e
clínicas da clientela e a influência destas na percepção de impacto da doença
constitui importante estratégia para qualidade do cuidado prestado ao paciente
valvopata em seguimento ambulatorial.
Como citar este artigo:
Anjos DBM, Rodrigues RCM, Padilha KM, Pedrosa RBS, Gallani MCBJ. Influence of
sociodemographic and clinical characteristics at the impact of valvular heart
disease. Rev Bras Enferm [Internet]. 2016;69(1):33-9.