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BrBRHUHu0101-33002007000200013

BrBRHUHu0101-33002007000200013

National varietyBr
Country of publicationBR
SchoolHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN0101-3300
Year2007
Issue0002
Article number00013

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Ruptura e construção: Gregori Warchavchik, 1917-1927

Figura tão onipresente quanto mal conhecida, Gregori Warchavchik (1896-1972) é o elo fundamental entre arquitetura e modernismo no Brasil. Não apenas pela acolhida no seio do movimento modernista, mas sobretudo pelo significado atribuído à sua obra arquitetônica em um momento decisivo de realinhamento das vanguardas no país metonímia de um momento construtivo mais amplo na história cultural no modernismo brasileiro. Ao sintetizar uma passagem da ruptura à normalização do espírito de vanguarda, da atualização estética à nacionalização artística no campo das artes plásticas e da literatura no país, suas primeiras obras dramatizavam o processo por meio das especificidades de gênero: na condição de arte útil, a mais social das artes, própria ao consumo de massa, haja vista sua inscrição na cidade, produzida coletivamente e desse modo inseparável das divisões do trabalho, a arquitetura, talvez pela relação inelutável com a natureza do país, e em particular a nova arquitetura com seus nexos com a industrialização, parecia religar modernismo e modernização enquanto sacrificava os ideais de representatividade à realidade técnica e social.

O mais intrigante ao menos para um historiador da arquitetura é constatar o abismo entre essa visão do arquiteto e seu lugar na historiografia especializada. Desde Lucio Costa, a obra de Warchavchik foi preferencialmente tratada como um esboço individual de renovação, sem importância especial para a compreensão da nova arquitetura brasileira. Incapaz de rivalizar em vigor, originalidade ou inquietação com a obra de Oscar Niemeyer, "o passo decisivo" não teria sido "dado na cidade cosmopolita de São Paulo, por volta de 1930, mas alguns anos mais tarde na Capital Federal, por uma equipe inteiramente brasileira liderada por Lucio Costa e inspirada diretamente em Le Corbusier". A origem desse descompasso por certo remonta à recepção da obra de Warchavchik entre os modernistas. Mário de Andrade, por exemplo, que pelo menos desde 1928 havia postulado a precedência de Warchavchik, e de São Paulo, na modernização de nossa arquitetura, em 1930 alertava que a notoriedade do arquiteto derivava tão apenas de seu isolamento. Se isso não diminuía o peso de sua figura, mas o dignificava como elo entre a arquitetura moderna "socialmente falando, a mais adiantada das manifestações eruditas de arte" e as virtudes fundamentais de toda produção coletiva, anônima, universal, aliás também presentes na arte popular2, essa abstenção da autoria punha em suspeição o valor do pioneirismo. Tanto mais em arquitetura moderna, que, segundo ele, viria a se estabilizar no começo dos anos 1940, no Rio, com Lucio Costa à frente3.

Essa leitura do modernismo arquitetônico por certo ecoa a própria interpretação de Mário sobre o movimento modernista, o escândalo representado por Warchavchik cedendo espaço à norma estabelecida pelo edifício do Ministério da Educação e Saúde. Mas a guinada na interpretação do papel de Warchavchik na história da arquitetura tornar-se-ia nítida apenas no fim da década de 1940, quando a arquitetura brasileira (leia-se "carioca") consagrara-se internacionalmente como uma das alternativas mais criativas de enfrentamento dos cânones do movimento moderno. O marco é a polêmica travada nos jornais entre Geraldo Ferraz e Lucio Costa em 1948. Entre reparos e censuras de um lado a outro, inaugurava-se ali a distinção historiográfica fundamental entre o papel dos modernistas de São Paulo e a formação da arquitetura moderna brasileira a partir do Rio. Nessa disputa, Warchavchik surgiria irremediavelmente ligado às vanguardas internacionais e ao universo refinado dos salões. Porém sua pregação jamais teria podido constituir uma expressão coletiva, institucional, tão representativa da geração profissional como da cultura e da sociedade brasileiras em processo de modernização. Não se trata de retomar aqui a raiz desse descompasso, mas de criticar uma de suas premissas: a inscrição imediata e sem limites de Warchavchik entre as vanguardas internacionais como parte da construção social do mito do pioneiro, assim como a idéia de sua obra como carente de representatividade na construção cultural nacional. Para tal, focalizo aqui o período que vai dos anos de formação do arquiteto até seu aparecimento na história do modernismo, entre a fuga de Odessa e a construção da primeira casa modernista em São Paulo. Em outra ocasião, talvez, possa desenvolver a contraparte dessa crítica, isto é, a idéia de que sua ação teria sido inoperante no andamento carioca em arquitetura moderna4.

VANGUARDA E REVOLUÇÃO EM ODESSA Gregori Ilych Warchavchik foi o primeiro dos três filhos de Sofia Podgaetz e Elias Warchavchik. Quase nada se conhece de sua infância e juventude em Odessa até 1918, quando embarcou para a Itália. Seus testemunhos e esboços biográficos não fornecem pista alguma sobre a cidade e o período. Foi comum associar sua origem a um vínculo imediato com as vanguardas russas e européias. Sobretudo com as vanguardas artísticas, uma arbitrária filiação cubista, futurista ou construtivista sendo apregoada como parte da herança que traria na bagagem. É verdade que Odessa, terceira ou quarta cidade mais populosa de todo o império czarista, com mais de 500 mil habitantes na época de seu nascimento, das mais europeizadas da região e integrada ao mapa contemporâneo dos deslocamentos de investimento e população, tornara-se no fim do século um centro cultural proeminente. Como outros, também aberto à inovação intelectual e artística.

Entretanto, apesar de constituir-se como sede de instituições e movimentos artísticos avançados, como a Escola de Arte local e os Salões Izdebsky, não nenhum indício de contato de Warchavchik com os movimentos locais de renovação.

Nem com o futurismo, que passara por ali em 1913, no tour organizado por David Burliuk, Maiakovsky e Wassili Kamensky e cujos manifestos começaram a ser traduzidos para o russo em 1910; nem com o cubofuturismo, muito ativo na Rússia depois da tradução e publicação do manifesto de Gleizes e Metzinger em 1913, nem muito menos com o construtivismo, que floresceria no país apenas depois da Revolução de 1917.

Além de superficiais, as informações disponíveis sobre esses anos também são discrepantes. Ora se supunha ter ele interrompido "os estudos na Escola Politécnica" "por causa da guerra e da revolução", ora que, em 1913, havia manifestado "interesse pela arquitetura, orientando sua atividade cultural nessa arte" e, em 1917, freqüentado "o curso de arquitetura na Universidade de Odessa".

A decisão de emigrar não parece ter derivado de uma circunstância de formação específica, nem muito menos de algum engajamento no campo das artes. Foi, aliás, anterior ao enorme fluxo de artistas russos de vanguarda para o exílio no Ocidente depois de 1920. Warchavchik emigrou sozinho em 1918, aos 22 anos de idade, sem renome nem profissão. É possível que nessa empreitada tenha contado com o auxílio de alguma instituição cultural judaica, comunidade muito atuante nesse momento de guerra e revolução, mas ao evocar os anos imediatamente anteriores à partida frisou a agitação política vivida na região: a guerra civil que lhe sucedeu, as incontáveis atrocidades praticadas por brancos e vermelhos naqueles anos, como se a decisão de abandonar a terra natal tivesse sido motivada pela incerteza política da região.

indícios de que tenha, estudante, se interessado pelo momento revolucionário russo, muito incerto entre 1917 e 1918. Na cidade, a situação não era menos instável. Com a queda do Império Russo durante a Primeira Guerra, a Ucrânia fora repartida entre diversos estados, inclusive a Alemanha e, em janeiro de 1918, com o território esgarçado pelas guerras e tratados, proclamada nação independente. Ao lado das lutas fratricidas e secessionistas, a guerra civil levou a sociedade e a economia locais ao colapso: batalhas violentas entre brancos e vermelhos, morticínios em massa, epidemias, desabastecimento, fome.

Um estado de anomia tomou conta das grandes cidades da região. Kiev mudou de mãos onze vezes até 1920, e Odessa foi esvaziada em meio ao caos político e às grandes levas de emigração que dali partiram pelo mar Negro e os Cárpatos. Se Warchavchik não se vinculou ideológica ou ativamente a quaisquer desses movimentos, a decisão de emigrar deve ter repercutido a falta de horizonte que tomou conta da população local, decerto assustadora para um jovem judeu de certa condição econômica como ele.

É verdade que, bastante estratificada internamente, a comunidade judaica de Odessa não era das mais isoladas naquele momento. Somando mais de um terço da população da cidade por volta de 1917, destacava-se nas altas finanças, na indústria e nos negócios de importação e exportação (em especial de grãos), com seus membros também ocupando posição importante no pequeno comércio, nos serviços artesanais e profissões liberais um terço dos arquitetos e engenheiros, diz o censo municipal de 1910 e constituindo, inclusive, parte significativa do proletariado industrial, portuário e naval, que também ali se formara. Tudo isso, entretanto, não impediu as constantes ondas de depredações e ataques contra judeus e estrangeiros, que se acentuaram com os pogroms do início do século XX em Odessa. A estabilidade forçada pela contra-revolução aristocrática a partir de 1906, ao lado da política ultrachauvinista em relação às nações não russas, levou à oficialização da discriminação. É possível supor que a avalanche anti-semita, assim como para tantas outras famílias judias no período, tenha acelerado o processo de diluição dos vínculos comunitários e a assimilação dos Warchavchik à cultura russa e européia. Ou ao menos que tenha repercutido no estreitamento das possibilidades econômicas locais da família.

De qualquer modo, as lembranças do arquiteto falam de certo declínio econômico e do sacrifício de um ethos judeu em favor de um projeto individual burguês, que naquelas circunstâncias o teriam estimulado ao empreendimento solitário da emigração: vivíamos vida burguesa, em família de nível superior, não de classe média, mas não de aristocracia. Eu criei minha própria vida, completamente separado e isolado. A palavra solitário é certa. Eu vivi, eu criei minha própria vida, e isto me deu vantagem de emigrar para a Europa e recomeçar outra vida, porque eu fui isolado completamente, nunca conversava sobre projetos com meus pais, eu sempre criava projetos dentro da minha cabeça 5.

Projetos talvez de ganhar o mundo como artista autônomo em um momento de aprofundamento do mercado livre dos talentos na Europa Ocidental. Não tendo afinal se vinculado diretamente aos movimentos artísticos e políticos de vanguarda desses anos, nem se fechado em sua condição étnica particular, o fato é que Warchavchik parece ter deixado a Ucrânia sem remorsos nem muitas raízes a cultivar, mas com o fôlego da emancipação individual.

FORMAÇÃO EXPERIMENTAL EM ROMA Warchavchik deve ter deixado a Ucrânia nos primeiros meses de 1918, talvez "aproveitando", como lembrou Pietro Maria Bardi (1900-1999), "a ocasião em que a cidade estava ocupada". Seguiu sozinho para Roma, onde se engajou no influente Instituto Superior de Belas-Artes, herdeiro da secular Academia de San Luca. A historiografia não cessou de enfatizar "o ambiente totalmente negativo do ponto de vista da formação didática" e o esforço de "resistência" de Warchavchik a esse estágio italiano "delineado por lições classicizantes"6.Em entrevista publicada em 1931, no Rio de Janeiro, por ocasião do envolvimento na reforma pedagógica da Escola Nacional de Belas- Artes, o próprio Warchavchik evocou esse caráter antiquado de sua formação: Eu, que estudei no Real Instituto de Belas-Artes de Roma, fiz um curso bem à moda antiga e bem diferente do que se faz hoje em dia na mesma escola. Apesar desse ensino clássico, saiu de um grupo de vanguardistas que tiveram que lutar e aperfeiçoar-se autodidaticamente para conseguir o que hoje se pode ensinar nas escolas. Isso, aliás, é um fenômeno natural 7.

Se não evidências de envolvimento do arquiteto com movimentos italianos de vanguarda, é certo, porém, que ele se matriculou na instituição quando ela passava por uma reforma importante, que a colocaria no centro das transformações pedagógicas e profissionais do sistema arquitetônico italiano.

Desde a unificação nacional, a oposição entre as escolas politécnicas e as academias e institutos de belas-artes entrara na ordem do dia do debate em torno da criação no país de escolas de arquitetura autônomas. Até então, era nas Scuole di Applicazione que se formavam os architetti civili, assim como os ingegneri civili, legalmente aptos a desempenhar a profissão; às instituições de belas-artes cabendo o papel de formar os professori di disegno architettonico, legítimos herdeiros dos grandes arquitetos do passado, e não por outra razão muitas vezes envolvidos com as tarefas da construção. O debate por certo repercutia uma tendência internacional em favor da autonomização do ensino e redefinição do papel tradicional do arquiteto, e ganharia corpo na Itália na virada para o século XX, sobretudo na Escola de Roma, em torno da idéia do "arquiteto integral": formado nas futuras escolas superiores, essa nova figura profissional deveria ser capaz de unir saber técnico-científico e conhecimento histórico na defesa dos valores artísticos das cidades italianas.

Nesses termos, em 1915 foi criado um curso experimental de arquitetura no Instituto Superior de Belas-Artes de Roma, base da futura Escola Superior de Arquitetura de Roma, referendada ao final de 1919 para substituir a partir do ano letivo de 1920-1921 tanto o curso de arquitetura das Belas-Artes como a seção de arquitetura da Scuola di Applicazione. Warchavchik chega a Roma, portanto, nesse momento de transição de uma formação acadêmica clássica para outra, integral, o que se evidencia na concepção curricularmente reformada da instituição. Ainda que condensada, sua formação deve ter se estruturado com a linearidade pretendida pela reforma, articulando em paralelo ciclos de estudos históricos, matérias científicas e técnicas e preparação artística, como contribuições progressivas ao curso principal de Composição Arquitetônica. Em julho de 1920, na formatura, essa situação ambivalente viria a se refletir na concessão de dois certificados pelo Regio Istituto Superiore di Belle Arti di Roma: Warchavchik recebe o diploma tradicional de professore di disegno architettonico após "concluído o curso especial de arquitetura de quatro anos", mas "tendo superado todos os exames prescritos no Regulamento vigente", foi também "licenciado pelo Curso Especial de Arquitetura (Período obrigatório)"8.

Logo depois de formado, começou a colaborar em diversos escritórios de arquitetura e construção, entre os quais alguns de ex-professores, como Marcello Piacentini e Vincenzo Fasolo.Na documentação pessoal que preservou desse período, além dos diplomas destacam-se algumas cartas de recomendação profissional. Em 15 de novembro de 1922, Piacentini escreveu: que o senhor arquiteto Gregorio Warsciavcik [sic] esteve empregado em meu escritório pelo período de um ano, aplicando- se especialmente no projeto de casas econômicas e populares; que depois foi mandado para acompanhar e cuidar dos trabalhos do novo Teatro Savoia em Florença durante o período de um outro ano, até o final deste trabalho. Declaro que o dito arquiteto desempenhou as suas tarefas com a máxima diligência, correção e competência 9.

Trabalhou dois anos com Piacentini, pouco depois que este se tornou professor de urbanismo na recém-inaugurada Scuola Superiore di Architettura in Roma, em 1921. Autoridade no tema das intervenções modernas em cidades antigas, desde a década de 1910 Piacentini se destacava também no projeto de espaços monumentais e nas experiências com tipologias habitacionais, da vila ao palacete, do vilino ao prédio de apartamentos. Muito conhecido a partir de 1922 como arquiteto de Mussolini, segundo Lupano sua produção anterior ultrapassava a oposição tradicional entre o arquiteto conservador e o renovador. Era também um dos colaboradores mais assíduos da principal revista de arquitetura na Itália, Architettura e Arti Decorative (1921-1926), um dos órgãos responsáveis pela divulgação da produção arquitetônica internacional no meio italiano, reconhecidamente atrasado. Segundo Piacentini, "o momento arquitetônico no exterior", título de um de seus artigos no periódico do início da década de 1920, estabelecia um nexo evolutivo entre as expressões novas, de Hoffmann a Le Corbusier, e a longa tradição mediterrânea10. A situação, para ele, sugeria a possibilidade de superar o atraso arquitetônico sem abandonar a tradição nacional nem os valores clássicos italianos de proporção, racionalidade estrutural, simplicidade compositiva e contenção decorativa.

Não me parece que, apesar de estrangeiro, Warchavchik tenha ignorado tais lições; ao contrário, tudo leva a crer que tenha se aproximado do pluralismo lingüístico daquele Piacentini, inclusive colaborando em projetos de tema não acadêmico, como de habitações econômicas e cineteatros. Com efeito, entre o final de 1922 e início de 1923, Warchavchik residiu em Florença, onde assumiu a conclusão das obras e o acabamento proto-déco do cineteatro Savoia, projeto decerto influenciado pelo contato de Piacentini com os arquitetos da secessão romana. Colaborador permanente ao longo daqueles dois anos, contudo, não deve ter se tornado seu discípulo. No mesmo período, Warchavchik se envolveu em encargos de Fasolo, principal antagonista de Piacentini na polêmica pedagógica em torno das relações entre o ensino dos estilos históricos e a prática compositiva, e durante sete meses demonstrou "capacidade e competência [...], ótimas qualidades morais [...], um precioso colaborador"11. A verdade é que naqueles quase dois anos e meio de atividade profissional na Itália, o arquiteto ucraniano lançou-se em diversas iniciativas no mercado profissional.

Além de Piacentini e Fasolo, e talvez Manfredo Manfredi, outro professor de Roma12, desenhou a cenografia de Hamlet em montagem de 1921 e no período que permaneceu em Florença aproximou-se também de outros escritórios: do Studio Artístico per le Decorazioni Edilizie, do arquiteto Augusto Innocenti, no qual se envolveu com trabalhos de decoração durante cerca de quatro meses; e, entre dezembro de 1922 e abril de 1923, no Studio Tecnico Industriale, ao lado do engenheiro Alighiero Roster, para quem se encarregou do projeto de casas econômicas13.

Além do esforço de inserção no mercado de trabalho e da provável vulnerabilidade econômica naquele momento, a variada experiência profissional do arquiteto parece revelar uma aposta pessoal de treinamento em projeto e construção. Aliás, Geraldo Ferraz inseriu em seu livro fragmentos de estudos desenvolvidos pelo arquiteto no período italiano, nos quais se vislumbra alguma tensão em seu repertório. Sobretudo nos estudos para "uma residência" e "um teatro", que não se filiam às grandes convenções estilísticas e aos aparatos acadêmicos de caracterização, distanciando-se tanto da exasperação eclética ou art nouveau com a originalidade, como da nostalgia heimatstil também em voga.

Suave reminiscência talvez de estilo sóbrio: tanto na residência neo-românica sem colunas, na qual os volumes básicos se articulam entre si e os materiais estruturais deixam-se à vista, como na inspiração secessionista do teatro, nota-se uma tentativa de objetivação da forma por meio de critérios compositivos menos codificados retoricamente. Reduções estereométricas, simplificações ornamentais e efeitos de textura que antecipam uma fuga às reminiscências italianas e russas, na linha talvez da visibilidade pura tão peculiar às arquiteturas proto-racionalistas da Europa Ocidental no pré-guerra.

O ARQUITETO IMIGRANTE E A VANGUARDA DO CAPITAL Warchavchik desembarcou no Rio de Janeiro no início de 1923, aos 27 anos de idade, com um punhado de cartas de recomendação e contrato firmado por um ano com a Companhia Construtora de Santos, de propriedade do empresário Roberto Cochrane Simonsen. Pouco se disse acerca do significado desse estágio na carreira do arquiteto, senão o fato de a transferência para o país relacionar- se à inserção na grande empresa. Jamais se perguntou por que o arquiteto tinha interesse em sair da Itália ou da Europa naquele momento, nem muito menos as razões que o teriam trazido para um país tão remoto quanto o Brasil. O fato é que, apesar da oportunidade profissional bem diversa das anteriores, a vinda de Warchavchik para o país deve ter sido precipitada pelo momento político e diplomático europeu. Desde o final da Primeira Guerra Mundial e conforme os tratados relativos às minorias étnicas e nacionais, os judeus dos Impérios Russo e Austro-Húngaro podiam ter direito à cidadania nos países resultantes de sua dissolução. Todavia, onde quer que se fixassem, eram obrigados a exibir nos documentos a origem semita. Foram justamente esses judeus provenientes dos Estados sucessórios, que não podiam ou não queriam se colocar sob a proteção da maioria levada ao poder em seus países naturais, que compuseram o primeiro grupo de apátridas reconhecidos pelos tratados internacionais de paz de 1919 e 1920. Em face das imensas levas de imigrantes e povos sem Estado que desde então inundaram a Europa Ocidental, todo refugiado ou estrangeiro nas nações preexistentes, mesmo os estabelecidos, passaram a enfrentar privações de direitos civis, inclusive de asilo, e enormes dificuldades de naturalização e processos de internamento, desnacionalização e repatriação forçada. Tornando-se então freqüente na Europa a superposição do estatuto de cidadão naturalizado ou estrangeiro estabelecido com o de apátrida, não era estranho, como lembrou Hannah Arendt, que os indivíduos pertencentes a esses grupos tenham praticamente perdido as esperanças de se ajustar a uma vida normal nos países de adoção. A situação repercutiu no rebaixamento das condições gerais de vida de todos eles, inclusive dos que se sentiam seguros14.

É provável que, para Warchavchik, a condição cidadã indefinida tenha se tornado mais complicada com a ascensão de Mussolini na Itália, em 1922. Afinal, a construção da raça de heróis e gênios italianos desde o final da década de 1910 caminhava pari passu à condenação futurista e fascista do bolchevismo. Ainda que no início não viesse a aderir explicitamente ao anti-semitismo, a exaltação da comunidade estabelecia um rigoroso traçado de fronteiras entre os incluídos e os estranhos à nação que renascia. Na Itália sua condição de forasteiro era evidente. Nos diplomas acadêmicos que trouxe na bagagem, lê-se: "Warscavcik Gregório di Ilia, da Odessa (Rússia)"; em uma das recomendações que Piacentini lhe concedeu, ressalva-se: "não mostrou tendências extremistas, ao contrário ele é vítima da dissolução de seu país"15. É que à maneira dos passaportes de Nansen, em que se lia com freqüência "pessoa de origem russa", Warchavchik carregava consigo os vestígios dessa nacionalidade duplamente perigosa: para os italianos, dada a identificação do judeu asquenaze ao russo bolchevista; e para si mesmo, pela ameaça objetiva de extradição para a Ucrânia no momento em que Stalin em pessoa encarregava-se de ampliar o mapa soviético sobre os escombros das antigas províncias e nações russas.

Não , pois, como reduzir o deslocamento de Warchavchik da Itália para o Brasil em 1923 a uma aventura pessoal nem apenas profissional, tampouco pensá- lo como parte de um movimento de emigração em massa e de judeus asquenazes, muitos dos quais proletários. É preciso entender a chegada do arquiteto considerando sobretudo a relação com a incerteza política, civil e diplomática que cercava a existência dos estrangeiros e refugiados na Europa Ocidental do entreguerras, afetando de modo especial uma classe de profissionais liberais naturalmente cosmopolita e móvel. Não é de estranhar que tenha estendido o contrato de trabalho ano após ano e que em 1927, pouco tempo depois de desembarcar , tenha se naturalizado, casando-se com uma brasileira e fixando-se em definitivo no país.

Embora trouxesse consigo os ingredientes do apátrida, chegou ao país contratado por uma poderosa firma construtora brasileira para atuar em seu ramo de especialização. De fato, na cidade, as oportunidades para os arquitetos autônomos tinham se ampliado com o intenso movimento de construções observado desde o final da Primeira Guerra Mundial. Com escritórios em Santos, São Paulo e Rio de Janeiro, a Companhia Construtora de Santos, fundada em 1912 pelo engenheiro recém-formado Roberto Simonsen, destacava-se naquele momento pelo pioneirismo em termos de organização racional e desenvolvimento de novas relações de trabalho, bem como pela composição das equipes especializadas. É possível que a origem de imigrante enriquecido e remotamente judaica do patrão tenha contado a favor de Warchavchik, mas o fato é que, sintonizado com a orientação norte-americana oferecida por Taylor, desde o final da Primeira Guerra, Simonsen vinha defendendo a importação de técnicos estrangeiros para cargos de comando em suas empresas: "moços de sólido preparo", capazes de assentar o trabalho em "bases verdadeiramente científicas"16 e, no caso da Companhia, de romper com o "predomínio absoluto dos mestres-de-obras"17.

Warchavchik chegou à construtora paulista, portanto, em um momento de valorização das funções de administração, planejamento e pesquisa tecnológica, típico de um ideal tecnocrático de reconstrução influente no pós-guerra, que recomendava rigorosa divisão de competências no campo da construção como antídoto à guerra de classes.

Concentrando diversos setores da cadeia produtiva da construção civil, a atividade de Simonsen chegaria ao apogeu entre 1921 e 1925, com as dezenas de construções militares encomendadas pelo Ministério da Guerra, que a transformariam na principal empresa construtora em atividade no Brasil na primeira metade da década de 1920. Mobilizando racionalmente até 15 mil operários e contando com um grande corpo de engenheiros, arquitetos e desenhistas práticos em construções, a empresa empregou nessas obras métodos de padronização nos canteiros e até de pré-fabricação.

Se Warchavchik chegou à empresa nesse período, não registros de que tenha trabalhado nesses serviços, mas em encargos isolados que também se avolumavam ao longo da década graças aos ritmos e parâmetros de eficiência considerados modelares. Sabe-se que Warchavchik trabalhou com Simonsen durante cerca de três anos e meio, entre meados de 1923 e início de 1927, porém sua contribuição individual aos trabalhos da Companhia dificilmente pode ser apreciada, tal a complexidade da divisão interna do trabalho naqueles anos de expansão das encomendas. A condição de anonimato do jovem arquiteto assalariado correspondia, na verdade, ao monopólio da encomenda governamental e das construções mais volumosas pelas grandes firmas construtoras, assim como à nítida saturação do mercado tradicional de exercício da arquitetura; em toda parte, o predomínio dos planos de organização técnica, burocrática e comercial das iniciativas empresariais inibia as iniciativas individuais, tanto mais dos que se arvoravam no modernismo como Jaime da Silva Telles, Rino Levi e Flávio de Carvalho.

Guardadas as proporções de obras públicas e privadas, monumentais ou representativas, é plausível supor o mesmo empenho econômico em todas as obras da Companhia por mais que a introdução de novas tecnologias construtivas e organizativas nos canteiros nem sempre tenha sido acompanhada de soluções arquitetônicas muito afinadas, nem pouco dispendiosas em termos de decoração.

Isso é particularmente visível em realizações suntuosas da empresa, como a Associação Comercial ou a Bolsa Oficial do Café em Santos, onde o desnível entre a ornamentação alegórica dos exteriores e as inovações estruturais, espaciais e de conforto nas áreas internas e de serviço característica cada vez mais comum na produção eclética do período escancara o aspecto grandiloqüente e desalinhado, quase tocante, da prática projetual. E mesmo em duas obras esteticamente mais bem informadas como o Cassino e Teatro de Santos, nos extertores do art nouveau de Otto Wagner ou Henri van de Velde, ou o Depósito de Material Bélico no Rio de Janeiro, ambos de 1922 é visível o elemento derivativo das licenças estilísticas praticadas, entre retardatárias e degradadas vis-à-vis a transformação de seus modelos de referência. No último caso, aliás, o emprego de dois sistemas constrastantes a simplificação geométrica classicizante, no exterior, e o esqueleto do grande vão, típico dos projetos industriais, no interior resulta no constrangimento de sua dimensão efêmera à composição monumental da fachada principal do edifício, ao fim e ao cabo um galpão de exposição. O que não configura, de modo algum, um disparate.

Se não se pode menosprezar o empenho modernizador também aqui consignado, não restam dúvidas de que em obras representativas como essas (do poder, do prestígio e do dinheiro) manifesta-se, ainda que de modo caricato, a necessidade comum entre as elites industriais da arquitetura de ultrapassar as preocupações materiais imediatas em direção a uma nova síntese cultural entre humanismo artístico e positivismo técnico.

Se Warchavchik não atuou diretamente nessas obras nem assumiu responsabilidade por algum projeto da empresa em particular, é improvável que tenha pretendido ou logrado escapar naquele momento à tendência de conciliação entre ecletismo e tecnologia moderna. Assim como na Itália, aliás, deve ter atuado no desenvolvimento de projetos e na condução de obras distintas, não importando o estilo adotado. Mas foi aqui que pela primeira vez tomou contato com a construção taylorizada. O que não é irrelevante, considerando-se que foi naquele ambiente empresarial inovador que assinou o primeiro artigo, em 1925, no qual exaltava ao mesmo tempo a engenharia, a máquina e o mecenato industrial18.

Por trás desses slogans estão alguns dos lugares-comuns e palavras de ordem de vanguarda mais recorrentes naqueles anos, mas foi o contato direto do arquiteto com o patrocínio industrial que deve tê-lo encaminhado às novas idéias. Ainda que na empresa fossem evidentes os limites institucionais, burocráticos e culturais da forma arquitetônica, foi paradoxalmente no Brasil, país industrialmente periférico , que Warchavchik deparou com esse pólo da vanguarda engajado na reorganização produtiva do capital19. Se naqueles anos Behrens, na Alemanha, ou o próprio Le Corbusier, na França, vinham se convertendo às elites tecnocráticas nacionais, o papel de Warchavchik talvez mereça ser reavaliado também à luz do envolvimento com a empresa construtora. Note-se que Simonsen, um dos representantes mais promissores da vocação ideológica e política dos politécnicos, empresário de sucesso e líder da burguesia industrial paulista, assim como seu sócio Francisco da Silva Telles, estavam desde 1922 entre os poucos assinantes brasileiros da revista L'Esprit Nouveau, dirigida por Le Corbusier.

WARCHAVCHIK E OS MODERNISTAS DE SÃO PAULO É possível que o compromisso ideológico de Warchavchik com um projeto taylorista de racionalização da construção fosse então perceptível, mas é difícil situar o momento em que entrou em contato com a informação de vanguarda e o movimento internacional da arquitetura. Tudo leva a crer que também tenha sido em São Paulo, para ele espaço inovador de trabalho, industrialmente agitado e no qual em poucos anos se projetaria nos círculos sociais e artísticos do modernismo. Em junho de 1925 publicou em italiano o artigo "Intorno all'architettura moderna", sob a rubrica "Il futurismo", na coluna de arte do jornal paulistano Il Piccolo, periódico não muito próximo ao modernismo e sem grande penetração nos meios eruditos20. Difícil avaliar, no artigo de Warchavchik, se a ausência de referências ao movimento futurista italiano derivava da natural prevenção antifascista do arquiteto russo formado na Itália do pós-Primeira Guerra Mundial, ou de uma percepção mais pragmática do caráter mimético do olhar futurista, entusiasmado demais com a nova aparelhagem para apenas utilizá-la em favor da nova construção. O fato é que, apesar do teor dissonante, o artigo não passou despercebido entre os da terra, e em novembro de 1925, por intermédio do jornalista Oswaldo Costa, foi traduzido e republicado em português no Correio da Manhã do Rio de Janeiro. É evidente no artigo a tomada de distância do autor diante do universo acadêmico de sua formação e experiência profissional anteriores. Envolvido com a promoção de um novo perfil de "arquiteto construtor", animado talvez pela experiência com Simonsen, Warchavchik propunha, de um lado, repensar a edificação tradicional a partir da racionalidade interna de seus atributos técnicos e decorativos; de outro, reconhecer as exigências impostas pelo desenvolvimento da indústria em uma "época de capitalismo incipiente, onde a questão da economia predomina sobre todas as demais". Racionalidade construtiva, antidecorativismo e economia: a evidência de um princípio lógico-evolutivo impunha também uma revisão completa da história dos estilos arquitetônicos à luz de um ideal universal de boa construção.

Muito se discutiu acerca das matrizes do que viria a se tornar o primeiro manifesto da arquitetura moderna no Brasil. No entanto, talvez porque Warchavchik não houvesse até então se engajado em um movimento arquitetônico específico, ou antes porque inequivocamente apelasse aos anseios de ruptura de parte importante de sua geração intelectual, o impacto inicial do manifesto "acerca da arquitetura moderna" foi mais forte entre os círculos locais do modernismo artístico e literário do que entre os arquitetos. Mas quais os motivos desse interesse modernista brasileiro pela nova arquitetura? Em torno de 1925 era comum, entre artistas e intelectuais ligados ao movimento no Rio e em São Paulo, a percepção de que se iniciara um novo estágio de destruição dos lugares-comuns do pensamento e da arte para a construção de um caminho próprio de vanguarda, sintonizado com a realidade brasileira. Em entrevista ao mesmo Correio da Manhã, que meses depois publicou o manifesto de Warchavchik, Sérgio Buarque de Holanda acentuava o peso que o espírito de combate dos primeiros anos modernistas havia legado para o enfrentamento do problema de uma "arte nacional" no presente. Em dezembro de 1925, durante "o mês modernista" promovido por outro jornal carioca também predisposto às vanguardas, A Noite, Mário de Andrade afirmava que o sentido de revolta em sua geração consistia "em dar uma realidade eficiente e um valor humano para nossa construção", enquanto Sérgio Milliet ressaltava uma evolução do modernismo "para tomar, depois da sua fase destruidora, uma orientação francamente construtiva"21. Tudo parecia tender ao reconhecimento da superação daquele "espírito de guerra, eminentemente destruidor", peculiar aos anos que culminariam na Semana de Arte Moderna22, em favor de um período novo, no qual a representatividade nacional adquirida pelo movimento somava-se ao esforço de emancipação do país em relação à influência européia, por meio de um programa artístico provisório ao mesmo tempo nacional e de vanguarda. Essa passagem do destrutivo ao construtivo, que afeta diretamente a arquitetura, talvez tenha permitido aos modernistas entrever nessa arte social por excelência uma dialética, no dizer de Gorelik, "entre a percepção dramática do declive histórico que a modernidade supunha e as tentativas otimistas de sua superação".

A chegada de Warchavchik a São Paulo em 1923, menos de um ano depois da Semana, coincide com o que a historiografia do movimento definiu como momento de "desrecalque localista" e, segundo Gilda de Mello e Souza, deslizamento do pólo francês e italiano de vanguarda para o alemão, sua arquitetura representando "uma das expressões mais vivas da vanguarda brasileira". Não apenas devido ao florescimento da proteção das elites à sua volta, mas também à difusão de agrupamentos, revistas e movimentos mais bem configurados, que permitiam ao movimento afirmar-se socialmente como projeto moderno para a cultura nacional.

Ao mesmo tempo em que se superavam as referências imediatas ao futurismo e ao cubismo nos combates antiacadêmicos anteriores à Semana, surgiam na cidade outros modelos de atualização estética. Em 1923, o pintor Lasar Segall chegava da Berlim expressionista e logo se envolveu com o círculo modernista paulistano. Em 1924, o influente poeta franco-suíço Blaise Cendrars também desembarcava, contribuindo para o aprofundamento em São Paulo da tendência primitivista e canibalista das vanguardas parisienses.

Ainda que não ligado de modo especial a tal ou tal tendência nova, Warchavchik, possivelmente em torno de 1925, pode ter se deixado contaminar pela movimentada atmosfera cultural paulistana, aprofundando por seu intermédio o conhecimento das vanguardas arquitetônicas européias. Isto é, talvez tenha redescoberto a arte européia mais recente uma vez no Brasil e num momento preciso no qual os modernistas da terra redescobriam-se a si mesmos pelas lentes das vanguardas internacionais. Não é improvável que um de seus primeiros canais de acesso à informação contemporânea, ao lado de Roberto Simonsen ou Silva Telles, seus ilustrados patrões, tenha sido o próprio Lasar Segall. Embora não haja nenhuma documentação ou testemunho, é tentador imaginar Warchavchik aproximando-se do artista lituano na exposição de 1924; dirigindo-se a ele, ainda em russo, para trocar recordações sobre a vida dos judeus em Odessa ou em Vilna, tema tão presente nos trabalhos do artista naquele período; sobre a situação complicada dos milhares de europeus desenraizados recém-instalados no país ou sobre outro tema da trajetória em comum. Ou imaginar Warchavchik sendo introduzido ao círculo requintado de relacionamentos sociais e culturais que o cercava, conhecendo de perto Mário, Oswald e Tarsila, Guilherme de Almeida e Paulo Mendes de Almeida, os Silva Telles, os Silva Prado, os Penteado, os Mindlin, os Neumann, os Bessell, os Lafer, os Klabin, assíduos freqüentadores de suas exposições, e através de uns e outros tomando das realizações de vanguarda na Alemanha, na França ou no Brasil, e sendo apresentado, em meados de 1926, à sua futura esposa, Mina Klabin, depois que ela regressara da Europa23.

Foi também no ano de 1925 que Warchavchik ingressou com o pedido de reconhecimento oficial do diploma italiano, depois do longo período de completa dedicação à empresa de Santos. Se o fato revela certo empenho de estabilização profissional, ou de liberalização da prática, é possível que o arquiteto então houvesse se decidido pelo país. Conforme depoimento pessoal, permaneceu no corpo técnico da Companhia Construtora até 1927, quando então abriu escritório próprio em São Paulo, casando-se com Mina Klabin e naturalizando-se brasileiro24. Antes disso, em setembro de 1926, a revista Terra Roxa e Outras Terras o convidou a exprimir suas idéias sobre o curso da arquitetura mundial e brasileira, introduzindo na influente publicação cultural paulista o tema da arquitetura. De fato, o depoimento intitulado "Arquitetura brasileira"25 freqüentemente tomado como obscuro testemunha outro olhar sobre o passado clássico e nacional, ainda que embebido pelo ciclo da Decadência do Ocidente de Oswald Spengler. Na transição da cultura à civilização, o neoclassicismo teria emergido de transformações fundamentais no final do século XVIII, atingido a plenitude de caracteres orgânicos a certa altura de sua evolução, desde meados do século XIX tendendo à decadência uma vez liberada a energia "faustiana" das máquinas26.

Ainda que em absoluto pessimista, o sentido da indignação de Warchavchik diante da macaqueação internacional do classicismo parisiense, e em especial sul- americana, tem essa fonte de compreensão do passado recente europeu27. Se o presente consagrava o cimento armado, o conforto tecnicamente informado, o desenho industrial, os valores de praticidade e economia pensava Warchavchik "deve o moderno arquiteto estudar os antigos não com o fito de imitá-los, mas com o de desenvolver sua capacidade estética no sentido do equilíbrio e das medidas". Se pouco importava a criação de estilos, o atendimento aos fins práticos da obra passava pela adaptação "ao clima e costumes do lugar" e observância estética das possibilidades dos materiais disponíveis. controvérsias acerca da autoria dessas idéias no artigo: se suas ou resultantes da interferência dos editores do periódico na entrevista, tal a riqueza de informações históricas sobre o Brasil. No entanto, se a idéia básica reapareceria em artigos posteriores do arquiteto, a redação definitiva do depoimento testemunha em primeira mão a suscetibilidade do autor ao imenso debate modernista sobre as relações entre o regional e o universal. Desse modo, se ainda havia alguma legitimidade para os palacetes neoclássicos ou as construções mais modestas em velho estilo colonial, seu interesse nitidamente se voltava para a nova burguesia urbana em ascensão. Confrontado com as clientelas e encomendas disponíveis na cidade, aristocráticas, médias ou populares, Warchavchik de bom grado contemporizava com, e convalidava, o neoclassicismo, o neocolonialismo e o modernismo, mas também vinha a público celebrar a constituição local de um meio de "arquitetos nacionais de primeira ordem", ao qual pouco depois viria a se incorporar. Todavia, enquanto fossem incapazes de conter as extravagâncias impostas ao projeto pela clientela endinheirada; de atender às demandas sociais sem recair na mesquinharia; ou de difundir "as vantagens do modernismo" contra o "embaraçoso desacordo entre as posses do cliente e suas ambições", talvez o profissional estrangeiro ainda tivesse um importante papel a cumprir nesta cidade.

DILUIÇÃO DA VANGUARDA: A CASA DA SANTA CRUZ REVISTADA Com ou sem concessões às várias formas de tradicionalismo, foi certamente a sintonia de Warchavchik com as tendências dominantes da arquitetura internacional o que despertou o interesse das vanguardas paulistanas por suas idéias mesmo que o debate arquitetônico brasileiro ainda fosse monopolizado pela oposição entre o cosmopolitismo beaux-arts e as várias formas de regionalismo, e que até os modernistas mais atilados continuassem a assumir posições nacionalistas não de todo defasadas do debate internacional. Pois sua campanha em favor de uma beleza construtiva, ao menos naquele momento, efetivamente transigia com o clássico e o colonial e não se afirmava por tal ou tal filiação a mestre, tendência, movimento ou submovimento de vanguarda.

Antes, ao contrário, parecia atualizar um ideal de Zeitgeist difuso, complexo e indeterminado da mudança, típico daquela fase do capitalismo, ora confessando uma concepção teleológica da história comum entre os arquitetos de sua geração, ora deixando-se permear pelas múltiplas reivindicações do próprio movimento moderno em favor do anonimato. Assim, nem Vers une architecture ou L'Art décoratif d'aujourd'hui, livros de Le Corbusier publicados em 1923 e 1925, nem apenas Internationale Architektur, de Gropius (1925), mas algo de um e de outro, assim como de Loos, Behrens, Perret, Marinetti, Piacentini, Taylor, Simonsen, Wladimiro Acosta, Segall, Mário de Andrade e Mina Klabin. Salvo engano, até pelo menos 1927 as matrizes de renovação em Warchavchik provinham desse estado de espírito que se intuía por uma percepção aguda das transformações e perturbações que o mundo industrial infundia sobre o campo material e simbólico de toda uma época que se reconhecia no vínculo entre arte, técnica e sociedade. Em 1928, ainda que "militando entre as fileiras dos que não se querem prender ao passado", diria pretender tão-somente enfrentar "o conjunto de interrogativas, a soma de inquietações, o fulcro, por assim dizer, de todas as aspirações que caracterizam a nossa época"28. E mesmo em 1929, em defesa dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM), reafirmaria acerca da arquitetura nova: "feita para aqueles que se utilizam das conquistas da técnica e ciência, que viajam de automóvel e que daqui a pouco viajarão de aeroplano". Tanto mais em um país novo como o Brasil, "cheio de forças" e de "poucas tradições", com um futuro brilhante tanto nas artes como nas "finanças, nas indústrias, na lavoura e na política"29.

Como tal, uma revisão completa do campo da produção material impunha-se aos arquitetos como forma de restabelecer uma unidade harmoniosa da arquitetura com todos os demais fenômenos da vida contemporânea, pouco importando o fato de ter sido precisamente essa totalidade cultural o que o curso da história havia deixado para trás. Tudo parecia convergir para o reconhecimento, mais ou menos comum na opinião de vanguarda em torno de 1925, de uma imagem unitária do mundo da qual decorreria uma inelutável Gemeinschaft internacional do movimento. Não apenas marcado pela expansão universal do consumo em massa de bens modernos, mas visivelmente informado pela discussão estabelecida por Gropius em torno das distintas contribuições nacionais e individuais para a unificação internacional do caráter construtivo moderno, Warchavchik pouco depois viria a reconhecer em toda parte o nascimento de uma idéia nova de arquitetura30. O que estava em jogo não dizia respeito unicamente às dimensões utilitárias e mercantis do projeto moderno, mas ao redimensionamento de seu alcance civilizatório. Ao mesmo tempo em que ultrapassava e incluía os termos antitéticos que ainda desafiavam a crítica acadêmica e as vanguardas o cosmopolitismo superficial e o essencialismo localista , essa nova arquitetura propunha oferecer uma síntese definitiva entre técnica e proporção, validade objetiva e vida espiritual, leis internas e meios formais, fim e sentido em uma simbólica funcional, irredutível ao utilitarismo universal e aos estilos regionais31. Em outras palavras, se não se pode categoricamente associar uma matriz de renovação específica o futurismo italiano, o purismo francês, a nova objetividade alemã, o neoplasticismo holandês, o construtivismo russo ou qualquer outra às idéias defendidas por Warchavchik naquele momento, a sua aposta no restabelecimento da unidade arte-técnica-sociedade no processo de industrialização, em sintonia com as tendências emergentes no seio do próprio movimento internacional, prefigura um realinhamento também decisivo na história da arquitetura brasileira.

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Em 1927, com o casamento e a naturalização, Warchavchik estabeleceu firma própria em São Paulo e iniciou a construção de sua primeira obra autoral, a própria residência do casal à rua Santa Cruz, na Vila Mariana, considerada a primeira obra brasileira de arquitetura moderna, salão modernista dos mais importantes da cidade. Construída no interior de uma gleba de propriedade dos Klabin pequena parcela do imenso patrimônio imobiliário da família constituído desde o início do século pelo patriarca Maurício Freeman Klabin em um bairro então pouco ocupado, a casa dominava um outeiro que se estendia por quase 13 mil metros quadrados de terreno, uma espécie de villa no parque que ensaiava as matemáticas da casa moderna ideal no fragmento geométrico do interior do qual o proprietário podia contemplar o desenvolvimento de seus domínios na paisagem agreste que o cercava.

A despeito do estatuto de obra pioneira, os historiadores não cessaram de frisar as discrepâncias entre a casa e o discurso de Warchavchik, ou entre a casa e as idéias canônicas que lhe teriam inspirado, assinalando as ambigüidades do arquiteto ante constrangimentos externos como a incompreensão do público, a legislação estética conservadora, o alto custo dos processos e materiais industrializados, a inexistência de mão-de-obra especializada. Em toda parte revelando defasagem, insuficiência, infidelidade, concessão, chegou- se a afirmar não ser ela sequer "um exemplar de arquitetura moderna". Levantada em alvenaria de tijolos sobre um amplo platô edificado, com piso de taboado sobre um vigamento de madeira, assim como o telhado convencional coberto de telhas de barro, nem mesmo a planta escaparia à tradição dos vestíbulos, segundo Carlos Lemos. Para Bruand, a aparência enganosa se estenderia do revestimento simulando construção em concreto armado à platibanda que sugeria um teto-jardim inexistente, sem contar as tecnicamente complicadas janelas de canto, ali usadas como expediente formal de composição, o que feria um a um os cinco pontos da arquitetura de Le Corbusier. É verdade que parte dessa bibliografia notou as dimensões de ruptura: as superfícies completamente lisas e a ausência total de modinatura, os efeitos de transparência e continuidade espacial graças ao uso generoso do vidro, o controle cuidadoso da execução, a unificação do design aos menores detalhes de acabamento, instalações, cor e mobiliário, em uma atitude de ascetismo e coordenação ao mesmo tempo agressiva e autoconsciente, inspirada nas lições de Loos, dos cubistas, da Bauhaus, de Le Corbusier ou até de Ernst May. Em qualquer dos casos, todavia, o que se reafirmava era o caráter impuro do projeto, suas concessões diante do passado.

Muitas dessas dificuldades seriam de fato reconhecidas pelo próprio Warchavchik, que, aliás, pouco depois viria a abjurar a formação acadêmica italiana32 e, em 1934, reformar a própria casa. O problema é que raras vezes se aprofundou o significado dessas contradições. Pois, em vários sentidos, a casa da rua Santa Cruz, muito além do anedotário específico, é a obra mais emblemática da virada arquitetônica brasileira. Urbana e suburbana, moderna e clássica, inovadora e convencional, provinciana e cosmopolita, representa eloqüentes matrizes compositivas e, simultaneamente, a negação de todos os estilos: uma vontade de correspondência entre o objeto e a função, a forma e o uso, mas também um vínculo com velhos esquemas de projetação e construção.

Realçando a unidade e autonomia do edifício ao mesmo tempo que recorrendo a critérios de contemporização com o local, as discrepâncias, as concessões e os desvios patentes na arquitetura de Warchavchik falam precisamente das possibilidades do modernismo neste solo social específico em que se assenta.

A solidez de sua fachada mestra não esconde as disputas entre formação acadêmica, preocupação construtiva, informação de vanguarda e consentimentos com a realidade local no interior da casa. Por certo informada por um pedigree no classicismo, cara também à produção européia da década, inclusive dos puristas, não se pode ignorar que a simetria elementar, ainda que "um pouco banal e rija por demais"33, em grande medida corresponde a uma exigência estrutural da construção, que, parede sobre parede em alvenaria, limita a exploração plástica dos planos verticais e horizontais, obrigando-a a cumprir eqüitativamente com o papel de suporte de todo o peso da cobertura. Decerto vem daí a tendência a repetir a distribuição interna nos dois pavimentos, o que, contendo o ânimo de expansão que a situação sugere, não impede que a planta resulte mais fluida que de costume, os vãos mais generosos, as grandes superfícies envidraçadas, linhas quase contínuas de janela, muita luz no interior e várias formas de mediação com o exterior, pátios, balcões e terraços em todas as faces. E, se a alvenaria predomina, o cimento aparece aqui e ali em lajes, vigas e pilares e na solução estrutural, a mais ambiciosa do período em termos formais: as controvertidas janelas de canto sob vergas em L, que suportam uma carga superior aliviada, afirmando sem pudor as novas possibilidades estéticas da técnica construtiva do cimento armado.

Em sua inspiração loosiana e palladiana, como se disse , predominam as estratégias conflitivas: entre a afirmação e a negação da divisão tripla da fachada e do desenvolvimento cruciforme da planta; entre uma distribuição excessivamente recortada e a presença de um foco central absoluto; entre a continuidade das linhas horizontais de janelas, terraços e beirais no pavimento térreo e as seqüências rítmicas de recortes verticais nas superfícies em geral cheias do primeiro andar; entre gestos de conveniência e explosão, expansão e inversão na estereometria; entre efeitos de tradicionalismo e arejamento, de síntese e desatino.

De fato, a sobriedade clássica da fachada urbana, que nos reenvia a seus desenhos do período romano, sobretudo os de habitação, é reforçada pela ênfase central da porta de acesso social e a divisão axial, em três ou em cinco, da fenestração e dos planos horizontais e verticais. Mas contrapesos e mediações quanto à ordem matemática. Desde o pátio de entrada, se o muro rebaixado à altura dos peitoris adiciona axialidade à composição, resquício talvez do velho pórtico frontal, aciona também efeitos de tridimensionalidade que se rebatem sobre a fachada principal, irradiando-se por todo o volume do edifício graças à perfuração das arestas laterais no nível térreo, à saliência em balanço das caixas dos balcões no piso superior e à platibanda cúbica da coberta. Tema visual introduzido pelos jogos de sobreposição e ambigüidades espaciais, caros ao rappel à l'ordre contemporâneo, o recurso se alonga na combinação entre as formas abstratas da construção e os episódios figurativos característicos do paisagismo. Aos deslocamentos de visão do exterior vincula- se a travessia do olhar em plano nobre pelos eixos que unem os quatro lados do cubo, articulando a sua face pública e publicitária mais retórica à assimetria dos ambientes domésticos. Entre o alpendre e o jardim sertanejo, projetado pela esposa Mina Klabin Warchavchik ao redor do volume branco reluzente dessa casa- grande moderna, no equilíbrio de antagonismos entre a ordem e o aparentemente casual, os cânones e as contingências, a abstração e o sertão, a firmeza redentora do cenário e a flacidez dos bastidores domiciliares, as distorções irregulares nos fundos e laterais da fachada formal à frente aludem aos impasses do momento.

Distorções irregulares por certo, mas também desequilíbrios, convém notar. Não tanto entre o cânone e a obra, e sim no próprio projeto da casa da rua Santa Cruz: dificuldades de composição evidentes no plano espacial, soluções estruturais ora exageradas, ora acanhadas, planimetrias um tanto confusas. É o que se percebe, por exemplo, nas passagens da fenestração frontal para as laterais, e dos peitoris e empenas para o telhado; no pedestal ciclópico de implantação da casa; na definição a priori dos vãos de um alpendre absolutamente independente; na equação entre planos e lajes, na divisão labiríntica do primeiro andar. Episódios de tensão que, para além de um desenho de síntese entre o tradicional e o moderno, o internacional e o nacional, denunciam as fissuras, as conveniências, os disparates, a penúria de razões do projeto em um campo ainda pleno de problemas de legitimação: em face das belas- artes e da engenharia, das artes aplicadas e da indústria da construção. Mas também em relação às demandas de um mercado e ao crivo de um público pouco afeito aos parâmetros de arquitetura, construção e habitação que um grupo ainda minoritário de arquitetos de vanguarda empenhava-se em unificar e validar internacionalmente. Se as fissuras e disparates no projeto embaraçam o treino profissional, desarrumam a técnica, iludem a crítica, desconcertam o público, e, mais, parecem trair o novo cânone em gestação, esses pólos de tensão talvez revelem o quanto havia de ambíguo e indeterminado na delimitação de uma esfera própria ao trabalho do arquiteto naquele momento.

E não poderia ser de outro modo. Não apenas porque a revolução estética encenada na casa dos Warchavchik se no meio dos estoques fundiários dos Klabin, inscrevendo-se como uma operação estranha e ao mesmo tempo emblemática e familiar de associação entre os conteúdos da terra, a forma clássica, o objeto industrial e os novos horizontes visuais. Afinal, como se sabe, na industrialização deste país atrasado pelo longo período de latifúndio monocultor e escravocrata, o abundante suprimento de terra especulativa e força de trabalho desqualificada e barata, reservas de acumulação primitiva, dependente e combinada do capitalismo internacional, viriam a se constituir na principal mola propulsora da construção civil e da urbanização ao longo do século XX. Será que não poderíamos encontrar muitos dos paradoxos de nosso processo de modernização e da moderna arquitetura brasileira nos compromissos intencionais, nos equilíbrios de circunstância e nos episódios irresolvidos que o trabalho da obra revela?

[1] Este artigo foi em parte apresentado no XXX Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), no Grupo de Trabalho Pensamento Social no Brasil, como resultado de uma pesquisa maior financiada pelo CNPq. Entre outros, agradeço aos arquitetos João Sodré e Juliana Braga pela dedicação ao projeto desde o início, assim como a Sérgio Miceli, Heloisa Pontes e Isabel Lustosa pela oportunidade de discuti-lo no evento a partir das relações entre as vanguardas e a sociedade brasileira. A pedido de Novos Estudos, parte expressiva das referências bibliográficas foi suprimida. A íntegra das fontes pode ser encontrada na versão completa do trabalho, a ser publicada em breve pela Cosac Naify.

[2] Mário de Andrade. "Arquitetura colonial III". Diário Nacional, São Paulo, 25 ago. 1928.

[3] Mário de Andrade. "Brazil Builds". Folha da Manhã, São Paulo, 23 mar. 1944.

[4] O período entre as duas exposições das casas modernistas, a de São Paulo e a do Rio, em 1930 e 1931, assim como a obra carioca de Warchavchik depois disso revelam uma relação bem mais densa do que se supõe entre a trajetória do modernista e o movimento moderno no Brasil [5] Pietro Maria Bardi. "Gregori Warchavchik (1896-)".

[6] Pietro Maria Bardi. "Prefácio". In: Geraldo Ferraz. Warchavchik e a introdução da nova arquitetura no Brasil: 1925 a 1940 (São Paulo: Masp, 1965, p. 8); Geraldo Ferraz, op. cit., pp. 20-1; Agnaldo Farias. A arquitetura eclipsada: Notas sobre história e arquitetura a propósito da obra de Gregori Warchavchik, introdutor da arquitetura moderna no Brasil (Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, IFCH-Unicamp, em 1990, p. 174).

[7] "A reforma da Escola de Belas-Artes e o Salão oficial deste ano". Diário da Noite, São Paulo, 26 ago. 1931.

[8] Istituto Superiore di Belle Arti di Roma, protocolo n-o 10.752. Ambos os documentos encontram-se no acervo pessoal do arquiteto, depositado no escritório de arquitetura Carlos Warchavchik em São Paulo. Segundo Gabetti e Marconi, ao fim dos cinco e não quatro anos do curso, o aluno deveria se submeter a um exame para obter o diploma de arquiteto civil e a licença edilícia. Warchavchik gradua-se no último ano de vigência do curso experimental, em pouco mais de dois anos de freqüência na escola, o que sugere formação prévia na Ucrânia.

[9] Carta de recomendação de Marcello Piacentini, Roma, 15 nov. 1922, original em italiano. Escritório de Arquitetura Carlos Warchavchik. Gregori Warchavchik, Correspondência, p. 001A.

[10] Marcello Piacentini. "Il momento architettonico all'estero". Architettura e Arti Decorative, n-o 1, maio-jun. 1921, pp. 32-76.

[11] Carta de recomendação de Vincenzo Fasolo, Roma, 23 out. 1923, original em italiano. Escritório de Arquitetura de Carlos Warchavchik. Gregori Warchavchik, Correspondência, p. 003A.

[12] Em atestado concedido pela Companhia Construtora de Santos ao arquiteto em 1926, menção a certa colaboração de Warchavchik com seu ex-professor Manfredo Manfredi. Carta de F. Silva Telles, Companhia Construtora de Santos, São Paulo, 5 jan. 1926. Escritório de Arquitetura de Carlos Warchavchik.

Gregori Warchavchik, Correspondência, p. 004A.

[13] Carta de recomendação de Augusto Innocenti, Studio Artístico per le Decorazioni Edilizie, Florença, 20 abr. 1923. Escritório de Arquitetura de Carlos Warchavchik. Gregori Warchavchik, Correspondência, p. 001B; carta de recomendação de Alighiero Roster, Studio Tecnico Industriale, Florença, 25 abr. 1923. Correspondência, p. 002A.

[14] Estima-se que houvesse mais de 10 milhões de apátridas de fato ou em potencial vivendo na Europa nos anos 1920, a maioria fugindo das guerras, da fome e do racismo. Entre 1921 e 1922, a Liga das Nações começou a emitir os passaportes de Nansen, inicialmente para os refugiados e apátridas do antigo Império Russo na Europa, mas logo ampliados a outras nacionalidades e válidos em todos os países da comunidade internacional.

[15] Carta de recomendação de Marcello Piacentini, Roma, 21 jul. 1923.

Escritório de arquitetura de Carlos Warchavchik. Gregori Warchavchik, Correspondência, p. 002B.

[16] Roberto C. Simonsen. "O trabalho moderno". São Paulo: O Estado/ Seção de obras, 1919, p. 11.

[17] Roberto Simonsen. À margem da profissão (discursos, conferências e publicações). São Paulo: São Paulo Editora, 1932, p. 157[ STANDARDIZEDENDPARAG] [18] Gregori Warchavchik. "Acerca da arquitetura moderna". Correio da Manhã, Rio de Janeiro, - nov. 1925.

[19] Enquanto edificava o império da construção civil, Simonsen diversificava seus investimentos, passando a controlar metalúrgicas, fábricas de combustíveis líquidos, borracha e cimento, cerâmicas, frigoríficos, fazendas de madeira, além de empresas do ramo comercial, financeiro e imobiliário. Na virada para a década de 1930, ascende à liderança intelectual e política da burguesia industrial paulista e brasileira: é o primeiro vice-presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo em 1928; funda em São Paulo o Instituto de Organização Racional do Trabalho, em 1931, e a Escola Livre de Sociologia e Política, em 1933; preside o Instituto de Engenharia local entre 1933 e 1934, elegendo-se constituinte em 1934 e presidente da Confederação Industrial do Brasil em 1935 e 1936. Sobre o vínculo da arquitetura moderna com a vanguarda do capital, cf. Manfredo Tafuri. Projeto e utopia. Lisboa: Presença, 1985.

[20] Gregori Warchavchik. "Note d'arte: Futurismo?". Il Piccolo, São Paulo, 15 jun. 1925.

[21] "Modernismo não é escola: é um estado de espírito. Entrevista com Prudente de Moraes, neto, e Sérgio Buarque de Holanda" (Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 19 jun. 1925); "Assim falou o papa do futurismo. Como Mário de Andrade define a escola que chefia" (A Noite, Rio de Janeiro, 12 dez.

1925 apud Homero de Senna (org.). O mês modernista. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 1994, p. 36); Sérgio Milliet. "O mês modernista. Tendências" (A Noite, Rio de Janeiro, 15 dez. 1925, apud Senna. O mês modernista, p. 45).

[22] Mário de Andrade. O movimento modernista. In: Aspectos da literatura brasileira. São Paulo: Martins, 1967, pp. 225-6[ STANDARDIZEDENDPARAG] [23] Sabe-se pela correspondência pessoal com sua irmã Jenny que entre 1920 e 1926 Mina passou a maior do tempo na Europa e curtos períodos no Brasil, como depois da morte de seu pai, Maurício Freeman Klabin em setembro de 1923. Depois de fevereiro de 1924, Mina viveu na Alemanha, viajando intensamente pelo continente e retornando a São Paulo em julho de 1926. Pouco depois, em 4 de janeiro de 1927, contraiu matrimônio com o arquiteto russo.

[24] "Architect Gregori I. Warchavchik". Súmula curricular datilografada em inglês. Cf. Gregori Warchavchik, Correspondência. Carta datilografada em papel timbrado de Gregori Warchavchik a Alberto Sartoris, São Paulo, 20 mar. 1958: "J'abandonnai mon emploi em 1927 et ayant organize mon bureau [...]".

[25] Gregori Warchavchik. "Arquitetura brasileira". In: Terra Roxa e Outras Terras, São Paulo, n-o 7, 17 set. 1926, pp. 2-3.

[26] Oswald Spengler. A decadência do Ocidente. Rio de Janeiro: Zahar, 1964. O primeiro volume do livro foi originalmente publicado em 1918 e traduzido para o russo em 1923.

[27] A idéia seria reafirmada em artigos de 1928: com o avanço da ténica industrial, a substituição do artista pelo operário na imitação do passado acusava a decadência do gosto. O neoclassicismo redundara em "trabalhos inexpressivos". No exame comparativo das diversas civilizações a arquitetura chegara ao século XX necessitando estabelecer uma nova leitura do passado. Cf.

Gregori Warchavchik. "Decadência e renascimento da arquitetura" (Correio Paulistano, São Paulo, 5 ago. 1928); G. Warchavchik.

"Arquitetura do século XX. VI. As relações entre arte e cultura" (Correio Paulistano, São Paulo, 21 out. 1928); G. Warchavchik.

"Arquitetura do século XX. IX. Arranha-céus" (Correio Paulistano, São Paulo, 2 dez. 1928). Recentemente reunidos em Gregori Warchavchik.

Arquitetura do século XX e outros escritos. São Paulo: Cosac Naify, 2006.

[28] Gregori Warchavchik. "Arquitetura do século XX. III. Ainda as teorias de Le Corbusier". Correio Paulistano, São Paulo, 14 set. 1928.

[29] Gregori Warchavchic. "São Paulo e a arquitetura nova". Ilustração Brasileira, ano X, n-os 107-109, Rio de Janeiro, jul.-set. 1929.

[30] Gregori Warchavchik. "Decadência e renascimento da arquitetura".Correio Paulistano, 5 ago. 1928. Republicado posteriormente com pequenas alterações como "Arquitectura moderna". Forma, n-os 2-3, Rio de Janeiro, out.-nov. 1930, p. 10.

[31] Cf. Adolf Behne. La construcción funcional moderna (1923) (Barcelona: Serbal, 1994, pp. 53-82); Moïsseï Guinzbourg. Le Style et l'époque: Problèmes de l'architecture moderne (1924) (Bruxelas: Pierre Mardaga, 1982, pp. 112-8); Jacobus Johannes Pieter Oud. Sobre la arquitectura del futuro y sus posibilidades arquitectonicas (1926) (In: Mi trayectoria en "De Stijl". Murcia: Colegio Oficial de Aparejadores y Arquitectos Tecnicos/ Yerba, 1986, pp. 72-87).

[32] "Quando encetamos a nossa separação pessoal daquele acervo de arte que constitui para muita gente o 'Passado', e procuramos, pela primeira vez, fazer uma arquitetura que se enquadrasse nas contingências do tempo atual [...]". Cf.

Gregori Warchavchik. "Arquitetura do século XX. VI. As relações entre arte e cultura". Correio Paulistano, São Paulo, 21 out. 1928.

[33] Parafraseando Mário de Andrade, em seu comentário sobre a proposta de Flávio de Carvalho para o Palácio do Governo. Cf. Mário de Andrade.

"Arquitetura moderna". Diário Nacional, São Paulo, 3 fev. 1928, p. 2.


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