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BrBRHUAp0080-21072012000400006

BrBRHUAp0080-21072012000400006

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaApplied Social Sciences
ISSN0080-2107
Year2012
Issue0004
Article number00006

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Determinantes da separação entre propriedade e gestão nas cooperativas agropecuárias brasileiras

1. INTRODUÇÃO As organizações caracterizadas como de propriedade difusa e complexas devem promover a separação entre propriedade e gestão. Essa é uma proposição consolidada na literatura de governança corporativa(1), tendo por base problemas decorrentes de alocação de risco, especialização e risco moral (ALCHIAN e DEMSETZ, 1972; FAMA e JENSEN, 1983a; HANSMANN, 1996). De um lado, a separação entre propriedade e gestão evita que o executivo principal arque diretamente com o efeito riqueza da ação, bem como permite a apropriação de benefícios advindos da especialização dos papéis de proprietários (investidores) e gestores. De outro, a separação contribui para reduzir os custos de tomada de decisão coletiva e de agência e mitiga possíveis problemas de shirking na atividade de controle.

As características dos direitos de propriedade e a forma de exercer o direito de controle permitem classificar as cooperativas agropecuárias brasileiras como organizações econômicas cuja estrutura de propriedade é difusa, com direitos vagamente definidos (COOK, 1995; GORTON e SCHMID, 1999; CHADDAD e COOK, 2004).

Ademais, essas organizações são estruturadas de forma hierárquica e atuam em atividades econômicas variadas, frequentemente distintas do negócio de origem do cooperado (COSTA, CHADDAD e AZEVEDO, 2010), o que permite relacioná-las como organizações complexas(2). Assim, essas firmas, com a finalidade de aumentar a probabilidade de sua existência, deveriam promover a separação entre propriedade e gestão.

Todavia, conforme estudo realizado por Costa, Chaddad e Azevedo (2010), 48% das cooperativas agropecuárias brasileiras pesquisadas em 2008 não promoviam a separação entre propriedade e gestão. Isto é, nessas organizações, os proprietários não são desvinculados das decisões de gestão. Essa constatação não segue os preceitos teóricos e difere do que ocorre em cooperativas semelhantes localizadas em Holanda, Suécia, Finlândia e Estados Unidos da América (GINDER e DEITER, 1989; PELLERVO, 2000; HENDRIKSE, 2005).

A inobservância do preceito teórico para as cooperativas agropecuárias brasileiras motiva este artigo, em que se tem por objetivo investigar quais os possíveis determinantes da separação entre propriedade e gestão nessas organizações. Na medida em que gera informações relevantes sobre os fatores que afetam o processo de separação entre propriedade e gestão, o resultado contribui, de forma geral, para ampliar o conhecimento sobre as estruturas de governança das empresas cujo arranjo societário é coletivo.

O trabalho compreende, além desta introdução, outras quatro partes: referencial teórico, determinantes da separação entre propriedade e gestão nas cooperativas agropecuárias brasileiras, resultados e conclusões.

2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1. Estrutura de propriedade e alocação dos direitos de controle nas organizações Os direitos dos proprietários de organizações econômicas são separados em dois tipos distintos e complementares: direito ao resíduo e direito ao controle. O primeiro refere-se à prerrogativa de o proprietário receber os ganhos e as perdas geradas, denominados de ganhos ou lucros residuais. Em contraposição, o segundo concede ao proprietário autoridade, sujeita à regulação externa, para definir como os membros da organização deverão alocar os ativos a serem utilizados no sistema produtivo e os mecanismos de monitoramento, premiação ou punição dos agentes contratados para gerir a empresa (ARROW, 1964; FAMA e JENSEN, 1983b; MILGROM e ROBERTS, 1992).

A relação entre os direitos de propriedade, estabelecida contratualmente entre os proprietários, define a estrutura de propriedade (E) da organização(3).

Então, tomando V como a função que considera essa relação, tem-se: Nas organizações em que o direito de controle ou voto é vinculado ao montante (s) de capital que cada um dos sócios possui no capital total (S) da sociedade, a estrutura de propriedade (E) variará entre difusa e concentrada (BEBCHUCK, 1999). Assim, definindo k como a relação entre s e S, tem-se: [/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm02.jpg] Portanto, nas organizações em que pequena parte ou apenas um dos proprietários concentra a posse do capital, a estrutura de propriedade é concentrada. Ao contrário, se a quantidade de donos é elevada e nenhum deles detém parte relevante do capital, trata-se de uma estrutura de propriedade difusa, cujo controle é contestável(4)(BEBCHUCK, 1999).

Para Gorton e Schmid (1999), nos casos em que o direito de controle ou voto não é vinculado ao montante de capital (s), mas ao proprietário, a estrutura de propriedade (E) é difusa ou concentrada em função do número de sócios (p), conforme descrito em [3].

[/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm03.jpg] Embora não seja comum o proprietário abdicar do direito ao resultado líquido, a delegação de parte dos direitos de controle da firma é observada e indicada para organizações de propriedade difusa (ALCHIAN e DEMSETZ, 1972; HANSMANN, 1996).

O direito de controle possui diferentes definições na literatura: direito de controle residual (GROSSMAN e HART, 1986), direito de controle formal e efetivo (ALCHIAN e DEMSETZ, 1972; HANSMANN, 1988). Uma vez que tanto direito de controle efetivo quanto direito de controle residual são associados a elementos não especificados nos contratos, assume-se que o segundo pertence exclusivamente aos proprietários e o primeiro pode ser exercido por aqueles que não detêm a propriedade da organização.

O direito de controle residual é inerente à posse de um ativo ou autoridade (GROSSMAN e HART, 1986). Em outras palavras, mesmo que o controle tenha sido formalmente cedido à outra parte, o proprietário ainda detém o controle sobre todos os elementos não especificados no contrato. Por exemplo, quem detém esse direito em uma companhia de capital aberto (S.A.) são os acionistas.

O direito de controle formal é aquele previamente definido em contratos ou leis. Assim, esse direito é definido como aquele alocado formalmente pelos proprietários, seus detentores originais, a seus representantes escolhidos por eleição ou nomeados para controlar a empresa. Por exemplo, na S.A. o conselho de administração é o órgão eleito que recebe a incumbência de estabelecer quais regras os membros internos da organização deverão observar para alocar os ativos e a forma como esses serão monitorados, premiados ou punidos, caso as regras estabelecidas não sejam seguidas (ARROW, 1964). Seu detentor recebe formalmente a autoridade para decidir em prol dos interesses dos proprietários.

O direito de controle gera a seu detentor a autoridade para tomar decisões nas organizações e pode ser delegado formal ou informalmente. Esse modo de delegação, formal ou informal, é a base para o que Aghion e Tirole (1997) denominam de autoridade formal ou real. A formal confere a seu detentor o direito formal de decidir, reconhecido pelas normas jurídicas, e a real é referente ao efetivo controle das decisões.

Portanto, nas organizações de propriedade difusa, os proprietários detentores dos direitos de controle residual, para fins de otimização do processo diretivo, delegam o direito de controle formal para um grupo (conselho de administração) decidir sobre o controle e gestão da empresa em seu nome.

Em síntese, a abdicação do direito de controle consiste em concentrar parte dos direitos de propriedade no conselho de administração. Isto é, trata-se de transferir ao conselho os direitos decisórios sobre as regras de alocação dos ativos e dos instrumentos de incentivos, que culmina na autoridade para nomear e destituir o agente responsável pela gestão (MIZRUCHI, 1983; ROE, 2003).

De forma similar a Jensen e Meckling (1976), assume-se que a delegação do direito de controle formal pelos proprietários ao conselho de administração, também denominada de separação entre propriedade e controle por Berle e Means (1932), gera problemas e custos de agência.

2.2. Complexidade e separação do processo decisório As organizações são caracterizadas como complexas se são compostas de suborganizações ' departamentos, unidades ou times ' que se relacionam de forma hierárquica dentro da organização geral e se dispersão do conhecimento específico e relevante para a tomada de decisão (HAYEK, 1945; SIMON, 1962; FAMA e JENSEN, 1983a; JENSEN e MECKLING, 1995).

Assumindo que as organizações, em geral, são compostas por diversas suborganizações com relação hierárquica entre elas ou delas com uma coordenação geral, é factível assumir que a complexidade é função do tipo de conhecimento no interior da organização. Por exemplo, se as organizações realizam atividades vinculadas a pesquisa, o conhecimento é específico e localizado em diversos agentes e, portanto, complexa (FAMA e JENSEN, 1983a; JENSEN e MECKLING, 1995).

Então, definindoΣeΔ, respectivamente, como representações da característica de complexidade e dispersão do conhecimento específico e relevante para a tomada de decisão, escreve-se [4]: [/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm04.jpg] Para Fama e Jensen (1983a), as organizações complexas deveriam promover a separação do processo decisório, ou seja, garantir que as decisões de controle e gestão não sejam realizadas por uma mesma pessoa ou órgão na empresa.

Especificamente, os autores impõem a separação como condição para que os proprietários não participem nas decisões de gestão. Ao contrário, segundo eles, se as organizações são não complexas, a tomada de decisão deveria ser concentrada. Isto é, os proprietários assumiriam, além das decisões de controle, as de gestão.

Em consonância com Fama e Jensen (1983a), assume-se que essa divisão das decisões é que explica a sobrevivência das organizações, pois sua existência auxilia no controle do problema de agência originado pela relação de agência estabelecida entre proprietários e conselho de administração e em todos os níveis da organização e, portanto, limita a possibilidade de os agentes expropriarem os detentores dos direitos sobre o lucro residual (principal).

2.3. Separação entre propriedade e gestão em organizações de propriedade difusa e complexas A aplicação dos conceitos apresentados aos estudos de Hermalin e Weisbach (2003) e Williamson (2007) permite assumir que o conselho administrativo recebe por delegação a autoridade formal para decidir sobre a gestão em prol dos interesses dos demais proprietários (WILLIAMSON, 1984) e configura-se como o elemento da governança corporativa com autonomia sobre as decisões de controle da organização (FAMA e JENSEN, 1983a; BECHT, BOLTON e RÖELL, 2002). Ainda, que cabe ao conselho de administração admitir, monitorar e demitir o agente responsável pela condução da gestão da empresa (MIZRUCHI, 1983; HERMALIN e WEISBACH, 1988; ROE, 2003).

Embora Galbraith (1967) aponte que a gestão da empresa é de responsabilidade de um grupo de profissionais (presidente do conselho de administração, presidente e vice-presidentes executivos e chefes de departamentos), a partir de Simon (1962) é possível assumir que a autoridade formal sobre as decisões de gestão é delegada pelo conselho de administração a um único agente escolhido como responsável pela condução da organização. Por exemplo, o Chief Executive Officer (CEO) ou diretor presidente são contratados para exercer o maior cargo hierárquico diretivo dentro da organização e investidos de autoridade formal para decidir sobre a gestão e contratualmente devem seguir os limites estabelecidos pelo conselho de administração para sua tomada de decisão(5) (BRICKLEY, COLES e JARRELL, 1997).

Portanto, em organizações de propriedade difusa e complexas, a separação entre propriedade e gestão existe se os proprietários são desvinculados das decisões de gestão. A desvinculação ocorre se proprietários delegam o direito de controle formal sobre a organização, ou seja, se existe a separação entre propriedade e controle (BERLE e MEANS, 1932); se separação do processo decisório, isto é, se as decisões de controle e gestão não são de responsabilidade de uma mesma pessoa ou órgão (FAMA e JENSEN, 1983a).

A separação é concretizada se os contratos formais e as relações de agência estabelecidas entre os proprietários e o conselho de administração (A1) e entre o conselho e, por exemplo, o CEO (A2) garantem que o interesse dos proprietários seja mantido e que os riscos da atividade não sejam alocados aos responsáveis pela gestão (BAYSINGER e HOSKISSON, 1990).

A relação A1 é delineada via contrato ou estatuto social das organizações e consiste na delegação dos direitos de controle formal pelos proprietários ao conselho de administração; A2 é fundamentada no contrato realizado entre conselho de administração e CEO, que concretiza a separação do processo decisório(6), conforme sugerem Fama e Jensen (1983a).

Neste trabalho, assume-se que delegação de direito de controle formal sobre a organização difere de delegação das decisões de gestão no interior da organização. A delegação do primeiro é o objeto do contrato da relação de agência A1 e consiste na transferência de parte do direito indissociável da propriedade dos proprietários ao conselho de administração. Ao contrário, a separação do processo decisório, estabelecida a partir da relação A2, não implica a transferência de propriedade e refere-se única e exclusivamente à definição sobre o direito de decidir a respeito de determinadas questões no interior da organização.

Em suma, se consideradas as características das organizações, a decisão de separar propriedade e gestão (Y) nas organizações é explicada teoricamente por fatores relacionados à estrutura de propriedade (E) e complexidade (Σ). Na equação [5], a seguir, são apresentadas as relações.

[/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm05.jpg] Note-se que, por uma perspectiva normativa, é possível afirmar que se ocorrem alterações nos fatores que afetam a dispersão da propriedade e a complexidade da organização, eles afetam o nível de separação entre propriedade e decisões de gestão. Em outras palavras, tem-se: [/img/revistas/rausp/v47n4/a06img01.jpg] > 0 e [/img/revistas/rausp/v47n4/a06img02.jpg] > 0, em que [/img/revistas/ rausp/v47n4/a06img01.jpg] demonstra o efeito marginal da alteração da estrutura de propriedade dispersa sobre a delegação dos direitos de controle formal e [/ img/revistas/rausp/v47n4/a06img02.jpg] o efeito marginal da alteração da complexidade sobre a separação do processo decisório. Portanto, fatores que afetam E eΣafetam Y (VARIAN, 1992).

3. ESTUDO DOS DETERMINANTES DA SEPARAÇÃO ENTRE PROPRIEDADE E GESTÃO NAS COOPERATIVAS AGROPECUÁRIAS BRASILEIRAS As cooperativas agropecuárias são organizações econômicas cuja propriedade é coletiva e são constituídas por produtores rurais para fazer frente às falhas de mercado (STAATZ, 1987). Elas diferem das demais organizações por duas razões: os cooperados são simultaneamente proprietários, usuários e consumidores de seus produtos e serviços (COOK, 1995) e a distribuição dos resultados econômicos auferidos pela organização aos proprietários é feita proporcionalmente às operações que cada um deles realizou com a cooperativa (BARTON, 1989).

O direito de propriedade sobre a organização concretiza-se na medida em que o produtor estabelece contrato com ela e adquire cotas de capital (capital social) na sociedade, que lhe asseguram os direitos de proprietário e usuário.

Como não clara separação desses distintos direitos no contrato, os cooperados adquirem direitos vagamente definidos, o que dificulta a gestão e o investimento nessas organizações (COOK, 1995).

Conforme destacam Costa, Chaddad e Azevedo (2010), o instituto (Lei 5764/71) que regulamenta o funcionamento das cooperativas brasileiras estabelece que, para serem constituídas, necessitam ter ao menos 20 proprietários e que as cotas de capital pertençam exclusivamente aos cooperados. Ainda, impõe que a distribuição do resultado não considere a quantidade de cotas dos proprietários e que o direito de controle seja desvinculado do montante da cota de capital do cooperado. Adicionalmente, os autores apontam que os estatutos sociais dessas organizações estabelecem que o resgate da cota de capital pelo cooperado não é simultâneo a seu desligamento do quadro de sócios(7) e facultam ao conselho de administração a remuneração das cotas até o limite de 12% (ao ano).

Em termos descritivos, Costa, Chaddad e Azevedo (2010) relatam que, em 2008, a cooperativa agropecuária média tinha 37 anos de idade, contava com 2.755 cooperados, tinha 450 funcionários e faturava R$ 254 milhões atuando em cerca de sete municípios com ao menos um funcionário. Do total, 62% delas executavam atividades industriais, sendo o índice de concentração de suas atividades econômicas igual a 0,514(8). Seu conselho de administração era integrado por oito membros internos eleitos para um mandato de quatro anos, que se reuniam a cada 28 dias; seu presidente dedicava 29 horas semanais a atividades da cooperativa.

No que se refere à alocação dos direitos de controle formal e separação do processo decisório, os autores apontam que 38% dos conselhos das cooperativas detinham, por delegação, o direito de controle formal e em 65% das cooperativas não havia separação do processo decisório.

3.1. Metodologia e banco de dados À medida que as decisões sobre a delegação do direito de controle formal e das decisões de gestão são realizadas por diferentes instâncias dentro da cooperativa, a investigação é conduzida de forma separada. Assim, pesquisam-se em separado os fatores que afetam a delegação dos direitos de controle formal e a separação do processo decisório. Esse formato gera informações agrupadas às relações de agência (A1 e A2) e testa se determinantes da propriedade difusa e complexidade têm implicações sobre a transferência do direito a definir o principal responsável pela gestão e divisão do processo decisório respectivamente. Adicionalmente, contribui para a investigação de como o comportamento do agente e as características da atividade impactam as decisões dos proprietários e do conselho administrativo.

Os dados da pesquisa são os mesmos utilizados por Costa, Chaddad e Azevedo (2010), referentes a 77 cooperativas atuantes em 2008 no agronegócio brasileiro e localizadas nos estados de Minas Gerais (MG), Paraná (PR), Rio Grande do Sul (RS), Santa Catarina (SC) e São Paulo (SP). Em síntese, os dados retirados do estatuto social geraram informações sobre a delegação dos direitos de controle formal; a partir dos questionários obteve-se um diagnóstico sobre alocação das decisões de controle e gestão, nível de dedicação do presidente à cooperativa e ocupação dos cargos de executivo responsável pela gestão e presidência do conselho de administração.

É importante observar que, devido ao tamanho limitado da amostra e por se tratar de uma única amostragem no tempo (cross section), o resultado da investigação traz informações que permitem fazer apontamentos sobre o grupo de cooperativas estudadas, mas pode não informar sobre a realidade de todas as cooperativas brasileiras.

3.2. Hipóteses de interesse sobre a separação nas cooperativas brasileiras A partir da equação [5], apresentada anteriormente, espera-se que cooperativas cuja estrutura de propriedade seja difusa apresentem delegação dos direitos de controle formal. Esse preceito teórico permite estabelecer a hipótese 1 (H1).

Hipótese 1 A delegação dos direitos de controle formal nas cooperativas agropecuárias brasileiras é determinada pela estrutura de propriedade difusa.

De acordo com Gorton e Schmid (1999), quanto maior o número de cooperados, mais difuso é seu direito de propriedade. Assim, nas palavras de Demsetz e Lehn (1985), mais difusa é a sua estrutura de propriedade. Portanto, espera-se que quanto maior o número de cooperados, maior a probabilidade de delegação dos direitos de controle formal.

A hipótese permite investigar se o número de proprietários, que representa o grau de dispersão de propriedade, conforme apontam Gorton e Schmid (1999), afeta a delegação do direito de controle formal.

Os trabalhos de Aghion e Tirole (1997) e Baker, Gibbons e Murphy (1999) estabelecem que o comportamento do agente afeta a decisão de delegação do principal. Em particular, Baker, Gibbons e Murphy (1999) apontam que se o principal percebe a reputação do agente em agir em prol de seus interesses, aumento na probabilidade da delegação dos direitos decisórios. Diante disso, investiga-se a hipótese 2 (H2), a seguir.

Hipótese 2 A delegação dos direitos de controle formal (X) ao conselho de administração é afetada positivamente pela reputação do conselho em agir em prol do interesse dos proprietários.

Para Baker, Gibbons e Murphy (1999), se o conselho de administração tem reputação por agir de forma alinhada aos interesses dos proprietários, espera- se que haja maior probabilidade de delegação do direito de controle formal. Em outras palavras, nas cooperativas cujos cooperados reconhecem que o conselho de administração toma decisões em seu benefício maior probabilidade de que a autoridade para definir o CEO seja transferida. Portanto, H2 informa se o pressuposto dos autores se aplica à transferência dos direitos de controle formal na relação entre cooperado e conselho de administração nas cooperativas agropecuárias brasileiras.

Ainda, Aghion e Tirole (1997) descrevem que, se o principal visualiza o esforço do agente no desenvolvimento de suas atividades, por exemplo, dedicando-se para captar informações sobre as decisões a serem tomadas, aumenta a probabilidade de delegação. Portanto, neste artigo é elaborada a hipótese 3 (H3) para investigar se o esforço do conselho em monitorar as atividades da cooperativa influencia a probabilidade de delegação pelos cooperados.

Hipótese 3 A delegação dos direitos de controle formal (X) é afetada positivamente pelo esforço do conselho de administração em monitorar o comportamento dos gestores.

Com base em Aghion e Tirole (1997), espera-se que a delegação do direito de controle formal seja mais frequente naquelas cooperativas cujo conselho de administração se dedique com maior intensidade a suas atividades. Por exemplo, nas organizações cujos membros do conselho despendam mais tempo estudando os projetos que lhes são apresentados pelos gerentes ou monitorando o desempenho da cooperativa a probabilidade da delegação é maior do que nas demais.

Adicionalmente, Aghion e Tirole (1997) relatam que o nível de informação que o agente possui sobre as atividades delegadas afeta positivamente a decisão de delegação. Assim, testa-se a hipótese 4 (H4).

Hipótese 4 A delegação dos direitos de controle formal (X) tem relação positiva com o nível de informação dos proprietários sobre as atividades desenvolvidas pela cooperativa.

É esperado, com base em Aghion e Tirole (1997), que se os proprietários possuem maior grau de informação sobre as atividades desenvolvidas pelas cooperativas, maior é a probabilidade de delegação dos direitos de controle formal.

A partir dos trabalhos de Demsetz e Lehn (1985), Bebchuck (1999) e Hwang (2005), é possível assumir que os adquirentes do controle na organização se beneficiam de sua posição. Em outras palavras, os proprietários que compõem o conselho de administração obtêm benefícios pecuniários ou não pecuniários. Por exemplo, informação privilegiada, remuneração adicional pelo exercício da função, influência sobre as decisões estratégicas da empresa, etc. Nesse contexto, investiga-se a hipótese 5 (H5).

Hipótese 5 A existência de potencial benefício ao controle a ser adquirido exclusivamente por quem está no controle reduz a probabilidade de delegação dos direitos de controle formal (X) pelos proprietários.

Para Demsetz e Lehn (1985), Bebchuck (1999) e Hwang (2005), quanto mais difícil o monitoramento pelo principal das atividades desenvolvidas pelo agente, maiores serão os benefícios privados aos controladores. Nessas situações, de acordo com Demsetz e Lehn (1985), o controle não será delegado. Portanto, H5 investiga como a existência de potenciais benefícios ao controle afetam a delegação dos proprietários ao conselho de administração nas cooperativas agropecuárias da amostra.

É esperado que as hipóteses estabelecidas não sejam rejeitadas, pois foram definidas conforme os preceitos teóricos predominantes. Assim, em síntese, espera-se que a probabilidade de delegação dos direitos de controle formal seja afetada positivamente por: grau de dispersão da propriedade, reputação positiva do conselho de administração junto aos cooperados, dedicação do conselho a suas atividades na cooperativa e nível de informação do proprietário sobre as atividades delegadas. Ao contrário, espera-se que a probabilidade de delegação seja inversa à presença de potenciais benefícios privados aos detentores do direito de controle formal.

De acordo com Fama e Jensen (1983a), a complexidade da organização impacta a probabilidade de separação das decisões de controle das de gestão. Isto é, na visão dos autores, as organizações complexas sobrevivem se promovem a divisão do processo decisório. Assim, a hipótese 6 (H6), a seguir, verifica se as cooperativas agropecuárias brasileiras seguem o que é estabelecido pelos autores.

Hipótese 6 A separação das decisões de controle e gestão nas cooperativas agropecuárias brasileiras é determinada pela complexidade da organização.

Portanto, espera-se que aumentos nos fatores que afetam a complexidade da organização impliquem elevação da probabilidade de delegação das decisões de gestão pelo principal (conselho de administração) ao agente (CEO), uma vez que essa decisão contribuirá para reduzir os problemas de agência, otimizará a alocação do conhecimento relevante para a tomada de decisão na organização e reduzirá as perdas originadas pelas decisões com baixo nível informacional (FAMA e JENSEN, 1983a; JENSEN e MECKLING, 1995).

Em significativa parcela (62%) das cooperativas agropecuárias brasileiras, conforme apontam Costa, Chaddad e Azevedo (2010), o presidente do conselho de administração assume as funções de CEO. Portanto, dada essa informação, torna- se interessante investigar se a alocação de autoridade ao conselho de administração e a existência de limites à reeleição ao cargo de presidente do conselho têm efeito sobre a separação do processo decisório.

Por meio da hipótese 7 (H7), descrita a seguir, é possível testar se o fato de o conselho administrativo ter autoridade para nomear ou destituir o CEO tem impacto sobre a alocação das decisões de controle e gestão.

Hipótese 7 A separação entre as decisões de controle e gestão tem relação positiva com a alocação dos direitos de controle formal ao conselho de administração.

A partir dessa hipótese, espera-se que a alocação do direito de controle formal ao conselho de administração impacte positivamente a probabilidade da separação do processo decisório, pois a autoridade permite que os membros desenhem mecanismos de incentivo e enforcement.

A hipótese 8 (H8), apresentada a seguir, permite investigar se a existência de limites à reeleição ao cargo de presidente do conselho de administração afeta a separação do processo decisório.

Hipótese 8 A separação entre as decisões de controle e gestão é afetada positivamente pela existência de limitações à reeleição ao cargo de presidente da cooperativa.

Assumindo-se que o limite à reeleição afeta a decisão do presidente em acumular as funções de executivo, então, na medida em que limites à reeleição, espera-se que haja elevação na probabilidade de separação do processo decisório. Isso ocorreria porque a impossibilidade de o presidente acumular ambos os cargos por um longo período de tempo afeta sua decisão em dedicar-se às atividades da cooperativa como executivo(9).

3.3. Determinantes da delegação do direito de controle formal e da separação do processo decisório Dadas as diferentes relações de agência (A1 e A2) no processo de desvinculação dos proprietários da gestão, primeiro investigam-se H1 a H5 referentes à delegação do direito de controle. Na sequência, estudam-se H6 a H8, concernentes à separação das decisões de controle e gestão.

Para estudar as hipóteses sobre os determinantes da delegação do direito de controle formal, é utilizada a regressão logística ' modelo logit ', pois assume-se a delegação como uma variável dependente binária (Xi) afetada, entre outros fatores, pelo tamanho da organização, reputação e esforço de monitoramento do conselho de administração, nível de informação dos proprietários sobre as atividades delegadas, incertezas do mercado de atuação, regulação externa sobre a atividade desenvolvida pela firma e demais fatores que permitem àqueles que detêm o controle extrair benefícios diretos ou indiretos de sua posição como controlador (DEMSETZ e LEHN, 1985; JENSEN e MECKLING, 1995; AGHION e TIROLE, 1997; BAKER, GIBBONS e MURPHY, 1999; BEBCHUCK, 1999; GORTON e SCHMID, 1999; HWANG, 2005).

O modelo 1, a seguir, descreve como as características da relação ou dos envolvidos na relação de agência A1 afetam a delegação dos direitos de controle formal nas organizações cooperativas agropecuárias brasileiras e testa as hipóteses de H1 a H5.

Modelo 1 [/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm06.jpg] No modelo 1, tem-se que Pi é a probabilidade da delegação do direito de controle formal,βsão os parâmetros de estimação,Λa matriz de variáveis explicativas de interesse ou controle do modelo e Xi é a variável binária que representa a delegação dos direitos de controle formal pelo principal ao agente.

O estudo dos fatores que afetam a separação das decisões de gestão e controle utiliza o modelo tobit, dado que a variável dependente é contínua no intervalo entre zero e um, com probabilidade positiva de assumir o valor zero e a possibilidade de concentração em torno do valor limite (WOOLDRIDGE, 2002; GREENE, 2003). O modelo 2 (tobit) é construído para averiguar se complexidade, alocação do direito de controle formal e limites à reeleição ao cargo do presidente afetam a decisão de separação do processo decisório nas cooperativas brasileiras. Isto é, o modelo é utilizado para testar H6, H7 e H8.

Modelo 2 [/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm07.jpg] Os valores deβe C são, respectivamente, os coeficientes a serem estimados e a matriz que contém as variáveis de interesse e controle.

No modelo 2, a variável dependente Z* é função do valor da variável Z, apresentada por Costa, Chaddad e Azevedo (2010) para demonstrar o nível de separação entre decisões de controle e gestão nas cooperativas agropecuárias brasileiras(10). A concentração das decisões existe se Z = 0 e aumenta a partir daí até tornar-se completa com Z = 1. Então, para a operacionalização do tobit tem-se: [/img/revistas/rausp/v47n4/a06frm08.jpg] No quadro a seguir, apresentam-se e descrevem-se as variáveis de interesse que compõem as matrizesΛ e C contidas nos modelos 1 e 2 respectivamente(11). Explicitam-se, ainda, os efeitos esperados de acordo com cada hipótese estabelecida.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES A estatística descritiva da amostra é apresentada na tabela_1. Os valores são expostos conforme o tipo de cooperativa: cooperativas singulares e centrais ou federações. As primeiras são organizações compostas majoritariamente de proprietários produtores rurais; as demais são integradas apenas por cooperativas singulares.

Os resultados da tabela_1 servem apenas para apresentar as estatísticas descritivas por tipo de cooperativa estudada na amostra. O teste de média não apontou diferenças significativas entre os dois tipos de empresas.

Na tabela_2 são expostos os resultados de duas regressões para cada um dos modelos (1 e 2), para avaliar o efeito marginal das variáveis explicativas sobre a delegação dos direitos de controle formal (Xi) e da separação do processo decisório (Z).

A diferença entre a primeira e a segunda regressão de cada modelo revela que, na primeira, são consideradas todas as variáveis de controle e, na segunda, são mantidas somente aquelas significativas na primeira regressão.

Os resultados apontam essencialmente se as hipóteses estabelecidas ' controladas pela presença de auditoria externa, efeitos da variação do mercado, idade, tamanho e tipo de cooperativa e características do estado ' são corroboradas para as cooperativas agropecuárias brasileiras que compuseram a amostra.

[/img/revistas/rausp/v47n4/a06quadro.jpg]

A partir dos resultados, nota-se que o número de proprietários (P) não é significante, assim a hipótese H1 não é corroborada. Isto é, diferentemente do que se esperava a partir de Gorton e Schmid (1999), não se pode afirmar, a priori, que a delegação dos direitos de controle formal ocorra nas cooperativas agropecuárias brasileiras devido à sua estrutura de propriedade difusa.

Diante do resultado, é necessário ponderar o fato de a Lei 5764/71 estabelecer que a cooperativa deva possuir no mínimo 20 cooperados para sua existência e que cada cooperado tenha um voto. Portanto, a cooperativa surge caracterizada por uma estrutura de propriedade e controle difuso. Assim, elevações na quantidade de sócios não afetariam de modo significativo a decisão dos cooperados quanto à delegação do direito de controle formal.

A distribuição de sobras apresentou efeito marginal acima de 55 pontos percentuais sobre a probabilidade de delegação dos direitos de controle formal em ambas as regressões do modelo 1. Isto é, se houve distribuição de sobras em ao menos um dos últimos cinco anos, a probabilidade de os cooperados delegarem ao conselho de administração o direito de controle formal da organização aumenta. Como consequência, a hipótese H2 é não rejeitada, ou seja, indícios de que a distribuição de sobras afeta positivamente, pelo menos 1% de significância, a delegação dos direitos de controle formal pelos cooperados ao conselho de administração(12).

Em outras palavras, infere-se que a delegação dos direitos de controle formal pelos proprietários ao conselho segue o que é previsto por Baker, Gibbons e Murphy (1999). Isto é, se existe reputação positiva do conselho junto aos cooperados, maior probabilidade de delegação de autoridade para conduzir a organização.

O esforço do conselho administrativo em monitorar os gestores foi significativo a 1% a partir da adição das variáveis de controle que consideram as características fixas do Estado. Os resultados apontam para a não rejeição de H3, pois o aumento em uma unidade da intensidade de monitoramento do conselho tem efeito marginal positivo de ao menos 0,5 pontos percentuais sobre a probabilidade de delegação ao conselho em definir o principal executivo da cooperativa.

Os proprietários da cooperativa adquirem informações sobre as atividades desenvolvidas pela organização de duas formas predominantes: contato com o conselho de administração e monitoramento via assembleias gerais ordinárias e extraordinárias. Assim, assume-se que quanto maior o tamanho do conselho de administração (Tam_CA), maior é o nível de informação dos cooperados sobre a cooperativas e o mesmo ocorre com a elevação do número de assembleias.

O tamanho do conselho de administração (Tam_CA) mostrou-se significativo em todas as regressões a pelo menos 5%. Os resultados apontam que se aumentos no número de membros no conselho administrativo, maior é a probabilidade de delegação dos direitos de controle ao conselho de administração. Esse resultado demonstra que a elevação em uma unidade no número de membros do conselho tem efeito marginal positivo de, ao menos, quatro pontos percentuais na probabilidade de delegação dos direitos de controle formal. Entretanto, o monitoramento dos proprietários (Mon_Prop) via assembleias não foi significante em nenhuma das regressões. Esse resultado corrobora, de certa forma, Bialoskorski Neto (2004) que aponta para a importância dos contratos relacionais como instrumento de influência nas cooperativas agropecuárias brasileiras.

O fato de o tamanho do conselho (Tam_CA) ter apresentado grau de significância e o monitoramento dos proprietários (Mon_Prop) não ter sido significativo não permite corroborar ou rejeitar H4. A indefinição demonstra a necessidade de aprofundar os estudos a respeito de por quais mecanismos os cooperados têm preferência para adquirir informações sobre as atividades da cooperativa.

Aparentemente, predileção pela relação com o conselho de administração em detrimento da participação nas assembleias.

Assumindo que a presença da atividade agroindustrial gera potenciais benefícios aos membros que estão no controle (DEMSETZ e LEHN, 1985) e que a existência desses benefícios inibe a delegação dos direitos de controle, os resultados encontrados na tabela_2 corroboram H5. Isto é, a existência de potenciais benefícios aos detentores do direito de controle formal, tais como consumo de bens pecuniários e não pecuniários, reduz a probabilidade de os cooperados delegarem aos integrantes do conselho autoridade para definir o principal executivo da cooperativa. Os resultados das regressões foram significativos a 1% com efeito marginal negativo de ao menos 43 pontos percentuais na probabilidade de delegação dos direitos de controle formal.

As dummies de controle do estado onde a cooperativa está localizada permite inferir que, aparentemente, existem características específicas às unidades da federação que incentivam ou inibem a delegação ao conselho de administração do direito de nomear e demitir o principal executivo da cooperativa.

Os resultados do modelo 2, também apresentados na tabela_2, não permitem corroborar H6, pois, tanto o número de funcionários (F) quanto o índice de concentração (HHI) são não significativos. Ao contrário do que aponta Fama e Jensen (1983a), os resultados demonstram que, aparentemente, a separação entre decisão de controle e gestão nas cooperativas brasileiras não leva em consideração as características relacionadas à complexidade.

A reflexão sobre esses resultados permite apontar que talvez o tamanho da amostra tenha sido insuficiente para captar a estimativa da população. Contudo, é importante salientar, no que se refere especificamente ao número de funcionários (F), que a sua não significância pode não estar relacionada à questão do tamanho da amostra e sim à concentração de funcionários em atividades que não demandam conhecimento relevante para a tomada de decisão nessas organizações. No que tange ao HHI, uma candidata justificativa auxiliar para o resultado é a possibilidade de as cooperativas atuarem em áreas correlatas ou complementares. Assim, o conhecimento relevante para a tomada de decisão pode ser menos custoso de ser transferido.

Ainda, os resultados das regressões do modelo 2 demonstram, a pelo menos 5% de significância, que se os conselhos administrativos têm autoridade formal para nomear e destituir o CEO, aumenta a probabilidade de separação do processo decisório. Isto é, se o conselho detém o direito de controle formal, um efeito marginal positivo de, no mínimo, 34 pontos percentuais sobre a separação entre decisão de controle e gestão. Esse resultado permite que H7 seja não rejeitada e demonstra a importância da alocação do direito de controle formal ao conselho para consolidar o processo separatório das decisões nas cooperativas.

H8 foi não rejeitada e os resultados contidos na tabela_2 apontam, com nível de significância a 1%, que limites à reeleição impactam positivamente a separação do processo decisório. Aparentemente, a existência de institutos que limitam a reeleição ao cargo de presidente do conselho de administração tem efeito marginal acima de 50 pontos percentuais sobre a separação das decisões de controle e gestão nas cooperativas; o resultado permite inferir que o limite ao número de mandatos do presidente do conselho reduz a probabilidade de acúmulo das funções executivas na organização. Crê-se, conforme apontado, que o custo de oportunidade do presidente para dedicar-se às atividades de gestão torna-se elevado e isso implica a maior probabilidade de separação do processo decisório.

Diferente do que ocorreu com modelo 1, o tamanho do conselho, como proxy para representar o nível de informações do conselho administrativo (principal) sobre a atividade delegada ao CEO (agente), não foi significante nas regressões.

Entretanto, a não significância não permite desconsiderar as afirmações de Aghion e Tirole (1997). Nesse sentido, duas observações são necessárias. A primeira refere-se à possibilidade da existência de outros instrumentos de obtenção de informação pelo conselho de administração não considerados no trabalho; a segunda diz respeito à não distinção entre o número de integrantes com ou sem funções efetivas no conselho, pois é possível que, se essas diferenças forem consideradas, haja alterações nos resultados.

5. CONCLUSÕES E SUGESTÕES PARA PESQUISAS FUTURAS No que se refere especificamente à investigação dos determinantes da delegação do direito de controle formal, a pesquisa aponta para indícios de que a quantidade de sócios, a intensidade de monitoramento que os cooperados executam, via assembleia geral, sobre o conselho administrativo e o tipo de cooperativa (singular ou central) não afetam sua decisão de delegar autoridade ao conselho para nomear ou demitir o agente responsável pela gestão da organização.

Em contrapartida, a distribuição de sobras, o tamanho e o esforço de monitoramento efetuado pelo conselho e a presença de potenciais benefícios aos controladores da empresa são considerados importantes determinantes da delegação dessa autoridade. Adicionalmente, fatores relacionados a tamanho da cooperativa, incertezas provenientes do mercado e estado de localização afetam a decisão de delegação de acordo com o conjunto de variáveis utilizado na investigação.

O fato de a quantidade de cooperados não afetar a decisão dos sócios sobre a transferência de autoridade ao conselho administrativo demonstra, diferentemente de Gorton e Schimd (1999), que nas cooperativas agropecuárias brasileiras a estrutura de propriedade não afeta a delegação dos direitos de controle formal. É possível que as características estabelecidas pela instituição formal estabeleça dispersão suficiente dos direitos de propriedade, tornando o número de sócios indiferente no processo decisório da delegação.

O monitoramento dos cooperados sobre as atividades do conselho não apresenta efeitos significativos sobre a delegação do direito de controle. Entretanto, o resultado não significa que o nível de informação dos cooperados não tenha influência sobre a transferência dos direitos de controle formal. a possibilidade de os proprietários estarem monitorando as atividades da cooperativa por meio de contratos relacionais com conselho ou outros meios não considerados neste estudo. Portanto, sugere-se que novas pesquisas considerem o efeito dos diferentes meios de monitoramento na probabilidade de delegação e a possível preferência do cooperado por contratos relacionais informais com os conselheiros de administração.

A efetiva distribuição de sobras aos cooperados é um importante determinante da decisão de delegação de autoridade pelos sócios ao conselho. Isto é, os cooperados premiam os conselhos que demonstram agir em prol de seus interesses.

Crê-se que a distribuição de sobras é um indicador mensurável e perceptível ao cooperado e que essas características estimulam seu uso pelo conselho como mecanismo de criação de reputação junto aos sócios. Todavia, é necessário salientar que o resultado não permite concluir que o cooperado tenha preferência por conselhos que priorizam a distribuição de sobras em detrimento das demais estratégias. Na medida em que existam, além das sobras, outros indicadores para representar a reputação do conselho junto ao cooperado, é recomendado que outros estudos sejam conduzidos para averiguar se o resultado aqui encontrado é mantido.

Os associados às cooperativas agropecuárias brasileiras consideram os benefícios privados ao controle como um fator determinante sobre a decisão de delegação dos direitos de controle ao conselho de administração. Nas cooperativas em que existia a possibilidade de serem expropriados, dada a presença de atividade industrial que aumenta a dificuldade de monitoramento, a assembleia concentrou a autoridade para definir quem seria o responsável pela gestão da organização.

O tamanho per capita da cooperativa e as incertezas do mercado são determinantes da delegação do direito de controle formal somente se consideradas as características individuais dos estados onde as organizações estão localizadas. A influência das incertezas do mercado foi diferente do que Demsetz e Lehn (1985) encontraram e demonstra que, para cooperativas atuantes em ambientes incertos, a delegação dos direitos de controle formal ao conselho torna a decisão mais ágil e menos custosa.

A investigação sobre os determinantes da separação do processo decisório não permite concluir que a complexidade afete a probabilidade de separação das decisões de controle e gestão. Entretanto, não se descarta a possibilidade de que novas proxies para complexidade sejam testadas e constate-se o efeito.

A autonomia do conselho para nomear e demitir o CEO, ou seja, a obtenção do direito de controle formal, aumenta a probabilidade de se observarem cooperativas com processos decisórios separados, pois esse órgão da governança tem a possibilidade de executar adequadamente suas atividades de monitoramento da gestão. Isto é, tem maior liberdade para desenvolver mecanismos de incentivo e enforcement aos gestores e não atuar como o conselho batedor de carimbos.

A existência de limites à reeleição ao cargo de presidente da cooperativa diminui a probabilidade de acúmulo das decisões de controle e gestão.

Entretanto, isso não permite afirmar que a existência de limites à reeleição ao cargo de presidente do conselho de administração afete seu custo de oportunidade para executar ambas as funções. Esse resultado abre espaço para investigações futuras, isto é, para estudar se o custo privado do ocupante do cargo de presidente do conselho afeta sua disposição em assumir a função de CEO.

O tamanho do conselho de administração e a presença de atividade industrial, embora tenham sido relevantes na delegação do direito de controle formal, não são significativos na separação do processo decisório. Isto é, a quantidade de membros no conselho e a existência de benefícios privados ao controle não afetam a decisão de separação entre as decisões de controle e gestão.

Embora haja maior probabilidade de delegação do direito de controle formal nas cooperativas localizadas em Minas Gerais e São Paulo, quando comparadas àquelas instaladas no Paraná, elas apresentam menor probabilidade de separação das decisões de controle e gestão. Os estudos que almejam debater a profissionalização das cooperativas agropecuárias brasileiras devem considerar essa constatação em suas investigações.

NOTAS (1) É importante destacar que no Brasil, a partir da publicação do livro Governança cooperativa ' diretrizes e mecanismos para fortalecimento da governança em cooperativas de crédito(MELO SOBRINHO et al., 2009), tem início o debate sobre o conceito e sua aplicação nas cooperativas. A partir do trabalho, uma linha de pesquisadores passa a usar o termo governança cooperativa para referir-se à governança corporativa em cooperativas. Os interessados devem consultar Melo Sobrinho et al. (2009).

(2) Uma organização é complexa independentemente de ser classificada como multidivisional (M-form) ou unidivisional (U-form), pois, mesmo nesses dois diferentes tipos de arranjos, a função objetivo é maximizar o resultado conjunto de todas as suborganizações. As organizações M-form são aquelas compostas de múltiplas divisões que englobam tarefas complementares e têm foco no produto. Ao contrário, as U-form são compostas de unidades especializadas, ou seja, as tarefas são similares ou substituíveis, cujo foco é o processo (QIAN, ROLAND e XU, 2006).

(3) Embora não exista na literatura uma definição precisa sobre estrutura de propriedade, o conceito aqui apresentado mescla as definições sugeridas por Jensen e Meckling (1976) e Demsetz e Lehn (1985).

(4) No que se refere especificamente às cooperativas brasileiras, a Lei 5764/71 apresenta mecanismos que propiciam a contestação do controle vigente. Por exemplo, o conselho fiscal ou um quinto dos cooperados podem convocar assembleia geral para votar a deposição do atual conselho de administração.

(5) uma vasta literatura que debate os custos e os benefícios para a organização da junção dos cargos de CEO e Presidente do Conselho de Administração. Para iniciar o assunto, recomenda-se consultar Brickley, Coles e Jarrell (1997).

(6) Para simplificação do raciocínio e consecução do objetivo do trabalho, considera-se apenas um principal e um agente nas relações A1 e A2. Embora gere limitações ao trabalho, a simplificação não impede uma primeira verificação sobre as relações de agência estabelecidas. Espera-se que trabalhos posteriores considerem as relações entre os principais e entre os agentes e agreguem as informações adicionais que neste trabalho não se objetiva mostrar.

(7) A justificativa é, em geral, salvaguardar a continuidade da sociedade.

Entretanto, essa cláusula de segurançainibe uma das alternativas ao cooperado de manifestar o desalinhamento de interesse com o controle da organização, isto é, a saída da sociedade, conforme aponta Holmström (1999).

(8) O índice utilizado para calcular a concentração das atividades foi o Herfindahl Hirschmann Indice (HHI), sugerido por Serigati, Azevedo e Orellano (2009).

(9) Assume-se que um custo de oportunidade do presidente em dedicar-se às atividades executivas da cooperativa em relação a suas atividades empresariais particulares. O fato de haver limite à reeleição elevaria seu custo de oportunidade para dedicar-se às decisões de controle e gestão.

(10) [/img/revistas/rausp/v47n4/a06img03.jpg] tal que 0 < Z < 1, em que zPR e zIM são variáveis binárias que apontam se as decisões de controle e gestão estão alocadas sem sobreposição no agente e no principal; d é variável dummy que aponta se sobreposição dos cargos de presidente do conselho de administração e executivo responsável pela gestão e b aponta a dedicação do presidente do conselho às atividades da cooperativa.

(11) Por tratarem-se o logit(modelo 1) e o tobit (modelo 2) de modelos não lineares, sua estimativa por mínimos quadrados ordinários (MQO) gera estimadores em viés. Assim, deve-se utilizar máxima verossimilhança, apresentada e debatida em Greene (2003).

(12) É assumida a não existência de endogeneidade entre delegação do direito de controle formal e distribuição de sobras, pois, em geral, a existência de sobras é função da estratégia definida entre conselho de administração e gestores da cooperativa.


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