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BrBRHUHu0002-05912013000100002

BrBRHUHu0002-05912013000100002

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0002-0591
Year2013
Issue0001
Article number00002

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O comércio negreiro na clandestinidade: as fazendas de recepção de africanos da família Souza Breves e seus cativos

José e Joaquim Breves, irmãos em uma extensa família luso-brasileira, vivenciaram praticamente todo o século XIX. A infância de ambos, no início dos oitocentos, coincidiu temporalmente com a afirmação do império luso-brasileiro; a maturidade com a construção do Império do Brasil; e a velhice com a derrocada do sistema escravista, e consequentemente do Império que ajudaram a construir.

O início, o apogeu e a decadência do Vale cafeeiro também cortaram as suas histórias. Por isso, participaram de importantes momentos da política imperial, embora em lados opostos. Adversários políticos, com perfis de pensamento diferentes, se aproximaram em relação a um aspecto da sociedade oitocentista: o tráfico ilegal de africanos. Ambos investiram nesse comércio até quando puderam, inclusive defendendo politicamente a manutenção do ilícito trato e mantendo fazendas destinadas à recepção de africanos recém-chegados. A defesa do tráfico talvez tenha sido o maior ponto de convergência entre os comendadores. Ela unia liberais e conservadores, que embora utilizassem estratégias diferentes, mostravam-se lado a lado ao insistirem na continuidade do tráfico. Os dois irmãos vivenciaram um mesmo tempo de forma bastante diferente, mas estiveram juntos, pelo menos até 1850, ao apostarem na ineficácia da nova lei antitráfico decretada em setembro daquele ano. Ao lado da insistência no comércio negreiro, os Souza Breves são conhecidos por possuírem, durante o século XIX, uma imensa fortuna, alicerçada basicamente em terras e escravos.

A conformação de uma das maiores fortunas do Brasil imperial, exemplificada pelos imensos domínios territoriais e humanos espalhados pela província do Rio de Janeiro, não se explicaria apenas pelas toneladas de café exportadas das fazendas da família Breves. Apesar de, no início da década de 1860, os Breves produzirem, sozinhos, mais de 1,5 % de todo o café exportado pelo Brasil,1 as maiores fortunas do período não foram construídas nas plantações brasileiras.

Como mostraram Fragoso e Rios, o capital usurário representava a mola mestra na construção das grandes fortunas imperiais, revertidas, quase sempre, em escravos e terras.2 No caso dos Breves, uma atividade em especial alicerçou, durante a primeira metade do século XIX, a fortuna dos comendadores: o tráfico ilegal de africanos.

O comércio negreiro, quando ainda permitido pelas leis brasileiras e internacionais, era atividade de alto risco. As perdas de capitais investidos poderiam ser totais. Entretanto, apesar dos riscos, a alta lucratividade do negócio motivava o empreendimento em escala atlântica.3 Com a ilegalidade do comércio de africanos, estabelecida pela lei de 7 de novembro de 1831, e ratificada quase 20 anos depois por uma nova lei, em 1850, os riscos que eram elevados aumentaram. Na década de 1850, apesar de todo o empenho das autoridades brasileiras em por um ponto final no comércio de almas entre a África e o Brasil, o tráfico continuava motivado, especialmente, pelo enriquecimento atrelado ao sucesso do empreendimento negreiro. Durante a ilegalidade, a repressão, posta em prática pelas autoridades, e a necessidade de agenciar capitais e redes de relações atlânticas afastavam os pequenos comerciantes do lucrativo trato, garantindo o mercado aberto apenas para aqueles que possuíssem capitais suficientes para investir no comércio clandestino.4 No Brasil os irmãos Breves representaram com exemplaridade a face dos novos agentes envolvidos no tráfico de africanos durante a ilegalidade.

Como veremos, a família Breves esteve atrelada aos negócios negreiros desde pelo menos meados dos anos de 1830.

Pesquisas sobre o tráfico são categóricas em afirmar que durante a segunda metade da década de 1830 o comércio negreiro entre o Brasil e a África voltou a tomar força.5 Foi justamente nessa época que os Souza Breves passaram a atuar no tráfico de africanos. Interessante notar que não estavam no comércio negreiro antes da ilegalidade, pelo menos não os encontramos nas listagens de traficantes atuantes na Praça do Rio de Janeiro até o início da década de 1830.6 Caso estivessem envolvidos nos negócios do tráfico, antes dessa data, certamente ainda não gerenciavam o empreendimento negreiro. Os irmãos Breves pareciam inaugurar e bem representar o rol dos novos personagens e das novas estruturas montadas para receber os sujeitos vindos da África durante a ilegalidade do comércio negreiro.

Estudos demonstram como, a partir da repressão inglesa, o infame comércio mudara nas duas margens do Atlântico.7 Na África, o deslocamento dos embarques de escravos do litoral de Luanda, para o norte de Angola ou para a Costa Oriental, se tornara frequente, principalmente após a abolição do tráfico nas colônias portuguesas em 1836. No Brasil os desembarques também foram reordenados para fugir da repressão. As praias litorâneas, mais afastadas do controle do Estado, passaram a acoitar os indivíduos traficados. Nelas, novas estruturas foram edificadas para receber os africanos que continuavam chegando em números crescentes na década de 1840. Novamente os comendadores Breves exemplificam e dão sentindo a reordenação do tráfico. Eram nas suas propriedades do litoral sul fluminense que parte dessa estrutura funcionava, pelo menos até os primeiros anos da década de 1850.

Não acreditamos que todo esse sistema surgiria sem o emprego de grandes capitais gerenciados em uma ampla rede comercial. Da mesma maneira, não era apenas um novo dispositivo jurídico que transformaria o tráfico em uma atividade ilegal aos olhos dos fazendeiros e da própria sociedade brasileira.

Sabemos que as leis são construídas nos embates políticos e sociais de uma época, quase sempre exemplificando interesses e perspectivas diferenciadas.

Nesse sentido, a ilegalidade do tráfico não estava dada na década de 1830, os interesses e as perspectivas estavam dispostos nas discussões no Parlamento brasileiro e na sociedade de época.

Iniciaremos nossa análise evidenciando mais detidamente o envolvimento dos Souza Breves com o tráfico de africanos. Acompanharemos os casos de desembarques de "negros novos" nas margens das suas fazendas litorâneas, no mar de Mangaratiba e de Angra dos Reis. Paralelamente, investigaremos as estruturas das fazendas de Santa Rita do Bracuhy e da Marambaia. Embora tenhamos uma avaliação tardia dessas propriedades, poderemos perceber os resquícios daquelas estruturas construídas para receber os africanos traficados na ilegalidade.

Certamente teremos uma imagem um pouco distante do fim do tráfico nessas fazendas. Entretanto, observaremos como estavam organizadas, ou mesmo desorganizadas, as propriedades litorâneas dos Breves no pós 1850. Acreditamos que, entre a década de 1830 e o início dos anos de 1850, elas passaram a suprir o mercado depois da desarticulação do Valongo e das demais estruturas de recepção dos negreiros que ancoravam na margem brasileira do Atlântico.

Conciliando os negócios do tráfico com as trajetórias individuais dos últimos africanos reduzidos à condição de cativos, encerrarmos nossa narrativa analisando a conformação da escravaria de Joaquim Breves, a presença dos últimos cativos africanos das suas propriedades. Para isso, analisaremos os perfis dos escravos falecidos nas fazendas do comendador, entre 1865-1875.

Destacaremos o grau de africanidade desses indivíduos, assim como seus grupos de procedência. A análise dos óbitos nos permite traçar um panorama dos últimos africanos de Breves, suas trajetórias marcadas pelo contrabando internacional de escravos e pelo cativeiro ilegal no pós 1831.

O infame comércio ao sul da província do Rio de Janeiro e os irmãos Breves [...] Mas aqui era o ponto de embarque e desembarque do comendador Sousa Breves (...), além de ser de desembarque, era de engorda também.

A história que eu sei (...) que proibiram a venda dos escravos (...) mas, não sei como é que fizeram, que ainda arrumaram uns escravos para trazer para , para vender novamente.8 Manoel Moraes mais de 80 anos vive nas antigas terras da fazenda de Santa Rita do Bracuhy, em Angra dos Reis. Seus avós maternos e paternos foram escravos do comendador José de Souza Breves. "Preto Forro", o avô paterno, e Antonio Joaquim da Silva, pai de sua mãe, viveram os últimos anos da escravidão na fazenda. Ambos receberam suas alforrias ainda na década de 1870 e foram citados como legatários da antiga fazenda no testamento do comendador, escrito em 1877 e aberto no ano de 1879. Muito provavelmente foram seus avôs que perpetuaram as histórias do tráfico e da escravidão ao longo dos anos, transmitidas de geração a geração, em um processo de rememoração em que o histórico da fazenda se confunde com as próprias trajetórias familiares dos seus moradores. No caso do senhor Manoel Moraes, as histórias da escravidão e do tráfico narram também lembranças de família muito vívidas e com referenciais muito fortes nas últimas décadas do século XIX.

Certamente, Antonio Joaquim da Silva, escravo de Breves, encarregado do engenho de cana de açúcar, vivenciou ou ouviu falar dos inúmeros desembarques de africanos que ocorreram no Bracuhy a partir da década de 1840.9 O engenho no qual trabalhava produzia essencialmente aguardente, mercadoria chave no comércio de escravos na costa atlântica da África. Ao analisarmos a fazenda de Santa Rita no final da década de 1870, encontraremos uma área em decadência, praticamente abandonada à própria sorte de seus habitantes. No entanto, antes de nos determos na relação entre a antiga fazenda do Bracuhy e o comércio de africanos, cabe esclarecer alguns pontos importantes sobre esse comércio clandestino: Como se reorganizara após a ilegalidade? Qual o papel dos Souza Breves no tráfico? E as suas fazendas do litoral, que funções representavam na reordenação do comércio negreiro após a Lei de 1831? No litoral africano, os padrões de abastecimento do tráfico atlântico de escravos se alteraram significativamente a partir da segunda década do século XIX. A repressão inglesa na África fez com que os traficantes do litoral mudassem suas estratégias de comércio. O embarque no continente africano deslocou-se de Luanda e dos demais portos centrais da região Centro-Sul para locais mais afastados do litoral, como o norte de Angola e as ilhas da África Oriental. Os embarques dos portos de Moçambique, Inhambane e Quelimane cresceram significativamente naquele momento, seguindo a tendência de reestruturação do tráfico atlântico de africanos na década de 1830.10 No Brasil, a partir da Lei de 1831, o tráfico também se modificou, principalmente em termos estruturais. Com o comércio negreiro considerado uma atividade ilegal, consequentemente, o mercado do Valongo, responsável por receber e redistribuir os escravos pelas fazendas fluminenses, foi fechado, pairando durante poucos anos um vazio sobre onde e como seriam recebidos os escravos que continuariam a vir da África após 1831. No entanto, rapidamente novos agentes entrariam no ilícito comércio. E com eles novas estratégias para burlar a lei e redefinir os mecanismos de um comércio juridicamente condenado.

Ao que tudo indica, rapidamente foram articulados novos portos de desembarque.

No caso do Rio de Janeiro, as praias afastadas ao norte e ao sul da Corte foram os locais escolhidos para receber os africanos. Novos agentes também entraram nesse lucrativo comércio, em meados dos anos de 1830, com destaque para os fazendeiros fluminenses.

Provavelmente os Breves despontaram nesse comércio ainda na década de 1830, sendo um dos primeiros agentes a se lançarem na atividade negreira. Nos litorais das diversas praias afastadas, os desembarques recomeçavam e passavam a contar com a ingerência dos antigos senhores de escravos e fazendeiros de café, sedentos pela mão de obra africana e pelos altos lucros desse tipo de comércio.

Em 1830, no comprovante de concessão e registro da Ordem da Rosa atribuído a Joaquim Breves, encontramos, além do nome completo do fazendeiro, uma referência bastante importante: comerciante de escravos.11 A Ordem lhe foi atribuída em um momento conjuntural no qual o envolvimento com o tráfico não mancharia a trajetória de Joaquim, nem de outros sujeitos atrelados ao comércio negreiro, alguns deles, inclusive, se tornariam políticos proeminentes durante o Segundo Reinado. Entretanto, não podemos afirmar que Breves gerenciasse a finalização do comércio atlântico de africanos no início de 1830. O futuro comendador poderia ser apenas mais um dos agentes envolvidos nos últimos desembarques, antes da Lei de 7 de novembro de 1831, como também era possível que estivesse reorientando os negócios negreiros inter-provinciais no Brasil. O que podemos afirmar com precisão é que os negócios negreiros, legais ou não, marcaram logo de início a trajetória dos Souza Breves, assim como tiveram uma importância singular na conformação das suas fortunas.12 Em 1837, os investimentos da família Breves passavam a se relacionar diretamente aos negócios do tráfico. Conjuntamente com o crescimento das plantações de café no Vale do Paraíba fluminense, os comendadores começavam a investir no lucrativo comércio de africanos. Nesse mesmo ano, o presidente da Câmara de Mangaratiba, em Ofício ao Governo do Império, evidenciava que: Em 10 de Janeiro [de 1837] [...], por aqui apreendido pelo Juiz de Paz deste distrito o patacho que se diz ser portuguez e que se denomina União Feliz ter-se empregado desde 1835 no ilícito, imoral, e desumano trafico da escravatura, e que acabava de verificar um desembarque de africanos no lugar onde fora apreendido e porque tivesse ingerência nessa embarcação Joaquim José de Souza Breves...13 Segundo a Câmara de Mangaratiba, o então comendador não era apenas um exímio comprador de indivíduos reduzidos ilegalmente à escravidão. Mais do que isso, possuía ingerência sobre a embarcação negreira que cruzava o Atlântico nas rotas da ilegalidade. Certamente o empreendimento traficante contava com um apoio logístico para o embarque na África e o desembarque no Brasil. Os negócios da família Breves movimentavam uma ampla rede comercial nas duas margens do Atlântico, envolvendo outros indivíduos de destaque na sociedade oitocentista. Entretanto, a gerência desse empreendimento, no lado brasileiro da costa, estava nas mãos de Joaquim Breves. E não foi pequeno o seu investimento nessa empreitada. Prova disso é que Joaquim levou até as últimas consequências a viabilidade dos seus negócios, enfrentando, inclusive, o Estado imperial. Certamente o presidente da Câmara de Mangaratiba não estava entre os pares de Breves, tanto que continuou sua denúncia sobre a audácia do futuro comendador, de continuar no ilícito trato a qualquer custo: [...] e conhecendo este [Joaquim Breves] não poder corromper o juiz de paz então em exercício [...] de viva força a senhorar-se [sic] do mesmo Patacho e do [...] que por cautela estaria depositado no Forte da Guia, e fazê-lo de novo navegar afim de transportar talvez outro carregamento de infelizes, e para esse fim mandou engajar em serra acima gente mercenária da mais ínfima classe, a maior parte seus dependentes os quais armados de diversos modos descerão efetivamente e em sua casa e na de seus protegidos se acoitarão subindo o seu[...] a 100 ou mais como se manifesta no documento junto marcado em [...] e porque este indivíduo reconhecesse a dificuldade da empreza vista da vigilância a parte na autoridade a quem diretamente pertencia aconselhar e precaver este atentado, disperadiu-se [sic] por então da empreza, e mandou retirar esse indivíduo esperando ocasião mais oportuna para por em execução o seu intento, quando com certeza de bom êxito pudesse efetuar o que premeditará [...] Por [...] rivalidade e mesmo por vingança Joaquim José de Souza Breves, Exmo.

Sr. ameaça a huma povoação inteira, espalhou o terror entre os habitantes do município e o que mais [...] disso se vangloria, e impune e audaz, passe entre nós. Ilmo. Homem que se [...] a mandar vir de Serra Acima, huma quantidade de gente armada para cometer um atentado de tal natureza, é capaz de praticar outros mais [...] e a vista de hum tal procedimento authorizado está para cometer quantas desvarias conceber em sua escaldada imaginação.14 Não imaginaria o presidente da Câmara que a imaginação de Joaquim fosse tão longe. Tampouco suporíamos que sua audácia fosse tão grande. Para organizar uma incursão ao Forte da Guia a fim de retomar o patacho, era possível que além de possuir ingerência sobre o tumbeiro, fosse o próprio Breves o dono da embarcação. Era comum, durante a ilegalidade, as embarcações usarem bandeiras falsas para fugir dos cruzadores britânicos.15 Breves poderia manter um navio com documentação portuguesa como forma de burlar a repressão. Ou simplesmente, apenas agenciava o contrabando, sendo responsável pelo desembarque na costa brasileira. Nessa hipótese, todo o malogro do empreendimento cairia sobre suas costas e seu bolso. Talvez isso ajude a entender a atitude impulsiva e audaciosa do então fazendeiro ao organizar uma empreitada, com mais de cem homens armados, com a finalidade de resgatar o patacho negreiro. É bastante improvável que Breves estivesse sozinho nessa iniciativa, certamente o prejuízo da travessia negreira implicaria em perdas econômicas e uma possível desarticulação de uma cadeia de relações sociais e econômicas estruturada no espaço Atlântico.

Quase quinze anos após a denúncia da Câmara de Mangaratiba, Joaquim de Paula Guedes Alcoforado, traficante redimido, era contratado pela legação inglesa no Rio de Janeiro com a finalidade de elaborar um detalhado relatório sobre os meandros do comércio ilegal de africanos entre 1831 e 1853. O Relatório Alcoforado, como ficou conhecido, ratifica os nossos indícios de que os Breves foram pioneiros na retomada do trafico em meados da década de 1830. Além disso, Alcoforado, que também estava a serviço da Polícia da Corte do Rio de Janeiro, desvenda novos nomes, confirmando a hipótese de um comércio de família em escala atlântica: Infelizmente o primeiro ambicioso brasileiro que tratou desse tão infame como repugnante tráfico foi Joaquim Breves, seu sogro e irmão, lançando mão do aventureiro e degenerado português João Henrique Ulrich (hoje de grande notabilidade), a quem mandavam à África com grandes negociações.16 Joaquim Breves, seu irmão e o sogro deles, José Gonçalves de Moraes, Barão de Pirahy, empreenderam um negócio em família que funcionava nas duas margens do Atlântico, gerando altíssima lucratividade. Além deles, João dos Santos Breves, irmão dos referidos comendadores, também participara das atividades traficantes. João, ao que parece, administrava armazéns e entrepostos comerciais de propriedade da sua família em Mangaratiba.17 Poucos sabemos sobre o irmão de José e Joaquim Breves, no entanto, podemos inferir que João exercia importante função nos negócios familiares com a costa africana, atuando na organização dos desembarques em Mangaratiba. Na África contavam com o agente João Henrique Ulrich para intermediar as negociações no litoral. Desconhecemos a trajetória de João Ulrich, acreditamos ser um negociante, como informa Alcoforado, que enriqueceu com o tráfico e fez fortuna em Portugal.

Mas se contavam com os barracões para armazenar os cativos até o embarque nos tumbeiros, com africanos para abastecer os navios e viabilizar o empreendimento do tráfico, e com Ulrich para fechar os últimos detalhes comerciais da viagem, como era a estrutura do desembarque? Quem os esperava? Onde deveriam desembarcar e aguardar instruções antes de irem para as fazendas? Novamente Alcoforado nos auxilia na construção das respostas: Em fins de 1835, o tráfico era grande. Em muitos pontos de nossa costa se estabeleceram barracões e fazendas apropriadas para se darem este desembarques de africanos; as autoridades de terra que tinham ingerência neste negócio eram os Juízes de Paz que no termo aonde eram feitas estas especulações tinham como paga 10,8% por cento de cada negro desembarcado [...] Um Joaquim Thomaz de Farias, patrão-mor da Barra de Campos e um marinheiro por nome André Gonçalves da Graça (hoje ambos Comendadores) trataram de fazer um ponto de desembarque um pouco mais ao Norte da Barra de Campos lugar denominado Manguinhos; José Bernardino de e um tal de Veiga estabeleceram próximo a São Sebastião, lugar denominado Itabatinga; [...]José Breves em Mangaratiba mais adiante na Ilha da Marambaia [...].18 (grifos meus) As fazendas da Marambaia e de Santa Rita do Bracuhy estavam entre aquelas propriedades organizadas para receber os africanos recém-chegados da travessia atlântica no período do tráfico ilegal. Após 1830, barracões e fazendas do litoral recriavam as estruturas outrora destruídas pela lei de 7 de novembro de 1831. Canoas, barracões para quarentena e locais de "engorda" conformavam as estruturas de recepção. Indivíduos especializados em se comunicarem com as diferentes nações africanas, os chamados línguas, em sua maioria escravos ou ex-escravos, vinham nos tumbeiros ou esperavam em terra a carga humana. Além deles, outros homens transportavam por terras os "negros novos" para quarentena ou os redistribuíam pelas fazendas da região. São esses sujeitos, ainda desconhecidos pela historiografia, que faziam funcionar o tráfico de africanos na clandestinidade, dinamizando o funcionamento das fazendas receptoras de escravos no litoral brasileiro.19 O complexo de fazendas da restinga da Marambaia, de propriedade do comendador Joaquim Breves, no litoral de Mangaratiba, abrigava algumas daquelas fazendas destinadas à recepção de africanos.20 Desde o final dos anos de 1830, a restinga funciona como porto seguro para a recepção de escravos. Em 1837 a embarcação bergantim Leão desembarcou 572 africanos, procedente do Quelimane.21 Quase 15 anos depois, em apenas três meses, entre dezembro de 1850 e fevereiro de 1851, foram apreendidos 940 africanos ilegalmente trazidos para o Brasil e desembarcados nas águas da Marambaia. 22 Em uma dessas apreensões, realizadas entre os dias 1 e 2 de Fevereiro de 1851, em incursão à Marambaia, o delegado de Polícia da Corte, Bernardo de Azambuja, após notificar o comendador, que se encontrava na fazenda, apreendeu espalhados pela restinga 199 africanos, que estavam escondidos por um escravo ladino pertencente a Joaquim Breves. Certamente esse cativo era um dos sujeitos que faziam a estrutura da Marambaia funcionar como um exímio porto de desembarque de "negros novos". Nessa mesma época, 450 africanos foram encontrados em um navio encalhado nas margens da fazenda da Armação, também na Marambaia em fevereiro de 1851. Três meses antes, o tumbeiro Jovem Maria tinha sido flagrado nas águas da restinga com 291 africanos a bordo. Entre os documentos trazidos pelo navio, as autoridades encontraram instruções para que os africanos se dirigissem à fazenda Bom Retiro, na província da Bahia. Coincidentemente, uma das fazendas de Joaquim Breves tinha o mesmo nome na década de 1860.

Não foram poucos os casos de contrabando de africanos que envolveram, direta ou indiretamente, os irmãos Souza Breves. Com exceção do desembarque realizado em 1837 na Marambaia, todos os demais incluíram os comendadores nos autos de investigação. Destacamos abaixo apenas aqueles que se confirmaram, deixando de fora as suspeitas e demais acusações de tráfico ilegal.

Entre 1837 e 1852, tivemos a confirmação de onze desembarques envolvendo os Breves ou suas propriedades, a grande maioria nas proximidades da Marambaia.

Como vimos, os comendadores foram dos primeiros indivíduos a retomarem o comércio de africanos, e os últimos a abandoná-lo. Nesse período de 15 anos, desembarcaram nas proximidades de suas fazendas 4388 africanos. Considerando que uma ínfima minoria dos casos era averiguada e investigada pela Polícia da Corte, na década de 1850, e pela Auditoria Geral da Marinha, podem supor que esses números fossem muito maiores. Não é exagero afirmar que os irmãos Breves ajudaram a trazer para o Brasil milhares de africanos durante a clandestinidade do comércio negreiro, e que boa parte desses sujeitos foi reduzida ilegalmente ao cativeiro nas escravarias espalhadas pelas fazendas do Vale do Paraíba.

Tabela_1

Chama a nossa atenção que a maioria das viagens começasse no Rio de Janeiro. Do bergantimLeão, que atuava no tráfico em 1837, ao brigueCamargo, último desembarque confirmado nas propriedades dos Breves, o caminho era semelhante: Rio de Janeiro ' África ' Rio de Janeiro. Na maioria das vezes a finalização se dava na Marambaia. Nos dois casos citados, ambos os navios partiram do Rio de Janeiro rumo a Quelimane. Retornaram com mais de 500 cativos cada um. Além deles, os brigues D. João de Castro e Edelmando fizeram trajetórias muito semelhantes, o primeiro saindo por duas vezes do Rio de Janeiro para Moçambique, e o segundo para Ibo, na África Ocidental.23 Em outras palavras, boa parte dos traficantes do período ilegal do comércio negreiro movimentavam suas redes transoceânicas a partir do litoral do Rio de Janeiro.

Também nos impressiona que das seis procedências registradas, cinco delas relacionavam-se ao litoral de Moçambique. A importância da África Oriental no período do tráfico ilegal é reconhecida por vários historiadores, no entanto, ela parece ter sido muito maior do que se tem imaginado. Entre os onze navios registrados, quase a metade deles saíra dos portos de Moçambique e Quelimane.

Estranhamente, uma das embarcações catalogadas teve em Ibo, próximo à atual Nigéria, sua principal praça de aquisição de cativos.24 Os 683 africanos embarcados em Ibo chegaram ao litoral sul fluminense em 1850. Em relação aos demais, não temos informações precisas sobre a procedência. Entretanto, pelos escravos apreendidos no iateJovem Maria,no patachoAtividade, e na embarcação que trouxe 199 africanos para a Marambaia em 1850, acreditamos que estes embarques tenham se dado na costa central-atlântica africana, provavelmente nos portos ao norte de Luanda.25 Entre as bandeiras dos navios, a maior parte era portuguesa ou brasileira.

Sobre as tripulações temos poucas informações, com exceção do iate Jovem Maria e do brigueCamargo.Nessas embarcações a composição da tripulação variava, em sua maioria, entre portugueses, espanhóis, norte-americanos e ingleses, embora também encontrássemos a presença de brasileiros e de indivíduos de diferentes partes da África. O comércio negreiro mantinha seu caráter transoceânico, tanto para aqueles que o financiavam, como para os indivíduos que o executavam.

Oito, entre os onze desembarques ocorreram na Marambaia. A restinga concentrava a finalização do empreendimento traficante desde pelo menos 1837. Duas embarcações atracaram nesse mesmo litoral, uma também em 1837, em Mangaratiba, e a outra em Angra dos Reis, na fazenda de Santa Rita do Bracuí, quinze anos depois. Nos dois casos encontramos o envolvimento direto dos comendadores Joaquim e José Breves.

Em mais um dos desembarques ocorridos fora da Marambaia, nos deparamos com a presença ilustre de Joaquim Breves. Em 1851 era ele o proprietário do brigue Destro, que desembarcou 457 africanos no Rio de Janeiro. Nesse caso, com seu próprio tumbeiro, Breves não utilizou suas fazendas litorâneas para finalização do empreendimento. Optou por atracar o brigue em outra parte do litoral fluminense, fugindo da visada restinga de sua propriedade.

Outros senhores também figuraram como proprietários de tumbeiros atracados na Marambaia de Breves. Entre eles, Antônio Brás dos Réis, Vitor Manoel Paneto e Francisco da Costa Ramos. Aquele dono do brigue D. João de Castro, capturado duas vezes pelos britânicos em 1839. No primeiro caso, o tumbeiro desembarcou 450 cativos no litoral da Marambaia, na segunda viagem 444 africanos foram levados da restinga do comendador para as fazendas do Vale do Paraíba.26 Vitor Panedo e Francisco Ramos eram proprietários do Jovem Maria e do Edelmando, apreendidos na mesma restinga em 1850.

Joaquim Breves centralizava na Marambaia a última fase do empreendimento traficante. Mais da metade dos desembarques registrados ocorreram após 1850. Os demais se deram nos anos de 1837 e 1839. Não nenhuma evidência de navios capturados na década de 1840.27 Não acreditamos que a Marambaia, o Bracuhy, e outras regiões do litoral sul fluminense tenham deixado de receber africanos ilegalmente durante aqueles anos. Mais provável é que o Império tenha sido bastante permissivo em relação ao tráfico nas fazendas afastadas da Corte. O domínio político conservador, após a maioridade de d. Pedro II, assegurava não o monopólio do tráfico para os seus pares, como também adiava para o início da década seguinte a perseguição aos tumbeiros e aos desembarques realizados ao longo da costa brasileira.28 Além disso, boa parte dos escravos traficados morreu a caminho do cativeiro no Brasil. Os avanços tecnológicos dos negreiros nem sempre garantiam uma redução significativa da taxa de mortalidade. Por exemplo, o tumbeiro bergantimLeão, perdeu 33,1 % dos seus cativos em 1837. Quatorze anos depois, o brigue Destro, de propriedade de Joaquim Breves, amargou um prejuízo significativo, com a morte de 30,4 % dos escravos a bordo. Embora essas taxas sejam bastante altas, elas não correspondem à totalidade dos desembarques. Nos casos analisados, as taxas oscilam bastante. Exemplo disso é que em 1839, nas duas viagens do brigue D. João de Castro, a taxa de mortalidade girava em torno de 10%, praticamente a mesma do brigue americano Camargo, que registrou mortalidade em torno 9,1% em 1852. Essas variáveis não eram fixas, e se relacionavam tanto com o itinerário das viagens e seus portos de origem, quanto com a finalização do empreendimento. A própria lógica de maximização dos lucros de alguns traficantes, que abarrotavam os tumbeiros com centenas de africanos, aumentava significativamente esses índices. Emblemático, nesse sentido, é o caso do bergantim Leão que embarcou 855 africanos em 1837 e, ao mesmo tempo, amargou a maior taxa de mortalidade entre as embarcações registradas.

Os novos portos de chegada: a fazenda de Santa Rita do Brachuy e o complexo da Marambaia Não restam dúvidas de que as fazendas litorâneas dos comendadores eram estruturadas para recepção de africanos recém-chegados da travessia atlântica.

Algumas delas, além de possuírem uma estrutura para o desembarque de africanos, tinham se organizado produtivamente para o empreendimento negreiro. É o caso da Fazenda Santa Rita do Bracuhy, de propriedade de José Breves, adquirida por compra em 30 de maio de 1829.29 Na avaliação do espólio do comendador José de Souza Breves, encontramos onze fazendas, duas delas no litoral sul fluminense, na extinta freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Ribeira, em Angra dos Reis, eram elas: Santa Rita do Bracuhy e a pequena fazenda de Jurumirim.30 Em 1881 ambas foram avaliadas, e o que nos chama atenção é o estado de abandono em que se encontravam. Enquanto nas outras propriedades inúmeros escravos foram listados, diversos bens avaliados, entre imóveis e semoventes, as duas propriedades do litoral parecem abandonadas à sorte dos cativos que anos depois receberiam em testamento a posse e o usufruto daquelas terras.

Em 1881, a fazenda do Bracuhy contava com dois mil seiscentos e quarenta metros de terras de frente, e fundos "até a mais alta serra do mar", avaliados em dois mil réis cada metro, totalizando cinco contos e duzentos mil réis. Entre as benfeitorias da fazenda, encontramos uma casa de vivenda bastante estragada, dois lances de casas que serviam como paiol, além de uma casa com rancho ao lado para guardar canoas. As edificações estavam em ruínas no início dos anos de 1880. Ao que nos parece tempos não se produzia em Santa Rita. Encontramos na fazenda apenas vinte enxadas, dez foices e dois machados de serviço de roça, tudo avaliado em míseros oito mil réis. Além disso, havia um pequeno canavial, um pomar e alguns cafezais, que somados não chegavam a meio conto de réis.

O que realmente encarecia a fazenda era sua antiga estrutura de produção de aguardente, que nessa época também estava em decadência, como nos mostra a avaliação feita em 1881. Dessas benfeitorias existiam quatro carros de bois, próprios para condução de cana, que somado aos semoventes, trinta e seis bois de carro, chegavam um conto cento e sessenta mil réis. Isoladamente, o bem mais valioso da antiga fazenda era uma casa de telha, com engenho, moendas, alambique, tonéis e outros elementos para a produção de cachaça, tudo visto e avaliado em um conto de reis. Somando o engenho, com os carros de bois e seus respectivos semoventes, destinados ao transporte da cana e seus derivados, chegamos a quase 50% do valor de referência da propriedade. Isso demonstra que, nas décadas anteriores, a estrutura produtiva de Santa Rita estava voltada para produção de aguardente.

Como demonstrou Roquinaldo Ferreira, a geribita, conhecida popularmente como cachaça, era uma das mercadorias mais valorizadas no comércio de escravos no interior do continente africano.31 Nesse sentido, a família Breves mostrava-se bastante conectada com as preferências dos mercadores africanos. Produzindo geribitaatendiam às demandas do tráfico, multiplicando os desembarques de africanos no litoral brasileiro. Provavelmente João Henrique Ulrich, agente dos Souza Breves em África, comercializava a aguardente do Bracuhy e de outras fazendas litorâneas dos Breves na margem africana do Atlântico.

Somado a decadência da fazenda analisada, encontramos uma pequena propriedade denominada Jurumirim, no lugar de mesmo nome, formada em sua maior parte por 528 metros de terras na Ilha da Barra, também na Freguesia da Ribeira. A descrição no inventário é muito sucinta, demonstrando que havia apenas terras e poucas construções, praticamente abandonadas. Além dela, José possuía também uma faixa de terra denominada Ilha Comprida, próxima a Mambucaba. O comendador deixara a ilha para usufruto dos pescadores que nela viviam e dos próprios moradores de Santa Rita.32 Na segunda metade do século XIX, enquanto o Vale do Paraíba ainda arrecadava os altíssimos lucros do comércio de café, o litoral sul da província parecia padecer em um crescente abandono. Certamente o fim do tráfico de africanos, nos primeiros anos da década de 1850, afetou em curto prazo a região que se especializara, no período imediatamente anterior, na recepção de negros vindos das mais diferentes regiões da África.

Entre os domínios litorâneos dos comendadores, a Marambaia configurava-se como a principal porta de entrada de milhares de africanos reduzidos ilegalmente à escravidão. Ligação entre o litoral de Mangaratiba e a imensidão do Atlântico, a restinga se tornara um porto seguro para o desembarque de africanos desde o final da década de 1830. No entanto, em meados do século XIX, o comércio clandestino passaria a ser tão frequente que mesmo o proprietário da restinga admitia as ocorrências dos desembarques.

A Marambaia foi comprada de Guedes e Irmão em 17 de abril de 1847.33 A avaliação da fazenda, em 1890, demonstra que tempos aquela propriedade estava abandonada e improdutiva. Entre os três primeiros dias do mês de setembro, os avaliadores juramentados no processo descreveram minuciosamente a restinga.34 Logo de início, observamos que o complexo da Marambaia era bem mais estruturado do que o de Santa Rita, principalmente pelo número de construções, móveis e canoas. No entanto, ao analisarmos mais detidamente a documentação, percebemos que o abandono na Marambaia era muito semelhante ao do Bracuhy, inventariado dez anos antes no espólio de José Breves. Na descrição das casas e de alguns móveis observarmos o uso, com frequência, de expressões que denotam esse abandono. Construções em mau estado, ou em ruínas, reincidentemente aparecem nas falas dos avaliadores.

Outra particularidade da Marambaia era o complexo de propriedades que a compunha. A fazenda da Armação parecia ser a principal delas. estava o bem mais valioso inventariado: "uma casa de vivenda, comprida com varanda, na frente envidraçado, na fazenda denominada Armação, assoalhada e forrada, com diversos quartos e salas e cozinha e outras dependências, parte em bom estado e parte em mau estado, visto e avaliada por dois Contos de Réis ' 2:000$000".35 Até mesmo o bem mais valioso da Marambaia estava se deteriorando, aparentemente abandonado no final do século XIX. Era na Armação que se encontravam importantes construções do recente passado escravista, como a casa de vivenda que servira outrora de hospital avaliada em 250$000 réis. Além dela, mais outras cinco construções pareciam seguir o mesmo caminho, servindo de abrigo pra gados, cavalos e chiqueiros para os porcos. Segundo consta no auto de avaliação da propriedade, os chiqueiros estavam ao lado da antiga enfermaria, evidenciando uma reestruturação do espaço após a Abolição da escravidão.

Reorganização semelhante deve ter ocorrido com o fim do tráfico de africanos, finalidade específica das propriedades da restinga da Marambaia.

A cerca de uma légua da Armação encontramos a fazenda da Serra d'Água, composta de duas casas erguidas sobre pilares de pedra, e uma capela de Nossa Senhora da Conceição construída em 1851. As duas casas, assim com as anteriores, se encontravam em ruínas. Além das fazendas, Joaquim Breves mantinha três ilhas em frente à restinga: Saracura, Bernarda e Papagaio fechavam o complexo da Marambaia. Certamente a ilha do Papagaio era a menor delas, apreçada em um terço (50$000 Réis) do valor das demais. No entanto, o que enriquecia o espólio deixado pelo comendador era a imensa restinga, descrita como ilha da Marambaia, avaliada em duzentos e noventa e cinco contos de réis (295:000$000), em 3 de setembro de 1890. O valor do complexo da Marambaia era 59 vezes maior do que a fazenda do seu falecido irmão no mesmo litoral.

Apesar de toda a vastidão da restinga, o abandono sócio-produtivo era a marca das antigas propriedades do litoral sul fluminense, não no final da década de 1880, mas a partir do início da segunda metade do século XIX. Esse processo ficou evidente a partir da avaliação da antiga fazenda de Santa Rita, mas se torna muito mais claro ao analisarmos as benfeitorias da Marambaia. Em 1890, tanto na fazenda da Armação, quanto na Serra d'Água, as únicas plantações existentes eram os mil pés de coqueiros da Bahia, espalhados pelas referidas propriedades e avaliados em mil réis cada um. Ao longo de toda avaliação, apenas uma referência indireta às antigas culturas agrícolas, exatamente no momento em que se avaliava um antigo engenho na praia da Armação para secagem dos grãos de café. Pela quantidade de coqueiros, e inexistência de qualquer outra cultura que ao menos valesse a pena ser inventariada, supomos que tempos a Marambaia fosse uma daquelas propriedades sem finalidade específica após o fim do tráfico de africanos.

Restaram aos herdeiros da Marambaia, além das construções em ruínas, alguns animais, móveis e canoas. Da antiga casa do comendador, sobraram apenas mesas e cadeiras em mau estado, dois pianos e uma canoa grande de Jequitibá, certamente usada no transporte entre Mangaratiba e a restinga. No dia 4 de setembro, o juiz do caso e os avaliadores juramentados deixaram a Marambaia, seguindo para o Saco de Mangaratiba, onde em apenas um dia inventariaram as construções em ruínas e uma chácara nessa mesma praia. Reminiscências de uma época marcada pelos altos lucros da exportação do café e pela ilegalidade do tráfico internacional de africanos.

É intrigante perceber o abandono e a decadência dessas fazendas do litoral sul fluminense, em contraponto com a opulência das demais propriedades da família Breves no Vale do Paraíba no final da década de 1870. A Lei de 1850, que ratificava a ilegalidade do tráfico e estendia as responsabilidades sobre o ilícito comércio,36 parece ter mudado, em curto prazo, a paisagem social das fazendas do litoral. O fim do tráfico de africanos, gradativamente construído na primeira metade da década de 1850, alterou profundamente a rotina das fazendas do sul da província do Rio de Janeiro. As estruturas do tráfico clandestino deveriam ser desmontadas, ou simplesmente abandonadas, e as fazendas que as englobavam, reestruturadas, ou deixadas a cargo dos seus moradores, em sua maioria escravos e libertos. Esse parece ter sido o destino da Fazenda de Santa Rita do Bracuhy e do complexo da Marambaia, logo após o fim do tráfico atlântico de escravos.

Talvez, por isso, os que permaneceram na restinga tenham suas identidades relacionadas diretamente às antigas histórias dos últimos desembarques de africanos, possivelmente vivenciadas, direta ou indiretamente, por seus pais e avós. Ao encontrar os que permaneceram na Marambaia, Assis Chateaubriand, registrou o que disseram os últimos ex-escravos do comendador em 1927.

Chateaubriand conversou com Adriano Júnior e Gustavo Victor. Adriano havia trabalhado na fazenda S. Joaquim da Grama, e tinha aproximadamente 75 anos.

Chateaubriand não precisara a idade de Gustavo, no entanto, disse aparentar ser mais velho que Adriano. Ao perguntar àquele sobre seu antigo senhor, Gustavo foi direto ao relacionar a restinga ao comércio de africanos: "Gente vinha de bahia d´Angola premero pra qui. Engordava, e depois ia pra roça, trabaiá no cafezá". Sobre seu antigo senhor, lembrava o seguinte:"Era um veio bão. Quando via nego assentado, depois do serviço, apreguntava se nego tava triste, e mandava reunir a senzala para dançar o cateretê e o batuque, fazendo tocar o bumba de barriga".37 O tráfico na Marambaia se confundia com a própria trajetória dos antigos escravos. Da conformação das fazendas, aos indivíduos que permaneceram, o infame comércio parecia atribuir sentido para a história daquela restinga, na interseção entre passado e presente. Certamente Gustavo e Adriano teriam muito mais a contar a Chateaubriand, faltou-lhe apenas o registro, ou um pouco do espírito do historiador.

Um retrato da ilegalidade: os últimos africanos do comendador através dos registros de óbitos Não consenso na discussão do quantitativo de escravos sob o domínio de Joaquim Breves. Nos trabalhos historiográficos seus números giram em torno de 4.000 a 6.000 cativos.38 Ao certo, nunca saberemos o número exato de homens e mulheres que conformavam suas fazendas. No entanto, parece bastante evidente que uma das maiores, senão a maior, escravaria do Brasil Império, tenha sido construída na ilegalidade, após a Lei de 7 de novembro de 1831. Não será nosso objetivo aqui comprovar tal afirmação, trataremos apenas de estabelecer uma breve relação entre os escravos de Joaquim Breves e o tráfico ilegal de africanos. Para isso, nos basearemos nos óbitos dos cativos de Joaquim, ocorridos entre 1865 e 1875, e registrados por um de seus funcionários.

Devemos enfatizar que o livro citado não se refere à típica documentação eclesiástica analisada em outros trabalhos acadêmicos. Os registros, de nascimento ao óbito, embora fossem de responsabilidade da Igreja, passavam também pelo controle senhorial. Stanley Stein, citando o inventário do Barão de Tinguá, enfatiza que Entre os fazendeiros diligentes era uma prática catalogar [...] num livro de registros os nomes de escravos homens e mulheres, assim como seus filhos [...] e os nomes daqueles que morreram e daqueles [...] libertados quando batizados.39 Segundo a visão do Barão, Joaquim estaria no rol dos diligentes fazendeiros, que construiu um registro interno de suas fazendas com os nascimentos, batismos, casamentos e óbitos de seus escravos e agregados livres, dispostos ao longo de suas propriedades. Além desse livro, encontramos também algumas folhas soltas organizadas em um fichário com nascimentos, casamentos e batismos de cativos, libertos e livres das antigas fazendas de Joaquim Breves entre 1876 e 1901.

Chama-nos a atenção o fato de que o fichário se diferencie bastante do livro citado. Enquanto este parece ter sido organizado por uma única pessoa que dispôs as informações de maneira muito objetiva, agrupando os dados em tabelas, quase sempre num tom quantitativo, aquele se assemelha mais aos tradicionais assentos eclesiásticos. Embora os documentos não apareçam em ordem, e não tenham sido escritos pela mesma pessoa, trazem ainda o nome do padre e o local de registro, quase sempre a fazenda de São Joaquim da Grama. Os registros que compõe o fichário, organizado posteriormente, foram produzidos naquela fazenda.

É bastante provável que o livro analisado também tenha sido construído na propriedade sede de Joaquim Breves. Ambos compunham o rol dos documentos da administração das fazendas da família Breves. É importante destacar o perfil das fontes citadas, sobretudo, por se tratarem de documentos praticamente inexistentes nos arquivos brasileiros.40 Os registros de óbitos presentes no livro citado, embora aparentemente escritos por uma única pessoa, apresentam também algumas nuances. Em geral o nome, a idade, a nação e a moléstia, indicando a causa da morte, aparecem com regularidade. em 1875, encontramos o campo cor nos óbitos, nesses casos referem-se a 13 inocentes pretos, falecidos na fazenda de São Joaquim da Grama.

Em decorrência da Lei de 28 de setembro de 1871, a partir do ano seguinte, os cativos começam a aparecer com seu número de matrícula. Além disso, a referência ao estado civil, se casado, solteiro ou viúvo, surge ao lado de uma observação que geralmente se remete à filiação. Em poucos casos encontramos mais informações sobre a profissão dos escravos. Os de roça nunca têm a profissão citada, destaca-se apenas, muito raramente, a atividade de alguns cativos.

Entre 1865 e 1875, setecentos e cinquenta indivíduos, registrados nas listagens de óbitos de cativos, faleceram nas propriedades de Joaquim Breves. Entre eles, encontramos certo equilíbrio entre o número de africanos (48%) e de nascidos no Brasil (52%). Caso desconsiderássemos os óbitos de inocentes, na medida em que boa parte deles ou eram ventre-livres, ou faleceram ainda recém-nascidos antes da Lei de 28 de Setembro 1871, esses números mudariam significativamente, especialmente porque entre as 372 mortes de indivíduos registrados como cativos nascidos no Brasil, 219 eram de crianças com menos de 12 anos. Sendo assim, entre os escravos adultos a proporção seria de sete africanos para três crioulos, ou pardos. Em outras palavras, 70 % dos escravos adultos que faleceram, entre 1865 e 1875, nas fazendas de Joaquim Breves eram africanos.

Interessante notar que entre os ingênuos muitos deles foram registrados nos óbitos no mesmo espaço e da mesma forma que os demais cativos, mesmo que fossem à época ventre-livres. Entre eles, alguns, inclusive, possuíam matrícula da relação, mas nunca matrícula geral. É fato também que diversos deles não chegariam nem a receber um número de ordenação, sobretudo por conta da alta taxa de mortalidade entre os recém-nascidos. Somente as crianças não atingidas pela Lei de 1871 possuíam ambas as matrículas. Em nenhum momento o termo ventre-livre aparece nos óbitos analisados. em 1875, na fazenda da Grama, ele é subentendido a partir da descrição dos registros de falecimentos dos ingênuos daquela propriedade. É importante destacar que os óbitos dos homens livres diferiam bastante dos registros dos cativos. Aqueles se assemelhavam aos tradicionais assentos eclesiásticos, principalmente em relação ao texto. Na percepção senhorial, representada pela produção do documento, os "ventre- livres" estavam muito mais próximos ao universo escravista, do que ao mundo dos livres.41

Entre os escravos nascidos no Brasil, incluindo os inocentes citados acima, na faixa de 0-12 anos, a maior parte dos óbitos era de cativos crioulos. Entre 1865 e 1875, morreram 46 pardos e 31 pretos. A reduzida taxa de mortalidade entre pardos e pretos, no universo em análise, relaciona-se à representatividade desses grupos nas fazendas de Joaquim Breves. Entretanto, é bastante curioso que todos os indivíduos declarados como pretos fossem inocentes. o termo crioulo aparece praticamente generalizado entre os escravos nascidos no Brasil,42 como vemos abaixo: Entre os africanos, o termo nação, difundido a partir da segunda metade do século XVIII, em substituição a ideia de gentio da Guiné, predomina na documentação, organizando os grupos de procedências das fazendas de Joaquim Breves. Entretanto, como afirma Soares, não qualquer homogeneidade entre os nomes de procedência, "vão desde nomes de ilhas, portos de embarques, vilas e pequenos reinos, a pequenos grupos étnicos, em nenhum deles é possível afirmar, com certeza, que a nação corresponde a um grupo étnico".43

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Entre os 329 africanos falecidos entre 1865-1875, a grande maioria pertencia a grupos de procedência comuns nos negócios do tráfico entre a África e o Rio de Janeiro na primeira metade do século XIX. Na costa Central-Atlântica da África embarcava a maioria dos cativos, que a região do Congo/Angola era responsável por boa parte dos escravos enviados para o Brasil durante o século XIX.44 No entanto, era grande a presença de africanos da costa Oriental, principalmente dos portos de Moçambique e Inhambane.

A partir de meados da década de 1870, os registros de procedência passaram a ser substituídos por definições genéricas, como "africanos" e "de nação".

Embora a organização por grupos de procedência não garantisse uma homogeneidade étnica entre os povos da África, denotava, ao menos, aspectos de uma trajetória compartilhada. A generalidade dos termos nação e africano inviabiliza a difícil tarefa de reconstituir as trajetórias dos últimos africanos sob o domínio dos Souza Breves. Vejamos agora, através dos óbitos, as nações daqueles indivíduos reduzidos à escravidão nas fazendas de Joaquim Breves: Alguns grupos, em termos quantitativos, são pouco representativos entre os cativos do comendador. Dos mais de 300 africanos falecidos, encontramos apenas 1 macua, 1 marave, 1 buí e 1 luisamam, grupos incomuns no sudeste escravista.45 O livro das fazendas registra também poucos angolas, monjolos e cassanjes, escravos que eram comercializados em larga escala, principalmente pelo porto de Luanda antes de 1836. Encontramos mais escravos minas, do que angolas, aqueles enviados para o Brasil, provavelmente de forma ilegal, após a proibição do tráfico ao norte do equador em 1815.

O comércio de almas, considerado ilegal nas colônias portuguesas em 1836, deslocou os embarques de escravos para as praias mais afastadas ao norte e ao sul de Luanda, ou mesmo para a desembocadura de rios que faziam ligação com o interior do continente, como a região do rio Zaire.46 Nesse contexto, ganhava destaque o porto de Cabinda ao norte de Angola. A autonomia em relação ao controle português, fez com que boa parte dos escravos daquela região passasse pelo porto ligado ao reino do Ngoyo.47 Isso explica a baixa incidência de escravos angolas entre a escravaria de Joaquim na década de 1870. Ao mesmo tempo, os portos de Moçambique e Inhambane adquiriam grande importância durante a ilegalidade do comércio de cativos na África. A primeira metade do século XIX maximizou o comércio negreiro entre o Brasil e a costa oriental da África, resultando no aumento do número de moçambiques entre os escravos africanos.48 Após 1836, o aumento da repressão na costa Atlântica fez com que o comércio de almascrescesse vertiginosamente nos portos de Moçambique, Quelimane e Inhambane. Isso fica bastante evidente quando conjugamos o gráfico_anterior, com o quantitativo de africanos que entraram no Brasil após a Lei de 7 de novembro de 1831, e mesmo assim, foram reduzidos ilegalmente à escravidão nas fazendas do comendador Joaquim Breves.49

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Entre os africanos livres escravizados, grande parte deles continuava vindo do litoral Central-Atlântico da África. No entanto, não encontramos mais cativos embarcados pelo porto de Luanda. Cassanjes, rebolos, angolas e moanjes tornam- se menos frequentes nas rotas do tráfico após 1836. A região do Congo se destacava no envio de cativos para as fazendas de Joaquim Breves, assim como o porto de Cabinda. A área do Congo Norte, incluindo os cativos monjolos, representava a procedência da maioria dos africanos de Joaquim Breves. Ao mesmo tempo, o número de escravos embarcados pela costa oriental da África ganhava uma nova dimensão. Entre eles, os embarques nos portos de Moçambique e Quelimane, correspondiam praticamente ao mesmo número de escravos enviados por Benguela. Os próprios benguelas, que eram a maioria dos africanos entre os escravos do comendador, deixaram de ser preponderantes entre os africanos traficados após 1831.51 Dos africanos falecidos, entre 1865-1875, 49 deles certamente haviam desembarcado no Brasil após a Lei de 7 de novembro de 1831. Em outras palavras, no mínimo 15% dos cativos africanos da escravaria de Joaquim Breves foram reduzidos ilegalmente à escravidão. Metade deles faleceu nos dois primeiros anos da década de 1870, entre os 36 e os 38 anos de idade, em diversas propriedades do comendador, destacando-se as fazendas da Floresta em Itaguaí, e de São Joaquim da Grama em Passa Três.

É bastante provável que as idades de muitos cativos tenham sido alteradas nos registros do final da década de 1860, com o objetivo de burlar a Lei de 1831, que evidenciava a ilegalidade da propriedade escrava. A apropriação da lei atrelada à reivindicação da liberdade aparecerá em alguns tribunais do Império durante a década de 1860. Apesar disso, foi possível perceber o descuido senhorial ao evidenciarmos a propriedade ilegal registrada nos próprios documentos das antigas fazendas.

Concluindo: o comércio negreiro e seus protagonistas no processo de ilegalização do tráfico.

As lembranças sobre o comércio de escravos, as fazendas de engordas e os antigos portos de desembarques conformaram o ponto de partida da pesquisa exposta nesse texto. Os depoimentos de Manoel Moraes e de outros moradores das antigas fazendas litorâneas dos comendadores Breves foram os nossos cicerones para adentrarmos nos últimos anos do tráfico ao sul da província do Rio de Janeiro. As memórias dos descendentes dos últimos escravos dos comendadores ao serem acionadas, para além das disputas políticas e territoriais que demarcam seu campo de produção,52 reascendem velhas questões, e colocam novos problemas para a história social da escravidão e do tráfico de africanos nos Oitocentos.

A rearticulação do comércio negreiro nas duas margens do Atlântico, após a proibição do tráfico na costa brasileira, em 1831, e cinco anos depois nas colônias portuguesas, em 1836, demandou a construção de novas redes comerciais, assim como reordenou os espaços litorâneos destinados ao comércio de escravos.

Seja em águas brasileiras, ou nas praias da costa da África, novos agentes despontaram no trato ilegal da carne humana, e para tanto se utilizavam da conivência das autoridades e da própria sociedade local. O imperativo da propriedade, atrelado ao governo da casa, garantiam até certo momento, no caso brasileiro até setembro de 1850, a proteção necessária aos empreendimentos traficantes. A última fase dos negócios atlânticos, ou seja, o desembarque dos africanos reduzidos ilegalmente à escravidão contava com novas estruturas organizadas em fazendas litorâneas destinadas, quase que exclusivamente, a recepção dos novos cativos. O desaparecimento do Valongo no Rio de Janeiro, e dos demais mercados de escravos nas outras províncias, foi compensado por essas novas propriedades que além de receberem os negros da costa, montavam seus próprios mercados de escravos: [...] tenho de participar a V. Ex.ª, que fui informado, que os dois irmãos Joaquim José de Sousa Breves, e José de Sousa Breves convidaram diversos fazendeiros dos Municípios de S. João do Príncipe, e Pirahy a [...] a comprar uma porção d'Africanos, que mandaram vir de Costa Leste em seu navio, que deve aportar à Província o Rio de Janeiro, demandando especialmente a parte dela compreendida entre a Guaratiba, e Angra dos Reis, e que aquele navio deve chegar em dias deste mês, ou do próximo futuro".53 (grifos meus) A dinâmica do tráfico, durante a clandestinidade, demandou, além de uma reordenação espacial dos novos desembarques, a construção de novas estruturas que viabilizassem a finalização do empreendimento traficante. Elas iam desde canoas que faziam a ponte entre os tumbeiros e a terra firme; passando pelos barracões para recepção dos negros novos, consagrados na memória local como locais de engorda; e como última etapa estava a comercialização e a redistribuição desses indivíduos reduzidos ilegalmente à escravidão. As propriedades destinadas à última fase do comércio negreiro funcionavam ativamente até o início dos anos de 1850, mas logo em seguida aparecem abandonadas nos autos de descrição de bens dos inventários de época. Na segunda metade da década de 1850 perderam sua principal funcionalidade: abastecer a demanda por mão de obra no próspero Vale do Paraíba fluminense.

Os Breves representaram a face ainda pouco conhecida dos homens de negócios que atuaram no ilícito trato a partir de meados da década de 1830, e que nele permaneceram no início dos anos de 1850. Nesse período solidificaram redes transatlânticas que faziam funcionar os empreendimentos traficantes através de agentes na África, como no caso de João Henrique Ulrich. Quando necessário poderiam acionar os laços pessoais e comerciais com influentes negreiros, e assim possivelmente o fizeram com o famoso traficante espanhol Francisco Ruviroza y Urzellas, ou com o comerciante português José Bernardino de , com quem os comendadores nutriam relações de amizade e lucrativos negócios.

Nas fazendas dos comendadores, o amplo envolvimento dos irmãos Breves como o tráfico internacional de africanos, durante a clandestinidade, se refletia claramente na conformação das suas escravarias. Como vimos, no caso das comunidades escravas das fazendas de Joaquim Breves, encontramos forte presença de africanos procedentes das regiões menos expressivas no tráfico no início do século XIX, e que ganharam representatividade no período da ilegalidade, como o caso de Cabinda e Moçambique.

Em outras palavras, boa parte dos africanos traficados pelos comendadores eram enviados para suas grandes fazendas no Vale fluminense e vivenciavam o cotidiano do cativeiro ilegal no Império, que ainda se convencia da necessidade de abolir o comércio negreiro em escala atlântica. nos primeiros anos da década de 1850 o Estado imperial transformou o tráfico em um comércio infame, através das incursões às fazendas litorâneas, do inquérito de escravos e da responsabilização criminal dos negociantes envolvidos com o tráfico. Vale lembrar que, em 1851, as fazendas da Marambaia e do Bracuhy foram ocupadas pela Polícia da Corte, e seus escravos inquiridos. Nesse mesmo ano, Joaquim Breves era condenado em primeira instância pelo crime de pirataria.

Apesar disso, o Estado imperial ratificara o cativeiro ilegal de milhares de africanos espalhados pelas fazendas fluminenses, e comercializados até a Lei de setembro de 1850. Assim, os africanos das fazendas dos Breves que desembarcaram antes da nova lei permaneceriam no cativeiro, garantindo a tranquilidade da propriedade ilegal dos seus senhores. Em carta ao dono do Bracuhy, em fevereiro de 1853, Euzébio de Queirós, Ministro da Justiça em 1850, esclarece a posição do Estado em relação à matéria. Ao mesmo tempo garante a paz dos senhores que formaram suas extensas escravarias na clandestinidade. Paramos por aqui, com as palavras do ex-Ministro que sintetiza a cumplicidade do Estado brasileiro com a violação da Lei de 7 de novembro de 1831 e consequentemente com o cativeiro ilegal de quase um milhão de indivíduos:54 [...] é o que disse até no Parlamento, isto é, quando o governo não iria dar buscas nas fazendas para resolver o passado [...] Pode ser que a audácia das especulações o leve a proceder com mais algum rigor ou outra vez, mais creio que nem se ultrapassarão os limites da necessidade, nem se resolvem o passado [...] Qualquer busca que se é para procurar os negros agora importados, e nunca para entender com o passado.55

Texto apresentado em 28 de junho de 2011 aceito em 7 de setembro de 2011

* Pesquisa financiada pela CAPES e pelo CNPq.

1 Afonso de E. Taunay, "No Brasil imperial, 1872-1889", História do café no Brasil, tomo VI, Rio de Janeiro: Editora do Departamento Nacional do Café, 1939. pp. 269-83.

2 Segundo João Fragoso e Ana Rios, "num ciclo que se iniciava com os lucros gerados do café, investidos em empréstimos, que retornavam sob a forma de mais escravos e terras, ou seja, mais café. Tanto é assim que os inventários característicos desse tipo de fazendeiro[se refere aos fazendeiros- capitalistas]representavam invariavelmente cerca de 80 % do valor total da riqueza deixada em escravos e terras". João Fragoso e Ana Rios "Um empresário brasileiro dos Oitocentos", in: Hebe Mattos e Eduardo Schnoor (orgs.), Resgate: uma janela para os oitocentos (Rio de Janeiro: Top Books, 1995), pp. 197-224.

3 Sobre os riscos e a lucratividade da travessia atlântica, ver: Manolo Florentino, Em costas negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro, São Paulo: Companhia das Letras, 1997. Afro-Ásia, 47 (2013), 43-78 4 Roquinaldo Ferreira. "Dos sertões ao Atlântico: tráfico ilegal de escravos e comércio lícito em Angola, 1830-1860" (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1996).

5 Robert Conrad, Tumbeiros. O tráfico de escravos para o Brasil, São Paulo: Brasiliense, 1985. Conrad afirma que o retorno do gabinete conservador, comandado por Bernardo Pereira de Vasconcellos, foi um dos elementos que facilitaram o recrudescimento do tráfico. As ideias de Conrad parecem bastante coerentes, na medida em que o próprio Vasconcelos propusera na legislatura de 1837 a extinção da lei de 1831. Sobre os debates políticos em torno da extinção do tráfico, ver: Jaime Rodrigues, O infame comércio.

Propostas e experiências no final do tráfico de africanos para o Brasil (1800- 1850), São Paulo: Editora da Unicamp / CECULT, 2000.

6 Para a listagem dos traficantes atuantes na praça carioca entre 1811-1830, ver o "Apêndice 26" de Florentino, Em costas negras, pp. 254-6. Entretanto, é possível que os irmãos Breves atuassem no fornecimento de cachaça para o comércio negreiro nas suas fazendas do litoral, antes de investirem diretamente no empreendimento traficante, após a segunda metade da década de 1830.

7 Ferreira, "Dos sertões". Ana Flávia Chicelli, "Tráfico ilegal de escravos: os caminhos que levam a Cabinda" (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal Fluminense, 2006).

8 Entrevista com Manoel Moraes, morador de Santa Rita do Bracuí, 27/10/2006, Acervo Petrobrás Cultural Memória e Música Negra, Laboratório de História Oral e Imagem (LABHOI), <www.historia.uff.br/jongos>, acessado em março de 2009. Sobre pesquisas arqueológicas recentes evidenciando o naufrágio de negreiros exatamente na região apontada por Manoel Moraes ver o trabalho de Gilson Rambelli, "Arqueologia de naufrágios e a proposta de estudo de um navio negreiro", Revista de História da Arte e Arqueologia, n. 6 (2006), pp. 97 106.

9 Martha Abreu, "O caso do Bracuhy" In: Hebe Mattos e Eduardo Schnoor (orgs.), Resgate: uma janela para o Oitocentos, pp. 167-95.

10 Ferreira, "Dos Sertões"; Chichelli, "Tráfico ilegal de escravos".

11 Biblioteca Nacional (BN), Projeto escravos no Brasil, Documentos Biográficos c. 1052, 44.

12 Segundo Luis Henrique Tavares, Breves estaria ao lado de grandes traficantes, como Manoel Pinto da Fonseca e José Bernardino de "grandes negreiros no Rio de Janeiro dessa época". Luis Henrique Dias Tavares, Comércio proibido de escravos, São Paulo: Editora Ática, 1988, p. 29 13 Fundação Mario Peixoto (FMP), Ofícios da Câmara ao Governo do Império, 1832- 1846, Ofício n. 6.

14 Fundação Mario Peixoto (FMP), Ofícios da Câmara ao Governo do Império, 1832- 1846, Ofício n. 6.

15 Conrad, Tumbeiros.

16 Joaquim de Paula Guedes Alcoforado, "História sobre o infame negócio de africanos da África Oriental e Ocidental, com todas as ocorrências desde 1831 a 1853". Transcrito por Roquinaldo Ferreira, Revista Estudos Afro-Asiáticos,n. 28 (1995), pp. 219-29.

17 Em fevereiro de 1851, quando o delegado de polícia do Rio de Janeiro, Bernardo de Azambuja, apreendeu 199 africanos novos na Marambaia, além de Joaquim encontrava-se na restinga João dos Santos Breves. Segundo os depoimentos colhidos por Azambuja, João era negociante em Mangaratiba. Juízo de Auditoria de Marinha, 1856, Arquivo Nacional (AN), 478, M: 2259, Gl. A Armando de Moraes Breves, em suas memórias familiares recorda que: "A ruga mais séria deu-se na ocasião em que alguns barcos ingleses entraram em Angra dos Reis, perseguindo dois navios negreiros [...] os tumbeiros chamavam-se Leopoldina e Januária. O contrabando vinha despachado para João dos Santos Breves, irmão do tio Joáca [Joaquim Breves]". Armando de Moraes Breves, O reino da Marambaia, Rio de Janeiro: Gráfica Olímpica Editora, 1966, p. 96 18 Joaquim de Paula Guedes Alcoforado, História sobre o infame negócio de africanos da África Oriental e Ocidental, com todas as ocorrências desde 1831 a 1853. Agradecemos ao professor Carlos Gabriel Guimarães do Departamento de História da UFF por ceder gentilmente a transcrição do referido documento. O trecho cedido por Carlos Gabriel não consta no texto transcrito por Roquinaldo Ferreira.

19 Para uma análise de alguns desses sujeitos, ver: Jaime Rodrigues, De costa a costa. Escravos, marinheiros e intermediários do tráfico negreiro de Angola ao Rio de Janeiro (1780-1860), São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

20 Sobre a Marambaia, ver: Márcia Motta, "Ilha da Marambaia: história e memória de um lugar", in Márcia Motta e Elione Guimarães (orgs.), Campos em disputas: história agrária e companhia (São Paulo: Annablume, 2007), v.1. p. 295-317. Para uma análise etnográfica, ver: José Maurício Arruti (coord.), Laudo antropológico da comunidade remanescente de quilombo da ilha da Marambaia(Rio de Janeiro: Koinonia / Projeto EGBÉ -Territórios Negros, 2003).

21 Cichelli, "Dos caminhos". Segundo a autora, em África embarcaram 855 escravos, e destes, 283 morreram ou foram lançados vivos ao mar durante a viagem.

22 Daniela Paiva de Moraes, "A capital marítima do comendador: a atuação da Auditoria Geral da Marinha no julgamento sobre a liberdade dos africanos apreendidos na ilha da Marambaia (1851)"(Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, 2009).

23 É importante destacar que o tráfico ao norte da linha do equador era ilegal desde 1815, segundo acordo traçado entre a Coroa Portuguesa e a Inglaterra.

24 "The Trans-Atlantic Slave Trade Database Voyages" Voyage 4640 <http:// www.slavevoyages.org/tast/index.faces>, acessado em setembro de 2009.

25 Sobre essas apreensões, ver: Moraes, "A capital marítima do comendador" 26 A coincidência no nome do navio, assim como do seu capitão, Vicente de Freitas Serpa, que comandou ambas as viagens, nos deu certeza de estarmos diante do mesmo brigue. Ver "The Trans-Atlantic Slave Trade Database", Voyages 1948 e 900153.

27 Entre os desembarques registrados no banco de dados do projeto Voyages, apenas o bergantim Leão não foi apreendido.

28 Tâmis Parron, "A política da escravidão no Império do Brasil, 1826-1865" (Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, 2009).

29 Carlos Eduardo de Almeida Barata, "Os Breves abastados proprietários", <www.hegallery.com.br/genealogia>, acessado em 30/03/2009.

30 Museu da Justiça do Estado do Rio de Janeiro (MJERJ), Inventário de José de Souza Breves, Volume 3, 1879, pp. 528-38.

31 Roquinaldo Ferreira, "Dinâmica do comércio intra-colonial: geribita, panos asiáticos e guerra no tráfico angolano de escravos", in João Fragoso, Maria Fernanda Bicalho e Maria Fátima Gouvêa (orgs.), O Antigo Regime nos trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (Séculos XVI-XVIII) (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002), pp. 339-78. Segundo Ferreira, "Em 1850, o consulado português no Rio de Janeiro dizia: 'uma grande parte dos gêneros de importação nesta África são produtos do solo brasileiro principalmente aguardente, açúcar, farinha de mandioca'". Ofício do Consulado Português no Rio de Janeiro em 27 de dezembro de 1850. Ferreira, "Dos sertões", p.16.

32 Museu da Justiça do Estado do Rio de Janeiro (MJERJ), Inventário de José de Souza Breves, v.1, p.164.

33 Jornal do Commercio, 6 de março de 1851.

34 Museu da Justiça do Estado do Rio de Janeiro (MJERJ), Inventário de Joaquim José de Souza Breves, Volume 2, pp. 291- 9.

35 Inventário de Joaquim José de Souza Breves, p. 294.

36 Em seu artigo a Lei estabelece que: "são autores do crime de importação, ou de tentativa dessa importação, o dono, o capitão ou mestre, o piloto e o contramestre da embarcação, e o sobrecarga. São cúmplices a equipagem, e os que coadjuvarem o desembarque de escravos no território brasileiro de que concorrerem para ocultar ao conhecimento da autoridade, ou para os subtrair à apreensão no mar, ou em ato de desembarque sendo perseguida". Colleção das Leis do Império do Brasil, Biblioteca Nacional (BN).

37 Assis Chateaubriand, Um viveiro morto de mão de obra negra para o cafezal, apud Padre Reynato Breves, A saga dos Breves. Sua família, genealogia, história e tradições, Rio de Janeiro: Editora Valença S.A, s/d., pp.749-50.

38 Ver: Alberto Lamego, O homem e a restinga, Rio de Janeiro: IBGE - Conselho Nacional de Geografia, 1946. José Murilo de Carvalho, Teatro das sombras. A política imperial, São Paulo: Vértice, 1988, p.16; e Richard Graham, Patronage and Politics in Nineteenth-century Brazil, Stanford: Stanford University Press, 1889, pp.125-7.

39 Stanley Stein, Vassouras: um município brasileiro do café, 1850-1900, Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990, p, 102, nota 56.

40 Robert Slenes, "O que Rui Barbosa não queimou. Novas fontes para o estudo da escravidão no século XIX", Revista Estudos Econômicos, v. 13, n. 1 (1983), pp.

117-49.

41 Para o século XVIII, Mariza Soares destaca que "na passagem de escravo a forro deve-se não apenas conseguir a alforria, mas também passar de um livro a outro. A alforria na pia batismal é completa quando o assento é feito no livro dos brancos". Mariza Soares, Devotos da cor: identidade étnica, religiosidade e escravidão no Rio de Janeiro do século XVIII, Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, p. 101. Embora os nossos dados não se refiram a alforrias, tampouco à documentação eclesiástica, é importante destacar as percepções sociais extraídas da documentação trabalhada.

42 Para primeira metade do século XVIII, Mariza Soares destaca que o termo crioulo era usado como sinônimo da primeira geração de filhos de mãe gentia.

Mariza Soares, Devotos da cor, p. 97 e 100.

43 Mariza Soares, Devotos da cor", p. 109.

44 Sobre as nações africanas da cidade do Rio de Janeiro na primeira metade do século XIX, assim como sobre a predominância dos grupos da região de Angola e do Congo Norte, ver Mary Karasch, A vida dos escravos no Rio de Janeiro (1808- 1850), São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

45 Entre os quatro grupos, apenas os macuas, procedentes do interior da Ilha de Moçambique, eram mais comuns na província do Rio de Janeiro. Acreditamos que os luisaman vissem do norte de Angola, próximo ao rio Cuanza. Ver: "Apêndice A Origens africanas do tráfico de escravos para o Rio de Janeiro, 1830-1852", in Mary Karasch, A vida dos escravos. Desconhecemos as procedências dos grupos marave e buí.

46 Ferreira, "Dos sertões".

47 Cichelli, "Dos caminhos".

48 Manolo Florentino, "Aspectos sociodemográficos da presença dos escravos moçambicanos no Rio de Janeiro (1790-1850)", in João Fragoso, Manolo Florentino, Antônio Carlos Jucá e Adriana Campos (orgs.), Nas rotas do Império: eixos mercantis, tráfico e relações sociais no mundo contemporâneo (Vitória / Lisboa: Edufes / IICT, 2006), pp.196-244. Devemos destacar que entre os moçambiques, era comum encontrarmos africanos de diversas etnias da costa leste da África.

49 No gráfico_3, consideramos africanos livres os indivíduos nascidos após o ano de 1831, e registrados como cativos africanos no momento do óbito. A partir da idade evidenciada no ano do óbito, conseguimos encontrar os sujeitos nascidos na África após a ilegalidade da entrada de africanos no Império do Brasil.

50 Diferentemente da perspectiva do Estado imperial, que geralmente considerou livre os africanos desembarcados após a segunda lei antitráfico, estamos considerando "africanos livres" os indivíduos que nasceram na África depois de 1831 e entraram ilegalmente no Brasil como escravos. Sobre as diferentes apropriações dessa categoria, ver: Beatriz G Mamigonian, "Revisitando a transição para o trabalho livre: a experiência dos africanos livres", in Manolo Florentino (org.), Tráfico, cativeiro e liberdade: Rio de Janeiro, séculos XVII-XIX (Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005), pp.389-17.

51 Segundo Karasch, "[...] os Benguelas tinham inundado a cidade [do Rio de Janeiro] na década de 1840 [...] À medida que os britânicos pressionavam Luanda nessa década, muitos comerciantes com base no Rio transferiam suas operações para o sul e negociavam com Benguela"; Karasch, A vida dos escravos, p. 57.

52 Vale enfatizar que as antigas fazendas litorâneas dos comendadores emergem no início do século XXI como Comunidades Remanescente de Quilombo, nos termos do artigo 68 dos ADCT da Constituição Brasileira de 1988.

53 Arquivo Nacional (AN), Secretaria de Polícia da Corte, Reservado, fevereiro de 1854, Série Justiça (IJ6 468).

54 Sobre os números do tráfico, ver: Maurício Goulart, A escravidão africana no Brasil (Das origens à extinção do tráfico), São Paulo: Livraria Martins Editora, 1949; Leslie Bethell, A abolição do tráfico de escravos no Brasil, Rio de Janeiro: Editora Expressão e Cultura, 1976; David Eltis, Economic Growth and the Ending of the Transatlantic Slave Trade, Nova York: New York University Press, 1987.

55 Minuta de Resposta. 1853, Museu Histórico Nacional (MHN), Coleção Euzébio de Queiróz, EQcr 79/1 (grifo do autor).


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