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BrBRHUAp0080-21072013000100011

BrBRHUAp0080-21072013000100011

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaApplied Social Sciences
ISSN0080-2107
Year2013
Issue0001
Article number00011

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Proposição de uma tipologia para a internacionalização de P&D interno e externo nas multinacionais brasileiras

1. INTRODUÇÃO O conceito de inovação ampliou-se e o desafio atual não envolve apenas a geração de inovações de produtos e processos, mas também a busca contínua de soluções inovadoras tanto organizacionais quanto mercadológicas. A análise do processo inovador, antes focada somente na geração linear de novos saberes, também sofreu inúmeras mudanças e hoje aborda o desenvolvimento de formas dinâmicas e abertas de produzir, aplicar, distribuir e compartilhar conhecimentos, competências e tecnologias.

A abordagem da inovação aberta está baseada na utilização de caminhos internos ou externos para avançar no desenvolvimento de novas tecnologias, ou seja, fluxos de entrada e saída de conhecimentos são usados de forma intencional, para acelerar a inovação interna e ampliar, respectivamente, os mercados e as inovações externas. Essa abordagem requer um modo diferente de pensar e suas formas de utilização podem ser inúmeras, colaborativas ou de simples troca, tais como: relacionamento com outras empresas, relacionamento com instituições científicas e tecnológicas (ICT), relacionamento com clientes, relacionamento com fornecedores e também importando e exportando ideias (CHESBROUGH e CROWTHER, 2006; CHESBROUGH, VANHAVERBEKE e WEST, 2008).

Assim, na inovação aberta, as competências necessárias para gerar grandes inovações tecnológicas de forma sistemática estão dispersas em outras inúmeras instituições além da empresa, mas, por outro lado, a empresa deve ter a capacidade de absorver e explorar devidamente esse conhecimento disponível no ambiente externo para, então, criar valor a partir dele (VAN DER MEER, 2007; ENGEROFF e BALESTRIN, 2008; FERRO, 2010).

Além da inovação aberta, verifica-se também outra te--mática bastante relevante na atualidade, denominada internacionalização. Inicialmente a atuação internacional das empresas restringia-se às atividades produtivas, mas nos dias de hoje atividades de inovação também são realizadas no exterior. Nesse contexto de globalização da inovação, nota-se a existência de uma intrincada rede de cooperação internacional na corrida tecnológica, da qual participam não matriz e subsidiárias (P&D interno), mas também universidades, institutos de pesquisa e, sobretudo, governos de diversos países (P&D externo) ; o fenômeno que se observa é o da internacionalização de P&D (PATEL e PAVITT, 1998).

Estudos recentes (como CANTWELL e PISCITELLO, 2007; CRISCUOLO e NARULA, 2007) enfatizam que a com-petitividade das multinacionais vem sendo potencialmente afetada pela globalização das atividades de P&D. Primeiro, porque os novos imperativos da competição global são cada vez mais afetados pela atuação das subsidiárias estrangeiras no que tange ao registro de patentes que irão nutrir grandes invenções e inovações locais e globais (BELDERBOS, 2003). Segundo, porque as subsidiárias adquirem um diferencial competitivo ao criar e transferir conhecimento e quando exploram os ativos dos sistemas locais de inovação (ZEDTWITZ e GASSMANN, 2002; CRISCUOLO, 2005; DUNNING e LUNDAN, 2009), resultando, muitas vezes, em produtos originais, em vez de mera adaptação tecnológica (HANSEN, MORS e LOVAS, 2005).

Deve-se destacar que as empresas brasileiras percorreram uma trajetória de inovação e de internacionalização, embora tardiamente quando comparadas a empresas dos países desenvolvidos. Apesar de ainda existirem inúmeros desafios a serem superados, é válido citar que algumas multinacionais brasileiras se destacam local e globalmente por suas estratégias de internacionalização e de inovação, sendo, portanto, extremamente válido estudá-las em profundidade.

Santos (2006) ressalta ainda que o sucesso futuro das mul--tinacionais emergentes, especificamente as brasileiras, dependerá, cada vez mais, da capacidade de acessar o conhecimento fora das subsidiárias e da matriz e de juntá-lo às capacidades de suas redes globais de operações e de cooperação tecnológica (ALMEIDA, 2007). Essa construção exigirá intensa melhora da capacidade de organizar o conhecimento que se encontra disperso em sua vasta rede de subsidiárias e parceiros tecnológicos (CYRINO e BARCELLOS, 2006). Ao mobilizar e compartilhar conhecimentos dispersos globalmente, as multinacionais emergentes poderão então inovar de forma mais eficaz e com resultados superiores aos de seus rivais que continuam presos à própria nacionalidade (LEYDESDORFF e ETZKOWITZ, 2001).

Em virtude da relevância científica e prática dos temas inovação e internacionalização, nota-se a necessidade de analisar a internacionalização de P&D interno e externo e suas possibilidades estruturais, além disso, o estudo das multinacionais brasileiras e a compreensão de seus modelos de gestão e de seus estágios de desenvolvimento são aspectos relevantes ao desenvolvimento do sistema nacional de inovação. Nesse contexto, buscou-se responder o seguinte problema de pesquisa: Qual o estágio de desenvolvimento da internacionalização de P&D interno e externo nas multinacionais brasileiras? Com o propósito de respondê-lo, levantaram-se perguntas de pesquisa secundárias tendo como foco as multinacionais brasileiras, tais como: Quais as motivações e as formas de entrada para a produção internacional? Qual o foco estratégico de P&D? Como são estruturadas e coordenadas as atividades nacionais e internacionais de P&D? Como ocorre o processo de inovação? Quais as características do fluxo de conhecimento entre matriz e subsidiárias? Como ocorre a decisão de cooperar na matriz e nas subsidiárias? Como as parcerias tecnológicas são gerenciadas e coordenadas na matriz e nas subsidiárias? Diante do problema levantado e das perguntas de pesquisa expostas, tem-se como objetivo geral propor uma tipologia para a internacionalização de P&D, enfocando as possibilidades estruturais para o desenvolvimento interno e externo. Especificamente, buscar-se-á identificar, com base na literatura, conceitos e abordagens que possam sustentar a proposição dessa tipologia; mapear as opções estratégicas e estruturais das multinacionais brasileiras com relação às atividades de P&D nacionais e internacionais; e, por fim, analisar o P&D das multinacionais brasileiras com base na tipologia apresentada.

2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1. Inovação aberta Os principais fundamentos da inovação aberta são: é necessário trabalhar com pessoas inteligentes dentro e fora da empresa; o P&D externo pode criar significativo valor e o P&D interno é necessário para captar e efetivamente incorporar à empresa esse valor; não é obrigatoriamente necessário desenvolver internamente pesquisa para lucrar com ela; construir um bom modelo de negócio pode ser melhor que ser a primeira empresa a colocar uma inovação no mercado; o ganho advém do uso dos projetos de inovação e é recomendável compartilhar e comprar ideias para alavancar o modelo empresarial (VAN DER MEER, 2007; ENGEROFF e BALESTRIN, 2008; FERRO, 2010).

Segundo Chesbrough, Vanhaverbeke e West (2008), é importante combinar ideias internas e externas dentro de arquiteturas e sistemas moldados por modelos de negócios que criam e capturam valor. Portanto, o papel relevante assumido pelos modelos de negócio acaba capacitando as organizações a sustentarem uma posição valorosa na indústria ao longo do tempo. Além disso, a busca por vantagens competitivas também passa por aplicações externas para as tecnologias desenvolvidas internamente e não utilizadas, seja por meio de novos modelos de negócio ou de licenciamento para terceiros.

A novidade trazida por Chesbrough, Vanhaverbeke e West (2008) refere-se, portanto, à proposição de uma remodelagem no modelo de negócio da empresa, pautada na sistematização de interações com atores externos no processo de inovação. Tal sistematização deve estar incorporada à estratégia corporativa da empresa na forma de processos internos específicos, mobilização de recursos humanos e financeiros, adaptação de competências e da cultura interna ao novo modelo. Assim, a implementação da inovação aberta traduz-se na sistematização de um conjunto de iniciativas organizacionais em P&D que a empresa pode adotar conjuntamente a fim de acelerar seu ritmo de geração de inovação (FERRO, 2010).

Segundo Ferro (2010), as iniciativas organizacionais de sistematização da inovação aberta dividem-se em duas categorias: a busca e aquisição de fontes externas de inovação (processos outside-in); e a comercialização de processos e tecnologias próprias não incorporadas à estratégia e ao modelo de negócio da empresa (processos inside-out). Essas categorias podem ser desmembradas em diversas práticas e modelos de colaboração com diferentes atores. A busca de fontes externas de inovação pode ocorrer, por exemplo, pelo estabelecimento de parcerias em P&D ao longo das diferentes fases desse processo; pelo monitoramento e envolvimento de clientes e usuários no processo de inovação; pela compra de tecnologias externas (patenteadas ou não) ou aquisição de outras empresas, notadamente start-ups, ou pelo investimento (capital de risco corporativo) em empresas com tecnologias promissoras ou com potencial de gerá- las. a comercialização de tecnologias próprias pode ocorrer pela geração de um novo modelo de negócio; pelo licenciamento da propriedade intelectual para outras empresas ou pela criação de uma nova empresa, seja um spin-off próprio, seja uma joint venture.

Van de Vrande, Lemmens e Vanhaverbeke (2006) ressaltam que as parcerias para a inovação aberta podem ocorrer em vários formatos, dependendo do objetivo que a empresa pretende atingir e também do nível de risco e do comprometimento que se pretende assumir. Fusões e aquisições, por envolverem um grande número de pessoas e um grande volume de recursos, são altamente irreversíveis e acarretam um alto nível de comprometimento das empresas envolvidas na transação. Por outro lado, iniciativas de capital de risco corporativo demandam um baixo nível de comprometimento da empresa investidora, que envolvem relativamente poucos recursos e pessoas e, também, são facilmente reversíveis, que a empresa investidora pode desfazer-se de suas cotas, em princípio, a qualquer momento.

Em uma posição mais intermediária estão as parcerias focadas em inovação, as quais podem ser definidas como um arranjo firmado entre dois ou mais parceiros (empresa, ICT, fornecedores, clientes etc.) que envolve esforços conjuntos de criação, compartilhamento ou codesenvolvimento de produtos, inovações, tecnologias ou serviços, porém sempre mantendo as identidades individuais, conforme enfatizado no modelo da tríplice hélice de Etzkowitz e Leydesdorff (2000).

Para Ferro (2010), é importante terem mente que uma em--presa não precisa adotar to das as iniciativas possíveis simultaneamente, pois o mais importante é a existência de áreas internas estruturadas e munidas de pessoal qualificado e de processos formalizados para monitorar, identificar e viabilizar o aproveitamento de oportunidades, quando considerada oportuna e viável a inovação aberta. Além disso, como destacado por Dodgson, Gann e Salter (2006), um dos maiores desafios na implementação da inovação aberta está na adaptação da cultura da empresa. Também é de grande importância a manutenção de um P&D interno estável e contínuo, assim como um nível elevado de capacidade técnica das pessoas envolvidas nas atividades internas e externas de P&D (XIA e ROPER, 2008). Finalmente, são necessárias novas estruturas organizacionais, processo e rotinas internas.

Nesse contexto, Chiaroni, Chiesa e Frattini (2010) argumentam que a adoção de uma estratégia de inovação aberta demanda novas ações sistematizadas e novas competências em atividades colaborativas, por meio de processos e rotinas dentro da empresa. Ferro (2010) também enfatiza que o sucesso de uma estratégia de inovação aberta baseia-se no desenvolvimento de determinadas competências e recursos. Esse processo de desenvolvimento passa pela identificação das principais fontes de inovação para a empresa, capazes de trazer vantagens competitivas sustentáveis. Em seguida, a empresa deve dedicar-se ao entendimento das particularidades e dinâmica de funcionamento das atividades desenvolvidas por essas fontes e, a partir dessa análise, delinear critérios de seleção dessas diferentes fontes e diretrizes para sua atração e para o estabelecimento e a condução de relações de parceria com cada tipo de fonte.

Além disso, são necessários esforços na definição de processos e métricas de avaliação e de internalização da aprendizagem decorrente dessas parcerias. A partir desse ponto, será possível dizer que a empresa desenvolveu suas capacidades relacionais de modo a estar apta para estabelecer rotinas de interação com cada um desses grupos e, se necessário, criar ferramentas para facilitar o acesso a cada um deles.

Para finalizar as discussões sobre inovação aberta, é relevante citar que as empresas terão, cada vez mais, de avaliar a possibilidade de inovar aberta e cooperativamente ao definirem suas estratégias de inovação, uma vez que o atual paradigma da inovação converge não para a geração de produtos e processos inovadores, mas também para a criação e renovação dinâmica de soluções e modelos de negócio inovadores, mediante o uso e compartilhamento de ideias que estão dispersas mundialmente. O desafio concentra-se em gerenciar a capacidade relacional, envolvendo não as atividades de criação, compartilhamento e comercialização de conhecimentos e tecnologias na matriz e/ou nas subsidiárias, mas refere-se também às relações de cooperação estabelecidas com fontes externas de tecnologia dispersas globalmente.

2.2. Processos e estratégias de internacionalização Tradicionalmente, as teorias de internacionalização são classificadas em critérios econômicos e na evolução comportamental. Na corrente econômica, pode- se citar como exemplo o paradigma eclético e, na corrente comportamental, cabe destacar o modelo de Uppsala, a perspectiva de redes e o empreendedorismo internacional (MACHADO, 2009). Em um esforço de sintetizar essas correntes teóricas, Dib e Carneiro (2006) apresentam um conjunto de questões básicas: Por quê? O quê? Quando? Onde? Como? (quadro_1).

Quadro 1 Questões Básicas do Processo de Internacionalização Fonte: Dib e Carneiro (2006).

Além das correntes teóricas dos processos de internacionalização, cabe discutir as diferentes estratégias de internacionalização que podem ser adotadas pelas corporações multinacionais. Nesse contexto, Barlett e Ghoshal (1992; 2000) classificam as organizações em quatro categorias: multidoméstica, global, internacional e transnacional (quadro_2).

Quadro 2 Estratégias de Corporações Multinacionais [/img/revistas/rausp/v48n1/11q02.jpg] Fonte: Barlett e Ghoshal (1992; 2000).

Cabe ressaltar que, na atualidade, muitas empresas, especialmente as que dependem de inovação para competir, consideram a busca por conhecimento e inovação o principal motivo estratégico para atuarem fora de seus países de origem. Doz, Santos e Williamson (2001), em sua abordagem da companhia metanacional, afirmam que uma empresa proveniente de um país que não é detentor de capital ou de indústrias líderes, pode aparentar estar em um ambiente inapropriado para entrar na competição global. No entanto, segundo os autores, em razão de o conhecimento que necessitam para competir globalmente não estar disponível no país de origem, essas empresas têm de desenvolver competências para prospectar, obter e operacionalizar tecnologias e conhecimentos de mercado no exterior, o que se mostra uma oportunidade de aprendizado que pode colocá- las em posição de vantagem.

Contribuindo com o conceito da companhia metanacional, Dunning e Lundan (2008) classificam as multinacionais como sistemas coordenados ou redes que criam atividades de valor, algumas realizadas dentro da hierarquia da empresa, outras a partir de relacionamentos contratuais e sociais. Assim, uma multinacional não deve ser definida apenas pela extensão de suas instalações estrangeiras de produção, mas pela soma total de todas as suas atividades internas e externas que criam valor (DUNNING, 2006; ANDERSSON, FORSGREN e HOLM, 2007). Diante disso, as multinacionais estão mudando suas estruturas para redes abertas e flexíveis, com subsidiárias que criam e compartilham conhecimento em contextos locais e globais (CANTWELL, DUNNING e LUNDAN, 2010). Essa estrutura requer da multinacional a disseminação e a institucionalização da gestão das relações de cooperação e a criação e integração contínua dos conhecimentos desenvolvidos na matriz, nas subsidiárias e nas parcerias em contextos locais e globais (MUDAMBI, 2008; GNYAWALI, SINGAL e MU, 2009; DUNNING e LUNDAN, 2010).

Quanto às estratégias de suporte ao desenvolvimento de competências nas multinacionais brasileiras, Borini (2008) ressalta a importância da autonomia e integração para as subsidiárias no modelo multidoméstico e global. O modelo transnacional tanto chama a atenção das iniciativas das subsidiá-rias que podem ser decorrentes da orientação empreendedora propagada pelas diretrizes corporativas, como também acaba por incentivar as iniciativas próprias da subsidiária essenciais para a criação de competências. O modelo metanacional, por sua vez, chama a atenção para o local de atuação das subsidiárias, em especial sua inserção nas redes estrangeiras, e a importância máxima das iniciativas das subsidiárias, conjugadas com a ausência de uma soberania central da matriz na estrutura da rede interna (quadro_3).

Quadro 3 Estratégias de Multinacionais e seus Elementos Estruturais [/img/revistas/rausp/v48n1/11q03.jpg] Fonte: Borini (2008).

Apesar da diversidade de formas, estruturas e estratégias de constituição, manutenção e coordenação dos negócios internacionais, é importante frisar que, na prática, uma série de combinações possíveis e que a escolha do modelo estratégico e estrutural de internacionalização a ser adotado por uma empresa dependerá, dentre inúmeros fatores, da estratégia de inovação adotada, do contexto, da história e das características particulares da empresa e de seu setor de atuação. Mesmo diante dessa diversidade e complexidade, é fato inquestionável que o estudo das multinacionais é algo extremamente relevante, pois essas empresas têm ocupado espaço cada vez maior no âmbito do processo de globalização da economia (ALTMANN, 2005).

Deve-se destacar que as empresas brasileiras, na medida do possível, também se inseriram no movimento da internacionalização, inicialmente muito mais como estratégias defensivas e compensatórias do que como opções conscientes e intencionais de desenvolvimento empresarial. A internacionalização como foco estratégico surgiu em um estágio posterior (CYRINO e BARCELLOS, 2006; ALMEIDA, 2007).

Muitas das empresas brasileiras presentes em diversos países estão se beneficiando do processo de internacionalização, pois obtiveram ganhos de escala e de escopo, de eficiência e de aprendizagem com a internacionalização, e conseguiram incorporar as vantagens obtidas a suas operações domésticas. No entanto, à medida que se internacionalizaram, as empresas brasileiras depararam-se com custos e com situações inesperadas, que dificultaram, ou mesmo inviabilizaram os ganhos auferidos no exterior. No balanço entre benefícios, custos e riscos, observa-se que ainda um longo caminho de aprendizagem para que as multinacionais brasileiras ingressem no rol das transnacionais do mundo desenvolvido.

Portanto, os principais desafios para as multinacionais brasileiras estão na construção de plataformas potencializadoras do processo de aprendizagem, na reestruturação dos modelos de governança e gestão, no treinamento de talentos para a internacionalização mediante processos de expatriação, na busca de maior integração entre operações internacionais, na adaptação dos modelos de negócios internacionais, na ampliação dos retornos financeiros do capital empregado e, por fim, no aproveitamento dos conhecimentos que estão dispersos globalmente (ALTMANN, 2005; CYRINO e BARCELLOS, 2006; ALMEIDA, 2007).

Sendo assim, o sucesso futuro não das multinacionais emergentes como das tradicionais dependerá cada vez mais da capacidade de acessar o conhecimento fora das subsidiárias e da matriz e de juntá-lo às capacidades de suas redes globais de operação e de cooperação tecnológica. Isso permitirá que essas empresas criem produtos, serviços e processos inovadores, necessários para vender em mercados do mundo inteiro. Essa construção exigirá de cada uma dessas organizações a intensa melhora da capacidade de organizar o conhecimento que se encontra inutilizado em sua vasta rede de subsidiárias e parceiros tecnológicos, tais como ICT. Ao perceber e mobilizar conhecimentos dispersos globalmente, as empresas poderão inovar de forma mais eficaz e com resultados superiores aos de seus rivais que continuam presos à própria nacionalidade.

Assim, as multinacionais prosperarão por valorizar as diferenças geográficas e culturais e o fato de procurarem em escala global o conhecimento permitirá que criem, potencialmente, novas e melhores capacidades dinâmicas para a inovação e a internacionalização.

2.3. Internacionalização de P&D Atualmente, uma intrincada rede de cooperação internacional na corrida tecnológica, da qual participam não empresas, mas também universidades, institutos de pesquisa e, sobretudo, governos de diversos países; o fenômeno que se observa é o da internacionalização de P&D (PATEL e PAVITT, 1998).

Estudos recentes enfatizam que a internacionalização de P&D vem gradualmente evoluindo e atualmente constitui um fator-chave para o realce do potencial inovador de uma empresa. Assim, grande parte das atividades internacionais de P&D é hoje direcionada por deliberações estratégicas organizacionais (CHIESA, 1995; REDDY, 1997; PATEL e PAVITT, 1998; EDLER, KRAHMER e REGER, 2002).

São inúmeras as razões que justificam a evolução estratégica dos processos de internacionalização do P&D. Inicialmente, pode-se citar a dinamicidade das tecnologias atuais, uma vez que o acelerado progresso técnico, a crescente especialização das atividades de P&D e a divisão internacional do trabalho geraram uma crescente e dinâmica variedade de novos conhecimentos e de tecnologias. Essa dinamicidade acabou formando um reservatório de C&T ao redor do mundo, o que potencializou o desdobramento dos recursos de P&D em escala global. Em segundo lugar, a inovação está se tornando cada vez mais sistêmica, isto é, resultado da integração de diferentes disciplinas tecnológicas, com isso as companhias são forçadas a alcançar fontes externas para adquirir o conhecimento técnico não disponível internamente. Em terceiro lugar, as empresas são pressionadas a encurtar o tempo de aprendizado do mercado o que acaba motivando a descentralização de P&D, dado que esse processo permite à empresa acelerar seu processo de aprendizagem técnica e analisar as necessidades dos clientes internacionais (CHIESA, 1995).

No que se refere às estruturas internacionais de P&D, nota-se na literatura a prevalência de classificações baseadas no estilo de divisão de tarefas e, genericamente, podem ser nomeadas de: estruturas centralizadas, nas quais o desenvolvimento de produtos e processos é realizado por algumas unidades centrais, geralmente centros de excelência, com ou sem a participação de subsidiárias da companhia; e estruturas descentralizadas, nas quais o desenvolvimento de produtos e processos é realizado pela atuação conjunta da matriz da companhia, de suas subsidiárias e de centros de pesquisa (REDDY, 1997; CHIESA, 2000).

Gassmann e Zedtwitz (1999) listam uma série de fatores que favorecem a centralização das atividades de P&D, tais como economias de escala em equipamentos e recursos humanos, aceleração do desenvolvimento de produtos, redução do risco de duplicação de esforços e visão integrada das atividades de P&D. Como fatores positivos à descentralização, os autores destacam a possibilidade de acessar um maior número de fontes de conhecimento e tecnologia, o estabelecimento de uma vigilância mais acirrada tanto dos clientes quanto dos concorrentes, a oferta de suporte de P&D para as subsidiárias, a possibilidade de a empresa beneficiar-se de políticas de fomento à inovação em outros países e o acesso a profissionais estrangeiros altamente qualificados. A adoção de estruturas centralizadas ou descentralizadas está diretamente associada ao tipo de P&D que a empresa pretende executar e à interação das unidades de P&D com a matriz, com as subsidiárias e com os sistemas internacionais de ciência e tecnologia (C&T).

Zedtwitz e Gassmann (2002) também relatam uma tendência de migração de estruturas mais centralizadas para estruturas mais complexas até alcançarem redes de P&D que desenvolvem atividades integradas, mas sem a necessidade de integração física. Nesse caso, argumentam os autores, pressões de foco e de redução de custos tendem a forçar companhias com uma rede integrada de P&D a concentrarem-se em um pequeno número de centros de pesquisa líderes, com a volta da centralização da decisão em alguns centros de competências. Os motivos dessa consolidação são a melhor exploração dos efeitos de escala, a coordenação mais fácil de atividades dispersas mundialmente, a redução do montante de P&D paralelo e a intensificação da transferência de tecnologia dentro da rede através das fronteiras.

Resultado de uma extensa pesquisa envolvendo 81 empresas industriais de tecnologia intensiva, em que se identificaram 1.021 locais de P&D, foram observados dois principais direcionadores que seriam responsáveis pelo processo natural de P&D: aspectos de ciência e tecnologia externa e de novos mercados. A seguir é apresentada a proposta de Zedtwitz e Gassmann (2002) para a internacionalização de P&D (quadro_4).

Quadro 4 Estruturas Organizacionais da Internacionalização de P&D [/img/revistas/rausp/v48n1/11q04.jpg] Fonte: Adaptado de Zedtwitz e Gassmann (2002).

Corroborando a tipologia de Zedtwitz e Gassmann (2002), Chiesa (2000) descreve duas categorias principais para as estruturas globais de P&D, cujas especificidades são apresentadas no quadro_5.

Quadro 5 Estruturas Globais de P&D [/img/revistas/rausp/v48n1/11q05.jpg] Fonte: Adaptado de Chiesa (2000).

Sobre a internacionalização das atividades de P&D nas multinacionais brasileiras, Porto, Galina e Costa (2010) relatam que incorporar efetivamente o modelo de inovação aberta e paralelamente enfrentar a concorrência internacional são tarefas complexas para as multinacionais de países que buscam o desenvolvimento como o Brasil. Assim, todas as formas de geração de sinergias para superar os desafios tecnológicos são positivas. São exemplos notáveis a cooperação dos setores produtivos com fontes nacionais e internacionais de inovação e a internacionalização das atividades internas de P&D. Os autores também retratam o atual momento da evolução da gestão de P&D nas multinacionais brasileiras (sem a pretensão de apresentar conclusões definitivas), cujos principais pontos podem ser assim sintetizados: Internacionalização de P&D por fatores de demanda, ou seja, pela necessidade de adaptar produtos aos mercados no exterior ou por regulamentações exigidas nos países / regiões de destino.

Internacionalização de P&D por fatores tecnológicos, ou seja, pelo acesso facilitado a recursos específicos utilizados no desenvolvimento tecnológico localizado no exterior.

Aquisição de unidades de P&D no exterior como estratégia de internacionalização.

Estabelecimento de parcerias como forma de internacionalização de P&D, utilizando as universidades e os institutos de pesquisa internacionais como fontes de conhecimento, tecnologia e inovação para o P&D central (normalmente localizado na matriz) e também para as atividades de desenvolvimento e customização das subsidiárias.

Estruturação incipiente das atividades cooperativas em grande parte das multinacionais brasileiras estudadas, revelando a necessidade de acompanhamento contínuo e articulado das atividades cooperativas realizadas nas subsidiárias.

Gestão incipiente das parcerias tecnológicas em grande parte das multinacionais brasileiras estudadas, evidenciando a necessidade de elaboração de um modelo de gestão formal e flexível para as parcerias estabelecidas na matriz e/ou nas subsidiárias.

Busca da consolidação de P&D internacional por meio da integração das unidades de P&D dispersas geograficamente, de maneira a torná-las parceiras produtivas dentro da rede de P&D local e global da empresa.

Por fim, é importante frisar que a estruturação organizacional de P&D global não é algo rígido, compreendido uniformemente durante todos os ciclos de P&D, mas trata-se de um processo dinâmico que está sujeito a mudanças contínuas. Na percepção de Zedtwitz e Gassmann (2002), essas mudanças podem ser formalizadas em cinco tendências: a orientação dos processos de P&D para mercados internacionais e centros de conhecimento; o estabelecimento de tecnologia que é firmemente coordenada; o aumento da autonomia e da autoridade dos centros de P&D estrangeiros; a integração expressiva das unidades de P&D descentralizadas; e o aumento da coordenação e das atividades de P&D e uma nova centralização dessas atividades em poucos centros de pesquisa, cujo foco central é a melhoria da eficiência global. É importante ressaltar que o movimento de globalização de P&D é uma incrível oportunidade de aprender, sendo o acesso a conhecimentos e tecnologias internacionais o aspecto-chave do processo de internacionalização da pesquisa e do desenvolvimento.

3. METODOLOGIA DE PESQUISA A pesquisa foi qualitativa e assumiu natureza descritiva. Segundo Richardson (1999), a pesquisa qualitativa é caracterizada como uma tentativa de compreensão detalhada dos significados e das características situacionais apresentadas pelos entrevistados, em lugar de produção de medidas quantitativas de características ou comportamentos.

O método utilizado na pesquisa foi o estudo de múltiplos casos. Para Martins (2006), o método estudo de caso é uma investigação empírica que pesquisa fenômenos dentro de seu contexto real (pesquisa naturalística), em que o pesquisador não tem controle sobre eventos e variáveis, buscando apreender a totalidade de uma situação e, criativamente, descrever, compreender e interpretar a complexidade de um objeto delimitado. Assim, o estudo de caso contribui, de forma satisfatória, na condução dos estudos investigativos.

A escolha das companhias estudadas foi definida de acordo com quatro critérios: as companhias deveriam realizar atividades industriais de extração ou de transformação; deveriam ser brasileiras ou possuir um histórico brasileiro expressivo; ter unidades produtivas no exterior; e teriam de possuir parcerias tecnológicas com fontes externas de tecnologia, tais como universidades e institutos de pesquisa nacionais e/ou internacionais.

A partir desses critérios, identificaram-se, por conveniência, três casos atrativos - Embraco, Tigre e WEG - , que foram alvo de entrevistas em profundidade presenciais e por skype. Cabe ressaltar que, das três empresas selecionadas, apenas a Embraco não é efetivamente brasileira, pois em 1997 a norte-americana Whirpool assumiu seu controle acionário. No entanto, a referida empresa foi mantida no estudo devido a seu expressivo histórico brasileiro, uma vez que o início e o desenvolvimento de suas parcerias tecnológicas com universidades e institutos de pesquisa (iniciadas na década de 1980) e de seu processo de internacionalização (iniciado em 1990) ocorreram antes de sua aquisição.

Foram utilizados nesta pesquisa dados primários e secundários e para interpretá-los utilizou-se análise documental e de conteúdo. Os primários foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas e questionários; os secundários foram obtidos em relatórios e documentos organizacionais e também em fontes secundárias de evidência, como jornais, periódicos, anais de congresso e nos sites das organizações estudadas.

4. RESULTADOS E DISCUSSÕES 4.1. Caracterização das multinacionais brasileiras estudadas Fundada em 1971, na cidade de Joinville, a Embraco começou a produzir em 1975 com o objetivo inicial de suprir as necessidades da indústria brasileira de compressores. Nesse período, sua capacidade de produção era de um milhão de unidades por ano e em 1977 são iniciadas atividades de exportação para a América Latina. Em 1981, inicia-se o desenvolvimento de tecnologia própria em parceria com universidades e centros de pesquisa. Em 2000, é alcançada a produção de 200 milhões de unidades e, no ano seguinte, a companhia ganha o prêmio Nacional de Inovação Tecnológica da Finep - Categoria Média e Grande Empresa. Em 2006, a empresa é adquirida por um grupo empresarial estrangeiro; entretanto, continua a operar de forma estruturalmente independente, dada a peculiaridade de seus negócios. Atualmente, possui unidades produtivas no Brasil, nos Estados Unidos, na Itália, na Eslováquia e na China. A empresa emprega 10.416 colaboradores, 6.147 no Brasil, 54 nos Estados Unidos, 908 na Itália, 2.100 na Eslováquia e 1.207 na China. Estima-se que seu market share mundial seja de 20%, cuja distribuição assume a seguinte ordenação: 47% da América do Sul, 45% da América do Norte, 15% da Europa e 6% da Ásia.

A Tigre iniciou suas operações, na cidade de Joinville, em 1941, com uma fábrica de pentes e cachimbos. Alguns anos depois, com a disseminação do plástico, a empresa começou a utilizar essa nova matéria-prima na fabricação de pentes, piteiras, copos, pratos, brinquedos e leques. No fim dos anos 1950, resolveu investir em um novo projeto: usar o PVC para fabricar tubos e conexões para serem usados em instalações hidráulicas. No final da década de 1970, a empresa iniciou seu processo de internacionalização adquirindo fábricas no exterior e solidificando suas bases de exportação. Atualmente detém 60% do mercado nacional de tubos e conexões de PVC. Sua matriz está localizada em Joinville (Santa Catarina/Brasil), a Tigre possui cinco unidades produtivas no Brasil, duas na Bolívia, uma no Paraguai, uma na Argentina, uma no Chile e uma nos Estados Unidos, e conta com aproximadamente 4.000 funcionários, sendo 3.500 no Brasil e 500 nas unidades do exterior.

Com um capital inicial equivalente a três fuscas, a WEG foi fundada em 1961, em Jaraguá do Sul, e iniciou suas atividades contando com apenas nove funcionários e três sócios, um eletricista, um administrador e um mecânico. Depois de 46 anos de existência e um longo aprendizado tecnológico, a empresa, com capital totalmente nacional, é uma das cinco maiores fabricantes de motores elétricos do mundo e uma das líderes em tecnologia em seu setor. Hoje a empresa realiza exportação para mais de 100 países, e sua matriz está localizada em Jaraguá do Sul (Santa Catarina/Brasil). A WEG possui 11 parques fabris no Brasil, três unidades produtivas na Argentina, uma no México, uma em Portugal e uma na China, e conta com 18 mil colaboradores, dois mil no exterior e 16 mil no Brasil.

Com relação à estrutura de P&D das multinacionais estudadas, constatou-se que, na Embraco, 426 colaboradores trabalham em atividades de P&D (243 no Brasil, dois nos Estados Unidos, 39 na Itália, 73 na Eslováquia e 69 na China).

A estrutura física da área de P&D é constituída por 37 laboratórios: 13 deles no Brasil, um nos Estados Unidos, oito na Itália, nove na Eslováquia e seis na China. duas décadas, a empresa investe de 2% a 3% de sua receita líquida anual em P&D, o mesmo percentual registrado pelos maiores nomes do setor de máquinas e equipamentos elétricos dos Estados Unidos. Na WEG, 1.739 colaboradores atuam em P&D ; a empresa possui um centro tecnológico na matriz, um centro de desenvolvimento na unidade de Portugal e também conta com os departamentos de engenharia de suas subsidiárias; seus investimentos em P&D equivalem a 3,5% do faturamento bruto anual. Na Tigre, 83 colaboradores atuam em P&D, a empresa possui um departamento de P&D na matriz e seus investimentos em P&D equivalem a 0,9% do faturamento bruto anual.

4.2. Internacionalização produtiva e de P&D: os casos Embraco, Tigre e WEG A forma de entrada para a produção internacional nas multinacionais estudadas (Embraco, Tigre e WEG) foi predominantemente a aquisição. A Embraco e a Tigre utilizaram mais de uma estratégia para a internacionalização produtiva, enquanto a WEG adotou um único tipo de estratégia. Os fatores logísticos, mercadológicos, alfandegários e de localização foram os motivadores centrais da internacionalização produtiva da Ti--gre. Além desses, a Embraco e a WEG consideram superficialmente a questão tecnológica e científica no que tange às decisões de internacionalização.

Com relação à internacionalização de P&D, verificou-se que os fatores de demanda, incluindo a necessidade de alcançar mercados, oferecer suporte técnico às subsidiárias, formular respostas rápidas ante as necessidades dos mercados internacionais e a fidelização do relacionamento com clientes estrangeiros, influenciam a decisão das multinacionais estudadas de internacionalizar P&D. Fatores tecnológicos, como acesso a tecnologias e conhecimentos internacionais, seleção de talentos estrangeiros e estabelecimento de parcerias tecnológicas com universidade e institutos de pesquisa estrangeiros, não são fortemente considerados por essas empresas no que tange à decisão de internacionalizar as atividades de P&D.

Apenas a Tigre centraliza totalmente na matriz as atividades e as decisões relacionadas a P&D. A WEG, apesar de manter atividades de desenvolvimento em sua unidade de Portugal para atender às exigências técnicas de determinada linha de produtos, adota uma postura predominantemente centralizadora, pois suas atividades de P&D são realizadas predominantemente na matriz e apenas atividades de engenharia e customização são realizadas nas subsidiárias. a Embraco assume uma postura intermediária, centralizando na matriz a pesquisa de tecnologias dominadas e não dominadas e o desenvolvimento de tecnologias não dominadas, e descentralizando entre as subsidiárias o desenvolvimento de tecnologias dominadas. Cabe ressaltar que todas essas empresas efetuaram desenvolvimento de processo no exterior para modernizar e nivelar a produção das subsidiárias.

A Embraco e a WEG possuem um direcionamento estratégico arrojado no que tange à inovação, uma grande preo-cupação por parte dessas empresas com relação à liderança tecnológica e ao desenvolvimento contínuo de produtos inovadores. a inovação na Tigre apresenta um foco estratégico mais restrito, estando vinculado basicamente à realização de benchmarking tecnológico e à observação das tendências do mercado.

Nas empresas estudadas, os conhecimentos são predomi-nantemente criados pelos centros de P&D e por meio de par-cerias tecnológicas, depois são revertidos em tecnologias de produtos e processos e, finalmente, são disseminados pelas unidades produtivas. Cabe ressaltar que os conhecimentos relacionados ao desenvolvimento de processo são criados e disseminados pelas unidades produtivas das multinacionais de forma mais pulverizada, enquanto os conhecimentos relacionados ao desenvolvimento de produto se encontram concentrados ou na matriz ou em alguns centros específicos de P&D.

Com relação ao processo de inovação, nota-se que nas empresas Embraco e WEG a inovação ocorre de forma dinâmica, sendo continuamente influenciada pelas evoluções mercadológicas, tecnológicas e científicas. Nesse caso, tem-se um processo de inovação interativo e mais aberto, em que atividades internas e externas de P&D corroboram para a execução dinâmica das etapas de pesquisa, desenvolvimento, engenharia, customização, produção e comercialização. o processo de inovação da Tigre é predominantemente linear, sofre intensa influência do mercado e é constituído por estágios que envolvem sequencialmente pesquisa e desenvolvimento, resultando em produtos e processos comercializáveis.

Nos casos da Embraco, da Tigre e da WEG, a decisão de estabelecer parcerias é centralizada na matriz. Deve-se também destacar que as parcerias da Embraco e da WEG envolvem pesquisa, desenvolvimento, monitoramento tecnológico, qua- lificação profissional e serviços técnicos, que resultam em conhecimentos e novos conceitos de produtos e de processos. As parcerias da Tigre estão associadas a serviços técnicos, testes, ensaios, desenvolvimento de protótipos e projetos pontuais de pesquisa, que resultam em conhecimentos e informações para a inovação.

Para cooperar, a Embraco e a WEG adotam mecanismos formais, como programas de pesquisa, consórcios, serviços contratados, acordos pontuais e parcerias interlaboratoriais. A Tigre utiliza convênios, acordos pontuais e serviços contratados como mecanismos de cooperação. As unidades da Embraco e da WEG possuem autonomia para gerenciar as parcerias mediante a monitoração da matriz e as subsidiárias destas empresas realizam apenas projetos pontuais de cooperação. as atividades cooperativas da Tigre estão totalmente vinculadas à matriz, uma vez que suas subsidiárias não efetuam parcerias tecnológicas.

Por fim, cabe ressaltar que as multinacionais estudadas estão inseridas em redes globais de conhecimentos basicamente constituídas pelas unidades produtivas (matriz e subsidiárias) e pelos parceiros tecnológicos nacionais e internacionais. Nas redes de conhecimento da Embraco, da Tigre e da WEG, os conhecimentos criados nas atividades internas e externas de P&D são canalizados para a matriz que posteriormente os dissemina na forma de tecnologias de produto e processo para as subsidiárias. O fluxo inverso é pouco expressivo. É importante ressaltar que, das multinacionais estudadas, a Tigre é a única que possui parceiros tecnológicos exclusivamente nacionais, as demais empresas possuem parcerias tecnológicas internacionais.

4.3. Tipologia para a internacionalização de P&D interno e externo nas multinacionais brasileiras A partir da convergência das discussões teóricas apresentadas e considerando as análises qualitativas dos casos da Embraco, da Tigre e da WEG, foram propostas três estruturas para a internacionalização das atividades internas e externas de P&D: a embrionária (figura_1), a intermediária (figura_2) e a madura (figura_3). Foram utilizados de forma adaptativa nessa proposição os seguintes elementos: as motivações e as formas de entrada para a produção internacional; o foco estratégico de P&D ; a localização e a coordenação das atividades de P&D ; o processo de inovação; a arquitetura da rede de conhecimento; a decisão de cooperar; e a coordenação das parcerias nas subsidiárias.

[/img/revistas/rausp/v48n1/11f01.jpg] Legenda: Sub = Subsidiária; Un = Universidades nacionais; IPn = Institutos de Pesquisa nacionais; P&D/c = Pesquisa e Desenvolvimento centralizados Figura 1: Estrutura Embrionária para a Internacionalização das Atividades Internas e Externas de P&D

[/img/revistas/rausp/v48n1/11f02.jpg] Legenda: Sub = Subsidiária; Un = Universidades nacionais; Ui = Universidades internacionais; IPn = Institutos de Pesquisa nacionais; IPi = Institutos de Pesquisa internacionais; P&D/dsc = Pesquisa e Desenvolvimento descentralizados sem coordenação global.

Figura 2: Estrutura Intermediária para a Internacionalização das Atividades Internas e Externas de P&D

[/img/revistas/rausp/v48n1/11f03.jpg] Legenda: Sub = Subsidiária; Un = Universidades nacionais; Ui = Universidades Internacionais; IPn = Institutos de Pesquisa nacionais; IPi = Institutos de Pesquisa internacionais; OE = Outras Empresas; IFG = Instituições Financeiras e Governamentais; P&D/dcc = Pesquisa e Desenvolvimento descentralizados com coordenação global.

Figura 3: Estrutura Madura para a Internacionalização das Atividades Internas e Externas de P&D

Na estrutura embrionária são estabelecidas joint ventures no exterior e fatores mercadológicos e logísticos motivam a internacionalização produtiva. As decisões e atividades de P&D estão totalmente centralizadas na matriz e a estratégia de inovação fundamental é a realização de benchmarking tecnológico e acompanhamento das tendências do mercado. O processo de inovação neste estágio é linear e não sistemático, no qual os conhecimentos e tecnologias disponíveis no mercado são replicados e/ou adaptados internamente para solucionar um problema técnico ou por pressão externa, gerando pontualmente inovações de produtos e processo. As parcerias tecnológicas normalmente não geram resultados inovadores, passíveis de patenteamento. As subsidiárias não efetuam parcerias tecnológicas, normalmente todas as atividades cooperativas estão centralizadas na matriz. Os conhecimentos são criados na matriz e repassados às unidades produtivas em forma de tecnologias de produtos e processos, o fluxo oposto é inexistente e somente parcerias tecnológicas nacionais são estabelecidas (figura_1).

Na estrutura intermediária, empresas são adquiridas no exterior, o acesso é facilitado a componentes importados utilizados nas atividades de P&D e o atendimento às especificações técnicas internacionais passam a motivar a internacionalização produtiva. As decisões e atividades de P&D estão centralizadas na matriz ou em algumas unidades específicas. Em alguns casos, as subsidiárias possuem autonomia para realizar desenvolvimento e customizações. A estratégia de inovação prevalente é a diferenciação tecnológica e o desenvolvimento de produtos e processos. Neste estágio, o processo de inovação é misto e fechado, trata-se de uma sequência lógica, mas não necessariamente contínua, cujas informações indutoras da inovação surgem do monitoramento do mercado, da ciência e da tecnologia e as fases de conceito, desenvolvimento e comercialização são processadas dinamicamente mediante o contato das áreas da empresa envolvidas no processo de inovação, resultando tanto em inovações de produtos e processo quanto em inovações organizacionais.

A decisão de cooperar é descentralizada na estrutura intermediária, não um monitoramento global das parcerias e as atividades externas apenas incrementam as atividades internas de P&D. As subsidiárias possuem autonomia para gerenciar as parcerias e, normalmente, a matriz estabelece programas de pesquisa e consórcios; as subsidiárias realizam apenas projetos pontuais, e ainda casos em que matriz e subsidiárias realizam somente projetos cooperativos pontuais. Os conhecimentos são criados predominantemente na matriz e disseminados pelas unidades produtivas continuamente em forma de tecnologia de produtos e processos, o fluxo oposto é inexpressivo, e parcerias tecnológicas nacionais e internacionais são estabelecidas. casos em que não é possível mapear os fluxos globais de conhecimento, uma vez as empresas do estágio intermediário normalmente não gerenciam formalmente as trocas globais de conhecimento e não efetuam um monitoramento formal das parcerias tecnológicas internacionais (figura_2).

na estrutura madura, plantas próprias são construídas no exterior, fatores tecnológicos passam a motivar a internacionalização produtiva e as decisões e atividades de P&D estão descentralizadas mediante uma coordenação global. A estratégia de inovação imperativa é a busca da liderança tecnológica e o desenvolvimento sistemático de soluções inovadoras, como produtos e processos novos ou adaptados, novas práticas organizacionais e surgimento de novos negócios. O processo de inovação é interativo e aberto, ou seja, interações dinâmicas ocorrem no interior das empresas, entre as empresas individuais e com instituições científicas e tecnológicas (ICT), mediante suporte legal e de capital de instituições financeiras e governamentais (IFG), lembrando que o estado corrente da ciência, da tecnologia e do mercado permeiam as fases de conceito, desenvolvimento e comercialização da inovação.

A decisão de cooperar é descentralizada na estrutura madura e as atividades internas e externas de P&D estão estrategicamente alinhadas. As subsidiárias possuem autonomia para gerenciar as parcerias e um monitoramento dessas parcerias por parte da matriz. Tanto a matriz quanto as subsidiárias realizam programas de pesquisa, consórcios, programas de monitoramento tecnológico, projetos pontuais de cooperação, programas de qualificação profissional e prestação de serviços técnicos. Redes globais são estruturadas para promover a criação e a disseminação, contínua e interativa, de conhecimentos pelas unidades produtivas, também parcerias tecnológicas nacionais e internacionais nesses arranjos e seus fluxos de conhecimento são multidirecionais (figura_3).

Além dessas estruturas, existem, na prática, inúmeras variações quanto às estratégias e ações que realmente são consideradas e incorporadas. Portanto, a pretensão não é sugerir condições ideais à inovação nas multinacionais brasileiras, se é que isso é possível e viável, mas sim oferecer indicativos que possam caracterizar o atual estágio de inovação dessas empresas e, ao mesmo tempo, sugerir caminhos que poderão conduzi-las a um estágio futuro mais robusto em termos de inovação. Outro ponto relevante é que muitas multinacionais não necessariamente deverão incorporar prontamente, total ou parcialmente, os preceitos da estrutura madura, pois a estrutura intermediária e até mesmo a embrionária serão suficientes para suprir suas necessidades momentâneas. O desafio, portanto, será caracterizar a estrutura vigente e, posteriormente, ajustá-la dinamicamente às mudanças do ambiente externo e interno, o que poderá exigir mudanças meramente pontuais ou a busca exaustiva por estruturas mais robustas.

4.4. Análise das multinacionais brasileiras ante a tipologia apresentada A seguir são sumarizadas genericamente, no quadro_6, as estratégias e estruturas de internacionalização de P&D interno e externo das multinacionais estudadas considerando-se a tipologia apresentada anteriormente.

Quadro 6 Estruturas Embrionária, Intermediária e Madura e as Multinacionais Brasileiras (MB) [/img/revistas/rausp/v48n1/11q06.jpg]

Com base na figura_4, concluiu-se que a internacionalização produtiva e de P&D interno da Embraco e da WEG oscila entre as estruturas intermediária e madura; no caso da Tigre, estrutura embrionária é prevalente. Para a internacionalização de P&D externo, a Embraco e a WEG estão entre as estruturas embrionária e intermediária, enquanto a Tigre está predominantemente situada na estrutura embrionária (figura_5).

[/img/revistas/rausp/v48n1/11f04.jpg] Figura 4: Estruturas para a Internacionalização Produtiva e de P&D Interno e as Multinacionais Brasileiras

[/img/revistas/rausp/v48n1/11f05.jpg] Figura 5: Estruturas para a Internacionalização de P&D Externo e as Multinacionais Brasileiras

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados da pesquisa evidenciaram que as parcerias tecnológicas normalmente incrementam as atividades internas de P&D na Tigre, na Embraco e na WEG essas parcerias são consideradas estratégicas e estão vinculadas às competências tecnológicas centrais. Verificou-se também que a decisão de estabelecer parcerias com universidade e institutos de pesquisa está normalmente centralizada na matriz nos casos da Embraco e da WEG. As subsidiárias dessas empresas possuem autonomia para gerenciar suas parcerias, que normalmente estão associadas a projetos pontuais de adaptação tecnológica, e, por sua vez, as matrizes as monitoram. É importante ressaltar que, das multinacionais estudadas, a Tigre é a única que possui parceiros tecnológicos exclusivamente nacionais. Outro ponto relevante é que as subsidiárias da Tigre não estabelecem parcerias tecnológicas com universidades e institutos de pesquisa, somente sua matriz possui parcerias dessa natureza, o que não se aplica às demais multinacionais estudadas.

Dessa forma, verifica-se a urgência de se prepararem melhor as subsidiárias das multinacionais brasileiras estudadas para que elas próprias possam optar pelas parcerias que melhor se adaptem a suas necessidades tecnológicas internas.

Outro ponto é que as multinacionais estudadas precisam acompanhar contínua e formalmente as atividades cooperativas das subsidiárias, para que os conhecimentos e as tecnologias gerados nessas atividades possam ser aproveitados pelas demais unidades, pois, sem um acompanhamento meticuloso, pode ocorrer duplicidade de esforços cooperativos e não é possível verificar se os resultados dos projetos cooperativos são, de fato, compartilhados pelas unidades produtivas.

As possibilidades estruturais que as multinacionais brasileiras possuem para a internacionalização das atividades internas e externas de P&D são genericamente sintetizadas em três estruturas: a embrionária, a intermediária e a madura. Na estrutura embrionária, o processo de inovação é linear, o P&D é centralizado e a cooperação com fontes externas de conhecimento e tecnologia é incipiente em nível nacional e inexistente em nível internacional. Na estrutura intermediária, o processo de inovação é misto e fechado, o P&D é descentralizado sem coordenação global e a cooperação com fontes externas de conhecimento e tecnologia é emergente em nível nacional e internacional. Na estrutura madura, o processo de inovação é interativo e aberto, o P&D é descentralizado com coordenação global e a cooperação com fontes externas de conhecimento e tecnologia é robusta em nível nacional e internacional. Deve-se mencionar que não existe um padrão rígido e único para a utilização de determinadas estruturas e estratégias para a internacionalização de P&D interno e externo, essas escolhas dependerão da ocasião, dos objetivos de cada empresa e de uma infinidade de variáveis externas, como setor de atuação, perfil dos concorrentes, condições econômicas etc.

Especificamente nos casos analisados, constatou-se que para a internacionalização de P&D interno a Embraco e a WEB transitam entre as estruturas intermediária e madura, para a internacionalização do P&D externo uma oscilação entre as estruturas embrionária e intermediária. No caso específico da Tigre, prevalece a estrutura embrionária para a internacionalização tanto de P&D interno quanto de P&D externo.

Com relação às limitações da presente pesquisa, pode-se citar o fato de as multinacionais estudadas terem sido selecionadas por conveniência e de o estudo ter sido realizado com apenas três empresas brasileiras, o que consequentemente impede a realização de generalizações acerca das conclusões obtidas no trabalho. Quanto às possibilidades de estudos futuros, destaca-se a realização de levantamentos quantitativos sobre as estruturas de internacionalização de P&D interno e externo que foram propostas, envolvendo tanto as multinacionais de economias desenvolvidas como as multinacionais dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul).

Por fim, conclui-se que o fortalecimento das atividades de P&D nas subsidiárias, a intensificação dos acordos internacionais de cooperação tecnológica e um maior intercâmbio de conhecimento e tecnologia entre matriz, subsidiárias e parceiros tecnológicos são ações que devem ser avaliadas pelas multinacionais brasileiras, pois, além dos parceiros tecnológicos e das unidades produtivas no exterior, é também importante construir uma estrutura de P&D robusta e desenvolver produtos e processos efetivamente inovadores.

Assim, surge o desafio de se criarem programas de pesquisa cooperativos mais amplos nos quais inovações possam ser criadas e difundidas de forma interativa em escala global, envolvendo matriz, subsidiárias e parceiros tecnológicos nacionais e internacionais. A articulação estratégica das subsidiárias e a definição de papéis tecnológicos também são pontos de reflexão. É importante avaliar formalmente a vocação tecnológica das subsidiárias e, posteriormente, definir qual será a contribuição de cada uma delas sobre o de-sempenho inovador da multinacional como um todo.


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