Home   |   Structure   |   Research   |   Resources   |   Members   |   Training   |   Activities   |   Contact

EN | PT

BrBRHUHu0101-33002005000200003

BrBRHUHu0101-33002005000200003

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0101-3300
Year2005
Issue0002
Article number00003

Javascript seems to be turned off, or there was a communication error. Turn on Javascript for more display options.

Impasses do desenvolvimento

LIBERALIZAÇÃO E DESEMPENHO COMERCIAL O principal desafio de política econômica com que se defronta a maioria dos países em desenvolvimento é a construção de uma base industrial diversificada e sólida como elemento-chave para o desenvolvimento, assim como a canalização das forças básicas do comércio internacional e do investimento estrangeiro direto para esse objetivo. Em geral, a mudança do padrão de dependência da produção e exportação de produtos primários para bens industriais tem sido considerada uma forma de participação mais efetiva na divisão internacional do trabalho.

Espera-se que os produtos manufaturados ofereçam melhores perspectivas de ganhos nas exportações, não apenas por permitirem a expansão da produção e um crescimento mais rápido da produtividade, mas também por representarem uma promessa de maior estabilidade dos preços, mesmo quando aumentam os volumes, evitando-se assim a deterioração dos termos de troca que tem frustrado os esforços de desenvolvimento de muitas economias dependentes de produtos primários.

Desde o início da década de 1980, os movimentos para agilizar a liberalização do comércio internacional e do investimento estrangeiro direto (IED) tiveram forte influência no pensamento dos formuladores de políticas em muitos países em desenvolvimento. Havia a expectativa de que a abertura ao investimento e ao comércio internacionais lhes permitisse mudar tanto o ritmo como o padrão de sua participação na divisão internacional do trabalho, superando-se assim os problemas de balanço de pagamentos e estimulando o progresso técnico e o crescimento econômico para que atingissem o nível de desenvolvimento dos países industrializados.

Ao mesmo tempo em que os países em desenvolvimento se esforçavam para aprofundar a integração à economia mundial, uma nova rodada de negociações comerciais estava transformando o cenário global. Havia a expectativa de que os acordos da Rodada Uruguai* fossem duplamente favoráveis a esses países. Por um lado, um sistema baseado em normas rígidas beneficiaria as economias menores e mais pobres, submetendo a conduta de seus principais parceiros comerciais a uma maior transparência e disciplina e instituindo um sistema de revisões e sanções que não poderia ser subvertido por fortes interesses legalmente estabelecidos.

Por outro lado, esperava-se que um ambiente de maior abertura comercial fortalecesse as perspectivas de crescimento dos países em desenvolvimento, estimulando seus produtores a buscarem mais eficiência e melhorando seu acesso aos mercados do Hemisfério Norte. Esse otimismo se refletiu nas previsões exageradas sobre os ganhos que essas nações colheriam a partir da Rodada Uruguai.

Nas últimas duas décadas, os países em desenvolvimento realmente se tornaram grandes atores no comércio mundial. Suas exportações cresceram mais rápido do que a média global, respondendo por cerca de um terço do comércio mundial de mercadorias no final dos anos 1990, contra menos de um quarto na década de 1970. Nesse período, tornaram-se também mercados importantes para seus próprios produtos: a participação do comércio entre eles atingiu 40% de suas exportações no final do milênio.

Grande parte do crescimento das exportações dos países em desenvolvimento ocorreu com produtos manufaturados, que respondem por mais de 70% do total de suas exportações, depois de pairarem por volta de 20% durante a década de 1970 e o início dos anos 80. Sua participação nas exportações mundiais de manufaturados superou os 25% no final dos anos 1990, contra 10% na década de 1970.

O mais importante é que muitos dos países em desenvolvimento parecem ter conseguido realizar a passagem para as exportações de produtos manufaturados intensivos em tecnologia, que estão entre os bens com crescimento mais rápido no comércio mundial nas últimas duas décadas. No caso de alguns produtos, tais como transistores, condutores, computadores, máquinas de escritório e equipamentos elétricos, as exportações desses países respondem por 40% a 50% do total das exportações mundiais. Grande parte dessa expansão se deu como resultado de sua crescente participação nas redes internacionais de produção (RIPs), em que as cadeias produtivas são separadas e alocadas em diversos países por empresas transnacionais que buscam produtores de baixo custo para exportarem para mercados do mundo todo.

COMÉRCIO E INDUSTRIALIZAÇÃO Entretanto, quando submetido a uma análise mais minuciosa, esse cenário revela muito mais nuances e menos otimismo. O êxito dos países em desenvolvimento em expandir as exportações de bens manufaturados e atrair investimento estrangeiro direto voltado para as exportações nem sempre foi acompanhado de um crescimento mais acentuado do Produto Interno Bruto (PIB). A taxa de crescimento médio desses países nos anos 1990 foi de 4,8% a.a., abaixo da média de 5,7% registrada na década de 70. Excluindo-se a China, a queda é ainda muito mais pronunciada, quase próxima de dois pontos percentuais.

A maioria dos países que realizaram a mudança do padrão de desenvolvimento voltado para o mercado interno pelo orientado para o mercado externo por meio da rápida liberalização das importações e do IED, particularmente na América Latina, não compartilharam da expansão das exportações de produtos manufaturados, tendo experimentado ondas de importações e déficits crescentes na balança comercial que resultaram no aumento da dependência de entradas de capital privado para manter o crescimento. Por outro lado, as tentativas de atrair as finanças privadas por meio da liberalização da conta capital agravaram o problema, ao gerarem ciclos curtos de expansão e contração (boom- bust) nos mercados financeiros, além de desajustes e mudanças bruscas nas taxas de câmbio, minando o investimento produtivo sobretudo nos setores de bens comercializáveis.

Grande parte da expansão das exportações de produtos manufaturados dos países em desenvolvimento se concentrou no Sudeste Asiático e, em menor grau, na América Central. Contudo, com exceção de algumas economias recém- industrializadas (NIEs, do original Newly Industrializing Economies) de primeira linha no Sudeste Asiático, sobretudo Coréia e Taiwan, que haviam atingido níveis de renda tão elevados quanto os de alguns países industrializados, as exportações dos países em desenvolvimento ainda se concentram em produtos derivados basicamente da exploração de recursos naturais e do uso de mão-de-obra não-qualificada ou semi-especializada, com limitadas perspectivas de crescimento da produtividade e baixo dinamismo nos mercados mundiais.

As estatísticas sobre o comércio que mostram uma rápida expansão das exportações de alto valor agregado e elevado conteúdo tecnológico dos países em desenvolvimento são enganosas, pois contabilizam duplamente o comércio entre os países ligados pelas redes internacionais de produção (RIPs). Tais produtos parecem ser exportados pelos países em desenvolvimento, mas na verdade estes participam apenas das fases de montagem da produção que requerem baixa qualificação, utilizando peças e componentes de elevado conteúdo tecnológico importados dos países mais desenvolvidos. Como os fluxos de comércio são medidos em valor bruto e não em valor agregado, as peças e os componentes importados são contabilizados entre as exportações dos países que realizam a montagem do produto. Conseqüentemente, embora pareçam ser grandes atores nos mercados mundiais de produtos dinâmicos intensivos em tecnologia, os países em desenvolvimento ainda respondem por apenas 10% das exportações mundiais de produtos com alto teor de P&D, complexidade tecnológica e/ou economia de escala.

Nas últimas duas décadas, o aumento da mobilidade do capital, aliado às constantes restrições aos movimentos da mão-de-obra e aos diversos incentivos oferecidos pelos receptores de IED, ampliou o alcance das redes internacionais de produção, sobretudo nos setores automotivo, eletrônico e de vestuário.

Estima-se que o comércio baseado na especialização ocorrida no interior dessas redes responda por até 30% das exportações mundiais. No setor de vestuário, apesar de o IED ter desempenhado um certo papel, a principal forma de realocação da produção é a subcontratação (terceirização) para empresas locais.

A indústria eletrônica é o setor mais globalizado, e o comércio desses produtos é fortalecido pela crescente dispersão geográfica das redes de produção das empresas transnacionais. A realocação da produção no setor automotivo é limitada pela distância física até os mercados finais, sendo fortemente afetada por acordos preferenciais de comércio regional, tais como o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte) e o Mercosul (Mercado Comum do Sul).

Cerca de três quartos do aumento da participação dos países em desenvolvimento nas exportações mundiais de produtos manufaturados ocorreram nos três setores em que as redes internacionais de produção mais se expandiram nos últimos anos.

Nessas redes, principalmente no setor eletrônico e automobilístico, a maior parte do conteúdo tecnológico e das qualificações está incorporada nas peças e componentes importados, e uma grande fração do valor agregado se reverte em benefício dos fabricantes nos países mais avançados onde tais itens são produzidos e das empresas transnacionais envolvidas (as montadoras). A participação dos países em desenvolvimento no valor agregado é definida pelo custo do recurso mais fraco e menos escasso, a saber, a mão-de-obra não- qualificada ou semi-especializada, enquanto os ganhos com os elementos escassos mas internacionalmente móveis, tais como capital, gestão e know-how, são colhidos pelos proprietários estrangeiros. Na verdade, é a mão-de-obra em si, e não o produto do trabalho, que é exportada.

Portanto, apesar de a participação dos países em desenvolvimento nas exportações mundiais de produtos manufaturados, incluindo-se os com alto conteúdo tecnológico, estar aparentemente apresentando uma rápida expansão, as receitas oriundas dessas atividades não compartilham esse dinamismo. A esse respeito, é bastante elucidativa uma comparação entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento nas últimas duas décadas. Embora a participação dos primeiros nas exportações mundiais de produtos manufaturados tenha caído de mais de 80% em 1980 para quase 70% no final da década de 90, eles realmente aumentaram sua participação no valor agregado desses bens no mesmo período. Nos países desenvolvidos, o valor agregado dos produtos manufaturados superou continuamente o montante das exportações de tais itens nas duas últimas décadas.

Contrariamente, nos países em desenvolvimento, a proporção das exportações de manufaturados apresentou um crescimento abrupto em relação ao PIB, mas sem uma tendência ascendente significativa na proporção do valor agregado desses itens em relação a ele. Nos principais países exportadores de manufaturados do Hemisfério Sul, os valores das exportações superaram continuamente o valor agregado desses produtos nas últimas duas décadas, e a diferença cresceu ainda mais com a expansão mais rápida das exportações. Por conseguinte, o incremento da participação dos países em desenvolvimento nas exportações mundiais de manufaturados não foi acompanhado do concomitante aumento da sua participação no valor agregado desses produtos.

Essas comparações se referem ao valor agregado criado nos países desenvolvidos e em desenvolvimento, e não às receitas oriundas das atividades de produção manufatureira. O valor agregado deixado nos países em desenvolvimento é menor, e a renda recebida pelos países industrializados é maior, quando se levam em conta os lucros auferidos pelas empresas transnacionais nos seus investimentos naqueles países.

DESCRIÇÃO ESTILIZADA DA DIVERSIDADE DO COMÉRCIO E DO DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL Esse panorama geral oculta indubitavelmente a diversidade de experiências dos países em desenvolvimento na área do comércio internacional e da industrialização nas últimas duas décadas. Nesse âmbito, é possível distinguir quatro categorias: PAÍSES DE INDUSTRIALIZAÇÃO MADURA Esse grupo é constituído pelas economias recém-industrializadas de primeira linha, principalmente Coréia e Taiwan, que atingiram maturidade industrial por meio da rápida acumulação de capital, do crescimento do emprego, da produtividade e da produção na indústria, bem como das exportações de produtos manufaturados. Essas economias experimentaram um grande aumento da sua participação tanto na produção como nas exportações mundiais de produtos manufaturados nas últimas duas décadas. Elas ainda apresentam uma participação da produção industrial no PIB superior aos níveis registrados nos países avançados, mas, conforme o esperado, o crescimento industrial começou a desacelerar.

NOVA GERAÇÃO DE PAÍSES INDUSTRIALIZADOS São países com participação crescente dos produtos manufaturados no total da produção, do emprego e das exportações como fruto de grandes investimentos e da passagem das atividades baseadas em recursos naturais para a fabricação de artigos manufaturados intensivos em mão- de-obra e produtos de conteúdo tecnológico médio. Nesse grupo se incluem as economias recém-industrializadas de segunda linha (principalmente Malásia e Tailândia) e em menor grau a China, todos com participação expressiva em redes internacionais de produção. Contudo, nesses países o desenvolvimento industrial avançou bem menos do que o sugerido por suas exportações de manufaturados. Na Malásia, por exemplo, entre 1980 e 2000, a participação das exportações de produtos manufaturados no PIB aumentou 42 pontos percentuais, enquanto o aumento do valor agregado desses itens foi de aproximadamente seis pontos percentuais. Na China, o valor agregado dos manufaturados em relação ao PIB caiu no mesmo período, em conseqüência da racionalização associada à mudança do padrão de planejamento centralizado, enquanto a participação das exportações desses produtos no PIB subiu cerca de dez pontos percentuais.

PAÍSES INDUSTRIALIZADOS DE ENCLAVENesse grupo se incluem os países que também se afastaram da dependência das exportações de commodities, ligando-se a redes internacionais de produção com intensa importação de máquinas e componentes de produção. Entretanto, é baixo o seu desempenho geral em termos de investimento, valor agregado e crescimento da produtividade. Dois países se sobressaem nesse grupo, a saber, México e Filipinas, onde as exportações de produtos manufaturados em relação ao PIB aumentaram rapidamente durante o período de 1980 a 2000, enquanto seu valor agregado estagnou ou caiu.

PAÍSES DESINDUSTRIALIZADOS Esse grupo abrange a maioria dos países de renda média da América Latina, especialmente Argentina e Brasil, que atingiram um determinado grau de industrialização, mas têm se mostrado incapazes de sustentar um processo dinâmico de mudanças estruturais por meio da acumulação e do crescimento acelerados. Num contexto de rápida liberalização, a participação da produção, do emprego e das exportações de manufaturados em geral declinou ou estagnou, além de ter ocorrido uma passagem para atividades com menor conteúdo tecnológico. Em alguns países desse grupo, sobretudo no Chile, houve um padrão menos destrutivo de desindustrialização em decorrência de um ritmo acelerado de investimento, estimulando o crescimento apoiado em recursos naturais. Contudo, esse processo parece ter atingido seu limite.

Por conseguinte, com a notável exceção das economias recém-industrializadas de primeira linha, a expansão recente das exportações de produtos manufaturados dos países em desenvolvimento esteve em geral associada à sua integração crescente nas redes internacionais de produção, tendo gerado um crescimento bem mais modesto no valor agregado de sua produção manufatureira. Portanto, os países em desenvolvimento parecem ter muito mais êxito quando seu desempenho é medido em termos de comércio internacional de manufaturados e não pelo valor agregado na sua produção manufatureira.

Na realidade, o contraste entre essas duas medidas se torna ainda mais evidente quando se comparam as estruturas de comércio e produção industrial utilizando- se cinco categorias amplas de produtos: commodities ou bens primários, produtos manufaturados baseados em recursos naturais e mão-de-obra e manufaturados com baixo, médio e elevado conteúdo tecnológico. Essa comparação mostra que os países em desenvolvimento estão se assemelhando cada vez mais aos desenvolvidos no que tange à estrutura das exportações de manufaturados, mas não à de valor agregado na produção manufatureira. Nesse ponto, porém, também diferenças: 1. Coréia e Taiwan sobressaem-se por terem atingido uma estrutura de valor agregado na produção manufatureira que é, de longe, a mais próxima à predominante nos principais países desenvolvidos. Nessas nações, o crescimento da produtividade nas últimas duas décadas superou o dos principais países industrializados do Hemisfério Norte, sobretudo dos Estados Unidos, em quase todos os setores de bens manufaturados.

2. A estrutura das exportações de manufaturados de um grande número de países em desenvolvimento com participação expressiva nas redes internacionais de produção, incluindo-se China, Malásia, México, Filipinas e Cingapura, também começou a se assemelhar à dos principais países desenvolvidos, mas tal similaridade é bem menor no que diz respeito à estrutura do valor agregado na produção manufatureira. Na maior parte desses países, até mesmo na Malásia, o aumento da produtividade foi mais rápido do que nos Estados Unidos na manufatura de produtos de menor margem e tecnologia difundida, mas não na de artigos de maior margem e tecnologia concentrada.

3. Na maioria dos países latino-americanos, não apenas a estrutura do valor agregado na produção manufatureira, mas também a das exportações, se assemelha bem menos às dos países industrializados mais avançados. Em muitos daqueles países, vem caindo a produtividade na fabricação de produtos intensivos em mão-de-obra, predominando o processamento de recursos naturais nas atividades de produção e exportação.

Em resumo, no todo, as evidências indicam que, entre os principais países em desenvolvimento, somente as economias recém-industrializadas de primeira linha conseguiram melhorar simultaneamente as estruturas de produção e exportação, aumentando a produtividade nos setores intensivos em tecnologia e reduzindo a distância em relação aos líderes industrializados. Muitos países em desenvolvimento dependentes de IED e das empresas transnacionais para a expansão da produção industrial e das exportações parecem estar bem longe de desenvolver suas estruturas produtivas, mas tiveram mais êxito na passagem para a fabricação de produtos manufaturados do que as economias latino-americanas dependentes de commodities.

É evidente que a participação dos segmentos intensivos em mão-de-obra das redes internacionais de produção pode render vantagens consideráveis para os países nos estágios iniciais de industrialização, com grande número de mão-de-obra excedente. Isso pode lhes permitir aumentar o emprego e a renda per capita mesmo quando o valor agregado gerado for baixo. Ademais, o aumento do emprego para a mão-de-obra de baixa qualificação em atividades associadas a redes internacionais de produção pode ampliar o escopo dos setores onde é possível iniciar a industrialização, além de ajudar na aquisição das técnicas básicas e habilidades organizacionais necessárias para um crescimento de base mais ampla.

Entretanto, isso não representa necessariamente um salto para um novo padrão de crescimento industrial acelerado e sustentado.

Essas redes permitem às empresas transnacionais maior controle e flexibilidade para escolher onde realizar seus investimentos. Além disso, seus ativos produtivos, tais como o know-how, o design e a tecnologia, podem ser mantidos no interior das empresas de forma mais segura, graças às barreiras de entrada decorrentes dos elevados custos de gestão e coordenação de tais unidades complexas. Nessas circunstâncias, a natureza modular do investimento estrangeiro direto pode ser a causa de uma distribuição altamente enviesada dos ganhos derivados do comércio internacional e do investimento, a menos que o poder de barganha local seja capaz de gerar uma produção mais equilibrada, como ocorreu nas economias recém-industrializadas de primeira linha.

Contudo, repetir o êxito dos países recém-industrializados é ainda mais difícil onde tais investimentos são bastante móveis: vantagens de localização são facilmente obtidas e perdidas por meio de pequenas alterações de custo ou do surgimento de locais alternativos, dando origem ao perigo das economias de enclave, nas quais a dependência de bens de capital e intermediários importados é persistentemente elevada. Esses problemas podem ser especialmente graves nos países de renda média que foram bem-sucedidos nos estágios iniciais de industrialização, mas que precisam se desenvolver rápido e aumentar a produtividade para avançar mais no caminho do desenvolvimento.

Um motivo importante para a atração de IED nos setores industriais exportadores é sua possível contribuição para o balanço de pagamentos. Na verdade, enquanto toda a produção for exportada, a participação nas redes internacionais de produção pode ter um impacto positivo no balanço de pagamentos dos países em desenvolvimento, impedindo práticas como a transferência de preços, mesmo se tais atividades forem bastante dependentes de peças e componentes importados, e o valor agregado deixado no país corresponder apenas aos salários de mão-de- obra não-especializada. Contudo, o cenário pode mudar quando os bens e serviços produzidos são comercializados nos mercados domésticos. De forma mais geral, a contribuição do investimento estrangeiro direto para o balanço de pagamentos varia inversamente à participação dos lucros das empresas transnacionais no valor agregado, ao grau de dependência de importações e à proporção de produtos finais vendidos nos mercados internos. Em geral, como o grosso do valor agregado vai para os lucros, o conteúdo importado é elevado e os bens e serviços produzidos são em parte comercializados nos mercados internos, é geralmente negativa a contribuição do IED para o balanço de pagamentos nos países em desenvolvimento.

Esse é até mesmo o caso da China, um dos países mais bem-sucedidos em atrair IED voltado para as exportações. No final da década de 1990, o total de lucros obtidos pelas empresas estrangeiras e joint ventures foi da ordem de US$ 20 bilhões, com US$ 12 bilhões reinvestidos no país e o restante expatriado. No mesmo período, essas empresas geraram um excedente líquido de US$ 2 bilhões nas exportações. Por conseguinte, as empresas estrangeiras como um todo apresentavam um déficit de cerca de US$ 6 bilhões, tendo como base o fluxo de caixa. As evidências disponíveis indicam que situação semelhante ocorreu na Malásia no final da década de 1980 e início da seguinte, quando tais déficits foram cobertos simplesmente com a dependência de novos fluxos de investimento estrangeiro direto, assemelhando-se a um processo de financiamento Ponzi ou seja, pagando-se o serviço da dívida incorrendo-se em novas dívidas.

A CONCORRÊNCIA E A FALÁCIA DA COMPOSIÇÃO Com a maior participação de inúmeros países densamente povoados e de baixa renda no comércio mundial nos últimos anos, até 70% da força de trabalho empregada nos setores exportadores possuem baixa qualificação profissional.

Ademais, ainda uma quantidade considerável de mão-de-obra excedente nessas nações, e muitos países de grande porte não estão ainda totalmente integrados ao sistema de comércio internacional. Portanto, um esforço simultâneo dos países em desenvolvimento para fomentar as exportações de manufaturados intensivos em mão-de-obra ou o aumento da concorrência entre si para atrair investimento estrangeiro direto, como por exemplo locais para processos que requerem esse tipo de força de trabalho, poderia evocar a falácia da composição ou adição: sozinho, um pequeno país em desenvolvimento pode expandir bastante suas exportações sem inundar o mercado nem reduzir consideravelmente os preços dos produtos em questão, mas isso pode não ser verdade para os países em desenvolvimento como um todo, ou mesmo para os de grande porte separadamente, como a China e a Índia. Os riscos da superprodução de bens de consumo de massa padronizados com elevada dependência de importações são representados pelo setor eletrônico, em que os preços das exportações dos países em desenvolvimento parecem ser mais voláteis do que os de produtos similares comercializados entre os países desenvolvidos, tendo caído mais abruptamente após 1995.

Também sinais de que os preços das exportações de manufaturados dos países em desenvolvimento vêm caindo em relação aos exportados pelos países industrializados nos últimos anos. As evidências mostram que os ganhos de produtividade nos produtos manufaturados baseados em recursos naturais e intensivos em mão-de-obra exportados pelos países em desenvolvimento nem sempre vão para a força de trabalho na forma de salários mais altos, mas em geral beneficiam os consumidores nos mercados do mundo ocidental com preços mais baixos. Essas tendências sugerem o aumento da "comoditização" de muitos produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra exportados pelos países em desenvolvimento.

Aparentemente, as diferenças no comportamento dos preços dos manufaturados exportados pelos países desenvolvidos e em desenvolvimento se originam sobretudo de assimetrias nas estruturas do mercado mundial e nas condições do mercado interno de trabalho. Em razão da existência de barreiras significativas à entrada de linhas de produção intensivas em tecnologia associada ao elevado conteúdo de P&D e aos vultosos custos envolvidos na organização das cadeias produtivas, os mercados para tais produtos são dominados por fabricantes oligopolistas nos países industrializados, que geralmente competem com base na qualidade, design, marketing, marca e diferenciação dos produtos, e não no preço. No caso desses produtos, a participação dos mercados exportadores é muito mais concentrada do que no dos manufaturados exportados pelos países em desenvolvimento. Isso também vale para os produtos que requerem investimentos muito elevados e específicos, tais como máquinas ou equipamentos de transporte.

Entre os países em desenvolvimento, ao contrário, existe uma concorrência muito mais acirrada nos mercados para os produtos intensivos em mão-de-obra. Embora esses artigos ofereçam oportunidades para a nova geração de economias em processo de industrialização, a maioria dos países em desenvolvimento de renda média também permanece nesses setores, pois seus produtores encontram dificuldade em se desenvolver e se diversificar. As economias industrializadas também continuam a operar nesses setores sob protecionismo, pois o baixo crescimento e o elevado desemprego desaceleraram o fechamento de suas indústrias em declínio, as chamadas sunset industries, limitando assim o tamanho do mercado para os produtores dos países em desenvolvimento.

As pressões competitivas são exacerbadas pela forma como os mercados de trabalho nos países em desenvolvimento ajustam a oferta adicional de produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra por meio de salários flexíveis, permitindo às empresas concorrer com base no preço sem diminuir a lucratividade. A concorrência entre as empresas nos países em desenvolvimento, incluindo-se as transnacionais, se transforma em concorrência entre os trabalhadores situados em diferentes países.

Nessa dinâmica em que um número crescente de países em desenvolvimento, alguns com enormes grupos de mão-de-obra não-qualificada, vale-se de estratégias orientadas para as exportações, as nações de renda média da América Latina e do Sudeste Asiático mostram-se especialmente vulneráveis. Em particular, a maior concorrência de preços entre produtos eletrônicos parece ter exposto cada vez mais os exportadores tradicionais dos países em desenvolvimento ao surgimento de fornecedores mais competitivos em países com custos menores. Na ausência de uma passagem rápida para a produção de manufaturados de alto valor agregado e mão-de-obra especializada, necessária para lhes permitir concorrer com países industrializados mais avançados, esses exportadores podem se ver comprimidos entre a fabricação de produtos manufaturados de maior e menor margem de lucro.

Esses desafios com que se defrontam os países em desenvolvimento no comércio mundial foram interpretados nos últimos anos pelas lentes da competitividade internacional. No atual contexto, porém, faz-se necessária certa cautela na utilização desse conceito. Em sentido restrito, ele pode ser útil para definir a posição das empresas em relação às outras, mas não para fazer comparações entre as economias como um todo, nem mesmo entre setores industriais que abrangem muitas empresas com características distintas. Afinal, não são os países, mas sim as empresas que comercializam. Do ponto de vista privado, pode ser irrelevante se a competitividade internacional de uma empresa melhorou por meio do aumento da produtividade, do corte de salários ou da desvalorização da moeda. Contudo, de uma perspectiva socioeconômica mais ampla, esses pontos têm implicações totalmente distintas no crescimento econômico, na estabilidade e no bem-estar social.

As evidências mostram que o corte de salários ou desvalorizações abruptas das moedas não são respostas viáveis ao surgimento de produtores de baixo custo.

Muitos países que procuraram aumentar a competitividade internacional de suas empresas por meio dessa estratégia não conseguiram obter melhorias sustentáveis no desempenho das exportações de manufaturados nem do valor agregado. Por outro lado, apesar de o aumento da produtividade ser uma forma mais segura de um determinado país adquirir vantagem competitiva, um esforço simultâneo por parte de um grande número de países para melhorar a produtividade e ganhar competitividade em manufaturados intensivos em mão-de-obra pode gerar uma superprodução desses produtos, ressuscitando o problema da falácia da composição, da mesma forma que ocorreu com vários produtos primários (commodities).

OS DESAFIOS DAS POLÍTICAS Em princípio, a principal questão de política com que se deparam os países em desenvolvimento no sistema de comércio internacional não é optar por um grau maior ou menor de liberalização, mas encontrar a melhor forma de extrair de sua participação nesse sistema os elementos que promoverão o desenvolvimento econômico. Para alguns, isso ainda é uma questão de sair do padrão de produção de commodities, mas para muitos outros se trata de avançar no desenvolvimento industrial. indícios suficientes de que poderia haver risco de uma concorrência excessiva entre os países em desenvolvimento nos mercados mundiais como locais para segmentos intensivos em mão-de-obra das redes internacionais de produção para esse tipo de manufaturados e para os investimentos estrangeiros diretos. Isso poderia interromper o processo de desenvolvimento, causando perdas significativas nos termos de troca e criando graves atritos no sistema mundial de comércio. Até que ponto esses possíveis problemas podem ser evitados dependerá de três conjuntos de fatores: 1. do crescimento mais rápido dos mercados para produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra nos países mais avançados tanto nos industrializados como nas economias recém-industrializadas de primeira linha o que, por sua vez, dependerá do crescimento mais acelerado da renda, além de melhor acesso aos mercados; 2. da velocidade com que os países de baixa renda serão capazes de sair da produção de bens manufaturados intensivos em mão-de-obra, criando espaço para países de menor renda; 3. do grau em que os países em desenvolvimento poderão depender da expansão dos mercados domésticos para o desenvolvimento industrial.

Com relação ao potencial de mercado nos países industrializados, o "Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento" de 1999 (1999, Trade and Development Report - www.unctad.org) estimou que os países em desenvolvimento conseguiriam ganhar mais US$ 700 bilhões por ano com as exportações de manufaturados intensivos em mão-de-obra se as barreiras protecionistas fossem eliminadas. Isso totaliza 60% dos ganhos oriundos das exportações de manufaturados que esses países registraram no início de 2000. Contudo, as tendências recentes nas políticas de comércio exterior dos países industriais não indicam nenhum relaxamento das restrições nesses setores. Pelo contrário, tem havido um aumento abusivo de medidas anti-dumping. Também problemas com a implementação do Acordo sobre Têxteis e Vestuário (Agreement on Textiles and Clothing, ATC). O impacto da retirada das cotas nos países desenvolvidos pode levá-los a invocar as salvaguardas incluídas no Acordo para evitar "graves prejuízos" à indústria nacional e retardar a retirada do restante das cotas. Contudo, mesmo que todo o comércio de têxteis e vestuário fosse feito sob as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), ele ainda poderia ser dificultado por taxas relativamente altas e pelo escalonamento de tarifas nos principais países desenvolvidos importadores.

A pressão crescente nos países industrializados para se aumentar o nível de protecionismo contra as importações de manufaturados intensivos em mão-de-obra deriva da ocorrência simultânea de elevadas taxas de desemprego e desigualdade salarial crescente nesses países, com acentuado aumento das importações de manufaturados intensivos em mão-de-obra provenientes das nações em desenvolvimento. Entretanto, o restabelecimento do protecionismo não é uma opção viável. As dificuldades decorrentes do aumento da concorrência podem ser mais bem tratadas nos países industrializados, agindo-se de forma a utilizar o leque completo de políticas macroeconômicas e estruturais para acelerar o crescimento e reduzir o desemprego. Foi assim que eles absorveram a entrada de produtores de baixo custo, como Japão e Itália nas décadas de 1950 e 60.

O crescimento do comércio entre os países em desenvolvimento também descortina novas oportunidades para se evitar as dificuldades nos mercados de produtos intensivos em mão-de-obra. Especialmente o progresso industrial nos países em desenvolvimento mais avançados permitiria que novos atores assumissem atividades intensivas em mão-de-obra no comércio mundial. Até certo ponto isso ocorreu. Países como a China, que adotaram estratégias mais voltadas para a exportação, absorveram uma boa parte do mercado das economias recém- industrializadas de primeira linha quando estas fizeram a passagem para exportações mais intensivas em tecnologia. Contudo, por não apresentarem o desenvolvimento industrial oportuno, alguns exportadores nos países de renda média foram afetados negativamente. Seus problemas podem se agravar se países de grande porte como China e Índia expandirem rapidamente suas exportações de manufaturados intensivos em mão-de-obra. O desenvolvimento industrial em muitos desses países de renda média deveria envolver a substituição de peças e componentes importados por outros produzidos no mercado interno. Nesse processo, seria de esperar que as participações no PIB tanto das importações como das exportações caíssem à medida que o valor agregado doméstico crescesse mais rápido, revertendo a tendência observada nos países participantes das redes internacionais de produção.

É certo que o desenvolvimento industrial necessário nos países de renda média depende em grande parte das políticas implementadas em áreas como o comércio, a indústria e a tecnologia. Muitas políticas adotadas para esse fim, e que geraram bons resultados no passado não apenas nas economias recém- industrializadas de primeira linha mas também nos países industrializados, não são mais viáveis em razão dos compromissos multilaterais assumidos pelos países em desenvolvimento no âmbito da OMC especialmente o Acordo de Propriedade Intelectual (os chamados Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights Agreements, TRIPs) e o Acordo sobre Investimentos (Agreement on Trade-Related Investment Measures, TRIMs) e dos subsídios. Ademais, substitutos eficazes para tais medidas podem nem sempre ser fáceis de encontrar. Faz-se necessário, portanto, reavaliar, no processo de revisão da OMC, o impacto geral no desenvolvimento da restrição de alternativas de políticas acessíveis às nações em desenvolvimento. Também é importante que esses países resistam às tentativas de restringir ainda mais seu espaço de políticas ao assumirem novos compromissos em áreas tais como IED, políticas de concorrência e compras governamentais.

Diz-se com freqüência, sobretudo no meio empresarial, que o setor de serviços contribuiu para a manutenção do ímpeto do crescimento dos países com renda média e população de bom nível educacional diante do aumento da concorrência nos produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra. Embora possa realmente haver algumas oportunidades de negócio, o que está em risco nesse caso pode ser algo distinto quando se passa de uma perspectiva empresarial para objetivos desenvolvimentistas mais abrangentes. É improvável que o aprofundamento do setor de serviços garanta convergência da renda com os países industriais, exceto no caso de economias pequenas, como Hong Kong. A experiência histórica mostra que o setor de serviços toma a dianteira, e se inicia um processo de desindustrialização benigna a partir de patamares de produtividade e de renda muito superiores aos atingidos pelos países de renda média, ou seja, por volta de US$ 9.000,00. Na realidade, um problema com que se deparam muitos países em desenvolvimento é a desindustrialização e o aumento da participação dos serviços em níveis de produtividade industrial e renda per capita muito inferiores aos das economias industrializadas. Mais importante ainda é que isso vem ocorrendo no contexto de um crescimento errático e lento. Seria uma falácia considerar que os países de renda média conseguiriam convergir para os níveis de renda dos países altamente industrializados simplesmente passando rápido para o setor de serviços antes de atingir a maturidade industrial.

Da mesma forma, precisariam ser identificados os limites do setor de serviços no fornecimento de novas oportunidades de comércio. Inúmeros serviços, especialmente os ligados a processamento de dados, vêm sendo transferidos para os países em desenvolvimento de renda média com população de bom nível educacional. Entretanto, os prós e os contras disso são muito semelhantes aos vinculados à participação nas redes internacionais de produção. Esses países possuem vantagem competitiva nesses serviços, pois os salários são inferiores aos dos países industrializados; ou seja, possuem vantagem por serem menos desenvolvidos. Contudo, salários baixos têm pouco a ver com a eficiência da mão-de-obra na realização dos serviços. Um analista de dados ou um médico em Kuala Lumpur não é necessariamente menos qualificado ou produtivo do que suas contrapartes na Europa, mas ganha um salário inferior porque a produtividade total da economia é bem menor. E na maioria dos países não outra forma de aumentar a produtividade total que não no desenvolvimento industrial.

Por fim, para evitar possíveis dificuldades para os produtos manufaturados intensivos em mão-de-obra, as economias em desenvolvimento de maior porte, incluindo-se China e Índia, precisarão maximizar as formas de utilização das fontes domésticas de crescimento. É verdade que o crescimento da manufatura e da industrialização nas economias recém-industrializadas de primeira linha dependeu em grande parte da expansão das exportações, sobretudo nos estágios iniciais de desenvolvimento. Entretanto, esses países possuíam poucos recursos naturais, o que requeria uma passagem rápida para a produção de manufaturados intensivos em mão-de-obra para a obtenção da moeda estrangeira necessária para as importações essenciais para o desenvolvimento. Ademais, tratava-se de países de pequeno porte; no conjunto, sua população era menor do que a da província de Guangdong, na China. Por conseguinte, suas indústrias precisaram buscar mercados no exterior para atingir as economias de escala de produção necessárias. Em geral, as evidências históricas realmente mostram uma relação inversa entre a orientação voltada para o comércio externo e o porte da economia; entre os países com níveis semelhantes de renda per capita, a proporção entre comércio externo e renda tende a ser menor nos países com populações maiores. Portanto, países como China e Índia podem depender menos dos mercados externos para sua industrialização do que as economias recém- industrializadas de primeira linha. Isso proporcionaria um espaço maior para novos participantes do comércio de produtos manufaturados intensivos em mão-de- obra.

O fortalecimento dos laços econômicos regionais também poderia auxiliar nesse processo no Sudeste Asiático e na América do Sul. O pensamento econômico tradicional tende a considerar os acordos regionais como a segunda melhor solução (second-best), à falta de coisa melhor, para atingir as metas de desenvolvimento, além de um possível obstáculo na trajetória de um sistema multilateral de comércio totalmente integrado e aberto. Contudo, essa conclusão se baseia numa visão um tanto utópica da economia mundial. Nas áreas em que as empresas nacionais ainda apresentam baixa capacidade produtiva e tecnológica e o contexto econômico global se caracteriza por assimetrias, os acordos regionais podem muito bem propiciar um ambiente de maior apoio para a implementação de estratégias de desenvolvimento interno.

A maior integração econômica regional aumenta o risco de os problemas em um país contaminarem as nações vizinhas. É indiscutível que o risco se intensificou no mundo globalizado, conforme observado na crise dos países do Sudeste Asiático em 1997 e 1998. Com fluxos de capitais voláteis fomentando ciclos curtos de expansão e contração (boom-bust), desenvolveu-se um contexto macroeconômico mais frágil, vulnerável às mudanças no humor (otimismo e pessimismo) dos investidores. Por conseguinte, a retomada do crescimento regional estável e acelerado requer apoio não apenas de políticas voltadas para o desenvolvimento da produção e das exportações, mas também de acordos monetários regionais e de cooperação destinados a garantir a estabilidade dos mercados financeiros e a atingir um padrão estável de taxas de câmbio intra- regionais.

traduzido do inglês por Marta Helena Cintra Este trabalho foi apresentado na Unctad XI, realizada em São Paulo de 13 a 18 de junho de 2004. Uma versão inicial foi também apresentada em palestra organizada pelo Ministério da Indústria e do Comércio Internacional e pela Universidade da Malásia no dia 24 de fevereiro de 2004, em Kuala Lumpur. Os dados citados neste artigo são fruto de pesquisas realizadas na Divisão de Globalização e Estratégias de Desenvolvimento da Unctad, publicadas sobretudo no "Relatório sobre Comércio e Desenvolvimento" (Trade and Development Report) de 1999, 2002 e 2003.

[*] Nota do editor: A Rodada Uruguai foi a última rodada de negociações multilaterais promovida no âmbito do GATT. Iniciada oficialmente em 1986, na cidade de Punta del Este, no Uruguai, a Rodada Uruguai estabeleceu um novo paradigma no sistema multilateral de comércio, pela incorporação de negociações de áreas além de mercadorias (serviços, propriedade intelectual) e pela criação da Organização Mundial do Comércio (OMC). Os setores de agricultura e têxteis foram objeto de acordos multilaterais. Negociou-se ainda um mecanismo de solução de controvérsias de aplicação obrigatória. Foi concluída em Marrakesh, no Marrocos, em 1994. (Fonte: <www.iconebrasil.org.br>).


Download text