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BrBRHUHu0011-52582009000200001

BrBRHUHu0011-52582009000200001

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0011-5258
Year2009
Issue0002
Article number00001

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Partidos políticos e governadores como determinantes do comportamento legislativo na câmara dos deputados, 1988-2006

INTRODUÇÃO O sistema democrático estabelecido na Constituição Brasileira de 1988 tornou-se um importante caso para a análise comparativa institucional. De acordo com a visão predominante na literatura comparativa, o regime brasileiro conteria todos os elementos que deveriam solapar a consolidação da democracia: um regime presidencial com um sistema partidário fraco e fragmentado; uma legislação eleitoral extremamente permissiva, que favorece candidatos em detrimento dos partidos políticos; um tipo forte de federalismo, que, de acordo com Stepan (2000; 2004), é o mais demos-constrainingdo mundo; um Congresso fragmentado; presidentes com poder e disposição de governar por decreto; e um modelo generalizado de clientelismo e de ineficiências econômicas muito difundidas e difíceis de conter.

Muito embora as expectativas dos analistas do Brasil não apontem mais para um inevitável fracasso do sistema político (Armijo, Faucher e Dembinska, 2006), muitas são as perguntas ainda sem respostas acerca da importância relativa das diferentes forças que forjam o comportamento de protagonistas políticos específicos e muitos são os mecanismos que permitem que o sistema opere de forma razoavelmente satisfatória. Neste artigo, cuidamos de um aspecto específico do sistema político brasileiro, a saber, a importância relativa das forças regionais e nacionais no comportamento dos legisladores na esfera nacional.

A preocupação com o papel das forças regionais e locais na formação - ou na obstrução - da política nacional intensificou-se com o advento da democracia e com o fortalecimento do federalismo na Constituição de 1988. Por outro lado, a Constituição redistribuiu recursos por diferentes esferas da federação, apoiando significativamente os governos subnacionais. De outro ponto de vista, o ressurgimento do Congresso Nacional como um protagonista central do processo de formulação de políticas forneceu uma arena renovada para a manifestação de interesses regionais e locais.

As preocupações são justificáveis. Por exemplo, as Casas legislativas são os locinaturais onde interesses regionais, em maior ou menor grau, podem se expressar. Ao decidirem como se comportar na Câmara, os legisladores devem considerar não apenas suas preferências pessoais mas também as de seu eleitorado, as de seus partidos, assim como as dos líderes regionais e nacionais. Essas preferências raramente coincidem, e a questão passa a ser detectar qual desses interesses prevalece nas condições vigentes.

A forma como a Câmara dos Deputados é eleita no Brasil naturalmente vincula os interesses dos congressistas aos das autoridades estaduais, especialmente aos dos governadores. O Brasil é uma federação composta de 26 estados (mais o Distrito Federal, Brasília), que constituem os distritos eleitorais pelos quais os deputados são eleitos. Os governadores controlam imensos recursos, que são de grande valor para os políticos interessados em progredir em suas carreiras.

Portanto, considerando o nível de recursos que os governadores controlam e a coincidência entre seus distritos eleitorais e aqueles dos deputados federais, é razoável esperar que os primeiros vão influenciar consideravelmente o comportamento dos últimos e, em razão disso, definir o processo de formulação de políticas na esfera nacional.

Os governadores são, portanto, fundamentais para o sistema político brasileiro.

De acordo com Abrucio (1998:170), a capacidade de formar suas próprias bancadas no Congresso (as "bancadas dos governadores") define o poder dos governadores no plano nacional. Para o autor, apolítica nacional segue uma lógica estadual segundo a qual a lealdade às bases eleitorais locais domina as preocupações nacionais e partidárias. Nesse sentido, o Congresso Nacional é transformado em uma "Assembleia de estados": "vinte e sete 'bancadas estaduais' são formadas com grande independência dos partidos políticos" (ibidem:178-179).

A importância dos governadores no sistema político brasileiro é incontestável.

Desde a Constituição de 1891 - radicalmente federativa -, o papel dos líderes regionais na formulação das políticas nacionais tem sido uma referência obrigatória em qualquer caracterização do processo político no Brasil1. Os mecanismos informais criados para amarrar interesses locais e nacionais no contexto da descentralização formal - a "política dos governadores" concebida por Campos Salles no fim do século XIX (Cardoso, 1977) sendo o exemplo conspícuo nesse sentido - serviram apenas para reforçar o papel das elites regionais, ao consolidarem seu poder e ao ajudarem a projetá-lo no cenário político nacional. Até mesmo intensos esforços centralizadores, tais como os perseguidos por Vargas nos anos 1930 e pelos militares nos anos 1960 e 1970, não teriam eliminado significativamente o poder nacional das elites regionais (Gomes, 1980; Hagopian, 1996). Mais do que natural, então, que a questão do poder dos interesses regionais sobre a política nacional permanecesse importante tanto do ponto de vista acadêmico quanto do político.

Contudo, mecanismos constitucionais e políticos que o governo federal pode empregar a fim de construir coalizões legislativas para dar apoio a suas políticas. Esses mecanismos permitem que o governo central evite ou neutralize as tendências centrípetas do arcabouço institucional codificado pela Constituição de 1988. Portanto, não se pode tomar como um fato comprovado que o comportamento dos legisladores individuais seja moldado e ditado pelo poder dos governadores, isto é, que o poder destes prevaleça sobre o dos partidos políticos nacionais.

Análises empíricas sugerem que a ideia de um legislativo nacional centrado nos estados deve ser mitigada. Análises anteriores de votações nominais na Câmara dos Deputados mostraram que o apoio parlamentar à agenda legislativa do presidente seguia as diretrizes do partido (Figueiredo e Limongi, 2000).

Cheibub, Figueiredo e Limongi (2002) constataram que as variáveis indicando a posição dos governadores e seus estados, com relação ao presidente, têm efeito limitado na distribuição dos recursos do orçamento federal pelos estados. Carey e Reinhardt (2003:797), por outro lado, não verificaram "nenhum efeito líquido da aliança com governadores sobre a unidade de voto entre grupos de deputados da coalizão estadual na Câmara dos Deputados", ao passo que Desposato (2004: 279) verificou que o federalismo tinha "pouco impacto real sobre o comportamento dos Legisladores" e que "a maioria do comportamento de voto dos legisladores pode ser explicada por protagonistas nacionais: presidentes e partidos políticos nacionais" (ibidem). Essa descoberta foi reforçada por Carey (2007), que, em um estudo sobre o voto do Legislativo em dezenove países, observou que, embora a unidade de voto em países federativos seja baixa, o efeito é relativamente pequeno no Brasil. Finalmente, Arretche e Rodden (2004; 2006) demonstraram o efeito limitado do federalismo fiscal no comportamento dos deputados em votações e na política da Câmara dos Deputados brasileira. Nosso objetivo neste trabalho é contribuir para essa literatura investigando o impacto relativo das influências das esferas estadual e nacional sobre o comportamento não do legislador individual mas também das bancadas dos estados na Câmara dos Deputados.

Com relação a estudos anteriores, este artigo traz inúmeras contribuições.

Usamos dados para um período de tempo maior - 1988-2006 -, abarcando cinco presidentes e quatro legislaturas diferentes. Isso é importante porque consideramos administrações operando sob circunstâncias econômicas e políticas diversas, o que nos permite levar em conta a possibilidade de o impacto dos estados sobre os fatores nacionais na formação do comportamento dos legisladores variar de acordo com essas circunstâncias. Os estudos existentes se concentraram em um número limitado e peculiar de administrações: os 17 meses finais do governo José Sarney; os 31 meses do governo Fernando Collor de Mello; os 27 meses do governo Itamar Franco; e os 48 meses do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso. Cada uma dessas administrações, porém, foi especial, no sentido de que enfrentaram circunstâncias que sugeriam tudo, menos uma política normal. Sarney assumiu o poder por acaso e governou - apenas parcialmente - sob as regras impostas pela Constituição de 1988; Collor pertencia a um partido pequeno e sofreu impeachmentpelo Congresso, com base em acusações de corrupção; Franco assumiu o poder como resultado da renúncia de Collor e não era filiado a nenhum partido; e Cardoso foi eleito na esteira de seu sucesso na estabilização da economia como ministro da Fazenda de Franco.

Neste artigo, cobrimos também o segundo mandato de Cardoso, quando foi implementado um conjunto mais rigoroso e impopular de reformas, além do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, caracterizado por severas restrições políticas. Isso nos permite abordar e distinguir as influências dos fatores conjunturais e de curto prazo, e os estruturais decorrentes do arcabouço institucional adotado em 1988 sobre o comportamento de voto dos parlamentares da Câmara dos Deputados brasileira.

Nossa análise também foca a decisão do legislador individual ao votar e está estruturada a fim de permitir que se levem em consideração as diferentes fontes de pressão que qualquer membro do Congresso tem de enfrentar. Portanto, ao modelarmos a decisão do legislador sobre como votar, somos capazes de considerar os atributos do legislador individual; da própria votação; do governo na esfera nacional; do governo na esfera estadual; as características do estado que podem indicar a complexidade e a heterogeneidade do eleitorado do legislador. Esses fatores representam um conjunto de determinantes do comportamento do legislador brasileiro mais complexo do que o encontrado em estudos anteriores.

Demonstramos ainda que os fatores nacionais são pelo menos tão fortes quanto os estaduais para o comportamento do legislador, mesmo controlando para a natureza do assunto submetido à votação. Comentando seus principais resultados - a saber, "que o federalismo tem impacto limitado sobre o comportamento do legislador" e que "a maior parte do comportamento de voto dos legisladores pode ser explicada pelos protagonistas nacionais: presidentes e partidos políticos nacionais" -, Desposato sugere que votos sem importância, votos que tratam de "questões nacionais e administrativas que não deveriam mobilizar pressões dos interesses estaduais" (2004:279), podem mascarar o verdadeiro impacto do federalismo no Brasil. Como usamos as informações relativas à natureza da matéria votada - se matéria procedimental ou substantiva; se legislação ordinária, emendas constitucionais ou os decretos do Executivo; sobretudo se revertem ou ajustam as medidas descentralizadoras implementadas pela Constituição de 1988; e, ainda, se são matérias em que existe um conflito nas preferências da União e do governador -, somos capazes de examinar a hipótese de Desposato de maneira sistemática.

Com o objetivo de isolar e avaliar o impacto das pressões locais sobre o modo como os legisladores nacionais se comportam, dirigimos nosso foco para a Câmara dos Deputados, e não para o Senado. A principal razão para isso é que todas as propostas legislativas de iniciativa do Executivo devem dar entrada no Congresso por intermédio da Câmara, onde recebem a primeira votação e, se rejeitadas, não seguem para o Senado. Além do mais, o sistema eleitoral da Câmara dos Deputados - representação proporcional de lista aberta - tem o efeito de induzir a fragmentação do partido e, presume-se, o individualismo entre os legisladores. Isso exacerba os potenciais conflitos entre o Executivo e o Legislativo, e fornece um lócus rigoroso para detectar a influência do governo federal no comportamento dos legisladores. Finalmente, conforme sugere Desposato (2004), o pequeno número de senadores por distrito (estado) compromete a validade das análises estatísticas.

Nossas análises não identificaram indícios de que os governadores exercessem mais pressão do que os partidos políticos sobre os legisladores. Essa constatação sugere que outros aspectos do sistema político que se contrapõem ao poder dos líderes subnacionais e à capacidade que eles têm de influenciar o comportamento dos legisladores nacionais. Consideramos essa constatação, em conjunto com os resultados da pesquisa prévia que comprova a presença de comportamento partidário no Congresso Nacional brasileiro, e argumentamos, na conclusão deste estudo, que os poderes da agenda do presidente e a centralização do processo legislativo neutralizam, dentro da Câmara Legislativa, as respostas que os legisladores individuais tenham de dar às preocupações locais e individuais (Figueiredo e Limongi, 1999; 2000).

A organização institucional democrática estabelecida pela Constituição de 1988 tornou-se um importante caso para a análise institucional comparativa. Além de seu forte traço federalista, ela resume tudo o que contribui para fragmentar o sistema político e multiplicar o número de potenciais pontos de veto institucionais. Contudo, importantes mudanças políticas vêm ocorrendo desde 1988: a hiperinflação foi controlada, os gastos públicos subnacionais também, o sistema de descentralização fiscal foi racionalizado e até o resistente e excessivamente alto nível de desigualdade do país começou a mostrar sinais de estar - devagar, mas de forma constante - decrescendo (ver Neri, s/d; Soares et alii, 2007). Esses fatos oferecem um desafio para as análises institucionais.

As evidências reunidas neste artigo são relevantes na medida em que ajudam a enfrentar esse desafio com sucesso.

Nesse sentido, este trabalho traz três contribuições teóricas. A primeira delas é mostrar que o federalismo, até mesmo em sua variedade mais demos-constraining (Stepan, 1999), não necessariamente conduz a um processo político dominado por interesses locais, em que as minorias conseguem facilmente obstruir importantes mudanças políticas. A segunda indica que o federalismo forte não é incompatível com mudanças políticas significativas2. O fato de os interesses dos estados e os interesses locais terem uma voz institucional não obrigatoriamente significa que vão impedir a constituição de maiorias nacionais e/ou obstruir mudanças políticas. A terceira é que, mesmo quando mudanças políticas tidas como necessárias não ocorrem, devemos considerar a possibilidade de as instituições não serem as causas do alegado imobilismo; o obstáculo às "reformas" pode ser mais simplesmente a ausência de uma maioria em seu favor. Em outras palavras: preferências, e não instituições, podem ser as variáveis-chave para explicar por que esta ou aquela política não foi aprovada.

Este artigo está organizado em três seções adicionais. Nas duas seções seguintes, analisamos dados de votação nominal trabalhando com dados organizados por legislador. Na primeira, consideramos os efeitos da participação na coalizão de apoio ao presidente versusos efeitos advindos da esfera estadual. Em especial, interessa-nos estudar o comportamento dos parlamentares que sofrem pressões antagônicas, isto é, que pertencem a partidos que apoiam o presidente enquanto os governadores de seus estados são filiados a partidos de oposição. Na segunda, a comparação dos efeitos das duas esferas, a nacional e a estadual,tomapor base o conflito entre o partido a que o deputado está filiado e o do governador de seu estado. Consideramos ainda os efeitos dos possíveis conflitos entre governadores e o presidente em políticas específicas, em especial as relativas à tributação. Aterceira seção analisa os fatores determinantes da coesão de votos das bancadas estaduais na Câmara dos Deputados. A conclusão geral dessas análises é que, ainda que presente, a influência do estado sobre o comportamento dos legisladores individuais e sobre as bancadas estaduais não é mais forte do que a dos partidos políticos nacionais e a do governo nacional. A seção que encerra o trabalho indica os mecanismos que explicam a competência do governo central para modificar o status quofederal em um ambiente que é, pelo menos superficialmente, hostil a mudanças.

FATORES NACIONAIS E LOCAIS NA FORMAÇÃO DO COMPORTAMENTO DOS LEGISLADORES INDIVIDUAIS Nesta seção analisamos os dados das votações nominais para avaliar o papel das bancadas dos estados no comportamento dos legisladores individuais no Congresso. A hipótese que testamos é se os governadores são capazes de influenciar os membros das bancadas de seus respectivos estados, sobrepondo-se às preocupações nacionais e partidárias. Nosso propósito é pesquisar a influência do estado pelo qual foi eleito no comportamento desses legisladores.

Projetamos uma série de comparações com base nas quais poderemos inferir se essa influência está de fato presente. Que tal influência existe é uma verdade reconhecida como consequência do federalismo no Brasil. Recordando a fórmula de Abrucio, a Câmara dos Deputados é composta atualmente de "vinte e sete 'bancadas de Estados'" (1998:178-179).

Nossa meta não é negar que os governadores - interesses da esfera dos estados, dito de forma mais abrangente - afetam o comportamento dos legisladores no Brasil. Mais propriamente, nossa meta é avaliar o poder desse fator com relação às forças que são nacionais por natureza. Nesse sentido, este artigo está de acordo com as descobertas relatadas por Carey e Reinhardt (2003) e Desposato (2004).

Trabalhamos com as votações nominais ocorridas na Câmara dos Deputados desde o começo de 1989 até dezembro de 2006, isto é, desde a entrada em vigor da Constituição de 1988 até o fim do primeiro governo Lula3. Na Câmara brasileira, a votação nominal ocorre em duas circunstâncias: é obrigatória quando a aprovação deve ser por maioria qualificada em uma ou nas duas Casas (por exemplo, as leis complementares4, que requerem maioria dos parlamentares; ou ainda as emendas à Constituição, que exigem 60% dos parlamentares das duas Casas legislativas). Em caso de legislação ordinária, uma votação nominal ocorre por requerimento de uma parcela (relativamente pequena) de parlamentares no plenário ou por líderes de partidos. Em razão desses princípios, a votação nominal não significa necessariamente que se trata de questões conflituosas.

Embora as emendas constitucionais e as leis complementares tenham, em geral, relevância real e política, o fato de que podem passar mediante votação nominal margem para que uma possa se realizar sobre uma matéria com relação à qual não haja conflito. Consequentemente, embora, em geral, as questões mais importantes e politicamente desagregadoras sejam decididas por voto nominal, decisões unânimes por voto nominal ocorrem de fato. Por outro lado, são poucas as questões de importância que nãosão decididas por esse tipo de voto.

Duas características da Câmara Baixa brasileira são úteis para nossas análises: a primeira se refere ao fato de que, antes de uma votação nominal, os líderes quase sempre declaram a posição do partido, o que quer dizer que eles divulgam publicamente como gostariam de que os membros de seus partidos votassem a questão. A segunda é que o governo tem seu próprio líder na Câmara, e este, nessa qualidade, anuncia a posição do governo com relação à votação a ser realizada. Essas características nos permitem computar não o grau de congruência entre o legislador individual e a indicação de seu partido mas também entre os líderes e o governo federal. É este último - o grau de congruência entre o legislador individual e o governo - que vamos usar como variável dependente em parte das análises que se seguem.

Nossas análises incluem apenas votações nominais para as quais as posições do governo são conhecidas5. Excluímos as votações nominais inválidas, quer dizer, aquelas que foram registradas, mas que não tenham chegado a nenhuma decisão por falta de quórum. Por último, excluímos votações nominais unânimes. Para nós, uma votação nominal é unânime se satisfaz a duascondições: (1) todos os líderes dos partidos recomendam o mesmo voto; e (2) pelo menos 90% dos legisladores votam de acordo com a orientação dos líderes. Não consideramos unânime sas votações nominais nas quais consenso no plenário, mas não entre os líderes dos partidos, ou aquelas nas quais consenso entre os líderes dos partidos, mas não no plenário O período que cobrimos, como mencionado, abrange cinco presidentes: os últimos 17 meses do mandato de cinco anos de Sarney; os 31 meses do mandato de Collor, interrompido pelo impeachment; os 27 meses do mandato de Itamar Franco; os dois mandatos inteiros de Fernando Henrique Cardoso; e o primeiro mandato completo de Lula. Durante esse período, foram 1.774 votações nominais, das quais 475 unânimes, 102 inválidas e 50 unânimes e inválidas, o que nos deixou um total de 1.147 votações nominais.

Com o objetivo de avaliar a influência dos governadores no comportamento dos membros da Câmara Baixa brasileira, concentramo-nos no grau de congruência entre o legislador individual e o governo nacional, e usamos o fato de que alguns deles são membros dos partidosdo governo (isto é, dos partidos que compõem a coalizão do governo nacional, no sentido de que eles mantêm cargos ministeriais), mas vêm de estados liderados por governadores que são membros de partidos de oposição (isto é, partidos que não têm cargos ministeriais no governo nacional). Esses são os casos em que as pressões que os membros da coalizão de governo sofrem dos líderes em seus estados podem funcionar no sentido inverso à pressão exercida na esfera nacional. Nesses casos, a pressão do estado deveria atuar para reduzir o grau de congruência entre o voto do representante individual e o voto divulgado pelo governo. Portanto, deveríamos observar um grau de congruência significativamente menor entre os legisladores governistas vindos dos estados de oposição do que entre os legisladores governistas que vêm dos estados governistas6. Conforme indicado na Tabela1, porém, esse não é o caso. Na média, os legisladores governistas de estados governistas votam de acordo com a recomendação do líder na Câmara dos Deputados em 87% dos casos, ao passo que os legisladores governistas de estados de oposição agem assim em 89% das vezes. Tanto essa diferença quanto a referente a cada uma das presidências não são estatisticamente significativas. Seja o que for que leve um deputado do partido governista a votar com ou contra o governo, a identidade do governador do estado não é um fator a ser considerado: o legislador individual pertencente a partidos governistas demonstra o mesmo - e bem alto - grau de congruência com o governo, independentemente de seu estado (que é coextensivo ao distrito eleitoral para a Câmara) ser ou não controlado por um governador de oposição7.

Essa conclusão é fundamentada em análises estatísticas cujos resultados são apresentados na Tabela_2, que contém várias estimativas dos efeitos marginais das variáveis independentes sobre a probabilidade de um representante votar de acordo com a recomendação do governo. A primeira coluna traz os resultados para uma regressão com apenas duas variáveis independentes, ambas dicotômicas, que indicam, respectivamente, se o legislador pertence ou não a um partido governista; e se pertence a um partido governista, mas vem de um estado da oposição. Esses números simplesmente confirmam o que a Tabela_1 havia demonstrado, a saber: que o efeito de se ter um legislador governista vindo de um estado controlado pela oposição é aumentar, em vez de diminuir, a probabilidade de que esse legislador vote de acordo com a posição do governo nacional. As colunas 2 e 3 apenas provam a robustez dessa conclusão. De acordo com Brambor, Clark e Golder (2006), regressões com termos de interação devem incluir todos os seus termos constitutivos, evitando, desse modo, erros inferenciais. Assim procedemos na regressão reportada na coluna 2, e os resultados indicam, uma vez mais, que ser um legislador governista de um estado governado pela oposição aumenta a probabilidade de um voto congruente8. Por fim, a coluna 3 avalia as probabilidades marginais de um voto congruente em uma amostra constituída apenas dos legisladores governistas. Os resultados, é evidente, contam exatamente a mesma história: entre os deputados que pertencem aos partidos governistas, ser eleito em um estado "oposicionista" aumenta a probabilidade de o legislador votar com o governo em aproximadamente 2,3%. Os resultados, portanto, são contrários à expectativa de que, em face de pressões antagônicas entre as esferas nacional e estadual, deputados atenderiam às pressões da última,seguindo a posição do governador, e não a das forças nacionais.

, naturalmente, muitos outros fatores em condições de influenciar a congruência de um representante com o governo que precisamos controlar. Em primeiro lugar, as características intrínsecas das votações nominais.

Algumas delas foram consideradas pela forma como definimos a amostra: foram consideradas as matérias com relação às quais haja algum grau de conflito e que sejam suficientemente importantes para o governo, a ponto de seu líder no Congresso anunciar a posição do governo sobre a questão. Além disso, limitamos as análises a um conjunto de votações válidas, que são aquelas que satisfazem ao quórum exigido para que uma decisão seja tomada. outros fatores, porém, que não são considerados nas estimativas geradas pelo modelo 1 da Tabela_2.

Portanto, também controlamos se é um voto sobre maté-ria substantiva (em oposição à matéria processual) e se a votação é de uma medida provisória, de um projeto de lei ordinária ou de uma emenda à Constituição. Qualquer um desses atributos do voto pode determinar a estratégia legislativa do governo, bem como dos executivos dos estados, influenciando assim, de forma independente, o grau de congruência entre o representante individual e o governo.

Em segundo lugar, existem atributos do representante que podem exercer uma influência independente em sua congruência com o governo. Aqui consideramos a frequência com que um representante participa das votações no Congresso. Essa variável é definida como a razão entre o número de vezes que um representante vota no Congresso e o número de votações que ocorreram durante o exercício de seu mandato. Tal número varia consideravelmente: alguns participaram de apenas 9% das votações de que deveriam ter participado, enquanto 29 representantes participaram de todas elas. A participação média do total dos representantes durante todo o período foi de 70%.

Em terceiro lugar, fatores relacionados com o próprio governo podem influenciar a congruência do representante com esse governo. Muitos analistas consideram que os atributos pessoais de Fernando Henrique Cardoso - seu nível de popularidade, seu estilo de liderança e suas competências, suas habilidades como estadista - foram cruciais para que o governo conseguisse obter suporte legislativo durante seu mandato9. Embora não estejamos de acordo com esse ponto de vista, consideramos a possibilidade de que os atributos pessoais de Fernando Henrique possam ter tido uma função ao induzir congruência com o governo, por meio da inclusão nas análises de uma variável que indica todas as votações que ocorreram durante seu mandato como presidente; quer dizer: votações que foram realizadas entre 1ºde janeiro de 1995 e 31 de dezembro de 200210.

Em quarto lugar, controlamos também por características socioeconômicas do distrito eleitoral do representante (nesse caso, o estado de origem), na suposição de que elas reflitam as pressões que os representantes enfrentam por se comportarem mais ou menos ideologicamente e, por conseguinte, por estarem mais ou menos disponíveis para votar contra seu partido político. Incluímos informações sobre a renda per capitado estado, o grau de analfabetismo e o nível de desigualdade de renda.

Por fim, controlamos para não observáveis, por meio de uma série de efeitos fixos, como as diferentes legislaturas (nossos dados cobrem cinco, da 48ª à 52ª), para os estados dos representantes (26 mais o Distrito Federal de Brasília), para o representante individual (observamos 1.741 indivíduos) e para as votações nominais.

Os resultados são notavelmente consistentes. O efeito geral sobre a congruência com o governo, vindo de estados da oposição, é positivo. A única ocasião em que observamos uma mudança significativa da magnitude e sinal nos resultados apresentados nas colunas 4-8 da Tabela_2 ocorre quando atributos não observados do representante individual são controlados (coluna 7). Nesse caso, o efeito marginal estimado de ser um legislador governista de um estado governista é consideravelmente menor do que as estimativas obtidas em outros modelos, e os sinais para o efeito de estados da oposição e o termo interativo estão invertidos. Ainda assim, o efeito geral na congruência de se ter um estado oposicionista ainda é positivo, contrariamente ao que esperávamos, caso as pressões antagônicas na esfera do estado tivessem afetado o comportamento dos legisladores que pertencem a partidos governistas11.

Com relação às outras variáveis, aprendemos que os legisladores tendem aser mais independentes - eles têm graus mais baixos de congruência - quando estão votando matéria substantiva, em comparação a procedimentos. Os graus de congruência são reduzidos quando está em votação uma medida provisória, ao passo que a votação de emendas constitucionais induz a congruência com a posição do governo. Os legisladores que quase sempre estão presentes quando votação nominal têm a tendência de ser mais independentes com relação ao governo - um aumento de 10% na taxa de participação reduz a probabilidade de um voto congruente com o governo em aproximadamente 2,8%.

Contrariamente às expectativas, a probabilidade de congruência entre o legislador individual e a posição do governo durante as administrações de Fernando Henrique foi menor do que em outras gestões. Em parte, a explicação se deve ao fato de que as coalizões de Cardoso eram consideravelmente mais amplas do que as de outros presidentes: a quantidade média de assentos que suas coalizões comandavam na Câmara dos Deputados, ponderada pelo número de dias em que durava cada coalizão, era de 69,1%, contra 36,1% para Collor, 57,9% para Itamar Franco e 59,5% para Lula. Considerando que o governo precisa ter apenas mais de 50% para ganhar uma votação regular, o tamanho inflado das coalizões de Cardoso sugere que seu governo podia, com mais frequência do que os demais, liberar os legisladores para votarem como quisessem, especialmente em casos em que votar com o governo podia provocar consequências negativas no distrito do legislador12. Ao mesmo tempo, a oposição, durante o mandato de Fernando Henrique, estava muito mais coesa do que no mandato de outros presidentes. O grau médio de congruência com o governo por partidos de oposição (ponderado pelo tamanho de cada partido) flutuava entre 50% e 77% para as diferentes coalizões sob Sarney, Collor e Itamar Franco. Entre abril de 1996 e março de 2002, por outro lado, a média ponderada de apoio da oposição ao governo foi de 25%. Como consequência, a probabilidade geral do legislador individual - sem distinção entre governista e oposicionista - era menor sob Fernando Henrique do que sob outros presidentes.

Finalmente, o efeito dos indicadores socioeconômicos é o mais instável de todas as estimativas da Tabela_2 e, na verdade, o mais difícil de ser interpretado; se houver uma tendência nessas estimativas, parece que é reduzir a congruência com o governo. Em todo caso, as alterações nos coeficientes remanescentes são tão minúsculas que reestimamos os modelos nas colunas 4-8 sem as variáveis socioeconômicas.

Portanto, é razoável concluir o seguinte: a condição de membro da coalizão do governo aumenta significativamente as chances de que um representante vote de acordo com a recomendação do governo; e que o fato de se tratar de representante vindo de um estado cujo governador seja de oposição realmente aumenta, levemente - em vez de reduzir -, esse efeito. A imagem de um Congresso composto de "27 delegações de estados" que agem independentemente não tem sustentação nos dados.

POSSÍVEIS CONFLITOS ENTRE OS GOVERNOS ESTADUAL E NACIONAL E O COMPORTAMENTO DO LEGISLADOR INDIVIDUAL Nem todas as matérias votadas pelos legisladores nacionais têm importância igual para os líderes na esfera dos estados e,consequentemente, os legisladores, com toda a certeza, não terão de encarar pressões contraditórias vindas tanto da esfera nacional quanto da estadual na hora de decidir como votar. O ideal seria que usássemos informações acerca da posição de cada um dos 27 executivos estaduais, em cada votação na Câmara dos Deputados, afim de avaliarmos a intensidade da pressão antagônica a qual o legislador do estado esteve submetido. Isso, porém, não é possível do ponto de vista prático. Sendo assim, adotamos uma estratégia indireta para identificar matérias em que a posição dos executivos estaduais provavelmente está em contradição com a posição assumida pelo governo nacional.

Usamos dois indicadores de preferências divergentes entre os governos estadual e nacional: o primeiro é se a recomendação de voto feita em plenário pelo partido do governador é diferente da recomendação de voto divulgada pelo líder do governo na Câmara dos Deputados; o segundo é se a votação é sobre o que chamamos aqui de "medidas centralizadoras". O primeiro indicador é gerado pela simples comparação das recomendações do líder do partido do governador do estado de onde vem o legislador e pelo líder do governo na Câmara dos Deputados. Os legisladores dos partidos governistas vão enfrentar incentivos conflitantes em casos de recomendações divergentes e deveriam, portanto, apresentar graus mais baixos de congruência com a posição do governo. O segundo indicador é mais complexo e demanda uma explicação mais detalhada.

O "pacto federalista" que foi definido pela Constituição de 1988 não permaneceu inalterado nos anos subsequentes, e muitas - se não a maioria - das alterações foram feitas por meio de legislação ordinária e de emendas constitucionais. A transformação das relações federativas no Brasil, desde 1988, ocorreu em níveis variados. O governo federal foi capaz de redefinir seu relacionamento com os estados e os municípios, e assim interrompeu o processo de descentralização de recursos instituídos pela Constituição. Isso foi conseguido basicamente pela imposição de novos tributos não sujeitos à redistribuição constitucionalmente obrigatória às esferas inferiores de governo e ao estabelecimento de alíquotas mais altas para impostos existentes, igualmente imunes à redistribuição. Por exemplo, o governo federal retém agora uma fatia da receita tributária da União, a qual, de outra forma, seria transferida para os estados e os municípios13. A União também conseguiu aprovar legislação que aumentou a competitividade das exportações do país, restringindo o poder dos estados de cobrar tributos. Além disso, o governo central também conseguiu impor medidas que reduziram a autonomia dos estados com relação a matérias tributárias e de endividamento. Isso foi feito ao privatizar ou simplesmente fechar bancos estaduais, ao estabelecer normas restritivas para o endividamento dos estados e, finalmente, ao instituir controles rigorosos sobre o desempenho financeiro das unidades subnacionais (Rodden, 2006). Esse tipo de controle culminou com a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2000, que estabelece tetos e outros preceitos sobre o gasto público e o endividamento dos estados e municípios. Por último, a provisão e o gerenciamento dos serviços sociais foram sendo gradualmente transferidos para os governos locais. Conforme mostra um minucioso estudo sobre seis áreas das políticas sociais nos anos 1990, o governo central implementou uma forte política de redefinição de competências entre as várias esferas de governo. Como resultado, o altamente centralizado formato institucional do sistema de proteção social brasileiro cedeu lugar a um modelo mais descentralizado de provisão das políticas sociais (Arretche, 2000; 2004).

Uma vez que essas medidas redefiniram o status quofederativo criado em 1988, que claramente beneficiara as esferas subnacionais da federação, era razoável esperar que os executivos dos estados exercessem alguma pressão sobre os membros das bancadas de seus estados. Além do mais, a ser verdade, conforme argumenta Samuels (2000), que os políticos brasileiros estão mais preocupados com suas carreiras no estado do que na esfera nacional, o mais provável era que os legisladores reagissem favoravelmente a pressões dos governadores quando são votadas medidas destinadas a alterar o status quofederativo na direção de uma maior centralização. Assim, se as preocupações de nível estadual prevalecessem sobre as de nível nacional no cálculo dos deputados federais, deveríamos observar um declínio no grau de congruência com o governo nacional entre os legisladores governistas quando medidas desse tipo fossem votadas.

Identificamos cinco tipos de medidas centralizadoras votadas na Câmara dos Deputados entre 1989 e 2006: (a) O primeiro conjunto consistia em mudanças de caráter geral na legislação tributária. Embora os efeitos dessas medidas na distribuição relativa de recursos entre os diferentes níveis da federação não pudessem ser avaliados por meio da leitura do título ou do sumário do projeto de lei, elas geralmente aumentavam o nível de receita fiscal obtido pelo governo central e, nesse sentido, contribuíam para o reequilíbrio de suas contas. Entre os exemplos se incluem mudanças no Imposto de Renda para pessoas jurídicas e físicas.

(b) O segundo grupo inclui medidas que aumentavam os recursos fiscais do governo central ao incidirem sobre receitas não sujeitas à redistribuição constitucionalmente obrigatória dos recursos às esferas subnacionais. Tais medidas incluem aumento das taxas de contribuições sociais e a introdução de novos tributos imunes à redistribuição, como o imposto sobre o cheque (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira - CPMF), o imposto sobre o lucro líquido (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL), o imposto sobre operações financeiras etc.

(c) No terceiro conjunto de medidas, incluímos os projetos de lei que afetavam diretamente os interesses de alguns estados, mas não necessariamente todos eles, tais como o estabelecimento de zonas especiais de exportação e a renegociação das dívidas dos estados.

(d) O quarto conjunto inclui medidas que alteram o sistema tributário afetando diretamente a capacidade arrecadadora dos estados e, consequentemente, a parcela da arrecadação fiscal que podiam gerar.

Essas são as medidas que deveriam provocar a mais forte e a mais orquestrada oposição dos estados, e são também aquelas pelas quais o governo nacional deveria ter o máximo de interesse. Entre os exemplos se incluem medidas tão diversas quanto: mudanças no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), no Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e no Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), assim como o estabelecimento do "Fundo Social de Emergência", com suas demais denominações, que inicialmente reteve 20% da receita que, de acordo com a Constituição, deveria ser transferida para os estados, e a Lei Kandir, que isentou bens primários e semimanufaturados do imposto sobre as vendas.

(e) Finalmente, identificamos as medidas que limitam e regulam a forma como os governadores dos estados e os prefeitos podem despender seus recursos. Entre elas se incluem a Lei Camata, que impõe limites nas despesas com a folha de pessoal do estado, e a Lei de Responsabilidade Fiscal, que regula as finanças públicas em todas as esferas de governo, introduz limitações nos gastos e na capacidade de endividamento pelos governos estaduais e municipais, e estipula penalidades em caso de infração a essas regras.

Se os governadores fossem capazes de exercer pressão suficientemente forte sobre os legisladores, deveríamos observar um grau menor de congruência entre os legisladores governistas quando medidas centralizadoras são votadas. Além disso, o grau de congruência desses legisladores deveria ser até mais baixo se eles vêm de estados cujos governadores são da oposição. Montamos dois indicadores de medidas centralizadoras: o primeiro inclui todas as medidas listadas anteriormente; o segundo, somente as medidas listadas nos itens (d) e (e), que são, assim acreditamos, aquelas que mais ameaçam o poder institucional dos governadores, sendo, portanto, aquelas contra as quais se deveria esperar uma reação mais vigorosa.

A Tabela_3 apresenta os resultados do impacto das medidas "conflituosas" e "centralizadoras" na congruência dos legisladores individuais com a posição do governo nacional. Lembre-se de que medidas conflituosas são aquelas em que observamos divergência entre as recomendações dos líderes do partido do legislador e do partido governador de seu estado. Estamos interessados em saber o efeito da votação dessas medidas na congruência dos legisladores que pertencem a partidos governistas. Conforme demonstra a coluna 1, esse efeito não é desprezível quando os legisladores têm de enfrentar recomendações conflitantes do governo e do partido de seus respectivos governadores.

Aconsequência de se ter um legislador governista, quando as recomendações de seu partido e o do governador de seu estado são conflitantes, é diminuir a probabilidade de congruência em quase 40%. Entretanto, quando os legisladores governistas são de estados de oposição e estão votando matérias conflitantes, a probabilidade de congruência aumenta em aproximadamente 34%. Portanto, quando confrontado com uma recomendação do partido do governador de seu estado que está em conflito com a do governo federal, os legisladores terão a tendência de seguir a recomendação do primeiro. Não obstante, o governo federal ainda exerce considerável poder sobre os legisladores da coalizão governista. O efeito geral de ser um legislador governista é aumentar a congruência com o governo, mesmo levando-se em consideração as pressões conflitantes que o legislador tem de enfrentar.

Quanto às medidas em que os governadores provavelmente têm interesse contrário àquele do governo federal, o impacto sobre a congruência é virtualmente nulo. A coluna 2 da Tabela_3 apresenta os efeitos marginais sobre a congruência quando o critério para definir medidas centralizadoras é abrangente (item (a) até (e)). A magnitude dos efeitos é bem pequena, de forma que o efeito incondicional de se ter um legislador governista é igual ao efeito condicional no estado de origem do legislador e ao tipo de medida em votação. A coluna 3 da Tabela_3 utiliza um indicador mais restrito de medidas centralizadoras (itens (d) e (e) apenas). No entanto, os resultados contradizem as expectativas com relação ao papel dos governadores, dado que o efeito de se ter um legislador governista condicionado ao estado de origem do legislador e ao tipo de medida em votação é positivo. Consequentemente, o efeito condicional é até mais forte do que o efeito incondicional de se ter um legislador governista.

Conforme mencionado, esses resultados são robustos, não sofrendo maiores mudanças em face da introdução de controles socioeconômicos, assim como da introdução de efeitos fixos para legislatura, presidência, legislador e ano14.

Portanto, visto que a divergência nas posições divulgadas pelo partido do governador e pelo governo federal reduz a probabilidade de congruência com o governo, esse efeito não é suficiente para compensar o fato de que, no cômputo geral, os legisladores dos partidos governistas tendem a votar com o governo, independentemente de seu estado de origem, da posição dos partidos de seus respectivos governadores e do tipo de matéria em votação.

DETERMINANTES DA COESÃO DE VOTO DAS BANCADAS DOS ESTADOS NA CÂMARA DOS DEPUTADOS Até este ponto, nossa análise tratou do comportamento do legislador individual.

Agora mudamos a unidade de observação - do legislador individual para a bancada do estado - e nos concentramos no índice de Rice de cada bancada estadual e em sua variação nas votações ocorridas entre 1989 e 2006 15 . Como antes, eliminamos das análises as votações nominais unânimes e também as que não alcançaram o quórum exigido. Lembre-se de que unanimidade aqui é definida como as situações em que não conflito entre os líderes do partido eno mínimo 90% dos legisladores votam em conformidade com a orientação dos líderes. Excluindo as votações nominais unânimes, então, ainda restam no conjunto de dados situações em que o grau geral de concordância entre os legisladores é alto. Por esse motivo, também excluímos das análises votações nominais com um índice de Rice global maior do que 0,90. Essas são votações que podem ser julgadas como consensuais ou quase isso; portanto, inadequadas para detectar a influência dos governadores ou dos partidos políticos sobre o comportamento do legislador. Finalmente, excluímos os casos em que apenas um ou dois membros de uma bancada estadual votou. Considerar esses casos enviesaria o índice. Quando um único representante vota, o índice assume automaticamente seu valor máximo. Quando dois votam, o índice se limita a seus dois valores extremos.

Nosso objetivo é detectar a influência dos governadores, se for o caso, no comportamento das bancadas dos estados. Também gostaríamos de contrastar, assim como fizemos na análise do representante individual, essa influência com a do governo, a fim de avaliarmos a importância relativa de cada uma dessas forças.

Isso, contudo, não é tão direto quanto o foi quando o legislador era a unidade de análise; e a estratégia que adotamos é especificar um modelo básico de coesão legislativa de bancadas dos estados e investigar o que acontece quando consideramos situações de suposto conflito entre os governadores e o governo nacional.

Vamos começar, então, por um modelo básico para prever o grau de coesão de cada bancada de estado em determinada votação nominal, conforme expresso pelo índice de Rice. A primeira coluna na Tabela_3 traz o modelo de referência. De acordo com esse modelo, o índice de Rice de uma bancada estadual pode ser afetado tanto pelo governo nacional quanto pelo governo estadual, e é dado pela proporção de legisladores filiados a partidos que pertencem à coalizão do governo nacional e pela proporção de legisladores que pertencem ao partido do governador. A coesão de votação também pode ser afetada pela fragmentação partidária da bancada, conforme expresso pelo número efetivo de partidos representados na bancada16; o tamanho do estado expresso por sua população; e o grau de desenvolvimento econômico do estado, mostrado por sua renda per capitaanual.

Não nenhuma expectativa ex antesobreadireçãodoefeitodainfluência nacional versusa influência estadual na coesão das bancadas dos estados. À medida que a votação ocorre na Câmara dos Deputados, todos os representantes estão igualmente sujeitos às ações do governo federal; parece razoável, então, esperar que o efeito das pressões nacionais seja aumentar a coesão de votos. O efeito das pressões na esfera estadual, por outro lado, deveria ser a redução da coesão das legislaturas dos estados. Considera-se provável que uma legislatura mais fragmentada, em se tratando de representação partidária, reduzir a coesão da bancada. População e desenvolvimento econômico supostamente provocarão um impacto negativo nos índices de Rice, pois eles sinalizam heterogeneidade no eleitorado e uma crescente probabilidade de que não votarão da mesma forma. Com base em Desposato (2006), que demonstrou que medidas como o índice de Rice são artificialmente infladas ao serem computadas para pequenas unidades, controlamos por tamanho da bancada e seu quadrado. Finalmente, estimamos todos os modelos com efeitos fixos para o tipo de votação (são 1.111 na amostra) ou para o estado (26 mais Brasília), o que nos permite controlar influências não observadas na coesão das bancadas dos estados.

O modelo básico é apresentado na Tabela_4: a coluna 1 apresenta estimativas calculadas pelo método dos mínimos quadrados (OLS); a coluna 2, estimativas com efeitos fixos para votos; e a coluna 3, estimativas com efeitos fixos para os estados. Os resultados não são muito diferentes em cada um desses modelos. O poder do governo nacional e o do governador em uma bancada do estado têm importância para sua coesão. A influência, porém, é positiva para ogoverno nacional (quanto maior a participação do legislador governista na bancada do estado, mais coesa a bancada) e negativa para o governo do estado (um número maior de membros pertencentes ao partido do governador resulta em uma menor coesão da bancada estadual). Além disso, a influência do governo nacional parece ser mais forte do que a do governo do estado: quando atributos não observados da votação são controlados, o impactopositivodogoverno nacional na coesão de voto é quatro vezes o impacto negativo do governo do estado. Quando controlamos por características estaduais não observadas, a diferença é menor, mas o efeito do governo nacional é ainda duas vezes maior do que o do governo estadual. Os outros fatores também importam para a coesão da bancada. A fragmentação partidária das bancadas dos estados é negativamente associada com a coesão da bancada,embora o efeito seja bem pequeno: um aumento de um partido efetivo reduz a coesão das bancadas do estado em aproximadamente 2%. O fato de a representação de mais partidos políticos ser associada a graus mais baixos de consonância entre os legisladores vindos do mesmo estado é, por si , evidência de que a filiação partidária tem impacto negativo sobre a coesão da bancada estadual. Ambos os indicadores da heterogeneidade do eleitorado diminuem o acordo entre os membros das bancadas dos estados, sugerindo que essas bancadas atuam menos como um bloco quanto mais complexo é seu eleitorado17. Finalmente, a coesão nas bancadas menores tende a ser maior do que nas maiores, embora os coeficientes não sejam estatisticamente significativos quando os efeitos fixos dos estados são considerados.

O que acontece com a coesão das bancadas dos estados quando presumimos a existência de um conflito entre as esferas nacional e estadual? Como discutido, temos em nosso conjunto de dados três indicadores de suposto conflito entre as posições nas esferas estadual e nacional: o governador não pertencer a um partido identificado com o do presidente; a votação ser sobre uma medida "centralizadora"; ou haver um conflito entre a recomendação de voto do líder do governo na Câmara dos Deputados e o do partido do governador. Nossa estratégia é comparar a magnitude e o sinal dos coeficientes para os casos de acordo e de suposto conflito.

A Tabela_5 apresenta os resultados. Por questão de espaço, apresentamos os coeficientes para os dois grupos relevantes: legisladores do estado pertencentes a partidos coligados ao governo nacional e legisladores do estado pertencentes ao partido do governador. É preciso ter em mente que esses coeficientes foram obtidos por modelos que contêm as mesmas variáveis encontradas na Tabela_4. Aconsideração mais importante a ser feita é que, mesmo depois de controlar para diversos fatores, observados e não observados, tanto o governo estadual quanto o nacional exercem um significativo efeito estatístico e real na coesão das bancadas dos estados na Câmara dos Deputados. O primeiro influencia no aumento da coesão de voto, enquanto o último provoca sua diminuição. Embora o impacto dos governadores em situações de acordo entre as esferas estadual e federal seja relativamente pequeno, invariavelmente aumenta, em geral por vários múltiplos, quando presumimos a existência de um conflito entre os dois níveis de governo. Esse aumento, porém, nãoésuficiente para eliminar o efeito do governo nacional, cuja magnitude permanece maior do que a do governo estadual em todos os casos, com duas exceções, quando o governador não pertence ao partido do presidente e quando um conflito entre a recomendação de voto do líder do partido do governador e a do líder do governo, e controlamos por efeitos fixos por estados.

Quanto aos outros determinantes, basta notar que as mudanças observadas não são suficientes para pedir uma discussão independente. Notamos, contudo, que, em muitos casos, os coeficientes não são estatisticamente importantes (significando que seus efeitos são absorvidos pelos efeitos fixos por votos ou por estados). A exceção é o coeficiente para o número efetivo de partidos representados em uma legislatura do estado, que permanece negativo e estatisticamente importante em todos os casos. Isso, conforme mencionado, é em si mesmo uma indicação de que a composição partidária das bancadas dos estados é importante para sua coesão, algo que não é compatível com a ideia de que governadores sejam capazes de superar pressões partidárias e nacionais a fim de moldar o voto da bancada de seu estado na Câmara dos Deputados18.

A conclusão geral desta análise é evidente: não indicação de que os governadores sejam capazes de controlar as bancadas de seus respectivos estados. Isso faz com que a vinculação a um partido, sobretudo a vinculação à coalizão governista, seja irrelevante. O fato de os estados exercerem seu papel na política brasileira é uma verdade incontestável, haja vista que o país é uma federação e os distritos eleitorais para a composição da Câmara dos Deputados são definidos pelas fronteiras entre os estados. Ainda assim, a afirmação de que esse papel é excessivo e de que ele impede o governo de governar e de obter apoio partidário estável no Legislativo nacional não é fundamentada em evidências empíricas. Filiação partidária e preocupações nacionais afetam significativamente o comportamento dos legisladores na Câmara dos Deputados brasileira, tanto no plano individual quanto no plano da bancada do estado.

CONCLUSÃO De acordo com Willis, Garman e Haggard, "se os líderes do partido estão organizados no nível subnacional e ocupam posições no governo subnacional, então os legisladores nacionais quase sempre agem como 'delegados' representando interesses subnacionais" (1999:18).

Acreditamos ter demonstrado que esse não é definitivamente o caso para o Brasil. Os legisladores brasileiros, que disputam por votos em distritos eleitorais idênticos aos estados, não agem como "delegados" desses estados. Ao votarem medidas que redefiniram o "pacto federalista" de 1988 de forma mais favorável ao governo central, não encontramos nenhuma evidência de que os membros da Câmara dos Deputados tenham agido como uma "bancada estadual" unificada para proteger o status quoque tanto beneficiava as esferas mais baixas da federação. Além da verdade incontestável de que os estados exercem um papel no sistema político brasileiro, não nenhum apoio empírico à noção de que o Congresso brasileiro seria constituído de uma "Assembleia de estados".

Talvez de forma que pode ser considerada por alguns - por motivos um tanto indefinidos e idealísticos - insuficiente, o fato é que os partidos políticos exercem um papel importantíssimo no processo legislativo de tomada de decisão no Brasil.

Qual é o mecanismo que permite aos partidos exercerem esse papel? A força dos partidos políticos e a habilidade do presidente de formar coalizões legislativas estáveis são o resultado tanto da maneira como o Congresso brasileiro é organizado quanto da capacidade de o presidente controlar a agenda do Poder Legislativo. Esses fatores neutralizam os incentivos centrífugos gerados pelo forte federalismo brasileiro, combinados com uma legislação eleitoral e partidária permissiva.

O Congresso brasileiro é altamente centralizado. A distribuição dos direitos parlamentares no interior do Poder Legislativo favorece decisivamente os líderes partidários, tomados como agentes perfeitos das bancadas partidárias nas decisões de caráter procedimental, tais como solicitações de votação nominal, encerramento de debates e, mais importante ainda, pedidos de urgência na tramitação de um projeto de lei. De acordo com o regimento interno da Câmara aprovado em 1989, os procedimentos para tramitação de um projeto podem ser alterados, passando de ordinário para especial, em casos "reconhecidos por deliberação do plenário como urgentes" (art. 155). Em termos práticos, a aprovação de um requerimento de urgência significa que a matéria a ser discutida sai da comissão e é incluída automaticamente na ordem do dia para apreciação do plenário. Os projetos apreciados em regime de urgência não podem sofrer alterações livremente: aquelas emendas assinadas por pelo menos 20% da Câmara Baixa são aceitas, o que implica que, para se tornar viável, uma emenda tem de receber o apoio dos líderes dos partidos. Estes, por sua vez, podem apresentar um requerimento de urgência, sendo que o peso de suas assinaturas depende do número de legisladores que representam. A maioria dos pedidos de urgência (assim como outras matérias) é deliberada em reuniões do Colégio de Líderes, um órgão que também tem o encargo de elaborar a agenda dos trabalhos do Legislativo, composto do presidente da casa e dos líderes de partidos com mais de seis deputados. Os procedimentos legislativos são, portanto, altamente centralizados, e essa centralização limita de forma significativa não apenas os direitos legislativos individuais dos membros do Congresso mas também sua capacidade de influenciar a legislação.

Os presidentes brasileiros, por seu turno, têm grande poder legislativo, permitindo-lhes influenciar diretamente a definição da agenda legislativa.

Usando da prerrogativa de editar decretos com força de lei (as medidas provisórias), o Poder Executivo põe na agenda aquilo que considera serem os assuntos mais relevantes e urgentes19. O presidente pode também influenciar o ritmo da tramitação de legislação ordinária, ao requerer o regime de urgência na apreciação de determinados projetos de lei (que dará a cada Casa o prazo de 45 dias para deliberar a respeito). O presidente tem ainda o direito exclusivo de iniciar o processo legislativo relacionado com a definição do orçamento, tributos e administração pública. Portanto, o Executivo monopoliza a iniciativa legislativa nas áreas mais cruciais da formulação de políticas. Por fim, o presidente pode também propor emendas à Constituição.

Em vista dessa estrutura, podemos observar que é por meio de sua participação no governo que o legislador individual terá acesso aos recursos de que necessita para a sobrevivência política, não importando tanto se seu interesse central se volta para a definição de políticas públicas ou para a obtenção e a distribuição de patronagem. Em ambos os casos, seu interesse será atendido por intermédio de sua participação no governo.

Assim que o governo é organizado, mediante o acordo formal dos partidos, os líderes dos partidos passam a ser os principais intermediários dos acordos entre o Executivo e os legisladores. Trocam apoio político (votos no Congresso) por acesso à influência política e à patronagem. O Executivo, nesse sentido, fornece aos líderes dos partidos os meios para punir o legislador individual que não seguir a orientação de seu partido, que aqueles podem negar a este sua cota de patronagem ou de influência política. Por sua vez, o Executivo, considerando os recursos que gerencia, está em uma posição extremamente vantajosa.

Inversamente ao que em geral se presume a respeito do Brasil, os presidentes não precisam barganhar caso a caso para aprovar suas propostas legislativas.

Eles estão na posição de exigir apoio para a totalidade de sua agenda legislativa. Consequentemente, o padrão atual da relação Legislativo-Executivo no regime presidencial do Brasil é bem diferente do que a simples contagem de veto playersinstitucionais poderia sugerir. Aposição institucional dos governadores não é suficiente para lhes permitir minar as políticas do governo federal, que o governo pode lançar mão de outros mecanismos institucionais para evitar que isso ocorra. A organização do Congresso e o poder da agenda do Executivo são capazes de neutralizar o efeito paralisante do alto número de aparentes veto playersno sistema brasileiro.

Para concluir, voltemos para a questão do federalismo e da governabilidade.

Aqueles que identificam o federalismo como uma das principais causas do problema de governança no Brasil20estão possivelmente desconsiderando a questão da representatividade, especialmente da representatividade regional. Para sermos capazes de considerar simultaneamente os dois aspectos - governabilidade e representatividade -, de se realizar um processo mental e imaginar como um país federativo como o Brasil seria se fosse unitário (ou se a lista eleitoral fechada fosse adotada com os líderes nacionais em Brasília decidindo, por exemplo, quem figuraria em que posição nas listas oferecidas aos eleitores do Rio Grande do Sul e de Roraima). Acreditamos que o resultado não seria um cenário desejável em nenhum aspecto. Além disso, os problemas de representatividade que tal estrutura geraria poderiam muito bem levar a maiores limitações de governabilidade.

Portanto, certa moderação na reforma política, que é não causa mas também consequência da necessidade de acomodar uma diversidade de interesses por meio de intensas barganhas, pode ser o preço a ser pago pela continuidade da unidade do país e de um nível mais sustentável de implementação de políticas públicas.

NOTAS 1. A literatura sobre regionalismo no Brasil é ampla e inclui obras clássicas, como as de Leal (1948) e Queiroz (1969), e também as séries de análises históricas a respeito do papel de estados específicos na federação brasileira de Love (1971; 1980), Wirth (1977) e Levine (1978).

2. A respeito do assunto, ver também Melo (2005) e Alston et alii(2006).

3. Essa análise é baseada no conjunto de dados sobre votação nominal do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), que contém informações sobre as votações nominais que ocorreram na abertura dos trabalhos da Câmara dos Deputados em janeiro de 1989. A descrição resumida desse conjunto de dados é oferecida no texto. Uma descrição mais completa pode ser encontrada em http:// www.cebrap.org._br/index.asp.

4. Leis complementares são normas que se situam em um patamar superior ao das leis ordinárias e em um patamar inferior aos preceitos constitucionais. São regulamentos, explicações, especificações ou consolidações previstas na Constituição.

5. Acreditamos que a indicação ou a omissão estratégica de suas posições pelo governo e pelos líderes dos partidos, embora possível, não tem relevância aqui.

A prática de divulgar a posição é quase universal. Além disso, nosso exame dos dados não sugeriu nenhum padrão nos casos para os quais o governo e os líderes dos partidos não divulgaram suas posições.

6. Observe que a Tabela_1 foca somente os legisladores que são membros de partidos coligados ao governo. Excluímos os deputados de "oposição", sejam eles de estados controlados por um governador de oposição ou não.

7. Estamos cientes de que tanto esse quanto os outros resultados demonstrados podem decorrer tanto de preferências homogêneas quanto da disciplina que os partidos são capazes de impor aos legisladores (Krehbiel, 1993). Para a finalidade a que nos propomos, essa distinção não é fundamental.

8. Observe que, na coluna 2, os efeitos marginais são com relação ao voto dos legisladores de oposição em Estados governistas; essa é nossa referência básica. Acomparação que nos importa é aquela entre os legisladores governistas em Estados governistas (o que aumenta a probabilidade de voto congruente em 48,32%) e os legisladores governistas em estados oposicionistas (o que aumenta a probabilidade de voto congruente em 52,02%). Portanto, o efeito sobre a probabilidade de congruência de legisladores governistas serem de um estado oposicionista é, de acordo com a coluna 2 da Tabela_1, aumentar a probabilidade de congruência em 3,7%, igual ao efeito encontrado nacoluna1.

9. Samuels e Mainwaring (2004:85) afirmam que, "no caso brasileiro, a liderança política eficiente sob o presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2000) foi capaz de superar alguns dos obstáculos que o federalismo impôs aos presidentes que o antecederam". Ver também Abrucio (1998:227), Eaton e Dickovick (2004), Mainwaring (1997:104-105) e Kugelmas e Sola (1999:71-73) para opiniões similares.

10. Na verdade, cabe observar que obtivemos resultados similares - com alguma variação na magnitude dos efeitos marginais - tratando cada gestão presidencial separadamente.

11. Observe ainda que a adaptação do modelo para explicar o comportamento do legislador individual e entre os legisladores não é muito boa, pelo menos se comparada a outros modelos.

12. Saiegh (2004) introduz uma justificativa teórica para esse raciocínio e Cheibub, Przeworski e Saiegh (2004) a usam para um estudo comparativo dos governos presidencialista e parlamentarista. Ver também King e Zeckhauser (2003).

13. Referimo-nos aqui à Desvinculação de Receitas da União (DRU), que substituiu o Fundo de Estabilização Fiscal (FEF), o qual, por seu turno, substituiu o Fundo Social de Emergência (FSE).

14. Não apresentamos os resultados por questão de espaço. Eles podem ser obtidos mediante pedido aos autores.

15. Considerando que as bancadas dos estados não têm um líder oficial que divulgue suas posições, não podemos, como antes, computar a congruência com seus líderes. Por isso, recorremos ao índice de Rice para cada bancada. O índice é calculado pela seguinte fórmula: |% Sim Voto -% Não Voto|. Essa medida pode assumir valores entre zero, quando a bancada está dividida em dois campos com a mesma força numérica, e um, quando todos os membros da bancada votam da mesma maneira.

16. Não faz nenhuma diferença importante se usamos, em seu lugar, a parcela de congressistas do maior partido ou uma variável dicotômica (dummy) que identifique os estados em que nenhum partido obteve mais da metade das cadeiras do estado.

17. Os modelos de regressão Tobit, que levam em consideração o fato de a variável dependente não poder passar de 1 ou ser menor do que 0, produzem resultados quase idênticos às regressões OLS. Isso provavelmente se deve ao fato de apenas um pequeno número de observações ser censurado (4,4% são censuradas em 0 e 2,1% em 1).

18. Os resultados são qualitativamente similares quando avaliamos os modelos na Tabela_3 para as administrações de Fernando Henrique e de Lula separadamente.

Quantitativamente, eles são mais fortes - o que quer dizer que a diferença entre os efeitos na esfera nacional e na esfera estadual permanecem maiores em situações de conflito - para a administração Lula do que para a administração Fernando Henrique. Os resultados não são mostrados por questão de espaço, podendo ser obtidos com os autores.

19. As mudanças implementadas em 2001 transformaram significativamente a dinâmica entre o Executivo e a Câmara com relação às medidas provisórias. Essas mudanças, entretanto, não significaram a redução da capacidade de o presidente organizar a agenda legislativa.

20. Kugelmas e Sola (1999:79), por exemplo, afirmam que "o regime federalista no Brasil é um elemento de um imbróglio político-institucional caracterizado por uma multiplicidade de pontos de veto". Baseado na suposição de que o "federalismo sempre restringe as maiorias nacionais", Ames (2001:3, 18, 23 e 292), por outro lado, enfatiza o "excesso de veto players" enraizados nas instituições políticas brasileiras, as quais, de acordo com o autor, são "o cerne da crise de governabilidade do país".


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