Avaliação de aspectos cognitivos em homens portadores de esquizofrenia em
tratamento com haloperidol ou clozapina
Introdução
São muitas as pesquisas que, sob o ponto de vista psiquiátrico, buscam
investigar as contribuições e contra-indicações da medicação antipsicótica de
primeira ou de segunda geração para a recuperação de pacientes esquizofrênicos
(Bechelli, 2000; Fleischhacker, 2002/2005; Frota, 2001; Nardi e Bueno, 2000;
Louzã et al., 1999; Shirakawa et al., 2001; Stip, 2001).
Os antipsicóticos de primeira e/ou segunda geração reduzem os sintomas
positivos da doença. Contudo, quando um grupo de pacientes faz uso da medicação
de primeira geração, não obtém nenhuma melhora de seus sintomas ou, se ela
ocorre, é apenas parcial. No entanto, mesmo esses pacientes refratários à
medicação podem apresentar melhora se usarem a de segunda geração,
especialmente se for a clozapina (Bechelli, 2000; Fleischhacker, 2002/2005). Os
clínicos deviam pensar seriamente em oferecer clozapina e outros medicamentos
antipsicóticos de segunda geração para pacientes que não respondem ou
demonstram intolerância a antipsicóticos de primeira geração (Jackson et al.,
2004).
Medicamento antipsicótico de primeira geração cuja descoberta de seus efeitos
antipsicóticos ocorreu ao acaso, uma vez que foi sintetizado com a intenção de
se obter um analgésico mais potente do que os existentes até então (Bechelli,
2000), ainda hoje o haloperidol é uma das drogas mais utilizadas no tratamento
de pacientes esquizofrênicos.
O haloperidol é considerado uma droga de alta potência, pois, para atingir a
mesma eficácia das drogas de baixa potência, suas doses devem ser até 20 vezes
menores do que as menos potentes (Frota, 2001). Entretanto, apesar de
apresentar efeitos colaterais autonômicos (sedação, hipotensão postural, etc.)
menos proeminentes, ele apresenta maior possibilidade de desencadear reações
extrapiramidais (distonia aguda, parkinsonismo medicamentoso, acatisia,
síndrome neuroléptica maligna e discinesia tardia) do que os antipsicóticos de
baixa potência (Bechelli, 2000), além de ser é considerado o agente causal mais
freqüente da síndrome neuroléptica maligna (Hanel et al., 1998).
A clozapina foi o primeiro antipsicótico que demonstrou diferenças
quantitativas e qualitativas em relação aos antipsicóticos de primeira geração.
Ela demonstra vantagens não apenas no tratamento de pacientes refratários, mas
também sobre os sintomas negativos da doença, mostrando-se eficiente em vários
domínios psicossociais, incluindo a qualidade de vida e a prevenção de
comportamentos suicidas (Fleischhacker, 2002/2005).
Em virtude do risco de causar agranulocitose (alteração hematológica), o uso da
clozapina deve se restringir ao grupo de pacientes refratários e/ou
intolerantes aos antipsicóticos de primeira geração (Bechelli, 2000; Graeff et
al., 1999; Pádua, 2000; Rocha e Silva et al., 2001; Shirakawa et al., 2001;
Stip, 2001). A agranulocitose causada pelo uso da clozapina é potencialmente
fatal em cerca de 1% dos pacientes (Shirakawa et al., 2001). Os efeitos
adversos mais comuns com o uso da clozapina são sonolência, salivação noturna,
hipotensão postural e ganho de peso (Shirakawa et al., 2001).
Lamentavelmente não há antipsicóticos que não possuam efeitos colaterais
inconvenientes. Portanto cautela, detecção precoce de efeitos adversos,
diminuição de dose, substituição por outra droga, suspensão de associações
desnecessárias e modificação comportamental são estratégias recomendadas (Abreu
et al., 2000).
Testes psicológicos são freqüentemente aplicados em pacientes internados em
hospitais psiquiátricos, buscando avaliar aqueles que apresentam potencial
diagnóstico de esquizofrenia. Os testes mais utilizados são o de Rorschach, o
teste de apercepção temática (TAT) e o Minnesota Multiphasic Personality
Inventory (MMPI). O diagnóstico por meio de testes psicológicos é questionável,
ponderam Lipton e Cancro (citados por Pull, 2002/2005). Há de se reconhecer que
qualquer instrumento de avaliação do comportamento humano e dos processos
cognitivos, incluindo entrevistas, tem sua margem de limitação.
Diversos autores (Adrados, 2000; Bohm, 1979; Klopfer e Kelly, 1977; Portuondo,
1976; Sousa, 1982; Vaz, 1997) apontam como sinais específicos de esquizofrenia
no Rorschach a presença de respostas de forma pura (escore de forma [SF] = F+,
F-, F±), ou seja, baixo controle geral sobre seus impulsos e instintos; baixo
percentual de forma de boa qualidade ({F+ x 100}/SF) e, conseqüentemente,
elevado percentual de respostas de forma de má qualidade ({F-x 100/SF}), o que
denota imprecisão, incoerência e desorganização do raciocínio lógico. Além
desses dados quantitativos, ratificando a desorganização do pensamento, é
freqüente o aparecimento de fenômenos especiais como contaminação, crítica à
técnica ou ao examinador e rejeição do cartão.
Em pesquisa para avaliação da capacidade de vinculação afetiva de pacientes
esquizofrênicos do tipo paranóide, Veiga Oliveira e Vaz (2002) constataram
indícios de respostas de movimento humano nos protocolos de Rorschach. Todavia
essas respostas ocorreram em índice muito baixo no grupo de pacientes composto
por homens, mas não houve respostas no formado por mulheres. Das respostas de
movimento humano observadas, três foram de boa qualidade (M+), isto é,
demonstraram ser pessoas com potencial criativo e alguma capacidade de empatia.
A totalidade das respostas M+ foi dada por pacientes que faziam uso de
antipsicóticos de segunda geração, enquanto as duas respostas de movimento
humano de má qualidade (M-) foram dos pacientes (homens) que usavam
antipsicóticos de primeira geração. Quanto ao controle externo (FC > CF + C), o
grupo de homens avaliados apresentou 1FC < 0CF + 4C e o de mulheres, 1FC < 7CF
+ 8C, o que ratifica um maior descontrole emocional por parte das mulheres.
Pessoas portadoras de esquizofrenia apresentam precário controle interno (M <
FM + m), isto é, o movimento humano (M%) é menor do que a soma dos movimentos
animal (FM) e inanimado (m). O controle externo (FC < CF + C) se caracteriza
pelo predomínio de cor com forma imprecisa (CF) e cor pura (C) sobre a cor com
forma definida (FC), indicando descontrole emocional. Já o controle social
raramente aparece, embora seja costumeiro haver respostas de claro-escuro (cor
acromática) (FC', C'F, C'), representativas de angústia, ansiedade e depressão
(Adrados, 1982).
Este estudo se propõe a avaliar, sob o ponto de vista psicológico, alguns
aspectos cognitivos de pacientes esquizofrênicos associados ao tipo de
medicamento antipsicótico em uso: haloperidol ou clozapina.
Métodos
Amostra
A população incluída na amostra era constituída de homens com diagnóstico
psiquiátrico prévio de esquizofrenia, com recidiva da doença, e em tratamento
psiquiátrico no ambulatório de esquizofrenia do Hospital de Clínica de Porto
Alegre (HCPA).
Foram escolhidos como amostra dois grupos. O grupo 1 (14 homens) era formado
por pacientes diagnosticados como esquizofrênicos com recidiva da doença, e em
tratamento farmacológico com haloperidol há, no mínimo, um ano e meio. Já o
grupo 2 (16 homens) também reunia indivíduos com diagnóstico de esquizofrenia,
recidiva da doença e em tratamento farmacológico há, no mínimo, um ano e meio,
mas em uso de clozapina. O estudo, com faixa etária variando entre 18 e 59
anos, adotou para a seleção da amostra os seguintes critérios de exclusão:
diagnóstico cruzado de esquizofrenia com doenças afetivas, bem como pacientes
que fazem uso concomitante de medicações de primeira e de segunda geração. Este
último critério limitou bastante o tamanho da amostra do estudo, uma vez que é
bastante comum o uso combinado de medicamentos de primeira e de segunda geração
em pacientes esquizofrênicos.
Instrumentos
Operational Checklist for Psychotic Illness (OPCRIT): os pacientes foram
avaliados previamente pela equipe do HCPA através do OPCRIT para definição do
diagnóstico de esquizofrenia. Esse instrumento possibilita a definição de
diagnósticos aproximados para pesquisas de transtornos mentais severos
(Williams et al., 1996).
O OPCRIT é considerado um instrumento confiável, de rápida aplicação e de
validade para pesquisas de doenças psiquiátricas (Craddock et al., 1996). Foi
validado para o Brasil em trabalho conjunto da equipe do HCPA com a equipe de
pesquisadores portugueses (Azevedo et al., 1999).
Técnica de Rorschach: para avaliação do controle geral dos impulsos, do
pensamento lógico, da percepção de conjunto, do senso de organização, da
capacidade de discernimento, do senso de objetividade, da capacidade de
análise, do senso de observação e da capacidade para tolerar frustrações,
utilizou-se a técnica de Rorschach. Essa técnica, de autoria de Hermann
Rorschach, teve sua primeira edição completa ao fim de junho de 1921. Trata-se
de uma técnica que possibilita avaliar os elementos psicodinâmicos da pessoa,
de modo abrangente e global, pois, por meio dela é possível avaliar a estrutura
da personalidade do indivíduo e o funcionamento de seus psicodinamismos, seus
traços de personalidade, o funcionamento de suas condições intelectuais, o
nível de ansiedade básica e situacional, a depressão, suas condições afetivas e
emocionais, o controle geral, a capacidade para suportar frustrações e
conflitos, a integração humana, assim como possibilita avaliar os impulsos, os
instintos e as reações emocionais (Vaz, 1997).
Existem vários sistemas para a classificação das respostas da técnica de
Rorschach: Rorschach, Klopfer, Silveira, Ombredane, Canivet, Beck, Piotrowski,
Hertz, Rappaport e Exner. Assim, a quantidade de sistemas hoje existentes nos
dá a dimensão de como essa técnica foi, e continua sendo, muito utilizada e
pesquisada. Todos os sistemas são capazes de chegar ao mesmo resultado na
interpretação final acerca da avaliação de um protocolo de Rorschach. O sistema
de classificação adotado neste estudo foi o de Klopfer adaptado por Vaz (1997)
e usado pelos autores na prática clínica e de pesquisa.
Foram levados em conta os seguintes dados quantitativos da técnica de
Rorschach:
o número de respostas (R) para avaliar a capacidade de produção e desempenho,
bem como a adaptação à tarefa;
a incidência de respostas de forma pura (SF%) e de movimento animal (FM) para
avaliação do controle geral e das reações impulsivas;
a incidência e a qualidade das respostas de forma pura (F+%, F-%, F±%) para
avaliar o funcionamento do raciocínio lógico;
a incidência de respostas de localização global (G), detalhes comuns (D) e
detalhes incomuns (Dd) para avaliação da percepção de conjunto, do senso de
organização, da capacidade de discernimento, do senso de objetividade, da
capacidade de análise e do senso de observação;
as respostas de sombreado de perspectiva e profundidade (FK, KF, K), cor
cromática (FC, CF, C) e forma de boa qualidade (F+) para avaliação da
capacidade de frustração.
Foram feitas ilações na interpretação dinâmica com os índices encontrados na
literatura como previsíveis (normais) das variáveis quantitativas.
Procedimentos
A Comissão Científica e a Comissão de Pesquisa e Ética em Saúde, reconhecida
pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP/MS) como Comitê de Ética em
Pesquisa do HCPA e pelo Office for Human Research Protections (OHRP)/ United
States Department of Health and Human Services (USDHHS), como Institutional
Review Board (IRB000921), analisaram o projeto e aprovaram a realização dessa
pesquisa.
A escolha dos pacientes para constituição da amostra se concretizou após a
confirmação do diagnóstico pela equipe médica, com a aplicação do OPCRIT. Os
pacientes foram convidados a participar da pesquisa, mas cada um assinou o seu
termo de consentimento livre e esclarecido, assim como cada familiar
responsável, e todos receberam uma cópia do documento.
Posteriormente foi realizada a aplicação da técnica de Rorschach nos dois
grupos. A avaliação foi realizada de forma individual, em sala e em condições
adequadas para essa finalidade, sendo a classificação das respostas de cada
protocolo de Rorschach feita às cegas por integrantes do grupo de pesquisa
treinados na técnica de Rorschach.
Apresentação dos resultados
Foi realizado estudo comparativo sobre os dados do Rorschach entre os grupos 1
(pacientes em tratamento com haloperidol) e 2 (pacientes em tratamento com
clozapina), utilizando-se a análise de variância (ANOVA), seguida do teste de
Bonferroni com nível de significância de p < 0,05.
Os dados do Rorschach apontam para os resultados que se seguem.
Os pacientes do grupo 1 (haloperidol) apresentaram um número bastante
reduzido de respostas por protocolo (R = 9,71), visto que a faixa clínica
considerada normal é de 15 a 30 respostas por protocolo. Já os do grupo 2
(clozapina) produziram em média 14,69 respostas por protocolo.
O grupo 1 revelou um índice de respostas com F+ inferior a 80% (F+ = 72,77%),
o que indica imprecisão, incoerência e desorganização do pensamento. Esse
índice, associado ao aumento do número de respostas com índice de forma
semidefinida (F± = 21,88%), indica que essas pessoas, quando abaladas
emocionalmente, têm dificuldade em lidar com a situação e, portanto, perdem a
qualidade do raciocínio. Embora não haja predominância de respostas de forma de
má qualidade, a desorganização do pensamento desses pacientes aparece
ratificada. O grupo 2, por sua vez, apresentou aumento de respostas de forma de
boa qualidade (F+ = 86,34%) e conseqüente diminuição do índice de respostas de
forma semidefinida (F± = 10,13%).
Os dois grupos manifestaram um índice de respostas de detalhe comum (D)
inferior à faixa clínica considerada normal, o que representa 40% a 55% das
respostas, comprometendo assim a capacidade de discernimento e o senso de
objetividade. O grupo 1 (D = 13,29%) está bem mais afastado da faixa clínica
considerada normal do que o 2 (20,83%).
Existem diferenças entre os dois grupos quanto à capacidade para tolerar
frustrações. Embora essas diferenças não sejam estatisticamente significavas,
observa-se (Figura_1) que o grupo 1 não demonstra capacidade para tolerar
frustrações, uma vez que não apresentou a proporção esperada em nenhuma das
três variáveis do Rorschach que avaliam tal capacidade, enquanto o grupo 2
correspondeu às proporções da faixa clínica considerada normal em tais
variáveis ' grupo 1: (FK < KF + K) = 0,07< 0,21; (FC < CF + C) = 0,36 < 0,57;
grupo 2: (FK = KF + K) = 0,19 = 0,19; (FC > CF+C) = 0,94 > 0,5).
![](/img/revistas/jbpsiq/v55n3/a05fig01.jpg)
Os dois grupos apresentam indicadores de controlegeral sobre impulsos e
reações instintivasde acordo com a faixa clínica considerada normal, que seria
o escore de forma (SF) entre 30% e 50%, não tendo sido constatada diferença
estatisticamente significativa entre os grupos (G1 = 40,48 e G2 = 46,36).
Quanto ao índice de respostas de movimento animal (FM), o grupo 1 apresentou em
média uma resposta por protocolo, enquanto o grupo 2 apresentou 1,31 FM por
protocolo.
Os dois grupos apresentam alto índice de respostas de detalhes incomuns (Dd)
' G1 = 22,76% e G2 = 20,42% ' uma vez que o máximo esperado seria de 17% do
total de respostas por protocolo de Rorschach.
Discussão dos resultados
O número reduzido de respostas do grupo 1 (haloperidol) indica baixa capacidade
de produção, desempenho e adaptação à tarefa. É comum aparecer um número
reduzido de respostas no Rorschach em pessoas com defesas paranóides. Para
evitar se expor, temendo a ameaça, o sujeito tenta se proteger através do
controle intelectual sobre o meio externo e, desse modo, emite um baixo número
de respostas. Já os pacientes do grupo 2 (clozapina) produzem respostas
situadas na faixa clínica considerada normal, demonstrando ser adequada a sua
capacidade de produção, desempenho e adaptação à tarefa.
Ao considerar que alogia, delírios e desorganização do pensamento são sintomas
característicos de esquizofrenia, a literatura aponta como fato comum a
presença no Rorschach de pacientes com esse diagnóstico, com baixo percentual
de forma de boa qualidade (F+) e elevado percentual de respostas de forma de má
qualidade (F-), caracterizando raciocínio impreciso, incoerente e desorganizado
(Adrados, 2000; Bohm, 1979; Klopfer e Kelly, 1977; Portuondo, 1976; Sousa,
1982; Vaz, 1997).
Um sujeito com raciocino lógico preciso, coerente, organizado e bem-ordenado
apresenta como índice esperado F+ > 80%, F± até 20% e F-= 0%, em relação ao
total de respostas de forma pura (SF), conforme Vaz (1997). Neste estudo foram
constatadas diferenças clínicas quanto ao funcionamento do raciocínio lógico
entre os dois grupos.
Embora não tenham ocorrido diferenças estatisticamente significativas quanto à
qualidade do determinante forma, se forem levados em consideração os índices
apontados pela literatura como normais, pode-se dizer que a medicação com
clozapina está ajudando na organização do raciocínio lógico desses pacientes,
uma vez que eles apresentam raciocínio lógico preciso, coerente, organizado e
bem-ordenado.
Os índices de respostas de detalhe comum (D) podem ser interpretados como
comprometimento quanto à capacidade de discernimento e senso de objetividadedos
pacientes tratados com haloperidol e com clozapina.
Uma pessoa com capacidade para tolerar frustrações apresenta respostas de
sombreado perspectiva e profundidade, com forma clara e definida, em número
maior ou igual ao sombreado perspectiva e profundidade com forma semidefinida e
sem forma (FK > KF + K), associado a respostas cromáticas, com forma clara e
definida, em número maior ou igual à cor com forma semidefinida e sem forma (FC
> CF + C), sendo, no mínimo, 80% das respostas de forma pura de boa qualidade
(F+).
O baixo índice de respostas de movimento animal do grupo 1 (haloperidol), além
de indicar que se trata de pessoas altamente defensivas, não-impulsivase sem
capacidade de iniciativa, quando associado à baixa incidência de respostas de
forma de boa qualidade (F+) e de detalhes comuns (D), também aponta para um
sintoma comum da esquizofrenia: a avolição.
Os integrantes do grupo 2 (clozapina), embora também apresentem reduzido número
de respostas de movimento animal e, portanto, igualmente possam ser vistos como
pessoas altamente defensivas e não-impulsivas, denotam potencial para
desenvolver capacidade de iniciativa porque apresentam adequados índices quanto
ao número de respostas (R) por protocolo de Rorschach, de somatório de forma
(SF) e de respostas de forma (F+) de boa qualidade.
Cabe destacar que o grupo 2, apesar de ter exibido um número de respostas de
detalhe incomum (Dd) superior à faixa clínica considerada normal, apresentou
adequados índices de respostas (R) por protocolo de Rorschach e de respostas de
forma de boa qualidade (F+), e, considerando que os participantes desse grupo
obtiveram baixo índice de respostas de detalhe comum (D), fica evidenciado que
fazem uso de defesas obsessivas (Vaz, 1997). Já o grupo 1, além de revelar
elevado índice de respostas Dd, não apresenta os índices de R, F+ e D
adequados, indicando comprometimento do funcionamento da inteligência pela
percepção de minúcias em detrimento da capacidade de análise e do senso de
observação.
A partir dos resultados encontrados nesta pesquisa e com base em aspectos da
literatura, alguns dados que se destacaram podem auxiliar no entendimento de
pacientes esquizofrênicos em tratamento com haloperidol e dos que são tratados
com clozapina.
De modo geral, ao se analisar por meio da técnica de Rorschach o funcionamento
da personalidade de pacientes com diagnóstico de esquizofrenia, observa-se
baixa capacidade de produção e desempenho devido ao controle paranóide e ao
inadequado controle geral sobre seus impulsos e instintos. São indivíduos
propensos a perder o controle emocional e, conseqüentemente, suscetíveis a
escapes agressivos. O raciocínio lógico deles é impreciso, incoerente e
desorganizado e, sendo assim, apresentam prejuízo da capacidade de
discernimento e do senso de objetividade, bem com não demonstram capacidade
para tolerar frustrações.
Conclusão
Os integrantes do grupo 1 (haloperidol) apresentaram no Rorschach baixa
capacidade de produção, desempenho e adaptação à tarefa, típicos do uso de
defesas paranóides, pois, para evitar se expor, temendo a ameaça, o sujeito
tenta se proteger através do controle intelectual sobre o meio externo e,
portanto, emite um baixo número de respostas. O pensamento lógico é impreciso,
incoerente e desorganizado. Essas pessoas, quando abaladas emocionalmente, têm
dificuldade em lidar com a situação e perdem a qualidade do raciocínio. Elas
denotam maior comprometimento da capacidade de discernimento e do senso de
objetividade, não demonstram capacidade para tolerar frustrações, justificando
a avolição. Embora apresentem controle geral relativamente adequado sobre seus
impulsos e instintos, são altamente defensivas, sem capacidade de iniciativa, e
evidenciam demasiada preocupação com minúcias.
Os resultados da avaliação por meio da técnica de Rorschach aplicada no grupo 2
(clozapina), cujos pacientes foram tratados com medicação de segunda geração há
pelo menos um ano e meio, demonstram que esses possuem adequada capacidade de
produção, desempenho e adaptação à tarefa. Também revela que o raciocínio
lógico está funcionando razoavelmente bem, que apresentam controle geral sobre
seus impulsos e instintos, bem como certa capacidade para tolerar frustrações e
potencial para desenvolver capacidade de iniciativa. A elevada preocupação com
minúcias caracteriza o uso de defesas obsessivas.
Diante desses resultados pode-se inferir que o medicamento antipsicótico de
primeira geração haloperidol está produzindo, parcialmente, o efeito esperado
nos pacientes participantes do estudo no tocante à melhoria do controle geral
sobre seus impulsos e instintos. Em contrapartida, os resultados apontam para
melhor funcionamento geral da cognição dos pacientes tratados com clozapina, o
que permite deduzir que esse medicamento antipsicótico de segunda geração é
capaz de produzir mudanças no paciente em relação ao funcionamento geral da
personalidade no que se refere a sua reintegração social.