Cidades e intelectuais: os "nova-iorquinos" da Partisan Review e os "paulistas"
de Clima entre 1930 e 1950
Neste artigo pretendo explorar as intersecções entre espaço urbano,
instituições acadêmicas, organizações culturais e formas de sociabilidade, por
um lado, e suas inflexões na modelagem de distintas gerações de intelectuais,
por outro.1 Tendo por base os trabalhos de Mary Gluck (1985) sobre a geração de
Lukács em Budapeste, de Clarck (1986) sobre Paris e a pintura da "vida
moderna", de Schorske (1988) sobre o modernismo em Viena, de Raymond Williams
(1982) sobre o grupo Bloomsbury, de Thomas Bender (1993) sobre Nova York e seus
intelectuais e de Maria Arminda Arruda do Nascimento (2001) sobre a relação
entre sociedade e cultura em São Paulo, pretendo abordar, numa perspectiva
comparativa, as similitudes e as diferenças entre os intelectuais "paulistas"
da revista Clima (editada entre 1941 e 1944) e os "nova-iorquinos" nucleados
pela Partisan Review (lançada em 1937). Delineados os termos e o conteúdo
substantivo da comparação proposta, o artigo se fecha com uma tentativa, ainda
exploratória, de pensar esse círculo de intelectuais norte-americanos à luz do
modelo teórico construído por Elias para analisar as dimensões estruturais
recorrentes na figuração "estabelecidos-outsiders".
Os editores da Partisan Review (Philip Rahv, William Phillips, Dwight
Macdonald, Clement Greenberg, Mary McCarthy, mais tarde, Delmore Schwartz e
William Barrett) e seus colaboradores (Alfred Kazin, Lionel Trilling, Diana
Trilling, Irving Howe, Elizabeth Hardwick, Hannah Arendt, Nicolas Chiaramonte,
Sidney Hook, Edmund Wilson, Meyer Schapiro, entre outros) renovaram a discussão
sobre a relação entre modernismo nas artes e radicalismo na política. Anti-
stalinistas fervorosos, de início marxistas, alinhados ao campo político da
esquerda norte-americana, foram aos poucos migrando do seu pólo mais radical,
representado pelos trotskistas, para o campo dos liberais democratas e dos
conservadores.2 Herdeiros do legado modernista, familiarizados com o
cosmopolitismo no plano da cultura, atentos à produção intelectual e artística
local, eles marcaram a cena cultural nova-iorquina dos anos de 1930, 1940 e
1950 e contribuíram decisivamente para a valorização, em novas chaves, da
cultura norte-americana. Como intelectuais generalistas, pertenciam a uma
geração que tinha a literatura como centro de sua educação. Como críticos da
cultura, resenhistas e polemistas, fizeram do ensaio o meio por excelência de
expressão e encontraram nas revistas literárias e políticas o seu fórum
institucional de divulgação. Como integrantes de um círculo predominantemente
literário, não se restringiram aos seus campos de especialização,
diferenciando-se, assim, dos acadêmicos em sentido estrito. Oriundos, a maioria
deles, de famílias pobres de judeus imigrantes vindos da Europa Oriental para
os Estados Unidos - onde nasceram - fizeram nome na contra-mão da
experiência dos pais, graças ao desempenho brilhante que tiveram nas escolas
públicas e, posteriormente, nos centros de ensino superior de Nova York.
Desse encontro entre os filhos talentosos da segunda geração de imigrantes
judeus destituídos de capital social e econômico com alguns jovens norte-
americanos promissores, oriundos de famílias brancas, protestantes e abonadas,
em uma conjuntura fervente de radicalismo político, depressão econômica e em
meio a uma cidade em intensa transformação, como Nova York, constitui-se uma
das mais inquietantes e intrigantes gerações de intelectuais norte-americanos.3
Entre os judeus desse círculo, que atingiram a vida adulta no final dos anos de
1920 ou começo de 1930, encontram-se: Philip Rahv (1908-1973), William Phillips
(1907-), Clement Greenberg, (1909-1994), Lionel Trilling (1905-1975), Diane
Trilling (1905-), Meyer Schapiro (1905-1996) Sidney Hook (1902-1989). Incluem-
se também os nascidos na década de 1910, que atingiram a maturidade no final
dos anos de 1930, como Lionel Abel (1910-), Alfred Kazin (1915-), Delmore
Schwartz (1913-1966), Daniel Bell (1919-), e outros mais jovens, nascidos no
decênio de 1920, como Irving Howe (1920-1993) e Nathan Glazer, entre outros. A
eles juntaram-se os não judeus, Frederick Dupee (1904-1979), Wiliam Barrett
(1913-), Dwight Macdonald (1906-), Mary McCarthy (1912-1989) - na condição
de editores da Partisan Review - e colaboradores como Edmund Wilson (1895-
1972), Elizabeth Hardwick (1916-), entre outros. Com exceção de Barrett, os
demais provinham de famílias norte-americanas prósperas e protestantes. Por
fim, cabe mencionar os europeus refugiados que chegaram nos Estados Unidos no
início da Segunda Guerra Mundial e se integraram ao círculo: Nicolas
Chiaramonte e Hannah Arendt (1906-1975) - da mesma etnia da maioria deles,
com a diferença que seus pais eram judeus alemães, educados e de classe média
alta.
* * * *
Até os anos de 1920, os intelectuais e escritores norte-americanos tinham a
Europa como rota obrigatória e referência fundamental, sentindo-se muitas vezes
como uns "desterrados na própria terra" (para usar uma célebre expressão de
Sérgio Buarque de Holanda que se aplica tanto à intelectualidade brasileira
como à norte-americana na época). Mas a partir dos anos de 1930, com a
Depressão, e de 1940, com a entrada dos Estados Unidos na Guerra e sua
progressiva hegemonia econômica e política, somadas à consolidação da sua
cultura acadêmica e de suas instituições culturais, observa-se uma reorientação
da intelectualidade local com as suas congêneres européias. Paris deixara de
ser a capital cultural do mundo. Nova York, com seus novos movimentos
artísticos, sobretudo com o abstracionismo, seus críticos de arte, seus museus
e poderosos mecenas, converte-se no novo pólo de atração mundial. Contribuíram
para isso não só as instituições locais, respaldadas por suas elites
dirigentes, como os novos círculos de intelectuais, entre eles os intelectuais
nova-iorquinos ligados a Partisan Review.
Parecidos e distintos dos "paulistas" de Clima, eles oferecem um bom
contraponto para uma sociologia da vida intelectual. Sobretudo, se ao lado da
recuperação das especificidades das histórias culturais e intelectuais das
cidades de Nova York e São Paulo, formos capazes de avançar na investigação de
um conjunto de problemas sociológicos pertinentes para o adensamento da
perspectiva comparativa. Entre eles: a relação entre origem social (e etnia, no
caso norte-americano), transformações na estrutura social e no campo cultural
das respectivas cidades e suas implicações nas trajetórias dos integrantes mais
expressivos desses grupos; o lugar do ensaio na modelagem da identidade
intelectual desses grupos; as relações (e tensões) desses intelectuais com a
cultura acadêmica e política da época; o impacto e a influência que receberam
dos intelectuais e artistas europeus, direta ou indiretamente, seja em razão da
importância que os últimos tiveram na montagem de instituições universitárias
(como a Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo e a New School for
Social Research de Nova York), seja pelo impacto da sua presença na cena
cultural e intelectual das respectivas cidades, onde se refugiaram antes ou
durante a Segunda Guerra em decorrência de perseguições políticas e étnicas.
Além dessas dimensões, outra que parece importante para a análise desses
círculos de intelectuais, de suas experiências sociais e do tipo de
sociabilidade praticada por eles diz respeito às inflexões de gênero na
conformação desses grupos.
Começo então pela última questão, relativa à posição das mulheres na divisão do
trabalho e no universo de sociabilidade desses círculos de intelectuais. Mas no
lugar de construir, de saída um argumento analítico, vou fazer aquilo que todo
antropólogo, por ofício ou vocação, pratica no dia-a-dia do seu métier: contar
casos, com a atenção voltada para as dimensões menos óbvias da interação
social, como meio de apreender a dinâmica vívida e tumultuada da vida social.
Sociabilidade, posição das mulheres e divisão do trabalho intelectual
Nova York, final de 1930. Num domingo de manhã, quatro jovens e uma jovem
dirigem-se a um encontro que será decisivo na vida de todos eles. William
Philips, Philip Rahv, Dwight Macdonald, Fred Dupee e Mary McCarthy preparam-se
para almoçar com um dos mais renomados críticos literários da época, Edmund
Wilson, de quem esperam o apoio necessário para a consolidação da revista que
estavam lançando. Queriam dele a chancela do nome próprio, este bem simbólico
dos mais prezados nos campos de produção cultural e intelectual, como mostrou
Bourdieu (1984), capaz de produzir por si só uma curiosa "contaminação de
prestígio" para todos e tudo que gravitam ao seu redor. "Glória de empréstimo",
diria outro arguto analista da vida em sociedade, no caso o nosso escritor
Machado de Assis.
Os jovens de Nova York sabiam disso por conhecimento direto da cena intelectual
da época e, indiretamente, pela experiência social que conformou a trajetória
de todos. Dois deles eram judeus e os demais vinham de famílias de classe média
alta, unidos pelo projeto comum de editar uma revista de cultura, a Partisan
Review, engajada num dos poucos e precisos momentos de radicalismo político que
tomou conta da parcela mais atuante e significativa da intelectualidade nova-
iorquina da época. Adeptos do marxismo, críticos ferrenhos do stalinismo,
gravitando num caldo de cultura que unia o cosmopolitismo no plano da cultura
ao radicalismo na política, eram próximos do trotskismo e admiradores
entusiastas de Trotski. Em disputa aberta com os comunistas e com o Partido,
eles precisavam do aval de nomes de peso, como o de Edmund Wilson, para
galgarem posições mais sólidas e garantir uma visibilidade maior para a revista
que estavam em vias de lançar.
Todos estavam ansiosos para o encontro, preocupados em causar uma boa impressão
no convidado, mas apenas um se vestiu de um modo ligeiramente inadequado para a
ocasião. No caso, Mary McCarthy que, no lugar de adotar o estilo "nervosamente
displicente" dos rapazes, sobre-investiu na escolha da roupa e apareceu linda,
com um vestido preto de seda, mais apropriado para uma recepção de casamento do
que para um encontro de negócios promovido no escritório de uma revista
radical. De lá partiram todos para um restaurante na Union Square.
Eles estavam na faixa dos vinte anos e Edmund Wilson na meia-idade. A única
mulher do grupo naquela ocasião, Mary não foi particularmente notada por Wilson
que conversou especialmente com Dwight Macdonald e com Fred Dupee. Com exceção
de Dwight - o mais "bem nascido" do grupo -, todos os demais estavam
nervosos, sentiam-se com a língua presa e aguardavam com ansiedade o garçom
para pedirem os drinques. Menos Edmund Wilson que com um gesto irritado
declinou a oferta. Eles entenderam rápido o recado e fizeram o mesmo, de modo
que o almoço, a seco, rolou menos solto do que desejavam e centrou-se em torno
das proposições programáticas da Partisan Review, do anti-stalinismo convicto
de seus editores e dos números que eles estavam preparando para dar seqüência
ao lançamento, em 1937, da revista. Wilson concordou que eles deveriam tentar
conseguir de Trotski uma contribuição assinada.4 Em seguida falaram do livro
que Edmundo Wilson estava escrevendo sobre o marxismo em conexão com a
Revolução Russa. O livro, Rumo à estação Finlândia, só seria lançado em 1940.
Mas bem antes disso, Wilson colaboraria com a revista e causaria uma revolução
na vida de alguns de seus editores.
Não neste almoço, que correu dentro do esperado. Mas no encontro seguinte que
ele teria com Mary McCarthy, a crítica de teatro regular da revista, que aos 25
anos, divorciada do seu primeiro marido, o ator Jonhsrud, estava vivendo com
Philip Rahv, o único imigrante do grupo, que chegara aos Estados Unidos em
1922, sozinho, com 14 anos, para morar com um irmão mais velho em Oregan,
enquanto o resto de sua família permanecia na Palestina, depois de uma passagem
pela Áustria, motivada pelo pogrom de que fora vítima em 1917. Autodidata, não
completou o segundo grau e fez toda a sua formação como leitor obstinado nas
bibliotecas públicas norte-americanas. Em 1932, mudou-se para Nova York, entrou
em contato com os comunistas, ingressou no Partido e dois anos depois, junto
com o amigo William Phillips, lançou o embrião da Partisan Review, patrocinada
pelo John Reed Club. O empreendimento ocorreu em meio aos processos de Moscou
movidos por Stálin. Estes, somados à visão dos comunistas norte-americanos
sobre o lugar da cultura e de sua função atrelada a objetivos políticos,
motivaram a ruptura de Phillips e Rahv com o Partido. O nome da revista, porém,
ficou como propriedade intelectual deles e foi reutilizado no lançamento da
nova Partisan Review em 1937.
O mais politizado do grupo, Rahv parecia, naquela ocasião, particularmente
incomodado com o convite que Mary recebera, da parte de Edmund Wilson, para um
segundo encontro que o excluía juntamente com os demais rapazes da revista.
Eles, ao mesmo tempo em que insistiam para que ela fosse, estavam temerosos do
seu desempenho, pois não achavam que Mary fosse muito bem informada no plano
político. Por isso não escondiam o medo de que a inexperiência política dela
pudesse fazer com que a revista parecesse ingênua aos olhos do crítico
experiente. Ela que tinha uma história de vida singular - órfã de pai e
mãe, falecidos praticamente no mesmo dia em decorrência da gripe espanhola de
1918, educada até os 12 anos por um casal aterrorizante de tios-avós
ressentidos e a partir daí pelo avô materno, advogado renomado, protestante,
casado com uma judia excêntrica - não entendia, por exemplo, as razões
substantivas que levaram os revolucionários russos a assassinarem o Tsar e sua
família. Não porque fosse desinformada e sim porque sua formação fora feita em
colégios católicos e completada no famoso college de Vassar, onde estudavam as
moças talentosas de elite da época, como a própria Mary e a poetisa Elizabeth
Bishop, por exemplo.
Se a mudança para Nova York, em 1936, alterara radicalmente o destino de Mary,
em 1938, quando do seu segundo encontro com Wilson, ela que já estava um passo
a frente das moças da sua época em termos da vida amorosa e, em certo sentido,
profissional ainda estava um passo atrás, segundo a avaliação dos rapazes da
revista, do clima de radicalismo político da época. Por isso resolveram
"treiná-la" para o encontro. Entre as medidas adotadas, além das conversas
sobre temas mais políticos, três martines secos, consumidos um pouco antes do
encontro. De modo que Mary já chegou calibrada para um jantar que todos, ela
inclusive, supunham que deveria transcorrer no padrão do almoço anterior:
conversas variadas sobre cultura e política, conduzidas com fluência e a seco
por Edmund Wilson.
O que "rolou", porém, estava bem longe do script imaginado. Para surpresa de
Mary, Wilson bebia, e bem, e só não fez isso no primeiro encontro porque
naquele dia ele acordara de ressaca. Sem coragem de recusar os drinques
oferecidos por ele e menos ainda de mencionar os martines consumidos antes, ela
bebeu mais que o habitual. Resultado: Mary se empolgou, roubou a cena, soltou a
língua e, encontrando em Wilson um ouvinte atento, fez da sua vida o tema da
noite. Depois apagou. Quando voltou a si, no dia seguinte, estava deitada na
cama, num quarto desconhecido. Sua primeira medida foi certificar-se se estava
sozinha ou acompanhada. Nem uma nem outra no sentido que a atemorizara.
Margareth, a outra convidada do jantar da véspera, estava dormindo na cama ao
lado e Wilson, que apenas depositara as duas no hotel e incumbira a amiga de
passar a noite com a Mary, encontrava-se em casa.5
No terceiro encontro, Mary e Wilson acabariam a noite juntos, na cama do
escritório da casa dele. De lá para frente, a história seguiria o curso
previsível dos relacionamentos triangulares. Dividida e dilacerada, Mary não
sabia se rompia com Philip Rahv ou com Wilson. Acabou casada com Wilson, 17
anos mais velho que ela, seu segundo marido oficial e pai de seu único filho.
Com o casamento, Mary se afastaria da Partisan Review e se reorientaria para a
ficção. Em grande parte graças à influência e aos métodos pouco usuais de
Wilson que, acreditando no talento da mulher como escritora e duvidando da
qualidade da crítica teatral de Mary, costumava trancá-la, às tardes, no
escritório, para que ela se disciplinasse na prática da escrita cotidiana.
Esta história resumida de uma vida atribulada, fascinante e instigante como foi
a de Mary McCarthy - memorialista de mão cheia, conhecida não só por seus
talentos literários mas pela sua inteligência cortante e língua ferina6 -
oferece um contraponto interessante para introduzirmos o outro termo da
comparação proposta: o Grupo Clima, seu universo de sociabilidade, o lugar e a
posição das mulheres.
O Grupo Clima
Formado no início de 1939, em São Paulo, por jovens estudantes da Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras (nascidos entre 1916 e 1920), unidos por fortes
laços de amizade e por uma intensa sociabilidade, o Grupo Clima era integrado
por Décio de Almeida Prado, Paulo Emílio Salles Gomes, Lourival Gomes Machado,
Ruy Galvão de Andrada Coelho, Gilda de Mello e Souza, entre outros. Juntos
lançaram-se na cena cultural paulista por meio de uma modalidade específica de
trabalho intelectual: a crítica aplicada a teatro, cinema, literatura e artes
plásticas.
Décio e Paulo Emílio, amigos desde os tempos de colégio, eram filhos de médicos
com destacada projeção nos círculos da elite paulista da época. O mesmo
aplicava-se ao pai de Antonio Candido, médico conceituado, com vasta clientela
no interior de Minas. Como o pai de Décio, ele também se formara na Faculdade
de Medicina do Rio de Janeiro e interessava-se tanto pela medicina como pela
literatura. Rui Coelho, filho de um advogado de renome, e o mais novo do grupo,
publicou seu primeiro trabalho - um longo ensaio sobre Proust - aos 21
anos, na revista Clima, que projetaria todos na cena cultural paulista, Gilda
inclusive - a prima de segundo grau do "papa" do modernismo brasileiro,
Mário de Andrade, e futura mulher de Antonio Candido.
As afinidades que os uniram, decorrentes de suas origens sociais semelhantes,
da vivência parecida que tiveram na infância e adolescência, do tipo de
formação cultural que receberam de suas famílias e das escolas que
freqüentaram, foram reforçadas e sedimentadas ao longo do período em que
cursaram a Faculdade de Filosofia. Para muitos deles, essa instituição
representou bem mais do que um espaço de profissionalização. Foi, antes de
tudo, o centro irradiador que conformou o universo de sociabilidade do grupo.
Ali construíram as relações pessoais, intelectuais, afetivas e, em alguns
casos, amorosas, que marcariam para sempre suas vidas. Tais foram, por exemplo,
os casos de Décio e Ruth de Almeida Prado e de Antonio Candido e Gilda de Mello
e Souza.
A única mulher do grupo que conquistou um "nome próprio", em razão de sua
trajetória acadêmica e dos trabalhos que produziu nas áreas de sociologia e
estética, o caso de Gilda de Mello e Souza é particularmente interessante para
pensarmos a assimetria das relações de gênero no interior desse círculo e, ao
mesmo tempo, para avançarmos na comparação proposta entre os intelectuais
"paulistas" do grupo Clima e os intelectuais nova-iorquinos da Partisan Review.
Enquanto no final dos anos de 1930, em Nova York, as mulheres do grupo já
podiam praticar uma sociabilidade arrojada, como vimos rapidamente a partir do
caso da escritora Mary McCarthy, em São Paulo, as moças e os rapazes de Clima
eram bem mais comportados. Relembrando esse período, Gilda afirma que
[...] saíamos muito juntos. A partir de certo momento, creio que só
conseguíamos nos divertir se estivéssemos juntos. Em geral nos
encontrávamos no fim da tarde, nas aulas de Maugüé. Era já noitinha
quando saíamos dos cursos para a réplica ligeiramente européia da
Praça da República de então. Os plátanos, a algazarra dos pardais, o
vento frio, o eco francês da voz de Maugüé - que carregando a sua
serviette, ia à nossa frente, discutindo a aula com algum aluno -
tudo isso nos envolvia numa doce miragem civilizada. Se não tínhamos
nenhuma tarefa escolar urgente, seguíamos dali para o nosso quartel-
general, a Confeitaria Vienense, na Barão de Itapetininga. Era ali
que entre um croissant e um ice chocolate alemão (pois ninguém bebia
no nosso grupo) combinávamos uma esticada ao cinema, quase sempre um
filme francês [...] (Mello e Souza, 1984, p. 135).
Esse aspecto bem comportado da sociabilidade do grupo contrasta com a dos
intelectuais nova-iorquinos. Menos atirados que eles, os integrantes de Clima
eram antes de tudo universitários recatados. Assim, se em termos da
sociabilidade mundana, os nova-iorquinos estariam mais próximos dos nossos
modernistas, do ponto de vista do perfil intelectual do grupo, deles se afastam
em aspectos decisivos. Críticos de cultura em sua maioria, com exceção de
alguns poucos escritores,7 eles se parecem, intelectualmente, mais com os
membros de Clima do que com os modernistas.
Essa dimensão é central tanto para a comparação que estou propondo entre eles,
como para discutirmos a posição que as mulheres tinham no interior desses
círculos. Nesse sentido, se a história narrada anteriormente com a intenção de
delinear a sociabilidade do grupo - as peripécias amorosas de Mary McCarthy
e a posição que ela ocupou na divisão do trabalho intelectual da então recém-
lançada Partisan - nos lembra (e muito) as vivências também atribuladas e
fascinantes das nossas modernistas Tarsila do Amaral, Anita Malfatti e Patrícia
Galvão, dela se distingue em vários aspectos. A começar pela formação
universitária em literatura que Mary recebeu em Vassar, o que a habilitou a
estrear na cena cultural nova-iorquina como crítica de teatro - e só um
pouco mais tarde como escritora, voltada também para a crítica de cultura.
Tarsila do Amaral (1886-1973) e Anita Malfatti (1889-1964) eram pintoras e não
críticas.8 E se Patrícia Galvão (1910-1962) - mais conhecida como Pagu
- fez as duas coisas como Mary, isto é, escreveu ficção e crítica de
teatro, isso se deu numa conjuntura distinta da sua aparição no modernismo,
quando era ainda uma colegial, transformada "em boneca"9 pelo casal Tarsila e
Oswald de Andrade. Antes, é claro, do romance avassalador que teve com Oswald e
do nascimento, em 1930, do filho de ambos, Rudá de Andrade, e da entrada deles
no Partido Comunista em 1931. A primeira de uma série de acontecimentos
políticos que marcariam a vida de Pagu no decênio de 1930: das viagens à volta
ao mundo (quando estréia como repórter), aos longos meses que morou em Paris
(sem o marido e o filho), onde fora presa em julho de 1935, como militante
comunista estrangeira. Repatriada, voltaria ao Brasil e, por duas vezes, em
1935 e 1938, seria presa novamente. Libertada em julho de 1940, depauperada e
magérrima, Pagu iniciou um romance com Geraldo Ferraz, com quem viveria até o
fim da sua vida. De modo que foi só nos anos de 1940 que ela retomou a vida
intelectual, ligando-se ao periódico socialista Vanguarda Literária, em 1945, e
iniciando, no ano seguinte, a sua colaboração regular no Suplemento literário
do Diário de São Paulo. Sua estréia como crítica de teatro, porém, só ocorreria
em 1957, quando ela e Ferraz já estavam residindo em Santos.
Se me estendi no caso de Pagu foi para mostrar que tanto ela como as nossas
modernistas pintoras são e não são comparáveis à escritora norte-americana Mary
McCarthy. São, se usarmos como critério as vidas amorosas atribuladas ou
tumultuadas que tiveram e o fato de terem sido mulheres que desafiaram os
padrões dominantes de moralidade e de gênero na época. Não são, se mantivermos
o foco no perfil dos círculos intelectuais e artísticos a que pertenceram.
Nesta dimensão, a comparação de Mary com Gilda de Mello e Souza mostra-se
pertinente, pois tanto uma como outra, além de serem produtos da vida
universitária em sua interface com o sistema cultural mais amplo das cidades em
que construíram suas vidas profissionais, fizeram parte de círculos com um
perfil intelectual parecido. No caso de Gilda e de outras mulheres da sua
geração que integraram o Grupo Clima, o acesso à formação intelectual que
tiveram na Faculdade de Filosofia, somado à vivência inédita de uma
sociabilidade fortemente ancorada na vida universitária, permitiu a várias
delas reorientar o papel social para o qual haviam sido educadas: mães e donas
de casa. O impacto dessa experiência renovadora propiciada pela Faculdade foi
enorme, sobretudo para aquelas que efetivamente tentaram inventar para si um
novo destino, como foi o caso de Gilda. Mas isso se deu às custas de conflitos,
inseguranças e dilemas muito específicos. Sobretudo no início, quando não se
sentiam socialmente seguras para se inserirem no campo intelectual
predominantemente masculino da época. As dificuldades preliminares que
enfrentaram, transmutadas sob a forma de inseguranças pessoais, foram sendo
contornadas, mas não eliminadas, à medida que construíam novos modelos de
conduta e atuação.
No período em que a revista Clima foi produzida, estava em curso a montagem de
um novo sistema de produção intelectual, e iniciavam-se as transformações dos
papéis femininos que Gilda de Mello e Souza e outras mulheres de sua geração
iriam viver, com as ambigüidades e dilemas mencionados acima. Nesse contexto de
dupla redefinição, Gilda, que estreara em Clima com um conto, seguindo o
conselho de Mário de Andrade de que seria bom para a revista ter alguém
dedicado exclusivamente à ficção, abandonou o papel que lhe fora reservado e
parou de escrever ficção. Seu gesto, reforçado ao que tudo indica pela ausência
de críticas claramente favoráveis à sua produção como contista, teve um sentido
preciso: recusar a posição e o papel que os companheiros da revista lhe
atribuíram. Insurgir-se contra as duas modalidades socialmente mais adequadas
de expressão intelectual para as mulheres na época, a ficção e a poesia, foi
talvez o seu "primeiro ato de liberdade",10 ainda que arrevesado.
Enquanto Gilda largava a ficção para se lançar no campo universitário e na área
da sociologia estética, Mary McCarthy deixava a crítica de teatro para se
notabilizar como escritora. Diferenças de estilo, de personalidade, de
parcerias amorosas e do campo intelectual em que ambas estavam inseridas. Mas
ao lado dessas diferenças, inegáveis, é preciso sublinhar também as
semelhanças, pois tanto uma como outra são impensáveis sem a presença das
instituições de ensino superior, das transformações que estavam ocorrendo na
estrutura social das cidades de São Paulo e Nova York no período, das novas
modalidades de recrutamento social dos intelectuais e de expressão simbólica
das dimensões de gênero.
Os intelectuais de Nova York vistos de longe e de forma comparativa
As relações que uniam esses intelectuais de Nova York eram, a um só tempo,
morais, pessoais, políticas, e, em alguns casos, conjugais. Eles não apenas
"envelheceram juntos" como aparecem, com muita freqüência, sob a forma de
personagens nas memórias que escreveram. Retratos de época, de pessoas, de um
universo intelectual e cultural específico, no interior do qual ganharam nome e
autoridade - por si mesmos e como parte inseparável dos círculos a que
pertenciam -, essas memórias são uma fonte preciosa para entendermos o tipo
de sociabilidade que praticavam, as fofocas que circulavam na época, os amores,
casamentos e separações, os conflitos, as inimizades, as alianças que
fizeram.11
A profusão de conflitos entre eles12 contrasta com a ausência de atritos
manifestos entre os integrantes mais expressivos do Grupo Clima, cujas relações
foram marcadas pela convivência íntima e pela ausência de competição explícita.
Isso se explica menos pela personalidade dos membros desses grupos e mais pelo
tipo distinto de sistema cultural em que estavam inseridos.
No caso paulista e no início dos anos de 1940, segundo o então estreante de 22
anos, Antonio Candido, todos tinham "em preparo um trabalho de história, ou de
sociologia, ou de estética ou de filosofia, como os maiores (da geração
anterior) tinham romances" (Candido, 1945, p. 34). Com exceção de Gilda de
Mello e Souza, que publicou primeiro ficção, todos os outros começaram com um
artigo de crítica e não se aventuraram na poesia como os maiores da geração
anterior. Nas palavras de Antonio Candido, emitidas no auge de sua juventude,
todos eram "críticos e estudiosos 'puros', no sentido de que, neles, dominará
sempre esse tipo de atividade" (Idem, ibidem).
Como produtos do novo sistema de produção intelectual implantado na Faculdade
de Filosofia da Universidade de São Paulo, por intermédio dos professores
estrangeiros (franceses, em particular), Antonio Candido e seus amigos mais
próximos do Grupo Clima renovaram a tradição ensaística brasileira. Situados
entre os literatos, os modernistas, os jornalistas polígrafos e os cientistas
sociais, construíram seu espaço de atuação por meio da crítica, exercida em
moldes ensaísticos mas pautada por preocupações e critérios acadêmicos de
avaliação. O fato de atuarem ao mesmo tempo como críticos de cultura,
acadêmicos e professores universitários sinaliza o alcance das transformações
que estavam ocorrendo ao longo das décadas de 1940 e 1950 no sistema cultural
paulista, decorrentes em larga medida da introdução de novas maneiras de
conceber e praticar o trabalho intelectual. Nesse contexto, fizeram a "ponte"
entre a Faculdade de Filosofia e as instâncias mais amplas de produção e
difusão cultural da cidade.
Escrevendo sobre modalidades variadas da crítica de cultura, deram visibilidade
à nova mentalidade universitária que estava sendo definida pela Universidade de
São Paulo. Mas no lugar de fazerem uma crítica apoiada apenas na discussão de
posições teóricas, centraram-se principalmente na análise interna da produção
cultural veiculada no período. Além disso, cada um dos editores mais
expressivos da revista Clima especializou-se numa área da cultura, que, embora
fronteiriça, como a crítica literária, de cinema, de teatro, de artes
plásticas, permitia aplainar os eventuais conflitos entre eles.
Em Nova York, por contraste, além da produção cultural e acadêmica ser bem mais
segmentada e especializada na época, pesava ainda o fato de a maioria dos
integrantes da Partisan estar voltada para a crítica literária como domínio
principal de suas atividades intelectuais (descontados os casos dos críticos de
arte, Clement Greenberg, Meyer Schapiro e Rosenberg).
Se ambos os grupos tinham em comum a crítica de cultura e o ensaio como modo
privilegiado de expressão, o mesmo não se pode dizer a respeito da origem
social de seus integrantes. Enquanto os membros de Clima pertenciam ao setor da
burguesia formado por profissionais liberais, altos funcionários, fazendeiros e
industriais médios; os intelectuais de Nova York - com exceção de uns
poucos "bem nascidos", oriundos de prósperas famílias protestantes - eram
provenientes sobretudo da segunda geração de famílias pobres de judeus
imigrantes. Tanto num caso como no outro, essas injunções lhes davam "um ar de
família, um viés definido de enxergar o real" (Mello e Souza, 1984, p. 135)
- nas palavras precisas de Gilda de Mello e Souza, que, utilizadas para
explicar as razões que propiciaram e alimentaram o convívio intenso de seu
grupo de juventude, aplicam-se também aos intelectuais nova-iorquinos.
Se o "viés definido de enxergar o real" apresenta conteúdos distintos em função
das experiências sociais diversas desses intelectuais, é preciso ressaltar a
existência de um solo estrutural e institucional semelhante que torna possível
e justifica a comparação proposta neste artigo. Em primeiro lugar, cabe
sublinhar que eles deram prosseguimento, em novas chaves, ao trabalho de
consolidação da cultura moderna, cujo impulso inicial fora emitido pelos
modernistas que os precederam. Tendo a França como modelo e, em vários casos,
como lugar de moradia temporária, esses "repatriados começaram a se empenhar em
produzir em casa o similar nacional" (Costa, 2001, p. 27).13 Repatriados
simbólicos, no caso dos modernistas; reais, no caso de muitos dos intelectuais
de Nova York ligados a Partisan Review, em razão da imigração forçada dos pais,
por razões econômicas e perseguições religiosas, vítimas em sua maioria dos
pogroms que tiveram lugar na Europa na segunda metade do século XIX.
Instalados em solo norte-americano, vivendo nos bairros "étnicos" de Nova York,
sobretudo no Bronx, onde se concentravam judeus e italianos, antes de sua
ocupação pelos negros, esses filhos de imigrantes, nascidos norte-americanos,
trilharam o caminho típico reservado à segunda geração. Primeiro freqüentaram a
escola pública, aprenderam bem o inglês, destacaram-se como alunos brilhantes e
encontraram as condições institucionais e culturais necessárias para se
tornarem universitários e realizaram o "destino" esperado pelos pais, que
depositaram neles todas as esperanças de um futuro melhor e o sonho norte-
americano de ascensão social. Mas isso se deu às custas de uma vivência
dilacerada, permeada por toda sorte de sentimentos ambivalentes, vividos no
registro individual da culpa, do tumulto interno e da vergonha em relação aos
progenitores e familiares em geral. Pobres, imigrantes, religiosos, os pais
falavam inglês com sotaque e apenas na esfera pública formal, em casa e na
vizinhança usavam o iídiche, freqüentavam a sinagoga, trabalhavam duro,
divertiam-se pouco. Restritos, de início, à sociabilidade familiar e da
vizinhança, pais e filhos, se já não viviam mais confinados em guetos, sentiam
que Manhattan era mais longe que a Europa. A proximidade geográfica era
atravessada por uma colossal distância social que, quando suplantada pelos
filhos, implicou uma viagem sem volta marcada à sinagoga, na suspensão dos
preceitos familiares e religiosos dos pais e na adesão a um outro universo de
valores: cosmopolita, no plano da cultura, radical, no âmbito da política,
agnóstico, avesso, num primeiro momento, às questões religiosas em sua
interface com os problemas étnicos.
Atingindo o início da idade adulta num contexto marcado pela grave crise
econômica de 1929, eles viveram esse período como um momento paradoxal de
liberdade. Nas palavras de um dos editores da Partisan Review, William Barrett,
aquilo que Sartre disse a respeito da situação da intelectualidade francesa
durante a ocupação alemã ("nunca fomos tão livres" quanto naquele momento)
aplica-se com perfeição para descrever a experiência de uma parcela dos
artistas e intelectuais (ou candidatos a) nova-iorquinos no período da
Depressão. Sem trabalho fixo e sem as obrigações próprias da carreira e da vida
profissional, eles puseram a inteligência e a curiosidade a serviço da
ampliação dos interesses culturais.
Se a Depressão implicou a suspensão temporária do sonho acalentado pelos pais
de ascensão social dos filhos, ela permitiu também que eles se reencontrassem
no terreno mais arriscado da política. Como muitos dos imigrantes operários, os
pais traziam da Europa a cultura socialista. E foi nesse contexto preciso e,
sob muitos aspectos, singular na história norte-americana - no interior do
qual a classe operária, os imigrantes e a "plebe" ganharam visibilidade na cena
política e na literatura da época - que os filhos desses imigrantes, já
antenados com o cosmopolitismo no plano da cultura, por conta de sua
socialização na cultura acadêmica da época, aderiram ao marxismo e se
enfronharam nas polêmicas travadas entre comunistas e trotskistas. Nas palavras
de outro integrante do círculo da Partisan Review, Irving Howe:
[...] o radicalismo dos anos 30 deu aos intelectuais de Nova York o
seu estilo distintivo: o faro pela polêmica, o gosto pela grande
generalização, uma impaciência com aquilo que eles enxergavam (muitas
vezes paroquialmente) como erudição paroquial, uma perspectiva
internacionalista, uma crença tácita na unidade - ainda que ela
estivesse fora do nosso alcance - do trabalho intelectual (Howe,
1990, p. 244).14
A adesão ao marxismo, o afastamento das proposições políticas e culturais do
Partido Comunista, o acirramento da convicção anti-stalisnista (sinalizada com
bastante clareza pelo lançamento em 1937 da Partisan Review), a defesa da
perspectiva internacionalista, tudo isso correu junto e em meio às
transformações da paisagem social e cultural da cidade de Nova York. No âmbito
da produção acadêmica, áreas de saber que até então tinham sido monopólio das
elites brancas e protestantes, como a filosofia e a literatura inglesa,
começaram a ser "invadidas" pelos estudantes judeus mais talentosos, que,
minoritários na Universidade de Colúmbia (a instituição universitária de maior
prestígio da cidade na época), encontraram na Universidade de Nova York (UNY)
e, especialmente no City College, o espaço intelectual necessário para darem
prosseguimento aos estudos superiores e à militância política de esquerda.15
Havia um clima de urgência no ar e uma sensação de que, malgrado a crise
econômica e o medo orquestrado da "ameaça vermelha" representada pela Revolução
Russa e perpetrado pela direita, os Estados Unidos poderiam converter-se numa
democracia de tipo socialista. Esse tipo de utopia política, acalentado por
parcelas minoritárias da cidade mais avançada dos Estados Unidos, palco das
vanguardas culturais e artísticas da época, não tardaria a emitir sinais de
falência múltipla.
Primeiro, como resultado da entrada dos Estados Unidos na Segunda Guerra
Mundial e de sua progressiva hegemonia no plano político e econômico. Segundo,
pelas implicações da Guerra Fria, do marcartismo e do anti-comunismo
desenfreado que tomou conta das elites políticas norte-americanas, não só das
mais alinhadas à direita como de um parcela dos liberais da época. Terceiro,
pelo progressivo conservadorismo de muitos dos intelectuais de Nova York, que,
marxistas e radicais nos anos de 1930, anti-stalinistas fervorosos nos anos de
1940, defensores do liberalismo e da democracia, inventaram uma ginástica
classificatória das mais extravagantes para, na década de 1950, afirmarem-se
como "anti-anti-comunistas", parcialmente afinados com os ideários do
socialismo democrático, em luta aberta contra todo tipo de totalitarismo.16 Por
fim, pelo peso que a questão judaica, ausente na perspectiva internacionalista
partilhada por eles no decênio de 1930, passou a ter na agenda intelectual dos
debates e escritos produzidos no pós-Guerra. A revelação dos campos de
concentração, do Holocausto e das atrocidades cometidas durante a Guerra pelos
alemães, a ampliação das bases econômicas e sociais da comunidade judaica em
Nova York e da influência de seus membros mais expressivos nos círculos
culturais de maior prestígio da cidade, o arrefecimento do radicalismo e da
visada internacionalista, tudo isso, somado, contribuiu para que os
intelectuais nova-iorquinos fizessem uma releitura de suas experiências
passadas, sobretudo daquelas relativas à vida em família, e dessem início à
problematização de um tema que até então estivera ausente de suas preocupações
cosmopolitas: a identidade judaica.
Outsiders, em sua maioria, nos anos de 1930, sob todos os aspectos (origem
social, capital cultural e econômico, procedência étnica, filiações
doutrinária), os intelectuais de Nova York, sobretudo aqueles ligados às
revistas Partisan Review e Commentary, foram paulatinamente migrando não só de
posição política como de status intelectual e social. Por volta do final da
Segunda Guerra, no momento em que recebiam sinais inequívocos da influência
intelectual que exerciam na cidade, eclodiram as primeiras crises internas do
grupo. Na visão de Irwing Howe, que pode ser tomada como expressão condensada
da auto-representação desses intelectuais,
[...] talvez houvesse uma relação entre crise interna e influência
externa. Tudo aquilo que os mantinha atuantes - a idéia do
socialismo, a defesa do modernismo literário, o ataque à cultura de
massa, um jeito especial de criticismo literário - foi julgado
como irrelevante nos anos do pós-guerra. Mas como grupo, no momento
exato em que a desintegração interna começara seriamente, os
intelectuais de Nova York podiam ser prontamente identificados. Os
líderes do grupo eram Rahv, Phillips, Trilling, Rosenberg e Kazin. O
principal teórico político era Hook. Os escritores e poetas ligados
ao meio de Nova York eram Delmore Schwartz, Saul Bellow, Paul Goodman
e Isaac Rosenfeld. E scholar o mais reconhecido, assim como a força
moral inspiradora, era Meyer Schapiro (Howe, 1990, pp. 251-252).
Dessa lista, os grandes ausentes são os não-judeus, como Dwight Macdonald e
William Barrett, por exemplo, e as mulheres, como Mary McCarthy, Elizabeth
Hardwick, Diana Trilling e Hannah Arendt, reconhecidamente a intelectual mais
influente e vigorosa desse círculo, rapidamente incorporada por ele logo após a
sua chegada em Nova York em 1941. Seu livro As origens do totalitarismo,
escrito no final dos anos de 1940 e publicado em 1951, foi um acontecimento e
teve uma recepção estrondosa entre eles.
Nesse mesmo período, no Brasil, os integrantes do Grupo Clima, afinados com os
ideários da esquerda, também partilhavam a crítica ao totalitarismo,
contrapunham-se ao Partido Comunista, criticavam o stalinismo e defendiam um
socialismo de tipo democrático. Mas, diferentemente dos intelectuais nova-
iorquinos, que, após a entrada dos Estados Unidos na Guerra e, sobretudo, no
pós-Guerra, foram deixando o pólo mais à esquerda do espectro político, os
intelectuais de Clima, que, de início, eram mais interessados na agenda
cultural do que no debate político (com exceção de Paulo Emílio), passaram a
ter uma atuação mais engajada. Primeiro, por meio dos dois manifestos que
publicaram na revista Clima (em 1942 e 1943), onde lançaram, segundo Antonio
Candido, as bases para a construção de uma ação socialista, "sem sectarismo mas
sem transigência", fundada na "fidelidade à Revolução Russa" e no "marxismo
como base", mas aberta "às correntes filosóficas e políticas do século" com o
propósito imediato de "lutar contra o Estado Novo e o fascismo" (Candido, 1986,
p. 61). Em seguida, pelo fato de se manterem como defensores intransigentes da
liberdade de expressão e dos valores democráticos, nos dois contextos de maior
repressão política no país, o Estado Novo e a Ditadura Militar.
Para além das diferenças políticas e das origens sociais diversas desses dois
círculos de intelectuais, eles são um dos produtos mais bem acabados do sistema
cultural moderno implantado nas cidades de São Paulo e Nova York no decorrer
dos anos de 1930 a 1950, num momento em que a vida acadêmica e a crítica de
cultura estavam intimamente entrelaçadas na esfera pública da cidade, nas suas
realizações mais expressivas, nos seus projetos mais arrojados.
Ao contrário da maioria dos campi universitários norte-americanos que, em certo
sentido, eram e continuam sendo isolados e auto-suficientes em relação ao meio
urbano no qual se situam, as instituições de ensino superior em Nova York
jamais perderam a conexão com a vida mais ampla da cidade. De fato, elas são
impensáveis sem o dinamismo cultural da cidade, o jornalismo, as editoras, os
artistas, os museus, as galerias, os intelectuais, os diversos grupos étnicos
que, composto por levas de imigrantes, deram uma feição particular à cidade.
Tanto lá como aqui, assiste-se no domínio da produção cultural e intelectual a
uma ampliação do recrutamento social de seus praticantes. Exemplar nessa
direção são os intelectuais nova-iorquinos e, no caso brasileiro, os atores e
as atrizes de origem humilde ou imigrante que se incorporaram ao Teatro
Brasileiro de Comédia (como Cacilda Becker e Nydia Licia, entre outros) e
vários estudantes da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo que,
uma vez formados, se destacariam nas suas respectivas áreas de especialização.
O exemplo mais notório nessa direção é o de Florestan Fernandes. Sua origem
social, somada às dificuldades de toda ordem que enfrentara na infância e na
adolescência, dificilmente lhe franquearia o ingresso nas faculdades onde se
formavam as nossas elites dirigentes, como as de Direito, Politécnica ou
Medicina. Do encontro entre jovens talentosos, instituições e projetos
arrojados e cidades em intensa transformação com perfil de metrópoles,
afastadas dos centros formais de poder político, deu-se a criação das condições
sociais e simbólicas para a produção dos círculos de intelectuais rastreados
nesse artigo.
Os intelectuais de Nova York vistos pelo prisma da configuração "estabelecidos-
outsiders"
A reorientação política dos intelectuais de Nova York, decorrente em parte da
alteração da posição social de seus integrantes e da conquista da autoridade
cultural e simbólica, parece ser inseparável da consolidação, no pós-Guerra, da
hegemonia econômica, militar e política dos Estados Unidos no cenário
internacional e da polarização produzida no plano interno pela Guerra Fria. A
crítica ao totalitarismo e ao stalinismo ganhou, nesse contexto, alianças
inesperadas e conteúdos diversos daqueles exibidos pelo clima de radicalismo
dos anos de 1930.17
Essa formulação tem algo de reducionismo político e de "verdade sociológica".
Para aplainar os deslizes reducionistas e dar consistência aos eventuais
acertos sociológicos, vou utilizar o modelo "estabelecidos-outsiders" de Elias
como o propósito de refletir melhor sobre a posição da intelectualidade nova-
iorquina. Para resumir um percurso teórico e analítico dos mais vigorosos no
campo das ciências sociais, como é o de Norbert Elias, vou apenas sublinhar que
as configurações sociais estudadas por ele sob o prisma do modelo mencionado
acima permitem apreender, de uma maneira renovada, um conjunto de fenômenos
empíricos que, à primeira vista, parecem avessos a uma generalização conceitual
mais abrangente. Dentre eles, as relações entre negros e brancos, entre judeus
e não judeus, entre burgueses e aristocratas, entre grupos operários idênticos
sob qualquer critério morfológico (nível de renda, escolaridade, domicílio,
ocupação profissional etc.) e distintos em termos simbólicos.18 Em todas essas
relações, sobretudo naquelas que apressada e equivocadamente vêm sendo
rotuladas como "étnicas", o que se verifica, segundo a análise de Elias, é a
existência de níveis variados de interdependência entre os grupos, expressos
por uma distribuição desigual de poder e por processos complexos de atribuição
de sentido que enredam todos num jogo dilacerado pela afirmação da
superioridade de uns e da inferioridade de outros. Aplicada ao caso das
relações entre os alemães e os judeus alemães no final do século XIX, Elias
mostra que o ressentimento dos primeiros, os "estabelecidos", em relação aos
segundos, era decorrente, em larga medida, do fato destes, os "outsiders",
terem começado a ocupar posições de poder e de prestígio tidas até então como
monopólio dos "estabelecidos".
Afirmando-se na economia e na cultura, os judeus alemães, vistos como um grupo
socialmente inferior, ameaçavam a auto-representação de parcelas expressivas
dos alemães. Expresso sob a forma do ressentimento, esse sentimento encontra a
sua contrapartida na posição, também em certo sentido "em falso", da sociedade
alemã no século XIX. Como mostra Elias,
Faz pouco tempo - somente depois de 1870 - que a sociedade
alemã dominante passou, ela mesma, de um status relativamente baixo e
freqüentemente humilhante em relação aos Estados nacionais europeus
considerados estabelecidos, a uma posição de poder relativamente
elevada. Em razão desse fato, a consciência que ela tinha de seu
status e de sua identidade era particularmente incerta e frágil,
comparada àquela de outras nações mais antigas e unificadas há muito
tempo. A minoria judia, que constituía uma grupo marginal no país,
irritava então especialmente os grupos estabelecidos cristãos e
provocava uma animosidade particular porque os próprios grupos
estabelecidos, em razão de seu destino, mostravam-se inquietos quanto
ao seu status e à sua identidade. [...] Para formular as coisas com
mais precisão, poder-se-ia dizer: quanto menos se era seguro de seus
status, mais se era anti-semita (1991, pp. 153-154).
Essa reflexão de Elias é particularmente sugestiva para lançarmos uma hipótese
final sobre a situação dos intelectuais de Nova York ao longo dos decênios de
1930 a 1950 e para entendermos o progressivo conservadorismo político de seus
integrantes. Eles, que num primeiro momento, ocupavam uma posição de
"outsiders" em relação às elites dirigentes, brancas e protestantes, foram
migrando de lugar e tornaram-se os "estabelecidos" no plano cultural e da
autoridade intelectual nos anos de 1950.
Um dos sinais inequívocos dessa nova condição é dado pela profusão de memórias
e de escritos desses intelectuais a respeito deles mesmos. Tudo se passa como
se ao lado da marca que deixaram nos seus respectivos campos de atuação, eles
não medissem tempo e energia para recontarem a história do grupo, de forma a
aparar as frinchas da imagem que construíram sobre si mesmos. Essa busca pelo
monopólio da representação legítima e autorizada, recorrente em todos os
círculos de intelectuais e artistas com algum destaque na história cultural,
ganha contornos específicos no caso dos intelectuais de Nova York. Se tomarmos
as diversas reflexões que fizeram sobre eles mesmos como expressões condensadas
da auto-representação que gostariam de ver preservadas, talvez possamos
descobrir novas pistas de análise.
Vejamos, nesse sentido, como um dos mais argutos integrantes do grupo, o
crítico literário e professor universitário Irving Howe, reflete sobre a
mudança de status, de reconhecimento social e de posição dos seus pares. A seu
ver, isso não implicou na produção de qualquer conexão com
[...] uma classe estável de altos funcionários públicos ou com um
segmento significativo dos ricos. Eles não tinham conexões em
Washington. Eles não moldaram os gostos oficiais ou dominantes. E não
podiam exercer o tipo de controle sobre a opinião cultural que o
establishment londrino parece ter logrado manter até recentemente.
Críticos como Trilling e Kazin eram ouvidos pelo pessoal do setor
editorial. Rosenberg e Greenberg pelas pessoas do mundo da arte, mas
dificilmente eles poderiam ser considerados algo tão formidável como
um establishment (1990, p. 266).
Se o termo de comparação for o grupo Bloomsbury,19 como quer Irving Howe,
certamente ele tem razão ao insistir no ponto de que os intelectuais nova-
iorquinos não conseguiram o mesmo grau de influência e projeção desfrutado pelo
círculo inglês. Entre outras razões, porque os últimos eram oriundos de uma
fração dominante da burguesia inglesa. Mas o fato de que as origens sociais
assim como a projeção e a influência desses círculos fossem diversas não deve
nos impedir de circunscrever algumas das recorrências estruturais observadas na
posição dos mesmos. Guardadas as devidas proporções, o círculo de intelectuais
de Nova York tornou-se com o tempo tão ou mais estabelecido que o grupo de
Bloomsbury. Não porque seus membros tenham enriquecido, estabelecido conexões
formais com Washington ou com as elites dirigentes, tampouco porque se
concentraram apenas - o que está longe de ser pouco nos anos de 1950 -
na crítica da cultura, das artes e da literatura. E sim porque eles se tornaram
uma elite cultural exatamente no período em que a sua comunidade "étnica" de
origem adquiria posições cada vez mais sólidas em Nova York, que pouco
lembravam a situação de seus "parentes pobres" imigrantes.
Uma menção à situação profissional dos membros mais expressivos da Partisan
Review no decênio de 1950 é necessária para dar contornos mais consistentes à
afirmação acima. Philip Rahv, agnóstico e marxista, fez-se reconhecido por suas
intervenções na intersecção da cultura com a política, pela sua capacidade de
"farejar" e descobrir jovens escritores, pelos inúmeros ensaios que publicou e
organizou sobre literatura russa e norte-americana, especialmente -
Dostoievski, Tolstoi e Henry James eram os escritores de sua predileção.20
Autodidata, dominava seis línguas (russo, inglês, alemão, francês, hebraico e
iídiche) e era um crítico literário renomado quando foi convidado, em 1958,
para ser professor de literatura em Brandeis - famoso college de Boston,
conhecido por sua ousadia intelectual e institucional, e por contratar um
número expressivo de intelectuais judeus, nascidos nos Estados Unidos ou
refugiados da Europa, como Herbert Marcuse, por exemplo.
Na época em que lecionou em Brandeis, Rahv estava casado com Nathalie Swan, sua
segunda mulher oficial e terceira relação conjugal, constituída pouco tempo
depois de sua separação de Mary McCarthy que, como vimos, o deixara para casar-
se com Edmund Wilson. Tendo estudado em Vassar no mesmo período que Mary,
Nathalie provinha de uma família rica e era arquiteta de profissão. Nela, Rahv
encontraria "a perpétua Guggenheim",21 segundo a formulação precisa e irônica
de outro membro do círculo, William Barrett.
Um dos poucos não judeus do grupo, mas profundamente identificado com eles, a
ponto de se dizer um "assimilado",22 Barrett graduou-se em filosofa no City
College (integrado por uma maioria de estudantes judeus), antes de ir para a
Europa no início dos anos de 1940, onde entraria em contato com o
existencialismo francês do qual se tornou especialista. Professor de filosofia
da Universidade de Nova York (NYU), amigo do poeta e escritor Delmore Schwartz
(que também foi editor da Partisan) desde os tempos em que ambos freqüentaram
alguns cursos de pós-graduação na Universidade de Colúmbia, Barrett foi colega
de departamento de Sidney Hook, a figura mais polêmica do círculo. Marxista
convicto nos anos da Depressão, anti-stalinista furioso nas décadas seguintes,
ensaísta brilhante, graduado em filosofia no City College, Hook foi professor
de filosofia da Universidade de Nova York, onde ingressou em 1931 e permaneceu
até a sua aposentadoria. Lá teve como aluno William Phillips, quando este
estava fazendo o mestrado, depois de se graduar em filosofia no City College e
antes de se doutorar em Colúmbia. Inicialmente comprometido com a literatura
proletária e com o radicalismo dos anos de 1930, Phillips, sempre em conjunto
com Rahv, distanciou-se definitivamente dos comunistas ao lançar, em 1937, a
revista que os tornaria conhecidos na cidade. Seus interesses intelectuais
concentravam-se na crítica literária e no jornalismo cultural.
Os críticos de arte da Partisan Review, Clement Greenberg e Meyer Schapiro,
eram figuras de destaque nesse campo nos anos de 1950. O primeiro teve uma
estréia retumbante na cena cultural nova-iorquina, graças ao artigo "Avant-
garde and kitsch", publicado em 1939 na Partisan Review. Defensor intransigente
do formalismo no plano analítico e do expressionismo abstrato norte-americano,
Greenberg foi o primeiro crítico a reconhecer a importância de Jackson Pollock
(contribuindo, assim, para projetá-lo como o pintor norte-americano mais
importante na época) e a tratar os artistas modernos de Nova York como parte de
uma escola coletiva.
Meyer Schapiro, por sua vez, professor de história da arte em Colúmbia, onde
ingressou, aos 16 anos, graças a duas bolsas de estudo que recebeu (Pulitzer e
Regents, respectivamente), graduou-se em 1924 e doutorou-se em 1928, no mesmo
ano em que começou a ensinar história da arte nessa instituição. Em 1952,
tornou-se professor titular de Colúmbia, especializado tanto na arte moderna
como na medieval. Reconhecido por seus escritos, por sua erudição, por sua
verve como professor, suas aulas tinham um público cativo. Nas palavras de um
de seus alunos, Marshall Berman, autor de Tudo que é sólido desmancha no ar,
suas aulas eram
[...] como sexo, música ou algumas poucas experiências tão
estimulantes: ele nos mostrava a riqueza de existir [...] ele
projetava uma corrente impressionante de imagens, modernas e
medievais [...] ele fazia ousados saltos ao passado, em culturas
radicalmente diferentes, em distintas visões do futuro [...] (Berman,
1996).
As observações apaixonadas do ex-aluno são contrabalançadas, num registro mais
irônico, pelos comentários de dois dos seus contemporâneos na Partisan. Afiada,
Mary McCarthy alardeava que ele era "uma boca à procura de um ouvido" (apud
Barrett, 1982, p. 53). Rahv não deixava por menos ao dizer que após uma hora de
conversa telefônica com Schapiro "podia-se obter um PhD" (apud Barrett, 1982,
p. 69).
Assim como Schapiro, Lionel Trilling também se graduou em Colúmbia, em 1925. O
primeiro judeu a integrar um departamento de literatura inglesa nessa
universidade, tornou-se membro estável de seu corpo docente em 1939. Fazendo do
ensaio seu meio privilegiado de expressão, autor de estudos importantes sobre a
relação entre literatura e psicanálise, Trilling - ao contrário de
Schapiro, que segundo seu ex-aluno Berman "banhava-nos na arte que nos fazia
ver a alegria e a beleza do mundo moderno" - "forçava-nos a ler a
literatura moderna de tal maneira que nos fazia imaginar se ainda sobrava algo
para viver" (Berman, 1996). Espécie de livre-pensador, ele foi dentre todos os
integrantes do círculo dos intelectuais nova-iorquinos, o mais resistente na
atribuição da importância da questão judaica na sua trajetória e formação.
No pólo oposto, encontrava-se Alfred Kazin. O primeiro a editar um livro de
memórias voltado para a tematização do seu passado de filho de imigrantes
pobres judeus, ele foi também o primeiro membro do grupo a enveredar pelo
estudo da formação da tradição literária norte-americana. On native grounds,
seu primeiro livro escrito nesta direção, graças a uma bolsa de estudos que
recebeu da Guggenheim Memorial Foudantion, data de 1942 e foi publicado quando
ele tinha 27 anos. O menos engajado do grupo, mais interessado na literatura do
que na política, Kazin era um crítico literário renomado nos anos de 1950.
Dividia essa posição com Lionel Trilling e Irving Howe.
No caso de Howe, a conquista do nome próprio deu-se, de um lado, pela
militância política - em 1950, após colaborar com a Partisan Review, onde
estreara em 1946, criou Dissent, a revista mais à esquerda no período. De outro
lado, pela sua intensa e profícua atividade como resenhista da revista Time,
onde trabalhou quatro anos em período parcial. Trotskista na juventude,
convocado a servir o exército norte-americano durante a Segunda Guerra, Howe
foi enviado ao Alaska nesse período. Encarregado de tarefas burocráticas,
dedicou os dois anos passados ali a ler compulsivamente sobre os mais variados
assuntos. Os livros eram aqueles disponíveis na biblioteca do acampamento do
exército. Mas para a sua sorte, esta era intelectualmente bem equipada, de modo
que, encorajado a aprender e impossibilitado de perseguir qualquer
especialização, leu e aprendeu muito nesse período. Em suas palavras, "por puro
desinteresse da mente, nenhuma universidade que eu tenha conhecido mais tarde
se equiparava a esses meses no Alaska" (Howe, 1982, p. 95). Vindo de alguém
como ele, que ensinou em universidades do porte de Stanford (entre outras), o
comentário dá o que pensar. Formado como a maioria dos judeus do círculo pelo
City College, onde se graduou em literatura inglesa, em 1940, Howe estreou como
professor universitário em 1953, em Brandeis, onde Rahv também ensinaria, como
vimos, a partir de 1958.
Dwight Macdonald, o único jornalista profissional do grupo, oriundo, como
vimos, de uma família de classe média protestante e próspera, estudou em
escolas particulares, formou-se em Yale, uma das universidades de maior
prestígio nos Estados Unidos, integrou o corpo de editores da Partisan Review
até o ano de 1943, quando saiu da revista, em razão de discordâncias políticas
com os demais editores que defendiam a entrada dos Estados Unidos na guerra,
para fundar a Politics, que existiu até 1949. Por fim, é preciso mencionar os
nomes de Mary McCarthy, Elisabeth Hardwick, Diana Trilling e Hannah Arendt.
Cada uma à sua maneira e em seus respectivos campos de atuação - a primeira
como escritora, a última como filósofa e as duas outras como críticas
literárias e ensaístas - já tinha conquistado, nos anos de 1950, nome
próprio, independentemente das parcerias amorosas. Elas circulavam com
autoridade na cena intelectual e cultural da cidade e eram reconhecidas como
mulheres brilhantes.
No decênio de 1950, eles e elas formavam uma elite cultural que, distinta do
grupo Bloomsbury, não era, como queria Irving Howe, menos "estabelecida" que
ele. A diferença entre esses círculos, que existe e precisa ser levada a sério,
advém do fato de que os primeiros, os nova-iorquinos, viveram de início os
dilaceramentos próprios da condição de "outsiders". Estes, como vimos,
exprimiam-se por meio de sentimentos tumultuados e ambivalentes, misto de
culpa, vergonha e ressentimento pela origem e condição de seus progenitores.
Pais e mães enredados na vida dura de operários, alfaiates, costureiros,
pintores de parede, tintureiros, vendedores ambulantes, para quem os filhos
eram "o único fim de suas existências", nas palavras de Alfred Kazin - cuja
infância e adolescência foi dominada pelo pensamento que repartia o mundo entre
os "de dentro e os de fora" (Kazin, 1951, p. 55). Na visão de Irving Howe, "o
lar significa privação", por isso a dificuldade em trazer algum amigo não judeu
para conhecer sua família. "Eu ficaria envergonhado de mostrar meus pais a ele,
assim como de mostrá-lo aos meus pais" (Howe, 1982, p. 5).
A situação que eles viveram de início era completamente distinta (e
desconhecida) dos integrantes do grupo inglês que, de tão seguros da sua
condição social, podiam-se permitir liberdades ousadas na época, como se
referirem a si mesmos pelo primeiro nome e não pelo sobrenome, como era usual
entre as elites inglesas. Além disso, é preciso enfatizar que os intelectuais
judeus nova-iorquinos alcançaram a condição de "estabelecidos" no momento em
que a cidade, que dava sentido, direção e vazão à produção (e à sociabilidade)
do grupo, se tornara a capital cultural contemporânea e o centro de referência
de um país que há muito perdera o estatuto de ex-colônia para se transformar na
nação mais "estabelecida" do mundo. Prisioneiros dessa condição de
"estabelecidos" numa nação "estabelecida", esses intelectuais, ao mesmo tempo
em que deixaram marcas indeléveis na cultura norte-americana, viveram a
ambivalência decorrente da tentativa de se manterem críticos ao totalitarismo e
de se afirmarem às vezes como anti-comunistas, outras como anti-anti-
comunistas, num país praticante do pluralismo cultural, mas afeito às lógicas
duais no domínio da política.
NOTAS
1 Este artigo, apresentado no Grupo de Pensamento Social da Anpocs, em outubro
de 2002, é parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida junto às bibliotecas e
aos arquivos da Universidade de Stanford, Estados Unidos, durante o segundo
semestre de 2001 e primeiro semestre de 2002, graças a uma bolsa de pós-
doutoramento no exterior que recebi do CNPq. Agradeço aos coordenadores do GT
acima mencionado, Fernanda Peixoto e Marcos Chor Maio, pelo incentivo para
publicá-lo, e a Ricardo Benzaquén de Araújo pelos comentários feitos por
ocasião da apresentação. Sou especialmente grata a Guita Debert, Sergio Miceli
e Maria Filomena Gregori pela leitura aguda. Por fim, quero agradecer ao comitê
acadêmico da Anpocs pelo parecer instigante que recebi. Incorporei, na medida
do possível, algumas das sugestões, reformulei afirmações mais peremptórias ou
obscuras, deixei outras em aberto ou inconclusas, para trabalhos futuros.
2 As revistas culturais mais importantes de Nova York nos anos de 1940 e 1950
são uma das fontes privilegiadas para a apreensão das sucessivas transformações
nas posições políticas desses intelectuais. Nesse sentido, destacam-se:
Partisan Review, criada em 1937; Politics (1944-1949), editada por Dwight
Macdonald que, em 1943, deixou o corpo editorial da Partisan, junto com Clement
Greenberg; Commentary, fundada em 1945, editada por Eliot Cohen (até o seu
suicídio em 1959) e depois por Norman Podhoretz, tinha entre os seus
colaboradores o núcleo da intelligentsia norte-americana judaica; Dissent,
lançada por Irving Howe e Lewis Coser, em 1950. No campo cultural da época,
atravessado por uma série de clivagens de ordem política, enquanto a Partisan
Review vai paulatinamente ocupando uma posição de centro, Politics e Dissent
situam-se no pólo mais à esquerda e Commentary mantém-se mais à direita.
3 Para um entendimento circunstanciado dos intelectuais de Nova York e do
contexto cultural e político no qual estavam inseridos, consultar os livros de
James Gilbert (Writers and partisans, 1992), Alexander Bloom (Prodigal sons:
the New York intellectuals and their world, 1986), Terry Cooney (The rise of
the New York Intellectuals, 1986), Alan Wald (The New York Intellectuals: the
rise and decline of the anti-stalinist left from the 1930s to the 1980s, 1987),
Neil Jumonville (Critical crossing: the New York intellectuals in postwar
America, 1991), David Laskin (Partisans: marriage, politics, and betrayal among
the New York intellectuals, 2000), Claudia Pierpont (Passionate minds: women
rewriting the world, 2001) e os trabalhos do historiador da cultura, Thomas
Bender (New York intellect, 1987; Intellect and public life, 1993, e Budapest
and New York [organizado em conjunto com Carl E. Schorkse], 1994).
4 O que de fato aconteceu em 1938, quando Trostsky escreveu o artigo "Art and
politics" para o número de agosto-setembro da revista.
5 As informações relativas aos episódios mencionados nessa parte do artigo
foram retiradas do livro de Mary McCarthy, Intellectual memoirs (1992).
6 Atestadas, por exemplo, pela atitude da escritora Lillian Hellman, que nos
anos de 1980 moveu um processo de danos morais contra Mary envolvendo uma soma
significativa de dinheiro, o qual só não chegou à sua tramitação final porque
Mary foi acometida por um câncer fatal no pulmão. Apoiada o tempo todo por
Hannah Arendt, com quem manteve uma relação intensa de amizade e uma profícua
correspondência, Mary McCarthy é uma das mulheres mais interessantes e
polêmicas do grupo. Suas memórias, fascinantes do ponto de vista literário e
informativo, são um manancial para o aprofundamento das convenções de gênero
nos círculos intelectuais de maior prestígio da época.
7 Com exceção de Mary McCarthy, Elizabeth Hardwick, Saul Bellow e Delmore
Schwartz, não havia outros escritores dentro do círculo dos intelectuais nova-
iorquinos, os quais tinham uma cabeça muito mais crítica do que artística (cf.
Jumonville, 1991, p. 9).
8 A literatura sobre o modernismo é extensa e daria, por si só, um artigo. Para
efeitos de "comprovação" da interpretação que estou propondo (e que merece uma
reflexão mais alentada, a ser feita em outra ocasião), remeto o leitor
interessado no aprofundamento da dimensão de gênero no círculo modernista ao
recém-lançado livro de Sergio Miceli, Nacional estrangeiro, 2003.
9 A expressão é do artista plástico Flávio de Carvalho e encontra-se
reproduzida no "Roteiro de uma vida-obra", incluído no livro de onde retirei os
dados sobre Pagu (cf. Augusto de Campos, 1982, p. 320).
10 Idem, p. 147.
11 Entre os livros de memórias publicados por eles até a metade dos anos de
1960, destacam-se: A walker in the city (1951) de Alfred Kazin, Memoirs of a
revolutionist (1957) de Dwight Macdonald, Against the America grain (1962) de
Dwight Macdonald, Starting out in the thirties (1965) de Alfred Kazin. A partir
do início dos anos de 1970, como resultado do envelhecimento de vários deles,
do questionamento que sofreram por parte das gerações mais novas, sobretudo
daquelas ligadas à nova esquerda, da publicação do livro de memórias da
celebrada dramaturga e escritora Lillian Hellman, Scoundrel time (1976), eles
voltam à cena editorial e apostam todas as fichas na reconstrução
memorialística de suas trajetórias profissionais, experiências pessoais e
engajamentos políticos. O livro de Lillian Hellman, premiado e aclamado pela
crítica, sucesso de público, é um libelo contra o macartismo dos anos de 1950 e
uma crítica dura ao silêncio de muitos dos intelectuais de Nova York em relação
ao período de maior arbitrariedade política da história norte-americana. Uma
grande parte dos livros que publicaram a seguir traz senão uma refutação
contundente à visão de Lillian Hellman, ao menos uma reconstrução do passado
que enfatiza o alinhamento de seus autores no campo político do anti-
stalinismo, numa tentativa de demarcarem as suas diferenças em relação ao
anticomunismo desenfreado dos conservadores de direita e de enfatizarem a
importância que tiveram na cena cultural e editorial. Entre os livros nessa
linha, destacam-se: We must march my darlings (1977) de Diana Trilling, Essays
on literature and politics (1978) de Philip Rahv, New York Jew (1978) de Alfred
Kazin, The Truants (1982) de William Barrett, A view of my own (1982) de
Elizabeth Hardwick, A margin of hope (1982) de Irving Howe, A partisan view
(1983) de William Phillips, Out of step (1987) de Sidney Hook, Conversations
with Lillian Hellman (1986) editado por Jackson Bryer, Essays, selections
(1990) de Irving Howe, Intellectual memoirs (1992) de Mary McCarthy, Writing
dangerously (1992) de Carol Brightman, Between friends: the correspondence of
Hannah Arendt and Mary McCarthy (1995) editado por Carol Brightman.
12 Como a que ocorreu, por exemplo, na relação dos dois principais editores da
Partisan Review, Philip Rahv e William Phillips, que romperam de forma
intempestiva na década de 1960, depois de anos de convivência estreita.
13 Se essa observação é corrente nos estudos sobre o modernismo brasileiro, ela
ganha uma nova dimensão a partir do instigante estudo de Iná Camargo Costa,
Panorama vermelho (2001), voltado para a análise da formação do teatro moderno
norte-americano e redigido com o propósito de oferecer uma trama mais
consistente para a comparação com a formação do teatro moderno no Brasil.
14 Esta e as demais citações dos intelectuais nova-iorquinos que serão
reproduzidas no restante do artigo foram traduzidas pela autora.
15 Segundo Alexander Bloom, a partir dos anos de 1920 observa-se um clima de
anti-semitismo nos Estados Unidos, expresso, por exemplo, por meio uma série de
restrições que os estudantes judeus começaram a enfrentar nas universidades
norte-americanas. Mas, mesmo assim, dois dos maiores colaboradores de Partisan,
Lionel Trilling e Meyer Schapiro, ainda puderam, nessa época, se graduar na
Universidade de Colúmbia. O que não foi possível aos membros mais novos desses
intelectuais judeus, nascidos entre 1915 e 1925. Nenhum deles cursou a
Colúmbia. A única alternativa de que dispunham, em razão quer da precária
situação familiar, quer do acirramento da discriminação étnica observada nas
universidades norte-americanas nos anos de 1930, era o City College. Delmore
Schwartz, nesse contexto, foi uma exceção. Oriundo de uma família judia de
classe média, graduou-se em filosofia, em 1935, na New York University e fez a
pós-graduação em Harvard (cf. Alexander Bloom, 1986, cap. 2, "A New York
education", e Shatzky e Taub, 1999).
16 Referência às disputas classificatórias e políticas que tiveram lugar entre
os intelectuais de Nova York a partir do início dos anos de 1950, quando Philip
Rahv, William Phillips (os principais editores da Partisan), entre outros,
criaram o termo "anti-anti-comunista" para se diferenciarem, de um lado, do
anti-comunismo da direita norte-americana e, de outro, dos anti-comunistas
liberais como Sidney Hook e Elliot Cohen (editor da Commentary). Marcando,
assim, o seu alinhamento junto à parcela dos "nova-iorquinos" mais à esquerda
no período, como Clement Greenberg, Meyer Schapiro, Dwight Macdonald, Irving
Howe e Lewis Coser (os dois últimos eram editores da Dissent), entre outros.
17 Cabem aqui esclarecer que a caracterização mais geral do realinhamento
político desses intelectuais, feita ao longo do artigo em termos de seu
progressivo conservadorismo, corresponde, de um lado, à maneira dominante com
que eles foram vistos pela esquerda norte-americana nos anos de 1960 e 1970.
Conservadores, neste caso, é um qualificativo atribuído a eles pelos
integrantes dessa também chamada "nova esquerda" norte-americana. De outro
lado, é preciso salientar que o envolvimento de vários desses intelectuais com
organizações que receberam na década de 1960 denúncias por suas ligações
supostas ou reais com a CIA contribuiu para o acirramento dessa percepção.
Basta mencionar, nesse sentido, a participação de Sidney Hook, Elliot Cohen,
William Phillips, Diana Trilling, entre outros, no American Comittee for
Cultural Freedom (fundado em 1949) e no Congress for Cultural Freedom,
entidades voltadas à defesa da democracia, contra o totalitarismo e o
comunismo. Em 1967, veio à tona a informação que a segunda recebia suporte e
dinheiro da CIA. O autor da denúncia, Jason Epstein, escreveu o artigo "The CIA
and the intellectuals", publicado no New York Review of Books, em abril de
1967. O efeito dessa revelação foi quase o de uma "bomba" a estilhaçar a imagem
e a credibilidade política desses intelectuais anticomunistas que se
consideravam liberais. A denúncia foi contestada por alguns dos intelectuais
citados. Sobre esse assunto, ver Diana Trilling, We must march my darlings,
1977, e Wiliam Phillips, A partisan view, 1983.
18 Ver, nesse sentido, o livro de Norbert Elias e John Scotson, Os
estabelecidos e os outsiders (2000). É preciso não esquecer que este livro
atualiza uma das dimensões analíticas presentes na figuração "estabelecidos-
outsiders". A saber, aquela em que as posições sociais de cada um dos grupos,
por estarem assentadas em critérios morfológicos idênticos, ganham uma fixidez
no plano da repartição de poderes. Enquanto os recursos simbólicos de cada um
dos grupos se mantiverem inalterados, a posição de poder de um sobre o outro
permanece a mesma. Isso não quer dizer que o modelo não possa ser aplicado a
grupos que, "outsiders" de início, possam vir a se tornar "estabelecidos" ou a
ameaçarem a posição dos estabelecidos, como bem mostra Elias em outros
trabalhos, notadamente em Os alemães e em Mozart: sociologia de um gênio.
19 Para uma análise densa e provocativa desse círculo, conferir o artigo de
Raymond Williams, "The Bloomsbury fraction", 1982, pp. 148-169.
20 A esse respeito, consultar o ensaio memorialístico que Mary McCarthy
escreveu sobre Rahv, alguns meses depois da morte dele, para o New York Times
Book Review, em 17 de fevereiro de 1974.
21 A observação de Barret refere-se à prestigiada e cobiçada bolsa de estudos
fornecida para intelectuais de destaque em diversos campos de conhecimento pela
John Simon Guggenheim Memoral Foundation. Transcrita em Andrew Dvosin,
Literature in a political world, 1997, p. 103.
22 Comentando a sua identificação com os judeus, William Barrett enfatiza que
ela se iniciou de maneira reflexiva e deliberada. Em suas palavras, "I was pro-
Jewish because the Jews seemed to me the people of the mind". Cf. The truants,
1982, p. 23.