Depressão resistente a tratamento: uma revisão das estratégias farmacológicas
de potencialização de antidepressivos
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Introdução
A depressão é uma doença freqüente, incapacitante, crônica e onerosa (Greenberg
et al., 2004). Cerca de 50% dos pacientes que iniciam tratamento para depressão
não respondem à primeira medicação antidepressiva (Thase, 2004); 29% a 46%
deles não se beneficiam de sucessivos ensaios terapêuticos (Fava e Davidson,
1996; Fava, 2001). Resposta inadequada ou ausência de resposta a um ou mais
antidepressivos define a depressão resistente a tratamento (DRT). Mesmo com os
esforços para a realização de ensaios clínicos, esses ainda não são suficientes
ou significativos para o estabelecimento da superioridade entre estratégias
para a terapêutica da DRT ou para a proposição de um consenso ou algoritmo de
tratamento.
As estratégias terapêuticas mais freqüentemente utilizadas na DRT são
substituição de antidepressivo, combinação e potencialização de
antidepressivos. A potencialização é definida como a adição de um segundo
agente farmacológico, não-antidepressivo, ao antidepressivo em uso, com o
objetivo de atingir a remissão da sintomatologia depressiva (Thase et al.,
1998). É indicada em casos de resposta parcial há pelo menos quatro semanas de
uso do antidepressivo em dose terapêutica, seguidas de mais duas semanas na
dose máxima tolerada (Thase et al., 1998).
A principal vantagem da potencialização é não requerer a suspensão do
antidepressivo em uso, ou seja, não se perderem os benefícios já adquiridos
(Thase et al., 1998; Bailey, 2003; Thase, 2004). Outras vantagens seriam a
possibilidade de resposta mais rápida e a redução da dose de uma ou de ambas as
drogas, minimizando seus efeitos colaterais (Sussman e Joffe, 1998; Thase et
al., 1998). Entretanto, existem desvantagens na potencialização, como a
possibilidade de interação medicamentosa prejudicial, efeitos adversos
adicionais e pior adesão ao tratamento (Thase et al., 1998).
Neste trabalho, far-se-á uma revisão dos estudos envolvendo sete fármacos
utilizados na potencialização de antidepressivos: lítio, hormônio tireoidiano,
buspirona, pindolol, carbamazepina, lamotrigina e olanzapina na DRT.
Métodos
Fez-se uma revisão da literatura a partir de 1990 até janeiro de 2006, nas
fontes eletrônicas de busca Medline, LILACS e da Biblioteca Cochrane. As
estratégias de busca dos artigos no Medline e no LILACS basearam-se nos termos
de busca treatment, resistant, refractorye depressione nos descritores
depression, drug resistancee augmentation. Na Biblioteca Cochrane, buscaram-se
artigos de revisão sistemática e ensaios clínicos, sendo excluídos os ensaios
dos fármacos ainda não avaliados em estudos duplo-cegos. Foram selecionadas
publicações nas línguas portuguesa e inglesa de artigos de revisão, ensaios
clínicos e abstractsde encontros científicos e, para complementar a pesquisa
bibliográfica, as referências dos artigos selecionados foram pesquisadas para
buscar possíveis artigos não encontrados pela busca eletrônica ou artigos de
valor histórico com data anterior a 1990.
Potencialização de antidepressivos
Lítio
Entre as estratégias de potencialização de antidepressivos, a do emprego de
lítio foi a mais estudada. O mecanismo de ação desse fármaco ainda não foi
adequadamente esclarecido, mas se demonstraram ações em várias etapas da
neurotransmissão. Por exemplo, ações em sistemas de segundo mensageiro, na
expressão gênica e na regulação da proteinoquinase C (PCK). Foram demonstrados,
ainda, efeitos neuroprotetores como regeneração de axônios e neurogênese
hipocampal e proteção contra estímulos pró-apoptóticos (Bauer et al., 2003).
No caso da potencialização, mesmo que haja indefinição no que diz respeito ao
modo de sua ocorrência, por efeitos de sinergismo ou por mecanismos
antidepressivos (Heninger et al., 1983; Bauer et al., 2003), formulou-se a
hipótese de que o lítio potencializaria a função serotonérgica pré-sináptica,
facilitando a transmissão serotonérgica por aumento de turnovere liberação da
serotonina em oposição à subsensibilização pós-sináptica induzida pelos
antidepressivos nos receptores de serotonina (De Montigny et al., 1983; Bauer
et al., 2003).
Nesta revisão foram encontrados 17 estudos duplo-cegos, randomizados, que
incluíram, ao todo, 591 pessoas. Entre os estudos, 14 utilizaram tricíclicos,
seis utilizaram inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), dois
utilizaram inibidores da monoamina oxidase (IMAO) e dois utilizaram outras
classes de antidepressivos. Dos 14 trabalhos envolvendo tricíclicos, nove
utilizaram apenas esses fármacos (De Montigny et al., 1983; Cournoyer et al.,
1984; Kantor et al., 1986; Dinan e Barry 1989; Browne et al., 1990; Stein e
Bernardt 1993; Joffe et al., 1993; Hoencamp et al., 1994; Nierenberg et al.,
2003) e cinco envolveram dois ou mais antidepressivos (Heninger et al., 1983;
Zusky et al., 1988; Schopf et al., 1989; Katona et al., 1995; Rybakowski et
al., 1999). Os IMAO foram utilizados em apenas dois ensaios, provavelmente
devido ao fato de em geral serem empregados em etapas mais tardias da
resistência ao tratamento e, também, devido aos riscos inerentes aos mesmos
(Tabela_1). Nesses estudos não houve comparação direta da potencialização com
lítio entre diferentes classes de antidepressivos.
O lítio mostrou-se significativamente superior ao placebo em 41% (seteem 17)
dos estudos considerados globalmente.Nos estudos apenascom tricíclicos, ele
foisuperiorem 43% (três em sete); naqueles envolvendo tricíclicos e outras
classes foi superior em 43% (três em sete) e nos estudos apenas com ISRS, em
14% (um em sete).
Vários fatores devem ser considerados na análise da potencialização pelo lítio,
como gravidade da depressão, cronicidade, número de episódios prévios, presença
de co-morbidade, história de bipolaridade, tempo de depressão, grau de
resistência, doses dos antidepressivos e níveis plasmáticos do lítio. Esses
fatores foram analisados em poucos estudos e, freqüentemente, de forma isolada.
A relação entre a gravidade da depressão e a resposta à potencialização com o
lítio foi analisada em seis estudos, mas os resultados foram controversos.
Quatro associaram menor intensidade da depressão à boa resposta ao lítio (Zusky
et al., 1988; Joffe et al., 1993a; Joffe et al., 1993b; Perlis et al., 2003) e
dois associaram depressão mais grave à melhor resposta (De Montigny et al.,
1983; Bschor et al., 2001).
A melhor resposta ao emprego do lítio também foi associada a episódios agudos
(Zusky et al., 1988; Rybakowski et al., 1999; Bschor et al., 2001), pacientes
com menor número de episódios prévios (Rybakowski et al., 1999), ausência de
transtorno de personalidade (Bschor et al., 2001), existência de histórico
pessoal (Heninger et al., 1983) ou familiar (Zusky et al., 1988) de
bipolaridade, histórico de início precoce da depressão e estado civil casado
(Perlis et al., 2003). Com relação ao grau de refratariedade, foi sugerido que
o emprego do lítio como potencializador de antidepressivos em pacientes com
depressão resistente a múltiplos tratamentos teria eficácia limitada
(Nierenberg et al., 2003). No entanto, nos sete estudos revistos que
demonstraram melhora significativa com o uso do lítio esse fator não foi
estudado (Tabela_1). Verificou-se que todos os ensaios utilizaram como critério
de inclusão a resistência a pelo menos um antidepressivo, mas nenhum deles
abordou o nível de resistência na análise dos dados.
As doses dos antidepressivos variaram dentro de variações estabelecidas como
terapêuticas, e não houve relação entre dose do antidepressivo e
potencialização pelo lítio. No caso dos tricíclicos, seus níveis plasmáticos
não interferiram na intensidade da resposta à potencialização pelo lítio
(Browne et al., 1990; Stein e Bernardt, 1993; Fava et al., 2002). Também
observou-se que o lítio não alterou os níveis plasmáticos dos antidepressivos
(De Montigny et al., 1983; Browne et al. 1990; Joffe et al., 1993; Baumann et
al., 1996) (Tabela_1). No que diz respeito aos níveis plasmáticos do lítio, os
estudos de De Montigny et al. (1983), Heninger et al. (1983), Cournoyer et al.
(1984), Shopf (1989), Rybakowisky et al. (1999), Bauer et al. (2003) e Fava et
al. (2002) não verificaram relação entre resposta e níveis séricos
terapêuticos, diferentemente do que foi evidenciado nos ensaios clínicos de
Stein e Bernardt (1993) e Fava et al. (1994) e sugerido por Zusky et al.
(1988). Apesar da controvérsia, recomenda-se a utilização do lítio em níveis
terapêuticos (Rouillon e Gorwood, 1998).
Quanto ao tempo de latência, embora haja relato de melhora significativa em
apenas 48h após adição de lítio (De Montigny et al., 1983), observou-se que a
maioria dos pacientes apresentou melhora após a primeira (Heninger et al.,
1983; Stein e Bernardt, 1993; Joffe et al., 1993; Baumann et al., 1996), a
segunda (Nierenberg et al., 2003) ou a sexta semana de potencialização (Katona
et al., 1995). Portanto, tendo em vista essas variações no tempo de resposta,
sugeriu-se o emprego do lítio por, no mínimo, três (Rouillon e Gorwood, 1998) a
seis semanas (Katona et al., 1995). A duração do tratamento de manutenção com o
lítio ainda não foi devidamente estudada. Boa resposta inicial a esse fármaco
foi associada a melhor resultado terapêutico em longo prazo (Nierenberg et al.,
1990). Recomendase o tratamento de manutenção pelo período mínimo de seis a 12
meses (Bschor et al., 2001; Bauer et al., 2003).
Tremor, náusea, poliúria e ganho de peso são eventos adversos no emprego do
lítio e podem ocorrer durante o tratamento (Zusky et al., 1988; Rouillon e
Gorwood, 1998). De uma maneira geral, não houve piora dos eventos adversos
apresentados pelos pacientes quando ele foi acrescido ao tratamento
antidepressivo (Baumann et al., 1996). Essa associação foi bem tolerada, mas
recomendou-se o controle da função tireoidiana, devido ao risco de
hipotireoidismo, e o controle dos níveis plasmáticos do lítio pelo risco de
intoxicação (Sussman e Joffe, 1998).
Algumas limitações podem ser apontadas nos estudos de potencialização com o
lítio. A maioria dos ensaios utilizou amostras pequenas (De Montigny et al.,
1983; Heninger et al., 1983; Cournoyer et al., 1984; Kantor et al., 1986; Zusky
et al., 1988; Schopf et al., 1989; Kramlinger e Post, 1989; Dinan e Barry,
1989; Browne et al., 1990, Stein e Bernardt, 1993; Baumann et al., 1996;
Nierenberg et al., 2003), alguns incluíram pacientes que não fizeram uso do
antidepressivo pelo período de tempo mínimo preconizado (Heninger et al., 1983;
Montigny et al., 1981; De Montigny et al., 1983; Kantor et al., 1986), outros
não foram controlados com placebo (Hoencamp et al., 1994; Fava et al., 1994 e
2002) e vários incluíram e analisaram em conjunto pacientes com história de
episódio(s) de mania ou hipomania (Heninger et al., 1983; Dinan e Barry, 1989;
Schopf et al., 1989; Hoencamp et al., 1994; Katona et al., 1995; Baumann et
al., 1996; Stein e Bernardt, 1993).
Como a maioria dos estudos incluiu pequeno número de pacientes, foi realizada
uma metanálise sobre o uso do lítio na potencialização de antidepressivos
(Bauer e Dopfmer, 1999). Esse estudo incluiu dez ensaios duplo-cegos,
envolvendo a potencialização de tricíclicos, IMAOs e ISRSs. Encontrou-se uma
média de resposta ao lítio de 52%, com odds ratiode 3,31 em relação ao placebo.
Concluiu-se que o lítio é eficaz na potencialização de antidepressivos.
Também foram realizadas duas revisões sistemáticas sobre a potencialização de
antidepressivos com o lítio (Stimpson et al., 2002; Bauer et al., 2003).
Stimpson et al. (2002) adotaram um crivo de seleção de artigos rigoroso e
incluíram apenas dois ensaios envolvendo tricíclicos e IMAOs (Zusky et al.,
1988; Joffe et al., 1993). Relataram que, embora encontrado um benefício
estatisticamente significativo para o grupo do lítio, o intervalo de confiança
(IC) foi muito amplo: de 2% a 49%. Consideraram que as evidências do uso do
lítio na potencialização de antidepressivos foram fracas. Bauer et al. (2003),
incluindo número maior de artigos em sua revisão, mesmo após apontarem as
limitações metodológicas dos estudos, consideraram suficientes as evidências da
eficácia do lítio e recomendaram seu uso como estratégia de primeira linha na
potencialização de tricíclicos, de IMAOs e de ISRSs.
Em síntese, as evidências sugerem que o lítio é eficaz na potencialização de
antidepressivos. Embora alguns estudos tenham avaliado os preditores de
resposta terapêutica, os dados sobre a gravidade da depressão foram
controversos e os sobre cronicidade, número de episódios prévios, presença de
co-morbidades, história de bipolaridade, tempo de depressão e grau de
resistência foram escassos. Algumas outras questões também permanecem sem
resposta: mecanismo de ação do lítio, o tempo necessário para início da
resposta, níveis plasmáticos eficazes do lítio, duração do tratamento, eficácia
em determinados subtipos de depressão, quando optar por seu uso na DRT e a
eficácia na potencialização de outros antidepressivos.
Hormônio tireoidiano
A utilização do hormônio tireoidiano para a potencialização de antidepressivos
no tratamento da DRT foi a segunda estratégia mais estudada. Os mecanismos de
ação sugeridos foram a melhora na neurotransmissão noradrenérgica e os efeitos
no eixo tireoidiano. Uma das ações no eixo tireoidiano seria a de correção da
hipofunção tireoidiana em pacientes com hipotireoidismo subclínico. Outra seria
a de que o emprego de L-triodotironina (T3) levaria a uma redução de tiroxina
(T4). Baixos níveis de T4plasmático acarretam baixos níveis de T3cerebral, o
que estaria relacionado a efeitos antidepressivos (Joffe e Singer, 1990; Joffe,
1998).
Foram avaliados seis estudos duplo-cegos que incluíram 243 pacientes (Tabela
2).
O uso do hormônio tireoidiano foi eficaz na potencialização de tricíclicos em
50% dos estudos revistos, sendo que em um deles (Joffe et al., 1993) a T3foi
equivalente ao lítio e superior ao placebo (p= 0,02). A T3foi mais
freqüentemente utilizada que a T4nos estudos de potencialização. Um ensaio
verificou superioridade da T3sobre a T4(Joffe e Singer, 1990). Levantaram-se
hipóteses para explicar esse resultado. A primeira relacionou-se com a menor
meia-vida da T3(12h) em relação à T4 (uma semana). Como o ensaio durou apenas
duas semanas, a T4 levaria um tempo maior até atingir o estado de equilíbrio
necessário para se obterem efeitos potencializadores de antidepressivos. A
segunda hipótese foi a de que os tricíclicos interfeririam na conversão de T4em
T3. Essa hipótese não foi comprovada em ensaios. A terceira foi a de que T3e
T4teriam diferentes mecanismos de ação, porém desconhecidos. Existe, ainda, a
hipótese de que T3e T4atuariam de maneira antagônica sobre os níveis de
hormônio tireoidiano no cérebro, levando a diferentes efeitos no humor ' a T3
exógena levaria a uma redução da T4plasmática, que está diretamente relacionada
à determinação dos níveis de T3no cérebro. Níveis menores de T3no cérebro
estiveram relacionados a efeitos antidepressivos. Assim a T3administrada por
via exógena estaria relacionada a efeitos antidepressivos e a T4, não (Joffe e
Singer, 1990).
Com exceção da gravidade da depressão, outros fatores preditores de resposta ao
emprego de T3na potencialização de antidepressivos não foram estudados. Ainda
assim, a relação entre gravidade da depressão e potencialização com T3até o
momento não foi esclarecida. Tal aspecto foi abordado em apenas um estudo sobre
preditores de resposta ao hormônio tireoidiano, que não encontrou diferenças
entre respondedores e não-respondedores (Joffe et al., 1993). Em relação à
possibilidade de interação medicamentosa, os níveis séricos dos antidepressivos
tricíclicos não foram alterados pelo uso do hormônio tireoidiano (Goodwin et
al., 1982; Joffe et al., 1993). A dose do hormônio utilizada foi entre 25 e
50µg/dia e não houve evidência de superioridade entre elas (Goodwin et al.,
1982). No entanto, foi preconizada a dose de 25µg/dia, que seria mais segura
quanto aos riscos de alterações na função tireoidiana (Joffe, 1998).
A resposta à potencialização de antidepressivos com o hormônio tireoidiano
ocorreu até a terceira semana (Sussman e Joffe, 1998). Seu tempo de uso ainda
não foi devidamente estudado (Aronson et al., 1996). Entretanto recomenda-se
manter o hormônio tireoidiano enquanto o paciente estiver em uso de
antidepressivos (Joffe, 1998).
No que diz respeito à segurança, o hormônio tireoidiano foi bem tolerado. Os
efeitos colaterais mais comuns foram nervosismo e insônia (Fava, 2000). Dado o
risco de hipertireoidismo, recomendou-se a monitoração da função tireoidiana
antes e após o uso do hormônio (Joffe, 1998).
Como os estudos com antidepressivos tricíclicos incluíram número pequeno de
pacientes nos grupos de uso hormônio tireoidiano (Goodwin et al., 1982; Joffe e
Singer, 1990; Joffe et al., 1993), foi realizada uma metanálise (Aronson et
al., 1996), que demonstrou a superioridade da T3em relação ao placebo (p=
0,02). Apenas um estudo avaliou a potencialização de ISRS, no caso a
paroxetina, apresentando resultado negativo (Fliers, 2003). Assim, ficou
evidenciada a eficácia do hormônio tireoidiano apenas na potencialização de
tricíclicos.As maiores limitações observadas nos estudos duplo-cegos sobre a
eficácia do uso do hormônio tireoidiano como potencializador de antidepressivos
foram o número reduzido de ensaios, a utilização de amostras pequenas (Steiner
et al., 1978; Goodwin et al., 1982; Gitlin et al., 1987; Joffe et al., 1993), a
inclusão de pacientes bipolares (Steiner et al., 1978; Goodwin et al., 1982) e
a curta duração do ensaio (Joffe et al., 1993).
Concluindo, o hormônio tireoidiano foi considerado eficaz na potencialização de
antidepressivos tricíclicos. Apesar de bem tolerado, seguro e eficaz, seu tempo
de uso, seus preditores de resposta terapêutica e a sua associação a
antidepressivos de nova geração ainda não foram adequadamente estudados.
Buspirona
A buspirona é uma droga agonista parcial de receptores serotonérgicos, com
fracas propriedades ansiolíticas. Em relatos de casos (Bakish, 1991) e em
estudos abertos não-controlados (Jacobsen, 1991; Joffe e Schuller, 1993; Fisher
et al., 1998; Dimitriou e Dimitriou, 1998) observou-se que a buspirona aumentou
os efeitos antidepressivos dos ISRSs. Além desses relatos de casos e estudos
abertos, foram realizados dois estudos duplo-cegos, randomizados e controlados
com placebo, e um comparativo, não-controlado com placebo, avaliando a
buspirona e a bupropiona como potencializadores de ISRS. O primeiro estudo
duplo-cego, randomizado e controlado com placebo (Landén et al., 1998) durou
quatro semanas e envolveu 117 pacientes de doze centros da Suécia e um da
Noruega, incluindo 102 pacientes unipolares e bipolares, resistentes a quatro
semanas de 30mg de paroxetina ou 40mg de citalopram. Cinqüenta e um por cento
dos pacientes que utilizaram buspirona e 47% dos pacientes do grupo placebo
melhoraram com o tratamento. Não houve diferença significativa entre esses
grupos. Entretanto, em follow-upaberto de duas semanas, 69,5% dos pacientes
responderam à associação ISRS + buspirona. O segundo estudo duplo-cego,
randomizado e controlado com placebo, realizado em três centros na Finlândia
(Appelberg et al., 2001), avaliou durante seis semanas 102 pacientes deprimidos
unipolares que eram resistentes a seis semanas de fluoxetina 30mg ou citalopram
40mg. Na primeira semana o grupo em uso da buspirona obteve melhora
significativa em relação ao placebo, diferença que não foi mantida ao longo das
seis semanas do estudo. Assim, embora não tenha sido encontrada diferença
significativa com relação ao placebo, foi observada aceleração na resposta ao
tratamento em pacientes resistentes à fluoxetina e ao citalopram. O estudo
duplo-cego, randomizado e não-controlado com placebo sobre o uso da buspirona e
da bupropiona como potencializador de ISRSs avaliou 286 pacientes resistentes a
11,9 semanas de citalopram numa dose média de 55mg e não encontrou redução
significativa dos sintomas depressivos na avaliação pela Escala de Depressão de
Hamilton (HDRS) (1960).
Arelação entre gravidade da depressão e eficácia do emprego da buspirona na
potencialização de antidepressivos foi avaliada em apenas um estudo. Nesse
trabalho os autores observaram que os pacientes com pontuação inicial mais
elevada na escala de depressão de Montgomery eAsberg (MADRS) (1979) tenderam a
uma maior redução da pontuação final nessa mesma escala. Isso indicou que a
buspirona poderia ser mais útil como opção de tratamento de pacientes graves,
resistentes a ISRSs (Appelberg et al., 2001). Não foram estudados outros
preditores de resposta terapêutica, como cronicidade da depressão, número de
episódios prévios, presença de co-morbidades psiquiátricas, história de
bipolaridade, tempo de depressão, grau de resistência, tempo de latência para a
resposta e tempo de tratamento da buspirona na potencialização de
antidepressivos.
Landén et al. (1998) observaram aumento nos níveis plasmáticos de citalopram e
paroxetina tanto nos pacientes em uso da buspirona quanto naqueles em uso do
placebo. O aumento foi atribuído à possibilidade de maior adesão ao tratamento
antidepressivo pelos pacientes incluídos no estudo ou, no caso da associação
buspirona/antidepressivo, à interação farmacocinética.
Nos estudos duplo-cegos, as doses de buspirona variaram de 20 a 60mg. Os
efeitos colaterais mais comuns foram sedação, cefaléia e sudorese, e nenhum foi
considerado grave. Foram relatados dois casos de síndrome serotonérgica. Num
deles o paciente estava utilizando buspirona e citalopram (Spigset e Adielsson,
1997) e no outro, buspirona e fluvoxamina (Baetz e Malcolm, 1995). O mesmo
paciente em uso da associação buspirona/citalopram desenvolveu hiponatremia
(Spigset e Adielsson, 1997). Houve relato de um paciente que entrou em mania,
achado que corroborou a hipótese de ação antidepressiva da buspirona (Sussman e
Jaffe, 1998). Apesar dos eventos adversos, a associação de buspirona a
antidepressivos ISRS foi bem tolerada (Jacobsen, 1991; Fisher et al., 1998;
Landén et al., 1998; Appelberg et al., 2001). No entanto, recomenda-se cautela
na associação de buspirona a antidepressivos que inibem a enzima 3A3/4 do
sistema citocromo P450, como a nefazodona e a fluvoxamina (Rocha e Hara, 1998).
Os três estudos duplo-cegos controlados existentes não constataram sua eficácia
na potencialização de antidepressivos. Pode-se concluir que a buspirona foi
pouco estudada e que os estudos existentes não sugerem que ela possa ter papel
mais relevante em DRT.
Pindolol
O pindolol é um agente betabloqueador, agonista parcial e antagonista de
receptores 5-HT1Asomatodendríticos. Esses receptores servem como inibidores de
auto-receptores e reduzem a síntese e a liberação de serotonina no terminal
nervoso. A administração aguda de ISRSs aumenta a concentração de serotonina na
fenda sináptica e, ao mesmo tempo, ativa auto-receptores 5-HT1A inibitórios
( feedbacknegativo). O pindolol tem sido utilizado com o objetivo de
potencializar antidepressivos com ação primária em receptores serotonérgicos. O
mecanismo de ação proposto seria o de bloquear o feedbacknegativo e permitir
maior liberação de serotonina.
Em ensaios abertos, observou-se que o pindolol induziu melhora dramática em
pacientes resistentes a ISRSs e IMAOs (Artigas et al., 1994; Blier e Bergeron,
1998). Em estudos controlados, entretanto, a eficácia do pindolol não foi
comprovada. Os resultados foram controversos (Tabela_3).
Os estudos duplo-cegos totalizaram 205 pacientes. Um dos ensaios avaliou o
emprego do pindolol na potencialização da trazodona (Maes et al., 1996); três
na potencialização de ISRS (Maes et al., 1999; Sokolski et al., 2004; Perry et
al., 2004) e dois na potencialização de ISRS e tricíclicos (Moreno et al.,
1997; Perez et al., 1999; Perry et al., 2004). Em três estudos (Maes et al.,
1996; Maes et al., 1999; Sokolski et al., 2004) foi encontrada diferença
significativa entre associação de pindolol a antidepressivos versusplacebo, e
em três (Moreno et al., 1997; Perez et al., 1999; Perry et al., 2004) não foi
evidenciada tal diferença. Como não existem estudos comparando diretamente a
eficácia do pindolol em potencializar diferentes classes de antidepressivos,
não é possível afirmar se há diferença na potencialização das diversas classes
(Tabela_3).
Os preditores de resposta não foram avaliados em estudos específicos. Apenas um
ensaio sobre a eficácia do pindolol na potencialização de antidepressivos
abordou tempo de depressão, número de episódios prévios, duração do episódio
depressivo atual e fatores sociodemográficos. Porém, o estudo não encontrou
influência dos mesmos na resposta à potencialização de antidepressivos com o
pindolol (Maes et al., 1996). Não foram estudados cronicidade, presença de co-
morbidade e grau de refratariedade.
Adose de pindolol utilizada nos estudos foi 2,5mg, três vezes ao dia. Em alguns
dos ensaios duplo-cegos observou-se celeração na resposta aos ISRSs na primeira
e na segunda semana (Moreno et al., 1997; Perez et al., 1999; Maes et al.,
1999). A duração do tratamento não foi estudada.
Os eventos adversos mais comumente observados foram náusea, tonteira, sedação,
hipotensão e bradicardia. Esses efeitos não foram graves e a potencialização de
antidepressivos com o pindolol foi bem tolerada. Entretanto recomenda-se
cautela na prescrição desse fármaco em pacientes asmáticos, alérgicos graves e
portadores de problemas na condução cardíaca. O seu uso em diabéticos é uma
contra-indicação relativa, devido à possibilidade de mascaramento de sintomas
de hipoglicemia (Blier e Bergeron, 1998).
As principais falhas encontradas nos estudos duplo-cegos sobre o uso do
pindolol na potencialização de antidepressivos foram o uso de amostras pequenas
(Maes et al., 1996; Moreno et al., 1997; Maes et al., 1999; Sokolski et al.,
2004) e a não-explicitação sobre inclusão ou não de pacientes com história de
bipolaridade (Maes et al., 1996; Maes et al., 1999; Sokolski et al., 2004).
Foi realizada metanálise sobre o emprego do pindolol na potencialização de
antidepressivos (Stimpson et al., 2002), incluindo três estudos duplo-cegos
(Maes et al., 1996; Moreno et al., 1997; Perez et al., 1999). Nesse trabalho o
pindolol não se mostrou eficaz.
Pode-se concluir que os estudos duplo-cegos sobre a potencialização com o
pindolol são escassos e os resultados são controversos, impedindo conclusões
definitivas sobre sua eficácia.
Carbamazepina
O mecanismo de ação da carbamazepina foi relacionado com redução do influxo de
sódio, facilitação do efluxo do potássio, NS: não-significativo; UP: depressão
unipolar; NE: não-especificado. inibição dos canais de cálcio e subseqüente
redução da liberação de aminoácidos excitatórios. Após sua administração
crônica, ela demonstrou efeitos noradrenérgicos, dopaminérgicos e moduladores
do sistema GABAérgico, que aumentaram os níveis de GABA no cérebro e no liquor.
No entanto, não se sabe como a carbamazepina atuaria nos transtornos do humor
(Post et al., 1998).
Em DRT existe um estudo duplo-cego, comparativo, nãocontrolado com placebo
sobre o uso da carbamazepina e do lítio na potencialização de antidepressivos
(Rybakowski et al., 1999). Nesse ensaio foram avaliados durante quatro semanas
59 pacientes deprimidos uni e bipolares (28 pacientes utilizaram a
carbamazepina e 31 lítio). Houve resposta terapêutica em 50% dos pacientes em
uso da carbamazepina, e sua eficácia foi equiparada à do lítio.
Quanto à gravidade da doença, observou-se que os respondedores à carbamazepina
apresentaram um grau de depressão mais brando em comparação aos não-
respondedores. Não foram estudados outros preditores de resposta terapêutica
como cronicidade, número de episódios depressivos prévios, duração do episódio
atual, presença de co-morbidade e grau de refratariedade. A dose de
carbamazepina utilizada variou de 400 a 800mg. Houve boa tolerabilidade, mas
deve-se estar atento aos riscos de interações medicamentosas (Dietrich e
Emrich, 1998).
Concluindo, a carbamazepina foi muito pouco estudada em DRT, de modo que sua
eficácia e sua segurança na potencialização de antidepressivos ainda não foram
esclarecidas.
Lamotrigina
O mecanismo de ação da lamotrigina ainda não foi total-mente elucidado. Propôs-
se que ela estabiliza membranas neuronais e, conseqüentemente, modula a
liberação pré-sináptica de aminoácidos excitatórios, particularmente glutamato.
Estudos com lamotrigina demonstraram sua eficácia nos transtornos bipolares, e
foram observados particularmente efeitos antidepressivos (Calabrese et al.,
1998; Calabrese et al., 1999; Fava, 2000, Bowden et al., 2003). Na
potencialização de antidepressivos esse anticonvulsivante foi estudado em um
relato de caso (Maltese, 1999), dois ensaios retrospectivos (Barbee e Jamhour,
2002; Rocha e Hara, 2003) e um estudo duplo-cego de potencialização de
antidepressivos em pacientes com DRT unipolar (Barbosa et al., 2003). Nesse
estudo o emprego da lamotrigina na potencialização de antidepressivos foi
eficaz em 52% dos pacientes. Não foi evidenciada eficácia da lamotrigina na
potencialização da fluoxetina quando se utilizou a avaliação pelo critério
principal (escalas HDRS e MADRS). Entretanto a lamotrigina foi estatisticamente
superior ao placebo em critérios secundários de eficácia (Impressão Clinica
Global [CGI]). Segundo os autores, a existência de bipolaridade não influenciou
os resultados do tratamento, e a cronicidade da depressão não foi avaliada
(Barbosa et al., 2003).
Embora tenha sido demonstrada superioridade terapêutica da dose de 200mg da
lamotrigina (Calabrese et al., 1999), a dose empregada nesse ensaio foi 100mg.
Houve relato de dois casos de leucopenia (Normann et al., 2003) e um de
hipomania (Barbosa et al., 2003). Recomenda-se atenção quanto aos riscos de
síndrome de Stevens-Johnson (pode ocorrer em 0,1% a 0,3% dos casos) e interação
medicamentosa. O valproato reduz em 50% o clearanceda lamotrigina, aumentando
sua meia-vida de eliminação. Há relato de dois casos de interação da
lamotrigina com sertralina em que ocorreu elevação dos níveis séricos da
lamotrigina e neurotoxicidade (Jefferson, 2005). Recomenda-se, ainda, que ao
iniciar o uso da lamotrigina seja feito o aumento gradual da dose, para reduzir
a probabilidade de rashcutâneo (Jefferson, 2005). Apesar dos eventos
mencionados, a lamotrigina foi bem tolerada pela maioria dos pacientes (Barbosa
et al., 2003). Algumas limitações poderiam explicar o resultado negativo desse
estudo: amostra pequena (23 pacientes), heterogênea (unipolares e bipolares II)
e dose máxima de lamotrigina de 100mg.
Assim, conclui-se que a utilidade da lamotrigina na potencialização de
antidepressivos em pacientes com DRT ainda não foi adequadamente estudada. Há
evidência menor de eficácia quando considerado critério secundário de
avaliação.
Olanzapina e outros antipsicóticos atípicos
O tratamento da DRT com associação de antipsicóticos típicos já foi estudado.
Houve achados promissores, mas de uso limitado devido ao risco de discinesia
tardia (Nelson, 2003). Com a introdução dos antipsicóticos atípicos, retornou o
interesse em avaliar o uso dos antipsicóticos no tratamento de pacientes com
DRT. A primeira publicação, de Ostroff e Nelson (1999), que sugeriu uma
possível utilidade da risperidona como agente potencializador de
antidepressivos, baseou-se na idéia de que a adição de um antagonista de
receptores 5-HT2A poderia aumentar o efeito de ISRS. Sendo o receptor 5-HT2A
excitatório, que age em oposição aos receptores 5-HT1A pós-sinápticos, o seu
antagonismo poderia facilitar a ação da serotonina nos receptores 5-HT1A.
Existem relatos de casos sobre o emprego da risperidona (Tani et al., 2004;
Stoll e Haura, 2000; Ostroff e Nelson, 1999) como potencializador; quatro
estudos abertos avaliaram a ziprasidona (Papakostas et al., 2004; Papakostas et
al., 2005 [abstract]; Simon e Nemeroff, 2005 [abstract]); um estudo aberto
avaliou a olanzapina (Corya et al., 2003). Realizaram-se cinco estudos duplo-
cegos, com um total de 1.530 pacientes, em relação à olanzapina como agente de
potencialização de antidepressivos (Tabela_4).
Em dois estudos o emprego da olanzapina associada à fluoxetina foi superior ao
emprego da fluoxetina ou da olanzapina em monoterapia (Shelton et al., 2001;
Corya et al., 2006). Outros não observaram essa diferença (Dubé et al., 2002a;
Dubé et al., 2002b; Shelton et al., 2005). Observou-se, porém, que os pacientes
em uso da combinação fluoxetina/olanzapina obtiveram maior rapidez de resposta
nas primeiras semanas de tratamento (Shelton et al., 2001; Shelton et al.,
2005).
Fatores como gravidade da depressão, cronicidade, tratamento prévio, presença
de transtornos psiquiátricos concomitantes, história de bipolaridade e grau de
resistência não foram analisados nos estudos duplo-cegos.
Adose de olanzapina utilizada variou de 5 a 20mg. Os eventos adversos mais
observados foram aumento do apetite, ganho de peso, sonolência, astenia,
cefaléia, tremores, ataxia, nervosismo, insônia e náusea. Com relação ao
aumento de apetite e ganho de peso, a combinação olanzapina/fluoxetina foi
equiparada à monoterapia com olanzapina e superior às com fluoxetina e
nortriptilina (Shelton, 2001; Shelton et al., 2005). Foi relatado um caso de
síndrome serotonérgica após associação de fluoxetina e olanzapina (Chopra e
Schweitzer, 2003). Em geral, a combinação de olanzapina com ISRSs foi bem
tolerada. Na prescrição de olanzapina são recomendados cuidados para prevenir o
ganho de peso e o desenvolvimento de síndrome metabólica (Nasrallah e Newcomer,
2004).
As maiores limitações encontradas para o uso de antipsicóticos na
potencialização de antidepressivos foram o pequeno número de ensaios, a
existência de ensaios duplo-cegos apenas com a olanzapina e a não-informação
sobre a inclusão ou não de pacientes bipolares (Dubé et al., 2002a, Dubé et
al., 2002b).
Dois estudos foram favoráveis ao uso da olanzapina, entre-tanto três grandes
ensaios não evidenciaram sua superioridade em relação ao placebo. Assim, a
eficácia da olanzapina como potencializador de fluoxetina em DRT não está
estabelecida. Quanto aos outros antipsicóticos atípicos, ensaios duplo-cegos
são necessários para que se chegue a alguma conclusão.
Discussão
Os dois potencializadores de antidepressivos mais estudados ' o lítio e, em
menor escala, o hormônio tireoidiano ' tiveram sua eficácia
estabelecida.Aolanzapina foi razoavelmente estudada, mas não foi comprovada a
sua eficácia na potencialização de antidepressivos em pacientes com DRT
unipolar. A buspirona também foi pouco estudada, e os estudos existentes não
sugerem que possa ter papel relevante em DRT. Os estudos duplo-cegos sobre o
pindolol como potencializador de antidepressivos são escassos e os resultados,
controversos, não permitindo concluir sobre sua eficácia na DRT. A
carbamazepina foi muito pouco estudada em DRT. A lamotrigina ainda não foi
adequadamente avaliada na potencialização de antidepressivos em pacientes com
DRT, e no estudo controlado existente observou-se evidência menor de eficácia
derivada da análise de critério secundário de avaliação de eficácia.
O lítio foi o preditor de resposta terapêutica mais estudado, embora ainda
existam controvérsias quanto a interferência da gravidade da depressão,
cronicidade, número de episódios prévios, presença de co-morbidades, história
de bipolaridade, tempo de depressão e grau de resistência nos efeitos
terapêuticos.Além disso, seu mecanismo de ação, o tempo necessário para início
da resposta, a possibilidade de relação entre resposta e doses dos
antidepressivos, a determinação de seus níveis plasmáticos eficazes, a duração
do tratamento, a eficácia em determinados subtipos de depressão, quando optar
por seu uso na DRT, e a eficácia na potencialização de outros antidepressivos
permanecem sem resposta. A buspirona, o pindolol, a carbamazepina, a
lamotrigina e a olanzapina não foram estudados adequadamente a esse respeito.
As doses recomendadas são as doses terapêuticas usuais para o lítio; 25µg para
o hormônio tireoidiano; 20 a 30mg para a buspirona; 2,5mg três vezes ao dia
para o pindolol; e 200mg para a lamotrigina. A dose de carbamazepina utilizada
no único estudo controlado de potencialização variou de 400 a 800mg; a de
olanzapina, de 5 a 20mg nos diversos ensaios clínicos.
A tolerabilidade e a segurança das estratégias estudadas foram avaliadas. O
emprego de lítio ou do hormônio tireoidiano requer monitoração da função
tireoidiana; no caso da buspirona, devem-se ponderar os riscos de síndrome
serotonérgica e interação com antidepressivos que inibem a enzima 3A3/4 do
sistema citocromo P450. O pindolol exige cautela na prescrição para pacientes
asmáticos, alérgicos graves, portadores de problemas na condução cardíaca e
diabéticos. A carbamazepina requer atenção ao risco de interações
medicamentosas. A lamotrigina exige titulação cautelosa da dose devido ao risco
de síndrome de Stevens-Johnson; exige também atenção ao risco de interação com
o valproato.Aolanzapina está associada a ganho de peso e desenvolvimento de
síndrome metabólica, demanda orientação nutricional e recomendação de atividade
física.
Os estudos sobre DRT apresentaram problemas metodológicos importantes:
utilização de diferentes definições de DRT; não-explicitação do critério de
definição de resistência utilizado em ensaios (Goodwin et al., 1982; Kramlinger
e Post, 1989); utilização de amostras insuficientes (De Montigny et al., 1983;
Heninger et al., 1983; Cournoyer et al., 1984; Kantor et al., 1986; Zusky et
al., 1988; Schopf et al., 1989; Kramlinger e Post, 1989; Dinan e Barry, 1989;
Browne et al., 1990, Stein e Bernardt, 1993; Baumann et al., 1996; Nierenberg
et al., 2003; Maes et al., 1996; Moreno et al., 1997; Maes et al., 1999;
Sokolski et al., 2004; Barbosa et al., 2003); realização de estudos não-
controlados com placebo (Hoencamp, 1994; Fava et al., 1994 e 2002; Maes et al.,
1999; Rybakowski et al., 1999; Corya et al., 2006); não-explicitação de
inclusão (Maes et al., 1996; Maes et al., 1999; Sokolski et al., 2004), ou
inclusão e análise em conjunto, de pacientes com história de episódio(s) de
mania ou de hipomania (Heninger et al., 1983; Dinan e Barry, 1989; Schopf et
al., 1989; Hoencamp et al., 1994; Katona et al., 1995; Baumann et al., 1996;
Stein e Bernardt, 1993; Normann et al., 2002; Barbosa et al., 2003; Dubé et
al., 2002a; Dubé et al., 2002b); não-informação sobre o tempo de uso prévio do
antidepressivo (Steiner et al., 1978; Fliers, 2003; Maes et al., 1996; Maes et
al., 1999; Dubé et al., 2002a, Dubé et al., 2002b); inclusão de pacientes que
não fizeram uso do antidepressivo pelo período de tempo mínimo preconizado
(Heninger et al., 1983; De Montigny et al., 1983; Kantor et al., 1986; Aronson
et al., 1996).Além disso, alguns fármacos, como a buspirona, o pindolol, a
carbamazepina e a lamotrigina, foram pouco estudados e outros, como a
risperidona, a ziprasidona, a clozapina e a quetiapina, não foram estudados em
ensaios duplo-cegos.
Esses aspectos metodológicos contribuíram para a elaboração de algoritmos e
consensos terapêuticos (Moreno e Moreno, 1993; Bauer e Dopfmer, 1999; Bauer et
al., 2003; Stimpson et al., 2002). Ademais, existem lacunas no conhecimento
neurobiológico (Ananth, 1998) acerca dos transtornos psiquiátricos e seu
tratamento, o que constitui fator ainda mais limitante, pois elas independem de
questões metodológicas, já mais bem esclarecidas. A decisão na escolha de uma
estratégia de potencialização ' e não de outra ' deverá atender, então, às
evidências de eficácia, às características do paciente, ao seu estado clínico,
à tolerabilidade e à segurança de cada fármaco (Ananth, 1998; Bailey, 2003).