O impacto da internacionalização com foco na inovação tecnológica sobre as
exportações das firmas brasileiras
INTRODUÇÃO
A questão do desempenho das exportações brasileiras sempre esteve presente na
agenda governamental e também não é nova na literatura. Mais recentemente, com
a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior do governo Lula, o
tema da internacionalização de empresas brasileiras volta ao centro da cena.
Uma vez que boa parte do comércio internacional se dá intrafirmas, a
internacionalização de empresas e sua relação com as exportações surgem como um
aspecto a ser investigado. Parece haver evidências de que o desempenho
exportador pode ser influenciado positivamente quando a firma estabelece uma
subsidiária no exterior. Esta pode contribuir com o seu desempenho exportador
por exercer diversas funções, tais como acessar canais de comercialização,
adaptar os produtos à demanda de mercados específicos, criar mercados, acessar
recursos financeiros mais baratos e apropriar tecnologias não disponíveis no
mercado doméstico.
Existe uma lacuna na literatura e nas políticas públicas brasileiras quando o
tema é a internacionalização e seu impacto sobre as exportações. Este artigo
procura ajudar a preencher essa lacuna. Os trabalhos até então elaborados
investigam, no máximo, poucas dezenas de empresas. No presente texto,
exploraremos integradamente as grandes bases de dados nacionais, quais sejam,
Pesquisa Industrial Anual ' PIA, Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica '
PINTEC/IBGE, SECEX/MDIC e Relação Anual de Informações Sociais ' RAIS/MTE, o
que possibilita análises extremamente abrangentes que alcançam mais de 90% do
valor adicionado na indústria. A PINTEC apresenta uma pergunta referente à
utilização de estabelecimento do grupo empresarial no exterior como fonte
principal de informações para a inovação, o que permite analisar as
características das firmas que realizam esse tipo específico de
internacionalização, chamado assim com base na inovação. Ou seja, essa forma de
internacionalização é entendida como a situação na qual a firma possui no
exterior um outro estabelecimento do grupo que é utilizado como fonte principal
de informação para a inovação tecnológica.
Buscam-se evidências sobre qual é a influência dessa internacionalização sobre
o comércio exterior da firma. Mais especificamente, o objetivo deste trabalho é
responder às seguintes perguntas: Quais são as características das firmas que
realizam internacionalização com foco na inovação tecnológica na indústria
brasileira? Qual é o impacto desse tipo de internacionalização no comércio
exterior brasileiro? Qual é a importância relativa dos diferentes tipos de
gastos em atividades voltadas para o processo de inovação tecnológica nas
firmas industriais brasileiras? Qual é a importância dos recursos financeiros
públicos para que as firmas possam realizar tais inovações no Brasil? Quais os
parâmetros para o governo apoiar a internacionalização com foco na inovação
tecnológica das firmas industriais no Brasil?
O artigo é composto de cinco seções, incluída esta introdução. A segunda parte
faz um apanhado não exaustivo sobre os trabalhos que tratam dos determinantes
das exportações brasileiras e das características da internacionalização das
firmas no Brasil. A terceira cumpre três objetivos: compara as características
das firmas que realizaram internacionalização com foco na inovação tecnológica
com as demais firmas na indústria; verifica qual o impacto dessa
internacionalização no desempenho comercial das mesmas; e estima quais são as
atividades mais importantes para a firma inovar. A seção seguinte mensura a
importância do apoio financeiro público para que se realizem inovações
tecnológicas. A última conclui procurando estabelecer parâmetros para atuação
do governo no apoio à internacionalização com foco na inovação tecnológica das
firmas brasileiras.
EVIDÊNCIAS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS DA INTERNACIONALIZAÇÃO DAS FIRMAS NO BRASIL
Diversos estudos sobre os determinantes das exportações brasileiras estiveram
voltados para estimação dos custos dos recursos domésticos, que é uma medida de
vantagem comparativa de um país apoiada nas teorias ricardianas e H-O
(Heckscher, 1919; Ohlin, 1933). Produtos que podem gerar maior quantidade de
divisas com menor custo dos recursos domésticos são aqueles sobre os quais
potencialmente o país possui vantagens comparativas. Vários autores, como
Savasini et alii (1974), Savasini (1978), Savasini e Kume (1979), Paula Pinto
(1981; 1984; 1994), Braga e Hickmann (1988), entre outros, fizeram estimativas
do custo dos recursos domésticos para o Brasil. Esses estudos encontram
evidências de que os setores industriais brasileiros que usam mão-de-obra de
forma mais intensiva têm um custo por divisa gerada mais baixo, se comparados
aos demais. Quando se separam as indústrias que utilizam mão-de-obra
qualificada daquelas que usam a não qualificada, verifica-se que o custo dos
recursos é menor nas indústrias que utilizam maior quantidade de mão-de-obra
não qualificada por unidade exportada.
Hidalgo (1985) foi um dos pioneiros em testar empiricamente o teorema H-O para
o Brasil. Os resultados mostram que o Brasil exporta bens intensivos em mão-de-
obra e importa bens intensivos em capital, o que comprovaria os resultados H-O.
Lafetá Machado (1997) testou a mesma teoria para o Brasil com base na abordagem
da mão-de-obra qualificada e menos qualificada1. Os resultados mostraram que o
padrão de comércio do Brasil está de acordo com a quantidade relativa de
fatores de produção que a economia desse país dispõe, ou seja, as exportações
são lastreadas em bens intensivos em mão-de-obra menos qualificada.
Outros trabalhos empíricos buscaram evidências de padrões de comércio não
explicados pelas teorias fundamentadas na dotação relativa de fatores. Teitel e
Thoumi (1986) são enfáticos em afirmar que o fato de o Brasil e a Argentina
serem países com uma boa base de recursos humanos e mão-de-obra com certo grau
de qualificação lhes possibilita aproveitar o crescimento via substituição de
importações, gerando um processo de industrialização diferente dos demais
países em desenvolvimento. A renda per capita relativamente alta e concentrada
em grandes centros urbanos e o mercado doméstico relativamente grande são
capazes de evitar substanciais deseconomias de escala nesses países.
A evidência de um padrão de comércio intra-indústria2 no Brasil está presente
nos trabalhos de Hidalgo (1990; 1993). Este autor identificou que, no final da
década de 80, mais da metade das exportações brasileiras de manufaturados era
do tipo intra-indústria. Machado (1992) também identificou a existência de um
padrão de comércio intra-industrial entre o Brasil e os países de Associação
Latino-Americana de Integração ' Aladi. Segundo este estudo, na década de 80, a
instabilidade macroeconômica que atingiu a região impediu que as indústrias
estabelecessem vínculos desse tipo de comércio, e o único fluxo de comércio
intra-industrial permanente que então se desenvolveu foi o intercâmbio
intrafirma. Essas evidências também foram encontradas por Baumann (1993). Seus
resultados indicaram que o comércio intrafirma no Brasil tinha aumentado de
forma expressiva nessa mesma década e respondido por parcelas significativas
das exportações em algumas indústrias.
A relação entre a estrutura industrial e a exportação de manufaturados do
Brasil foi também analisada por Braga e Guimarães (1985). A particularidade
deste trabalho está na base de dados que utiliza informações por firmas. Alguns
resultados indicam que há evidências de que o desempenho exportador do Brasil
em 1978 é explicado pela variável "escala de produção"3.
Os trabalhos que investigam os determinantes das exportações brasileiras
utilizando informações por firmas não são freqüentes na literatura brasileira.
Pinheiro e Moreira (2000) analisaram o perfil das firmas exportadoras
brasileiras e encontraram evidências sobre os determinantes das exportações com
base em dados por firmas. Esses autores encontraram que o fator que mais afeta
a probabilidade da firma ser exportadora é o seu tamanho4. Também foram
encontradas evidências de que há uma relação inversa entre a probabilidade de a
firma ser exportadora e a proporção de trabalhadores qualificados/não
qualificados empregados na indústria em que a firma atua.
João De Negri (2003) realizou estudos utilizando dados por firmas e encontrou
evidências de que o tamanho do mercado brasileiro permite que aquelas
instaladas no território nacional atinjam escalas de produção competitivas.
Desta forma, as brasileiras também são competitivas na produção de bens em que
rendimentos crescentes de escala são um dos fatores determinantes da
competitividade das firmas no mercado internacional. Fernanda De Negri (2003)
detectou que existem diferenças significativas no desempenho comercial entre
empresas nacionais e estrangeiras. Estas últimas possuem, em média, volumes de
importação e de exportação superiores aos das empresas nacionais. Entretanto, a
magnitude da diferença entre nacionais e estrangeiras é substancialmente maior
nas importações do que nas exportações. O estudo mostra que, por um lado, as
empresas estrangeiras exportam, em média, 70% a mais do que as nacionais; e,
por outro, importam 290% a mais.
Há um consenso na literatura de que a internacionalização5 das firmas afeta o
seu desempenho exportador. Iglesias e Motta Veiga (2002) ressaltaram que há um
alto grau de insatisfação quanto à internacionalização das firmas industriais
brasileiras. Os estudos que tratam do assunto, contudo, também não são
numerosos.
Brasil et alii (1996) estudaram 150 empresas e encontraram evidências de que a
necessidade de estar próximo ao cliente, conquistar novos mercados e acesso à
tecnologia foram os três primeiros fatores relevantes na decisão das firmas
investirem no exterior. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
' BNDES (1993) realizou um estudo com trinta grandes grupos econômicos
nacionais e concluiu que a maioria das filiais das firmas brasileiras no
exterior atende à finalidade de aproximar a firma da realidade cultural e
organizacional do país receptor e permite que a firma brasileira obtenha ativos
específicos capazes de ampliar sua atuação no mercado.
O trabalho de Iglesias e Motta Veiga (2002) torna-se singular no contexto dos
estudos sobre internacionalização das firmas porque estabelece a ligação entre
internacionalização e desempenho exportador. Esses autores selecionaram um
conjunto de exportadores com investimento no exterior e encontraram que cerca
de 85% das unidades dessas firmas no exterior são utilizadas em atividades de
comércio e distribuição de produtos. Os investimentos produtivos, que
representaram 12% da amostra, estavam concentrados nos setores têxtil, químico,
metalurgia básica e autopeças. Segundo os autores, a logística e a necessidade
de acompanhar as tendências do mercado consumidor foram os principais
motivadores das firmas para promoção de investimentos no exterior.
Em síntese, as evidências empíricas sobre os determinantes das exportações
brasileiras mostraram que o Brasil tem vantagens comparativas estáticas nos
produtos intensivos em mão-de-obra pouco qualificada e recursos naturais. Há
evidências, entretanto, de padrões de comércio intra-industrial e intrafirma
entre o Brasil e as principais economias industrializadas. Estudos por firmas
indicam também que o seu tamanho e os rendimentos crescentes de escala são
variáveis especialmente relevantes na determinação da probabilidade de a firma
brasileira tornar-se exportadora. Com relação às evidências sobre
internacionalização das firmas brasileiras, os estudos mostraram que algumas
delas realizam internacionalização de diversas naturezas. Esse movimento tem
sido mais evidente nas indústrias intensivas em mão-de-obra e recursos
naturais, indústrias em que o Brasil tem reconhecidamente vantagens
comparativas.
Apesar de haver trabalhos que tratam dos determinantes das exportações
brasileiras e da internacionalização das firmas, há ainda lacunas na literatura
brasileira. Uma delas, especialmente relevante, diz respeito à relação entre um
tipo particular de internacionalização, a internacionalização com foco na
inovação tecnológica, e sua influência sobre o desempenho exportador da
indústria brasileira. Este artigo procura levantar elementos que ajudam a
preencher essa lacuna.
INTERNACIONALIZAÇÃO COM FOCO NA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA DAS FIRMAS INDUSTRIAIS
BRASILEIRAS
Características das Firmas Brasileiras Internacionalizadas com Foco na Inovação
Tecnológica
Para classificar as firmas industriais em categorias e identificar aquelas que
se internacionalizaram com o objetivo de realizar inovações tecnológicas, este
trabalho utilizou informações provenientes da PIA do IBGE, da RAIS do MTE,
SECEX do MDIC, e da PINTEC do IBGE.
Utilizou-se a PINTEC para a categorização das firmas e obtenção de outras
informações sobre inovação tecnológica. As informações sobre as características
da mão-de-obra ocupada nas firmas são provenientes da RAIS. As informações
sobre as firmas, como faturamento, valor adicionado e outras, provêm da PIA.
Sobre comércio exterior, exportações e importações, a base utilizada é a da
SECEX. O ano de referência é 2000.
Para classificação das firmas, foram utilizados dois critérios: i) origem do
capital controlador e ii) internacionalização com foco na inovação tecnológica.
No questionário da PINTEC/IBGE6, há duas perguntas sobre esses critérios. A
primeira diz respeito à origem do capital controlador da firma. Neste caso, há
três alternativas de resposta: nacional, estrangeiro ou nacional e estrangeiro
(misto). A segunda é sobre a localização de outra empresa do grupo utilizada
como fonte principal de informação para inovação. Neste caso, há três
alternativas disponíveis: a localização de uma outra firma do grupo no
exterior; a localização no Brasil de outra firma utilizada como fonte principal
de informação para inovação; ou a inexistência, no Brasil e no exterior, de uma
outra firma do grupo utilizada como fonte de informação para o processo de
inovação, o que implicaria que o esforço e a capacidade de inovação da firma
dependeria dela mesma e não de outra firma do grupo. De acordo com as respostas
dos entrevistados, foram construídas sete categorias de firmas: três foram
consideradas internacionalizadas com foco na inovação e quatro não
internacionalizadas com foco na inovação, conforme mostra a Tabela_1.
Neste trabalho, entende-se que uma firma brasileira está internacionalizada com
foco na inovação quando está produzindo no Brasil e possui no exterior outra do
grupo utilizada como fonte principal de informação para realizar inovação
tecnológica. De acordo com esse conceito, as categorias EST_BR, NAC_EXT e
EST_EXT são formadas por firmas que realizaram processos de internacionalização
com foco na inovação. Na categoria EST_BR, estão as estrangeiras que utilizam
firmas localizadas no Brasil como fonte principal de informação para inovação.
Em virtude de estas serem estrangeiras, é plausível acreditar que, apesar da
principal fonte de informação para inovação ser uma firma localizada no Brasil,
a sua localização em outros países seria também uma fonte de informações para
inovação, o que daria a essa categoria a característica de estar
internacionalizada com foco na inovação. A categoria EST_EXT também é formada
por firmas de capital controlador estrangeiro. A diferença é que, nesta
categoria, elas declararam que a principal fonte de informações para a inovação
é uma firma localizada no exterior. A categoria NAC_EXT é formada por firmas de
capital misto que utilizam outra firma no exterior ou no Brasil como fonte
principal de informação para inovação tecnológica e firmas de capital
controlador nacional que possuem no exterior outra firma do grupo utilizada
como fonte principal de informação para inovação tecnológica. As firmas de
capital misto que utilizam como fonte principal de informação firmas
localizadas no Brasil foram consideradas internacionalizadas com foco na
inovação, porque muito provavelmente a associação com o capital estrangeiro
deve ser também uma das fontes de informação da mesma, apesar de a fonte
principal estar localizada no Brasil.
As categorias NAC_BR, NAC_ISOLADA, EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA foram
consideradas não internacionalizadas com foco na inovação. Na categoria NAC_BR,
as firmas de capital nacional têm como fonte principal de informação para
inovação tecnológica outras firmas localizadas no Brasil. Como não há capital
estrangeiro associado a elas, as mesmas foram consideradas não
internacionalizadas. A categoria NAC_ISOLADA é formada por firmas de capital
nacional que não declararam possuir outra firma utilizada como fonte para
inovação. Nas categorias EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA, a presença de capital
estrangeiro ou misto indica firmas internacionalizadas; no entanto, estas
declararam não possuir outra firma do grupo no Brasil ou no exterior utilizada
com o objetivo de obter informação para inovação tecnológica, o que exclui
destas categorias a característica de internacionalização com foco na inovação
tecnológica.
A Tabela_2 mostra a participação de cada uma dessas categorias na indústria
brasileira, considerando as seguintes variáveis: número de firmas, pessoal
ocupado, faturamento, valor adicionado, exportação e importação.
Conforme pode ser observado nos indicadores apresentados na Tabela_2, 96,10%
das firmas estão classificadas na categoria NAC_ISOLADA. Apesar de
numericamente esta categoria representar a grande maioria delas, sua
representatividade cai de forma significativa quando se considera sua
participação no valor adicionado da indústria: elas contribuem com menos da
metade deste valor, 42,79%. A participação desse segmento nas exportações é
ainda menor, 39,15%.
Dentre as categorias internacionalizadas com foco na inovação, destaca-se a
NAC_EXT. A origem do capital controlador da firma é nacional ou compartilhado
com capital estrangeiro. Esta representa apenas 0,35% das firmas na indústria
brasileira. Sua baixa representatividade em termos numéricos é esperada porque
o processo de internacionalização daquelas com foco na inovação não é um
fenômeno generalizado na economia brasileira. Apesar de poucas firmas de
capital nacional ou misto realizarem esse tipo de internacionalização, é
importante ressaltar que a representatividade desse grupo aumenta quase nove
vezes quando a variável de análise é o faturamento ou o valor adicionado na
indústria, e quase dezessete vezes quando se observa a variável exportação.
Tais firmas são responsáveis por aproximadamente 3% do faturamento e do valor
adicionado da indústria, e por 5,8% do total exportado, o que significa que
exportam anualmente mais de US$ 2,5 bilhões.
Quais as principais diferenças entre essas categorias de firmas? Existem
diferenças entre elas quando se considera a média por categoria de variáveis
como tamanho delas, valor adicionado, exportações, importações e
características da mão-de-obra? Para responder a estas perguntas, a Tabela_3
apresenta a média de características da firma e dos trabalhadores dentro de
cada uma das categorias criadas a partir do critério de capital controlador e
internacionalização com foco na inovação.
Quando são comparadas as categorias dessas, a primeira evidência especialmente
relevante é que a menor escala média de produção, mensurada por meio do pessoal
ocupado, do faturamento ou do valor adicionado, é encontrada na categoria
NAC_ISOLADA. A média do pessoal ocupado nas firmas desta categoria, no ano
2000, foi de 102,8, e o faturamento médio nesse mesmo ano foi de R$ 4,1
milhões. O valor adicionado médio nessa categoria também é baixo quando
comparado com as demais. Para quaisquer destas variáveis, a dispersão em torno
da média é relativamente alta indicando que essa categoria é mais heterogênea
que as demais. Essas firmas formam a grande maioria numérica das industriais
brasileiras. Na maioria dos casos, é plausível acreditar que, na média, elas
possivelmente operam com menor eficiência de escala e são pouco integradas ao
comércio internacional, mas que, em conjunto, alcançam 39,15% do total das
exportações industriais. Essas firmas, além de não serem internacionalizadas
com foco na inovação, são também pouco internacionalizadas via comércio
exterior, uma vez que exportam em média US$ 0,3 milhão e importam em média US$
0,1 milhão, muito abaixo das demais categorias. É importante destacar,
entretanto, que essas têm em média cem pessoas ocupadas, faturamento de R$ 4
milhões e que exportam US$ 300 mil. Isso significa uma relação exportação/
faturamento próxima das demais categorias. Levando-se em conta que essa relação
representa a importância da exportação na atividade produtiva da firma, na
média o indicador parece mostrar que as exportações, nessa categoria, têm
importância relativa similar às das demais.
A segunda evidência relevante é que há semelhança quanto à escala de produção
entre as das categorias NAC_ISOLADA, EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA; no entanto, há
diferenças entre estas categorias quando se verifica o desempenho comercial.
Essas se assemelham entre si pelo fato de não terem declarado que possuem outra
firma no Brasil ou no exterior utilizada como fonte principal de informação
para a inovação, e diferem quanto à origem do capital controlador da firma, se
nacional, estrangeiro ou misto, respectivamente. É plausível acreditar que as
estrangeiras da categoria EST_ISOLADA e as de capital nacional associadas ao
capital estrangeiro da categoria MIST_ISOLADA têm maior articulação com canais
de comercialização no exterior, o que ampliaria seu potencial exportador e
importador médio, independentemente de estarem associadas à iniciativa de
buscar em outras firmas informações para inovação tecnológica.
O expressivo saldo comercial negativo da categoria NAC_BR é a terceira
evidência que chama a atenção nas estatísticas associadas às características
das firmas. Nesta, a origem do capital controlador é nacional e são utilizadas
firmas nacionais como fonte principal de informação para a inovação. O motivo
desse saldo negativo está possivelmente vinculado ao fato de que há um grande
número dessas firmas na indústria química, montagem de veículos, autopeças e
bens de capital. Estes segmentos são reconhecidamente setores nos quais as
importações ocorrem com maior intensidade do que em outros segmentos da
indústria7. Portanto, é plausível acreditar que as inovações de processo desses
segmentos demandem maior intensidade de importações de máquinas e equipamentos.
A quarta evidência está relacionada ao fato de a escala de produção ser
relativamente maior nas categorias consideradas internacionalizadas com foco na
inovação. Na categoria EST_BR, destaca-se o fato de as empresas, em média,
empregarem um grande número de pessoas. Essa estatística é razoável porque na
categoria EST_BR há grandes empresas de capital controlador estrangeiro no
segmento de alimentação, o qual é intensivo em mão-de-obra. Isto explica também
o expressivo saldo comercial dessa categoria, pois, dadas as vantagens
comparativas da indústria brasileira, as exportações de produtos como óleo de
soja, suco de laranja, café solúvel e outros acabam por gerar superávits
comerciais expressivos.
Quanto às características individuais dos trabalhadores, é possível observar
que aquelas internacionalizadas com foco na inovação (EST_BR, NAC_EXT, EST_EXT)
e as não internacionalizadas com o mesmo foco, mas com a presença de capital
estrangeiro (EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA) remuneram melhor a mão-de-obra do que
as de capital nacional não internacionalizadas com o objetivo de inovar (NAC_BR
e NAC_ISOLADA). A maior parte do diferencial de salários deve estar relacionada
com a maior produtividade da mão-de-obra, que, por sua vez, depende das
especificidades das firmas e das características individuais dos trabalhadores.
Primeiro, quanto à parcela da remuneração associada às características da mão-
de-obra, as estatísticas apresentadas mostram que a escolaridade média do
trabalhador e o tempo de permanência médio do mesmo na firma são menores nas
categorias NAC_BR e NAC_ISOLADA. Estas duas variáveis têm uma relação direta
com a tecnologia utilizada pela firma. O tempo de permanência do trabalhador na
firma é um indicador importante de aprendizado tecnológico e a escolaridade
média dos trabalhadores nela é uma proxy para o nível tecnológico da firma,
pois é razoável supor que tecnologias mais sofisticadas demandem mão-de-obra
mais qualificada. A internacionalização com foco na inovação, que caracteriza
as firmas das categorias EST_BR, NAC_EXT e EST_EXT, deve exigir trabalhadores
mais escolarizados e mais bem treinados. Os trabalhadores brasileiros devem
passar por algum processo de aprendizado no interior da firma. Muitas vezes o
treinamento está associado à exigência de escolaridade concluída ou em curso no
supletivo, por exemplo, o que impulsiona de alguma maneira a qualificação da
mão-de-obra doméstica. É razoável acreditar que esse processo de aprendizado se
reflita no tempo de permanência do trabalhador nas firmas, pois elas têm
dispêndios de treinamento que seriam perdidos com uma rotatividade alta.
Emprego mais estável favorece o aprendizado e reduz os dispêndios de
treinamento, atração e demissão de pessoal. No caso das categorias EST_ISOLADA
e MIST_ISOLADA, muito provavelmente o diferencial positivo de remuneração
estaria associado à presença de capital estrangeiro8.
Em segundo lugar, quanto à parcela de remuneração do trabalhador associada às
características das firmas, é possível que as das categorias EST_BR, NAC_EXT,
EST_EXT, EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA tenham uma preocupação maior com a
competitividade e, assim, possam fazer uso de mecanismos de salário eficiência
para aumentar a produtividade da sua mão-de-obra. A teoria do salário de
eficiência baseia-se na hipótese de que o custo de monitoramento pode ser muito
elevado nas firmas maiores e/ou nas que operam com tecnologias mais
sofisticadas, e de que a rotatividade e o treinamento são custosos para a
firma. A escala de produção também pode ser um motivador da remuneração maior
nessas categorias, pois os rendimentos crescentes de escala podem garantir
maior produtividade para firmas maiores. É importante ressaltar ainda que a
exposição da firma ao mercado internacional, via internacionalização com foco
na inovação ou via presença de capital estrangeiro no controle das firmas, cria
externalidades positivas capazes de aumentar a produtividade do trabalho.
Em síntese, foi possível observar, pelas características das firmas e da força
de trabalho, que as internacionalizadas com foco na inovação são maiores,
possivelmente aproveitam de forma mais eficiente os rendimentos crescentes de
escala e se inserem no comércio internacional de forma mais intensa, pois
exportam e importam mais do que as outras categorias de firmas. Além dessas
características, foi possível ver que elas remuneram melhor a mão-de-obra,
porque muito provavelmente são mais produtivas, empregam pessoal com maior
escolaridade e possivelmente fazem algum tipo de treinamento para o seu pessoal
ocupado. Dentre as que realizaram processos de internacionalização com foco na
inovação tecnológica, cabe destacar com especial relevância as da categoria
NAC_EXT. Nela, encontram-se firmas de capital nacional e misto as quais podem
ser tomadas como exemplos de internacionalização a serem seguidos por outras de
capital nacional, principalmente aquelas que já fazem um esforço inovador
dentro de um grupo empresarial, como as da categoria NAC_BR.
IMPORTÂNCIA RELATIVA DOS TIPOS DE GASTOS EM ATIVIDADES VOLTADAS PARA INOVAÇÃO
TECNOLÓGICA
Na seção anterior, vimos que as categorias de firmas aqui em análise diferem
entre si quanto às características das firmas e da mão-de-obra. Esse
diferencial seria importante para alavancar as inovações das firmas? Qual o
percentual de firmas inovadoras em cada uma das categorias de firma? Para
responder a esta pergunta, a Tabela_4 apresenta o percentual de firmas que
realizam inovações tecnológicas, de produto e de processo, em cada uma das
categorias.
As estatísticas apresentadas na Tabela_4 mostram que as categorias que possuem
outra empresa do grupo utilizada como fonte principal de informação para
inovação têm maior percentual de firmas inovadoras do que aquelas que não
declararam utilizar outras firmas como fonte principal de informação. Esse
comportamento é também verificado no caso das inovações de processo e de
produto. Quais são os gastos mais importantes que as firmas devem realizar para
aumentar a probabilidade de ser uma inovadora?
Uma medida objetiva para identificar qual a importância que a firma atribui à
implementação de inovações é o valor dos dispêndios das firmas em atividades
vinculadas à inovação tecnológica como proporção do seu faturamento. A Tabela_5
apresenta a média do percentual de gastos das firmas em relação ao seu
faturamento, para seis tipos de atividades voltadas à inovação tecnológica, por
categoria de firmas. O primeiro tipo de gasto compreende o realizado nas
atividades internas de Pesquisa e Desenvolvimento ' P&D. Neste tipo de
gasto, englobam-se o desenho, a construção e o teste de protótipos e de
instalações-piloto, bem como o desenvolvimento de softwares. A aquisição
externa de P&D diz respeito à contratação de serviços de empresas ou
instituições tecnológicas. Nas aquisições de outros conhecimentos externos,
estão incluídos acordos de transferência originados da compra de licença e
direitos de exploração de patentes e uso de marcas, know-how , software e
outros tipos de conhecimento de terceiros. Para introdução de inovações
tecnológicas no mercado, a firma realiza gastos em comercialização, testes de
mercado e publicidade para o lançamento, além da adaptação do produto a
diferentes mercados. No caso de projeto industrial, ela realiza dispêndios que
incluem novas especificações técnicas, características operacionais, métodos,
padrões de trabalho e softwares, além de atividades de metrologia, normalização
e avaliação de conformidade. Para treinamento da mão-de-obra, além dos gastos
diretos, são também contemplados os gastos com a aquisição de serviços de
técnicos especializados9.
Os dados da Tabela_5 mostram que, para o agregado da indústria brasileira, as
atividades de inovação mais dispendiosas das firmas são os gastos em P&D,
treinamento da mão-de-obra e projeto industrial. Os gastos em treinamento da
mão-de-obra são elevados muito provavelmente porque a maior parte das inovações
de processo é realizada com a introdução de novas máquinas e equipamentos que
necessitam de treinamento específico da mão-de-obra para sua operação.
Em princípio, parece não haver um padrão específico que possa distinguir as
categorias de firmas. No entanto, é possível observar que, na média industrial,
as aquisições de conhecimento e P&D fora da firma são relativamente baixas,
mas, nas categorias EST_BR e EST_EXT, em que o capital controlador é de origem
estrangeira, tais aquisições parecem ser relativamente maiores. Apesar de não
existirem informações detalhadas sobre a origem delas, pode ser razoável
acreditar que uma parcela importante dessas aquisições ocorra fora do país.
O dispêndio de P&D proporcionalmente ao faturamento das empresas de capital
nacional que utilizam outros estabelecimentos no Brasil como fonte de
informação principal para a inovação tecnológica (NAC_BR) é em média o maior
entre todas as categorias ' inclusive comparativamente às empresas
internacionalizadas com foco na inovação. Esse comportamento pode indicar que
as firmas de capital controlador nacional, que utilizam como fonte principal de
informação para inovação tecnológica outra firma do grupo localizada no Brasil,
devem empenhar-se mais em gerar inovações tecnológicas com seu próprio P&D
do que aquelas das categorias em que o capital controlador é estrangeiro, ou
seja, o esforço endógeno é maior. Essas evidências são corroboradas também
pelos indicadores de gastos em P&D realizados pelas firmas de capital
controlador misto, categoria MIST_ISOLADA, que são relativamente altos quando
comparados com os das demais categorias. Isso mostra que a localização dos
gastos em P&D guarda íntima relação com a origem do capital, tendendo a se
concentrar em matrizes. Essa conclusão vai ao encontro de pesquisas
anteriormente elaboradas10.
Dado que inovação é um aspecto central da competitividade empresarial, faz-se
necessário desenvolver estudos específicos para essa categoria, inclusive
abordando as questões de internacionalização. Seria importante compreender se
há um conjunto significativo de empresas NAC_BR internacionalizadas, ainda que
não com foco na inovação. Isso significaria que o esforço endógeno (nacional)
de inovação estaria dando frutos na competitividade internacional. O problema
que esse tipo de empresa apresenta é o seu saldo médio negativo de comércio
exterior, o que sugere dependência, e não autonomia tecnológica. Responder a
essas perguntas exigiria outras bases de dados referentes a investimentos no
exterior.
Destacam-se também os indicadores que mostram pouca importância dada aos gastos
com introdução das inovações no mercado das categorias EST_ISOLADA e
MIST_ISOLADA. Nestas, o percentual de firmas inovadoras é menor do que nas
demais, conforme mostrou a análise da Tabela_4, o que torna o resultado
trivial. Menos triviais, entretanto, são os indicadores da categoria
NAC_ISOLADA, uma vez que nela os gastos com a introdução de inovações no
mercado são relativamente maiores, quando comparados com os das categorias
EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA. Também são relativamente grandes os gastos
realizados em P&D e projetos industriais. Isso parece indicar que muitos
projetos industriais e gastos em P&D da categoria NAC_ISOLADA não chegam a
consolidar-se em inovações validadas pelo mercado, o que sugere que a inovação
é mais de processo, voltada para a racionalização da produção (custos,
qualidade etc.), em vez de buscar novos nichos de mercados.
Na categoria NAC_EXT, a relação gastos/faturamento nos itens gastos em P&D,
aquisição de P&D, aquisição de conhecimento e treinamento da mão-de-obra é
relativamente menor do que na média da indústria. Parte desse diferencial pode
ser creditado ao fato de o faturamento médio dessa categoria ser maior do que a
média industrial. As firmas da mesma podem também estar utilizando suas bases
no exterior para imitar inovações tecnológicas disponíveis em outros mercados,
ou, então, estar realizando parte dos seus gastos em atividades voltadas para
inovação tecnológica nas outras firmas do grupo localizadas no exterior.
Independentemente da razão pela qual as firmas dessa categoria gastam
relativamente menos do que a média em algumas atividades de inovação, é
importante ressaltar que poderia haver espaço para mecanismos que incentivem o
aumento de gastos nessas atividades.
Os dispêndios realizados pelas firmas em atividades voltadas à inovação não
refletem, entretanto, a importância dos gastos de cada categoria no total de
dispêndios que a indústria brasileira realiza com essas atividades. Para
mensurá-la, a Tabela_6 apresenta o valor total dos dispêndios em atividades
relativas à inovação realizados no ano 2000, por categoria de firmas.
A Tabela_6 mostra que as atividades de P&D e projeto industrial
correspondem aos principais gastos realizados pelas firmas com o objetivo de
inovar. Em 2000, a indústria brasileira gastou R$ 3,7 bilhões em P&D. Uma
parte significativa desses gastos foi realizada por firmas de capital
controlador estrangeiro, particularmente as pertencentes à categoria EST_EXT
foram responsáveis por gastar R$ 1,4 bilhões11. É importante observar que essas
firmas representam apenas 1,33% do total de firmas da indústria brasileira. As
firmas da categoria NAC_ISOLADA, que representam 96% delas, gastaram cerca de
R$ 1,3 bilhões.
Esse padrão se repete para os demais tipos de gastos, ou seja, as firmas de
capital controlador estrangeiro da categoria EST_EXT realizam a grande maioria
dos gastos em atividades voltadas à inovação, e, como representam uma parcela
menor de firmas em relação ao total, os gastos individuais dessas são
significativamente superiores quando comparados aos das demais categorias. Da
mesma forma, a segunda categoria que mais gasta em valores absolutos é a
NAC_ISOLADA, mas, como nesta categoria se encontra a grande maioria das firmas
da indústria brasileira, o valor médio investido por elas é o menor dentre as
categorias.
Para quantificar a importância dos tipos de dispêndios como proporção do
faturamento das firmas na probabilidade de ela ser uma inovadora, foram
estimados três modelos probabilísticos em que a variável dependente é a
condição de a firma ser ou não inovadora, inovadora de produto e inovadora de
processo, e as variáveis explicativas são os diferentes tipos de gastos em
atividades voltadas para a inovação tecnológica divididos pelo faturamento. A
escolaridade média dos trabalhadores na firma também foi introduzida como
variável explicativa. Os resultados são apresentados na Tabela_7. Além dos
tipos de gastos, foram também introduzidas variáveis dummies para divisões de
acordo com a Classificação Nacional de Atividade Econômica que não foram
reportadas na tabela12. A variável "gastos com treinamento da mão-de-obra" não
foi significativa no modelo em que a variável dependente era a inovação de
produto, e as variáveis gastos em P&D e projeto industrial não foram
significativas no modelo de inovação de processo. O fato de a inovação de
produto não estar significativamente correlacionada com treinamento sugere
inovações incrementais, que pouco afetam as formas de trabalho. Outras
estatísticas do modelo podem ser vistas na tabela em questão.
A probabilidade marginal mostrada na mesma tabela demonstra o quanto aumenta a
probabilidade de a firma ser inovadora para cada aumento de uma unidade da
variável explicativa. Como os tipos de dispêndios estão relacionados ao
faturamento, não é razoável acreditar no aumento de uma unidade nessas
variáveis, pois isto significaria investir todo o faturamento da firma em
atividades vinculadas à inovação tecnológica. Para melhor interpretar os
resultados, foi simulado quanto aumentaria a probabilidade de a firma ser uma
inovadora se os dispêndios nas diversas atividades de inovação aumentassem
100%, mantido constante o faturamento das firmas. Os resultados da simulação
são apresentados entre colchetes na coluna da probabilidade marginal na Tabela
7.
Os resultados da simulação indicaram que os três dispêndios mais relevantes
para aumentar a probabilidade de a firma ser uma inovadora são os realizados em
treinamento da mão-de-obra, P&D e projeto industrial. Uma faixa de gasto
100% acima dos realizados pelas firmas industriais brasileiras em treinamento
da sua mão-de-obra resultaria em um aumento de 12% na probabilidade de as
firmas serem inovadoras. Esse resultado é particularmente relevante, pois
significa dizer que um esforço para aumentar a taxa de inovação da indústria
brasileira requer maiores investimentos em escolaridade e treinamento, o que
poderia ser um dos pilares de um programa nacional pró-inovação. No caso dos
gastos em P&D, o aumento na probabilidade de inovar é de 6% e, no caso dos
gastos em projeto industrial, esse aumento seria de 5%. A probabilidade de a
firma ser inovadora aumentaria também 8% caso a escolaridade média dos
trabalhadores nas firmas aumentasse dois anos em média. Cada ponto percentual
de aumento na probabilidade de as firmas serem inovadoras significa que 227
novas firmas se tornariam inovadoras na indústria brasileira. Dessa maneira, um
aumento de 100% nos gastos dos três dispêndios mais relevantes do ponto de
vista dos determinantes da inovação tecnológica ' o que representaria um
aumento no valor de R$ 7,4 bilhões, associado a um aumento de dois anos na
escolaridade média dos trabalhadores ocupados nas firmas ' significaria um
aumento de aproximadamente sete mil novas firmas inovadoras na indústria.
Em princípio, parece ser relativamente alta a relação entre o aumento de R$ 7,4
bilhões de gastos em treinamento da mão-de-obra, P&D e projeto industrial e
a geração de sete mil novas firmas inovadoras. Esta relação merece melhor
qualificação. Segundo dados da Pintec, existem na indústria brasileira 70 mil
firmas com mais de dez pessoas ocupadas. Destas, cerca de 22 mil são
inovadoras. O aumento de sete mil novas firmas industriais inovadoras
significaria ampliar em mais de 30% o número de firmas que realizam inovações
na indústria brasileira. Outro ponto relevante é que a maior parte dos gastos
em atividades voltadas para a inovação tecnológica são realizadas por firmas de
capital controlador estrangeiro. Firmas de capital nacional ou misto da
categoria NAC_EXT possuem maior êxito em alcançar inovações e têm dispêndios
muito menores do que a média, conforme observado nas Tabelas_5 e 6. Seria
razoável acreditar que um esforço muito menor seria necessário se firmas das
categorias NAC_BR e NAC_ISOLADA identificassem o exemplo das da categoria
NAC_EXT e realizassem internacionalização com foco na inovação.
Nos modelos desagregados por inovadoras de produto e processo, os parâmetros
caíram de forma significativa. Essa queda seria esperada porque a interface
entre inovadoras de processo e de produto não é grande. No modelo de inovadora
de produto, os gastos mais importantes são aqueles realizados em P&D, pois
um aumento de 100% nesses gastos resultaria em um aumento de 3% na
probabilidade de a firma ser inovadora. No modelo de inovadora de processo, o
gasto mais importante é realizado no treinamento da mão-de-obra. Um aumento de
100% nesse gasto resultaria em um aumento de 3% na probabilidade de a firma ser
inovadora. O aumento de dois anos na escolaridade média do trabalhador teria o
mesmo impacto tanto no modelo de inovadora de produto quanto no de processo, ou
seja, aumentaria em 7% a probabilidade de inovar.
Nos resultados desse modelo, chama atenção a importância da qualificação da
mão-de-obra na probabilidade de a firma inovar. Das quatro variáveis que mais
afetam a probabilidade de a firma ser uma inovadora, duas delas estão
diretamente vinculadas à mão-de-obra: treinamento e escolaridade. Estas duas
variáveis são determinantes importantes para as firmas competirem nos mercados
doméstico e internacional. Cabe destacar que a variável treinamento da mão-de-
obra está estreitamente vinculada à inovação de processo, uma vez que esse tipo
de inovação depende da aquisição de máquinas e equipamentos, que, por sua vez,
gera necessidade de treinamento específico da mão-de-obra.
Desempenho no Comércio Exterior das Firmas que Realizam Internacionalização com
Foco na Inovação Tecnológica
A literatura sobre o tema demonstra que inovação tecnológica e rendimentos
crescentes de escala da firma estão incluídos entre os determinantes das
exportações de um país. Na seção anterior, identificamos que as características
da mão-de-obra empregada é uma das variáveis especialmente relevantes para a
firma tornar-se uma inovadora. No caso brasileiro, há evidências de que a
qualidade da mão-de-obra também é importante para as firmas competirem no
mercado internacional via exportações. Se o Brasil já está inserido nos
mercados internacionais em que rendimentos crescentes de escala e inovação são
os principais fatores de competição entre as firmas, qual seria a importância
da internacionalização com foco na inovação tecnológica para aumentar a
probabilidade de uma firma ser exportadora ou importadora?
Para responder a essa questão, dois modelos probabilísticos foram estimados. No
primeiro, a variável dependente é a condição de a firma ser ou não exportadora,
e, no segundo, a variável dependente é a condição de a firma ser ou não
importadora. As variáveis explicativas são dummies por categoria de firmas
criadas neste trabalho e dummies por divisão de acordo com a Classificação
Nacional de Atividades Econômicas ' CNAE. A categoria de referência é a
NAC_ISOLADA. Os resultados são apresentados na Tabela_8.
Os resultados da Tabela_8 mostram que, nas categorias de firmas que realizam
processos de internacionalização com foco na inovação (categorias EST_BR,
NAC_EXT e EST_EXT), a probabilidade de a firma ser exportadora é maior do que
na categoria NAC_ISOLADA. Para as categorias EST_BR e EST_EXT, compostas de
firmas com capital controlador estrangeiro, a probabilidade de a firma ser
exportadora, caso ela pertença a uma dessas duas categorias, é,
respectivamente, 38% e 39% maior do que na categoria NAC_ISOLADA. Se a firma
pertence à categoria NAC_EXT, ela tem 27% mais chances de ser uma exportadora
do que se pertencesse à categoria NAC_ISOLADA. Esses números mostram que a
internacionalização com foco na inovação é positivamente correlacionada com a
probabilidade de a firma ser exportadora, e particularmente maior quando ela é
de capital controlador estrangeiro. A presença de capital estrangeiro nas
categorias EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA e o esforço inovador das firmas da
categoria NAC_BR possivelmente deve ter afetado positivamente a probabilidade
de a firma ser uma exportadora em relação à categoria NAC_ISOLADA, mesmo sendo
estas categorias não internacionalizadas com foco na inovação.
Em relação à probabilidade de a firma ser importadora, os resultados mostraram
que a internacionalização com foco na inovação parece afetá-la positivamente.
Nas categorias EST_BR, NAC_EXT e EST_EXT, tal probabilidade aumenta,
respectivamente, 54%, 37% e 51% em relação à categoria NAC_ISOLADA. Esses
números são maiores em comparação aos das firmas que não realizam
internacionalização com foco na inovação. Ou seja, nas categorias NAC_BR,
EST_ISOLADA e MIST_ISOLADA, a probabilidade de a firma ser uma importadora
aumenta, respectivamente, 35%, 33% e 31%. Mais uma vez, quando o capital
controlador é estrangeiro, a probabilidade de ela ser uma importadora aumenta
mais do que quando o controle é nacional ou misto.
Na categoria NAC_EXT, apesar da maior probabilidade da firma ser importadora do
que exportadora, o saldo comercial é positivo em mais de US$ 0,5 bilhão. Na
categoria NAC_BR, o saldo comercial é negativo em mais de US$ 3 bilhões. Na
categoria NAC_ISOLADA, as firmas, em média, exportam e importam pouco, mas o
saldo é positivo em mais de US$ 1 bilhão.
A evidência de que a probabilidade de a firma ser uma exportadora aumenta se
ela realiza internacionalização com foco na inovação tecnológica não qualifica
o tipo de inserção dela no comércio exterior. Essa inserção será tanto mais
virtuosa quanto maior for o preço que ela conseguir cobrar pelo seu produto
exportado, quando comparado ao preço dos demais exportadores de um mesmo país.
A internacionalização com foco na inovação tecnológica aumenta a chance de uma
firma instalada no Brasil obter preço prêmio nas suas exportações em relação
aos demais exportadores brasileiros? Esta questão é especialmente relevante
porque há uma relação direta entre a agregação de valor ao produto exportado e
o preço prêmio relativo aos exportadores de um mesmo país. Essa agregação de
valor é uma condição importante para a inserção virtuosa de um país no comércio
internacional.
Para verificar se a internacionalização está correlacionada com a obtenção do
preço prêmio nas exportações, foi estimado um modelo probabilístico em que a
variável dependente é a condição de a firma exportar com preço prêmio, e as
variáveis independentes representam a condição de a firma ter obtido as
informações necessárias para a inovação tecnológica no exterior e por
diferentes caminhos. Deve-se ressaltar que a firma pode obter no exterior
informações de diversas fontes: participando de eventos, comprando informações
de centros de pesquisa, contratando consultoria etc., ou por intermédio de uma
outra empresa do mesmo grupo no exterior. A especificação do modelo foi
detalhada, por meio das variáveis explicativas, de maneira a mapear todas as
possíveis formas de a firma obter no exterior informações para a inovação. O
objetivo dessa especificação é verificar qual tipo de fonte no exterior é mais
importante para a obtenção de preço prêmio nas exportações. Participar de um
grupo empresarial com empresa no exterior é a melhor forma de a firma obter
preço prêmio nas exportações?
Neste trabalho, o preço prêmio foi calculado por produto e mercado de
referência. Considerou-se que a firma obteve preço prêmio de exportação caso o
preço do bem exportado pela mesma estivesse 30% acima do preço médio exportado
pela indústria brasileira13. Foram considerados três mercados de referência:
Estados Unidos, Europa e América Latina. Foram estimados quatro modelos. No
primeiro, a variável dependente é a condição de a firma ter obtido preço prêmio
em qualquer um dos três mercados de referência. Nos outros três modelos, a
variável dependente é a condição de a firma ter exportado com preço prêmio para
cada um dos mercados de referência. Os resultados estão apresentados na Tabela
9.
O primeiro resultado importante do modelo de preço prêmio é a estimativa de que
a probabilidade de a firma exportadora no Brasil obtê-lo em relação aos demais
exportadores da indústria brasileira, para os mercados dos Estados Unidos,
Europa ou América Latina, aumenta em 18% caso ela obtenha as informações
necessárias para realizar inovação tecnológica de outra empresa do seu grupo
empresarial no exterior. Ou seja, a internacionalização com foco na inovação
tecnológica está positivamente relacionada à obtenção de preço prêmio nas
exportações e, portanto, à agregação de valor aos bens exportados pelas firmas
brasileiras. Os resultados são consistentes quando as estimativas são
realizadas para cada mercado de referência.
O segundo resultado relevante do modelo é que as demais fontes de informação no
exterior, que não a participação em um grupo empresarial internacionalizado,
não são significativas do ponto de vista estatístico, ou são pouco importantes
para a firma obter preço prêmio nos seus bens exportados.
No caso de preço prêmio para os Estados Unidos, as informações para inovação
provenientes de fornecedores e clientes no exterior estão também positivamente
correlacionadas com a obtenção de preço prêmio. Para a Europa, as informações
que têm como fonte os clientes estão positivamente correlacionadas com o preço
prêmio. No caso da América Latina, essas fontes não são importantes para
obtenção de preço prêmio. Considerando que a exigência do consumidor no mercado
da Europa e dos Estados Unidos é maior do que no mercado brasileiro, no qual a
firma exportadora realiza sua produção, esses resultados parecem estar de
acordo com o que seria esperado. É razoável acreditar que, nos mercados mais
exigentes, como Europa e Estados Unidos, vis-à-vis a América Latina, as firmas
que realizam inovações tecnológicas com informações dos clientes e fornecedores
podem adequar melhor seu produto à demanda externa e, com isso, obter um
diferencial de preços sobre as firmas que não levam em conta tais informações.
Nos mercados menos exigentes ou mesmo naqueles tão exigentes quanto o do país
onde a firma está instalada, que parece ser o caso das firmas brasileiras que
exportam para o mercado da América Latina, as firmas não precisam contar com
informações adicionais do país de destino da mercadoria para realizar
inovações. Desta forma, não haveria um diferencial relativo de preços originado
de firmas que buscam informações em clientes e fornecedores no exterior.
Em síntese, do ponto de vista da corrente de comércio, foram encontradas
evidências de que as firmas que se internacionalizam com foco na inovação têm
maior probabilidade de serem exportadoras vis-à-vis as firmas que não realizam
esse tipo de internacionalização. Foram também encontradas evidências de que as
firmas brasileiras que se internacionalizam com foco na inovação conseguem
obter um diferencial positivo de preço nos bens exportados, quando comparados
com os demais exportadores da indústria brasileira. Desta maneira, é plausível
acreditar que a internacionalização voltada para a inovação, além de promover a
inserção externa da firma, torna mais virtuosa sua inserção no comércio
internacional, pois aumenta a agregação de valor ao produto exportado.
A IMPORTÂNCIA DO APOIO GOVERNAMENTAL E ARRANJOS COOPERATIVOS PARA A FIRMA
REALIZAR INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
Neste trabalho, detalhamos as características de diferentes categorias de
firmas de acordo com a origem do capital controlador e sua internacionalização
com foco na inovação tecnológica. De maneira geral, observamos que as firmas de
capital nacional ou misto que realizam processos de internacionalização com
foco na inovação tecnológica são mais competitivas do que a grande maioria das
firmas na indústria brasileira, e suas características se assemelham àquelas
estrangeiras, que são reconhecidamente mais competitivas.
No Brasil, há diversos tipos de apoio governamental que as firmas podem usar
para alavancar seu esforço inovador. O apoio governamental está relacionado
principalmente ao financiamento de atividades vinculadas à inovação tecnológica
da firma. Além do apoio público, muitas cooperam com outras organizações com o
objetivo de desenvolver inovações. Qual é a importância do apoio financeiro
público e da cooperação para as diferentes categorias de firmas? A Tabela_10
mostra o percentual de firmas, em cada categoria, que receberam apoio público
para o financiamento de atividades relacionadas à inovação tecnológica, assim
como o percentual das que estiveram envolvidas em arranjos cooperativos com
outras organizações a fim de desenvolver atividades inovadoras.
Com relação aos recursos financeiros públicos, observamos que os maiores
percentuais estão nas categorias NAC_EXT, NAC_BR e MIST_ISOLADA, que são
formadas por firmas de capital nacional ou misto. Mais de 10% das firmas em
cada uma dessas categorias receberam algum tipo de apoio financeiro público
para alavancar suas atividades de inovação tecnológica. No entanto, é
importante observar que 5% das firmas estrangeiras da categoria EST_EXT recebem
apoio público. Como nesta categoria está concentrada a maior parte dos gastos
em atividades voltadas à inovação, é possível que essas firmas absorvam um
volume considerável de recursos provenientes do setor público. A Tabela_10
mostra também que a cooperação pode ser um elemento importante para se obter
êxito no processo de inovação, uma vez que nas categorias EST_BR, NAC_EXT,
EST_EXT e NAC_BR há maior percentual de firmas que cooperam, sendo maior também
o percentual de firmas inovadoras.
Para dimensionar a importância de diversas fontes de recursos na probabilidade
de ela ser uma inovadora, foram estimados três modelos probabilísticos. A
condição de a firma ser inovadora, inovadora de produto ou inovadora de
processo foi explicada pela participação relativa de fontes própria, privada ou
pública sobre o total de gastos em P&D e pela participação relativa de
fontes própria, privada ou pública sobre o total de outros gastos em atividades
relacionadas com inovação tecnológica. Os resultados foram apresentados na
Tabela_11.
A análise dos resultados pode ser feita diretamente sobre a probabilidade
marginal. No caso dos gastos em P&D, a fonte de recursos própria é duas
vezes mais importante para a firma alcançar a inovação tecnológica do que
quando a fonte de recursos é pública. Os resultados mostram que um aumento na
participação das fontes próprias em dez pontos percentuais sobre o total dos
gastos em P&D aumentaria em 2,8% a probabilidade de a firma realizar
inovação tecnológica. Se a fonte pública de financiamento para as atividades de
P&D aumentar em dez pontos percentuais, a probabilidade de as firmas
realizarem inovações tecnológicas aumenta em 1,4%. Ainda com relação aos gastos
em P&D, no caso da inovação de produto, a fonte de gastos próprios continua
sendo a mais importante para determinar a probabilidade de a firma ser uma
inovadora de produto, seguida por fontes privadas e, por último, por fontes
públicas; no caso da inovação de processo, as fontes privada e própria não
foram significativas, e a fonte pública tornou-se a principal variável
explicativa da probabilidade de a firma inovar em processo.
Com relação aos outros gastos em atividade de inovação tecnológica, observa-se
pelos resultados da Tabela_11 que a importância das diferentes fontes de
financiamento na determinação de as firmas serem inovadoras parece ser
relativamente a mesma nos três modelos. No caso da inovação de processo, a
fonte pública parece ser relativamente mais importante que as outras fontes de
financiamento, o que parece ser razoável porque as fontes públicas de
financiamento como BNDES e Banco do Brasil financiam compras de máquinas e
equipamentos utilizados na inovação de processo.
Em síntese, esta seção encontrou evidências de que a cooperação é possivelmente
um elemento importante para as firmas realizarem inovações tecnológicas, pois
nas categorias EST_BR, NAC_EXT, EST_EXT e NAC_BR, nas quais o percentual de
firmas que realizou inovações tecnológicas é maior, também é maior o percentual
de firmas que participam de arranjos cooperativos. Nessas categorias, também é
maior o percentual de firmas que receberam recursos de instituições públicas
para realizar inovações tecnológicas, o que seria uma evidência de que esses
recursos públicos estariam sendo direcionados para firmas mais inovadoras e
estão positivamente relacionados com a probabilidade de a firma realizar uma
inovação tecnológica. Há também alguma evidência de que uma parte significativa
dos recursos públicos esteja sendo destinada para firmas de capital
estrangeiro. Os resultados também mostraram que os recursos públicos são mais
importantes para inovação de processo do que de produto e que, no caso dos
gastos em P&D, os recursos próprios ganham mais relevância.
Tais resultados têm implicações importantes para a Política Industrial,
Tecnológica e de Comércio Exterior que o governo federal vem construindo e
implementando, e que possui a inovação como seu ponto central. Uma vez que a
indução da inovação passa por reduzir o custo e o risco privados, devem ser
elaborados instrumentos adequados. Assumindo, porém, que a inovação mais
relevante é aquela voltada para o mercado (inovação de produto), temos a
prevalência do gasto privado como variável explicativa. Se é fato que, no ano
base das análises aqui realizadas (2000), não havia o empuxo exportador atual,
os dados mostram que é absolutamente relevante estimular o gasto privado em
P&D ; um dos aspectos importantes a serem tratados pela Agência Brasileira
de Desenvolvimento Industrial é a redução do risco da inovação não só para
pequenas e médias, mas também para grandes empresas.
CONCLUSÃO
A conclusão deste trabalho se volta para a seguinte questão: quais são os
parâmetros para o governo apoiar a internacionalização das firmas brasileiras?
A análise aqui desenvolvida demonstrou que existem benefícios resultantes da
internacionalização da firma com foco na inovação tecnológica. Verificou-se que
essas empresas remuneram melhor a mão-de-obra, empregam pessoal com maior
escolaridade e, portanto, geram empregos de melhor qualidade. Além disso,
apresentam, relativo ao faturamento, maior percentual de dispêndio em
treinamento de mão-de-obra, o que impulsionaria de alguma forma a qualificação
da mão-de-obra doméstica. Com relação às características da firma, observou-se
que as internacionalizadas com foco na inovação exportam mais do que as que não
fazem esse tipo de internacionalização, além de agregar valor aos bens
exportados. Portanto, há evidências de que o aumento da competitividade das
firmas é influenciado positivamente pelas inovações tecnológicas resultantes do
processo de internacionalização, e que tal competitividade auxilia nas
exportações de bens de maior valor adicionado. A abertura de mercados externos
geraria maior potencial de expansão e crescimento da firma e também a própria
internacionalização geraria mecanismos de retroalimentação da sua capacitação
tecnológica.
A internacionalização com foco na inovação tecnológica das firmas industriais
brasileiras é, nesse sentido, um componente especialmente relevante da inserção
internacional do Brasil, e há espaço para políticas públicas que incentivem a
internacionalização com esse intuito. É importante ressaltar que a inovação
tecnológica exibe rendimentos crescentes a longo prazo, não quantificáveis em
exercícios estáticos e, portanto, não comparáveis com os custos de curto prazo.
Entretanto, o custo de curto prazo de uma política de incentivo, como, por
exemplo, uma linha de financiamento a longo prazo para estimular a
internacionalização, pode ser relativamente reduzido se esta for focada na
inovação tecnológica e restrita por ações pré-estruturadas que estabeleçam como
critérios fazer com que as firmas de capital nacional que já fazem
significativo esforço para realizar inovações tecnológicas ampliem seu
potencial de inovação internacionalizando-se. Desta maneira, ficaria evidente
que a ação pública deve levar em conta exemplos de êxitos empresariais
nacionais que poderiam ser seguidos por outras firmas de capital nacional,
principalmente por aquelas que já fazem esforço inovador significativo. Deve
ser ressaltado que os incentivos à internacionalização com foco na inovação
tecnológica devem estar também associados a mecanismos que estimulem o aumento
dos gastos privados em atividades voltadas para a inovação tecnológica no
Brasil.
Dos resultados deste trabalho, chama a atenção a importância da qualificação da
mão-de-obra na probabilidade de a firma inovar. Das quatro variáveis que mais
afetam esta probabilidade, duas estão diretamente vinculadas à mão-de-obra:
treinamento e escolaridade. Nesse sentido, há um parâmetro importante para a
política pública de longo prazo. Se a escolarização da força de trabalho por si
só não vai levar automaticamente à inovação e à internacionalização das
empresas, os dados mostram que as empresas que se internacionalizaram com foco
na inovação empregam mão-de-obra mais escolarizada. Assim, uma política de
incentivo à inovação na indústria passa por políticas de aumento da
escolaridade da população.
Deve ser destacado também que um dos resultados deste trabalho é a evidência de
que a cooperação é possivelmente um elemento importante para as firmas
realizarem inovações tecnológicas. Assim sendo e, portanto, verificando-se que
há busca de informação conjunta entre firmas que procuram inovar, há espaço
para o poder público atuar na promoção de ações que procurem no exterior
informações sobre oportunidades de negócio e que podem ser realizadas de forma
compartilhada entre uma agência de promoção de desenvolvimento industrial e
grupos empresariais interessados em internacionalizar-se com foco na inovação.
NOTAS
1. Antes de Lafetá Machado (1997), os trabalhos de Tyler (1972), Rocca e Barros
(1972) e Carvalho e Haddad (1977), também com base na abordagem da mão-de-obra,
tinham encontrado evidências do padrão H-O para o Brasil.
2. Para explicar esta característica do comércio internacional entre países
foram formuladas teorias baseadas nas hipóteses chamberlianas de diferenciação
do produto, economias de escala e competição monopolista. A incorporação dos
rendimentos crescentes de escala aos modelos de comércio internacional trouxe
um arcabouço complementar à explicação do comércio internacional dos modelos H-
O. Os modelos de comércio chamberlianos podem ser encontrados nos trabalhos de
Krugman (1979; 1981), Lancaster (1980), Helpman (1981) e Helpman e Krugman
(1985).
3. Braga e Mascolo (1980) encontraram evidências de que o tamanho exerce
considerável influência sobre a rentabilidade das firmas na indústria
brasileira.
4. Nesta mesma direção, Markwald e Puga (2002) mostraram que 85,5% das grandes
firmas industriais são exportadoras, e que este percentual cai para 40,6%
quando a firma é média, e para 12,4% quando é pequena. Veiga e Markwald (1997)
verificaram que a participação das pequenas e médias empresas nas exportações
brasileiras é pequena e não constante, apesar de grande número destas firmas
estar anualmente presente na base exportadora.
5. Entre as teorias que buscam explicações para a internacionalização das
firmas, destaca-se a eclética desenvolvida por Dunning (1988; 1991; 1993).
Segundo esta teoria, custos de transação e informação, oportunismo dos agentes
e especificidades dos ativos são as bases dos determinantes do investimento
externo de uma firma. Sobre custos de transação, ver Coase (1991) e Williamson
(1985).
6. A Pintec/IBGE é a Pesquisa Industrial de Inovação Tecnológica "realizada
pelo IBGE, que tem como objetivo gerar um conjunto de indicadores setoriais
para as atividades de inovação tecnológica da indústria brasileira. Realizada
pelo IBGE com o apoio da FINEP, adota a metodologia recomendada no Manual de
Oslo e, mais especificamente, o modelo proposto pelo EUROSTAT, a terceira
versão da Community Innovation Survey (CIS) 1998-2000, da qual participam os 15
países membros da comunidade européia. Os resultados da Pintec são relativos às
empresas industriais com 10 ou mais empregados, cerca de 70 mil no país" (IBGE,
2002).
7. O segmento automotivo apresentou déficits consideráveis pós-regime
automotivo (1997-2002). A balança do setor de autopeças só ficou positiva em
2003.
8. Ver Arbache e De Negri (2002) e De Negri e Acioly (2004).
9. A Pintec possui informações sobre os gastos realizados nas aquisições de
máquinas e equipamentos utilizados para a inovação tecnológica. Esta variável
não foi reportada na Tabela_5 por uma questão metodológica. Os investimentos
das firmas em máquinas e equipamentos muitas vezes são superiores ao
faturamento anual da firma ou então representam um percentual grande em relação
ao faturamento do ano. Essas máquinas geralmente são compradas com carência e
prazos de amortização relativamente longos, pois esta é a dinâmica do mercado
de bens de capital. Desta maneira, a relação dispêndio/faturamento para essa
variável daria a falsa impressão de que a firma teria comprometido
significativamente o seu faturamento anual, o que não é verdade pelas condições
de financiamento nesse segmento.
10. Fleury (1997), estudando o comportamento de empresas multinacionais com
relação a atividades de engenharia, mostra a concentração de P&D e
engenharia básica nas matrizes, com as subsidiárias focando na engenharia de
processo; Salerno et alii (2003; 2004), a partir de extenso survey no setor
automotivo (incluindo matrizes), introduzem o conceito de sede de projeto, que
guarda íntima relação com a escolha local de fornecedores.
11. Em termos absolutos, as estrangeiras investem mais; no entanto, estimativas
preliminares realizadas por Araújo (2004) mostram que as firmas de capital
nacional investem proporcionalmente mais em P&D em relação ao faturamento
do que as de capital estrangeiro.
12. Os modelos foram estimados inicialmente com a variável gastos em máquinas e
equipamentos. Esta variável apresentou uma correlação acima de 0,5 com a
variável dispêndio em treinamento da mão-de-obra. Muito provavelmente, as
compras de máquinas e equipamentos são acompanhadas de gastos com o treinamento
da mão-de-obra para operar essas máquinas e processos, o que deve ocorrer com
freqüência nas firmas que introduzem inovações de processo. Para evitar os
problemas de multicolinearidade, a variável dispêndio com máquinas e
equipamentos foi retirada do modelo.
13. Dois problemas metodológicos podem surgir quando o preço prêmio é estimado
para cada produto e mercado. Primeiro, a firma pode exportar mais de um produto
para um mesmo mercado. Nesse caso, o preço prêmio seria calculado para cada
produto da firma e, posteriormente, seria estimada a média do preço prêmio
ponderada pelo valor dos produtos exportados pela firma. Segundo, ela pode ser
a única exportadora brasileira de um produto específico para um determinado
mercado. Nesse caso, não haveria preço prêmio, pois o preço médio da indústria
é o preço médio da firma. A idéia de preço prêmio está, entretanto, vinculada
também à idéia de competitividade, pois firmas que obtêm preço prêmio são as
mais competitivas. Se ela é a única firma capaz de exportar um produto, não
seria razoável dizer que a mesma não é competitiva em relação às demais firmas
da indústria brasileira. Para contornar esse problema, a exigência de que o
preço do bem exportado pela firma esteja 30% acima da média da indústria, para
definir se a firma obteve preço prêmio, foi ponderada pelo complemento da
participação da firma no total exportado pela indústria brasileira no mercado
de referência. O procedimento metodológico está detalhado no anexo deste
trabalho.