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BrBRCVHe0034-71672016000100067

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National varietyBr
Year2016
SourceScielo

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Estratégias de enfrentamento por enfermeiros da oncologia na alta complexidade INTRODUÇÃO O câncer trata-se de um problema de saúde pública, no âmbito mundial, de grande relevância epidemiológica no que tange à incidência e à morbimortalidade. É uma doença crônica e representa, no imaginário das pessoas, o símbolo da impossibilidade de cura, remetendo o ser humano ao confronto com a finitude da vida(1).

A assistência às pessoas com câncer tem avançado ao longo dos anos. Novos métodos de detecção precoce, rastreamento dos agentes cancerígenos e tipos de neoplasias são exemplos da evolução. Contudo, o termo câncer é evitado pelos profissionais de saúde e é carregado pelo estigma da iminência de morte(2).

A constante aplicação da ciência e da tecnologia no processo de cuidar em saúde, com destaque para a enfermagem, tem influenciado significativamente a prática destes profissionais em decorrência do surgimento de dilemas éticos durante o exercício da profissão, inferindo-se, assim, a importância que a bioética adquire para os enfermeiros na sua tomada de decisões frente a problemas morais(3).

No contexto hospitalar, a equipe de enfermagem assume grandes responsabilidades frente a esses pacientes, tendo como competência prestar assistência na avaliação diagnóstica, tratamento, reabilitação e atendimento aos familiares.

Ainda, deve lidar permanentemente com situações de sofrimento e morte, que são exacerbadas pelas características da demanda e do ambiente de trabalho. Esse contexto exige dos enfermeiros uma assistência com primazia na avaliação integral do paciente e sua família, extrapolando os limites da própria doença (4-5).

A rotina de trabalho da enfermagem não leva em conta os problemas que os profissionais enfrentam em seu cotidiano, tanto dentro quanto fora do trabalho.

Espera-se que os enfermeiros jamais expressem ao paciente suas dificuldades e que possam transmitir-lhe apenas tranquilidade(5).

Na dificuldade de cuidar das pessoas com câncer surge a necessidade de desenvolver estratégias de enfrentamento, considerando os aspectos éticos envolvidos nas diferentes situações e relações no contexto do cuidado, enfrentamento este que pode ser definido como um conjunto de respostas comportamentais que o indivíduo emite, diante de uma situação de estresse, para modificar o ambiente na tentativa de adaptar-se da melhor forma possível ao evento estressor, de maneira a reduzir ou minimizar seu caráter aversivo(4-5).

Nesta perspectiva, justificou-se este estudo a partir da necessidade de reconhecimento das estratégias que os enfermeiros desenvolvem diante do enfrentamento dos conflitos e problemas no cotidiano de trabalho, identificando assim suas fragilidades, dificuldades e limitações. O objetivo deste estudo foi identificar as estratégias de enfrentamento dos enfermeiros de serviços de oncologia, na alta complexidade hospitalar, diante do cuidado à pessoa com câncer.

MÉTODO Estudo exploratório e descritivo, com abordagem qualitativa, realizado com 18 enfermeiros que trabalhavam em unidades de internação e ambulatório hospitalar de quimioterapia, em duas capitais do Sul do País. Para a seleção dos sujeitos, utilizou-se a técnica de amostragem em "bola de neve", consistindo em eleger participantes iniciais em cada uma das duas capitais, solicitando-se, ao final de suas entrevistas, que outros sujeitos com as características fossem indicados para as próximas coletas de dados. A coleta de dados aconteceu simultaneamente nas duas capitais, em março de 2013, após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa local. A pesquisa seguiu os preceitos éticos referentes à pesquisa e ao cuidado com seres humanos.

Uma entrevista semiestruturada foi o instrumento de coleta de dados, baseada em três questões norteadoras: 1) Quais as dificuldades que você encontra na convivência com os familiares e pacientes e com os outros profissionais?; 2) Quais estratégias de enfrentamento você utiliza no cotidiano do cuidado oncológico? e 3) Quais estratégias você sugere serem adotadas pelas equipes, para facilitar o enfrentamento do cuidado oncológico? Essas entrevistas foram áudio-gravadas e ocorreram em um local de preferência do participante, sendo posteriormente transcritas na íntegra. Com relação aos critérios de inclusão dos participantes, considerou-se o fato do profissional desenvolver atividade assistencial com adultos com câncer e que possuíam um ano ou mais de experiência na oncologia. A metodologia utilizada para analisar os dados foi a análise temática, segundo Minayo(6), que compreendeu: a transcrição das entrevistas e a leitura prévia com delimitação dos elementos chaves; a leitura aprofundada e o agrupamento dos elementos chaves em categorias e, por fim, o processo analítico descritivo e interpretativo, promovendo o diálogo com a literatura atual e pertinente à temática. Para a garantia do anonimato dos participantes, os mesmos foram identificados no estudo através da adoção de nomes gregos.

RESULTADOS Através da análise dos dados, emergiram três categorias principais: a) negação e resignação no cuidado à pessoa com câncer; b) a busca de apoio na equipe de saúde e na pluralidade e multiplicidade de olhares sobre o cuidar, incluindo o paciente e sua família e c) a busca de aperfeiçoamento pessoal e profissional.

Negação e resignação no cuidado à pessoa com câncer Esta categoria reflete ações individuais que culminam em estratégias que aparentemente não se tornam benéficas para os pacientes com câncer, mesmo que o resultado momentâneo dessas estratégias permita a continuidade das ações dos profissionais enfermeiros. O processo de negação, que é um mecanismo de defesa muito comum, aparece como uma constante estratégia de enfrentamento: Acho que as fases da negação de uma doença passam pelo paciente, pela família, e principalmente, pelos profissionais que cuidam. Tu também está negando, até mesmo uma série de cuidados para aquele paciente.

(Kera) Outra situação comum aos indivíduos que enfrentam o contexto oncológico de forma individual refere-se às tentativas de afastamento, que apesar de terem como foco a manutenção de um nível de distância entre o profissional enfermeiro e os sujeitos envolvidos, acabam repercutindo fortemente nas ações de cuidado, desqualificando-as e limitando-as.

Logo que entrei eu me envolvia mais, quando o paciente estava mal fazia questão de conversar com a família e aquilo depois eu fui perdendo, foi um bloqueio. (Perséfone) Para eu conseguir fazer o meu trabalho com sanidade mental e fortificada emocionalmente tenho que estabelecer alguns limites.

(Bia) Por fim, apresentam-se nesta categoria as ações de aceitação da doença e suas consequências, buscando demonstrar que a resignação e a naturalidade são estratégias usadas pelos enfermeiros diante do contexto oncológico: No começo eu sofria muito, mas depois a gente vai tendo que encarar a realidade. (Eucleia) Procuro trabalhar a questão da resignação, aceitando as doenças com naturalidade. (Têmis) A busca de apoio na equipe de saúde e na pluralidade e multiplicidade de olhares sobre o cuidar, incluindo o paciente e sua família Esta categoria evidencia estratégias que se pautam na coletividade, na pluralidade de olhares e ações entre equipes de enfermagem e multidisciplinar, assim como com as pessoas com câncer e seus familiares: Temos uma equipe bem legal [... ] psicologia, serviço social, enfermagem, odonto, estomatologia na verdade, e medicina. Esses profissionais se reúnem toda a sexta-feira, das 10:30 - 11h da manhã, e fazemos uma reunião clínica, [...] quando posso ir junto levo um técnico. Quando não, fazemos um rodízio, coloco todos na mesma balança. (Pandora) Uma característica na atenção à pessoa com câncer é o envolvimento emocional mais estreito do profissional com o paciente e seus familiares, que, geralmente, o tratamento é longo e as hospitalizações e os retornos são frequentes: Minha primeira estratégia é escutar muito o paciente, não ele, família também, a pessoa que acompanhando. (Kera) Eu me envolvo, converso com a família, eu abraço, pego na mão, digo alguma coisa que tente confortar ele, chamo os familiares pra fora do quarto e converso, o familiar desabafa comigo, encaminho pra algum lugar se for preciso. (Iris) Os depoimentos de alguns enfermeiros denotam a necessidade dessa interação, da formação de grupos para favorecer esse enfrentamento ou até mesmo da realização de atividades que ultrapassem os limites da instituição hospitalar, como atividades de lazer: Acho importante realizar atividades que tirem o foco do trabalho, manter uma vida social ativa ajuda bastante. (Cáris) Eu acho que a troca de experiência entre vários profissionais, reuniões de grupo, muitas vezes com discussões de caso, ajudam o profissional a enfrentar melhor essas dificuldades. (Selene) A busca de aperfeiçoamento pessoal e profissional Nesta categoria estão presentes as estratégias ligadas ao processo de qualificação profissional e capacitação, para atuar de forma mais competente, humana e ética: Nunca faço nada sem saber o porquê e isso exige estudo. (Bia) E importante buscar conhecimento em congressos, workshop, fazer com que a gente não leia, mas compartilhe com o colega. (Kera) Conforme evidenciado a seguir, Pandora expressa que a qualificação profissional também significa desenvolver habilidades relacionais no manejo com o paciente e seus familiares, a partir de um modo propositivo de enfrentamento que conduz o profissional a aprender a lidar com o sofrimento, as necessidades psicobiológicas e espirituais da pessoa com câncer, de modo a aprimorar a escuta e a sensibilidade: Eu não quero um profissional muito especializado em tecnologias e que saiba mexer num monitor, quero um profissional que tenha esse olhar, que consiga ver de forma humana. (Pandora) DISCUSSÃO Adoecer é uma ameaça à autoimagem e à existência de todas as pessoas, é contatar com a sua finitude, e uma das formas de lidar com a doença é o fato negá-la(7). Nas situações em que a negação pode atrapalhar o tratamento disponibilizado ao paciente, é preciso construir alternativas(8). Mesmo assim, na medida em que o cuidado é o objeto de trabalho da enfermagem e, por conseguinte, do enfermeiro, a relação do profissional com a negação da doença e, consequentemente, do cuidado qualificado à pessoa com câncer evidencia um paradoxo. E esta análise tem sido exaustivamente realizada por estudos(9-10) que contemplam a temática do cuidado à pessoa com câncer.

No entanto, outra possibilidade de analisar este processo de negação do cuidado. Sinaliza-se que, quando se trata do ato de cuidar, o profissional da enfermagem, assim como outros profissionais, baseia-se em suas crenças e valores, pontos determinantes de comportamentos que seguem oriundos de seus hábitos de vida, os quais constroem(11) modos de ser e de se comportar na sociedade. Indaga-se, então: quais valores e crenças este profissional conduz que os faz limitar ou desqualificar o cuidado como estratégia de enfrentamento no cuidado à pessoa com câncer? Valores e crenças que amparam a noção de que a doença câncer articula-se a uma possibilidade ambígua de cura, ao sofrimento das pessoas e à morte. Assim, deve-se considerar que o conceito de experiência é o entrecruzamento de várias dimensões (pensamento-ação, consciência-corpo, cultura-individualidade), o que expressa uma síntese entre corpo e cultura.

Isso implica, pois, um sistema de cuidados, em saúde, tendo a doença como um idioma cultural socialmente determinado e articulado a crenças e padrões de comportamento, experiência dos sintomas e alternativas de tratamento(12). Em suma, comportamentos desenvolvidos no cuidar e o modo como os trabalhadores expressam suas ações estão relacionados, também, a padrões culturais(13).

Culturalmente, a resignação diante do câncer e suas consequências prevalecem entre as pessoas.

evidências de que a equipe de enfermagem utiliza mecanismos de enfrentamento para conviver com o sofrimento: distancia-se dos pacientes e evita o envolvimento, o que representa a incapacidade de lidar com a carga emocional resultante desse convívio diário. Por outro lado, a satisfação em promover o alívio do sofrimento do outro pode traduzir a reposição de energias, o bem- estar e a amenização da dor, permitindo novos enfrentamentos e melhor desempenho no seu trabalho. A valorização e a dedicação ao trabalho, quando reconhecidas, geram uma satisfação na equipe de enfermagem, pois esta se sente valorizada(14). Portanto, os dados que emergem na segunda categoria implicam na discussão da possibilidade do enfrentamento, tanto pela ancoragem nada equipe profissional, como pela compreensão do quanto é produtivo e compensador compreender os múltiplos modos como o cuidado pode se expressar.

Muitos pacientes acometidos pelo câncer e com uma expectativa de vida limitada sofrem, desnecessariamente, quando não recebem a atenção necessária e adequada para os sintomas que acompanham sua doença ou compreensão de suas angústias.

Cada vez mais se fazem necessárias equipes de saúde compostas por profissionais de diferentes áreas de formação, dispostos a esclarecer possibilidades para o paciente e seus familiares enfrentarem este momento de suas vidas, amenizando o sofrimento de todos, inclusive da própria equipe. Fica eminente a importância de ações no cuidado algumas vezes desvalorizadas, como o toque, o estar presente, o esclarecer dúvidas em relação à medicação, cuidados, patologia, bem como sinais e sintomas que o paciente possui ou poderá apresentar. Na verdade, são ressignificados os atributos das relações de cuidado, enfatizando valores éticos, como a confiança e a autonomia(15).

O enfermeiro, após ingressar em uma unidade oncológica e adaptar-se ao novo ambiente, evidencia um grande comprometimento e paixão por sua profissão e, principalmente, pelos seus pacientes e familiares. Isto é, a vivência é intensa, na qual a vinculação com a área se pela compreensão de que o cuidado vai além do biológico, superando o sofrimento e a penalização em direção a uma visão pautada no sentimento de gratificação pelo trabalho desenvolvido.

Nesta perspectiva, diante da dificuldade em lidar com as pessoas com câncer, os participantes desta investigação manifestam, na terceira categoria, o aprimoramento profissional como uma forma de enfrentamento no cuidado à pessoa com câncer. Portanto, é necessário um preparo contínuo para lidar com os seus sentimentos e do paciente desenvolvendo mecanismos de proteção, pois o ambiente hospitalar traz consigo a ideia de sofrimento, e a rotina de trabalho da equipe de enfermagem gera momentos de grande vulnerabilidade emocional(16).

Logo, uma forma de apoiar os profissionais para lidar com estes enfrentamentos é criar estratégias de prevenção do sofrimento moral, e uma das maneiras é por meio da educação e do desenvolvimento da competência ética. Isto se torna fundamental tanto para a satisfação no trabalho e disponibilidade no cuidar quanto para a retenção dos profissionais no ambiente de trabalho(17).

Estar disponível para o doente, ou seja, através da sua presença, atenção, cuidado, ajuda e informação, é uma forma de apoiar emocionalmente, proporcionando uma proximidade afetiva e favorecendo as trocas significativas entre paciente e profissional(10,18). Na oncologia, é primordial que a equipe de enfermagem seja capaz de manter uma boa comunicação e relação com a pessoa com câncer e com sua família, vistas como parte indissociável para o cuidado integral. Outra abordagem que vem crescendo é o fundamentado na modalidade do cuidado da equipe multidisciplinar, a qual traz desafios e exige habilidades para o trabalho em equipe(19).

Diante disso, apresenta-se como fundamental que as instituições devam proporcionar aos seus colaboradores um espaço dedicado à discussão, para que o olhar também seja voltado para cuidar dos que cuidam(20). A criação de espaços de discussão, de troca de experiências, até mesmo rounds, pode ser uma maneira de reduzir o estresse e situações de sofrimento. É preciso levar em conta que as inovações científicas e tecnológicas exigem dos enfermeiros reformulação nas formas de pensar, ser e agir diante das exigências e requisitos da prática assistencial(9).

O saber do enfermeiro é o resultado não de conhecimentos teóricos e técnicos adquiridos através de formação formal, como também de saberes práticos adquiridos com a experiência e com a relação que estabelece com os pacientes.

Com o tempo e a experiência, o enfermeiro aprende a mobilizar, a integrar e a transferir o conhecimento para a prática, desenvolvendo sua habilidade(9).

Identifica-se que a educação continuada e as atividades multiprofissionais podem resultar na melhoria da qualificação profissional e da assistência prestada ao paciente(21).

CONSIDERAÇÕES FINAIS Diante da complexa problemática apresentada, considera-se de fundamental importância o envolvimento e participação do enfermeiro nos debates que envolvam pacientes com câncer, na busca de maiores conhecimentos sobre a temática.

A enfermagem tem vivenciado dificuldades no cotidiano da assistência oncológica. Neste contexto, desenvolve várias formas de manejo para não criar vínculos afetivos, sendo isso um paradoxo, pois a assistência à pessoa com câncer, ao mesmo tempo em que mobiliza as mais variadas emoções, demanda uma conduta de proteção e de manejo de sentimentos e emoções.

Na medida em que este estudo abordou enfermeiros de diferentes instituições em duas capitais do sul do país, seus resultados são representativos do modo de ser e fazer de uma região. No entanto, sua abrangência é limitada, não sendo possível generalizar os resultados, pois cada equipe e instituição possuem características bastante distintas.

Como citar este artigo: Luz KR, Vargas OAM, Barlem ELD, Schmitt PH, Ramos FRS, Meirelles BHS. Coping strategies for oncology nurses in high complexity. Rev Bras Enferm [Internet].

2016;69(1):59-63.


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