Risco e contingência
Um clima de crise teórica espalhou-se desde o final dos anos de 1970, cujas
causas uns detectaram na "incredulidade nas metanarrativas" (Lyotard, 1979),
outros na "crise do marxismo" (Althusser, 1978), outros simplesmente na
"mudança paradigmática". Paralelamente foram constatados o "fim da história", o
"fim da utopia" e o "fim do comunismo", a ponto de Robert Kurz exclamar: "nunca
houve tanto fim!" (Fukuyama, 1992; Kurz, 1991). Estas afirmações, por vezes com
uma existência passageira, por vezes em circulação até hoje, estão intimamente
interligadas com eventos históricos das últimas três décadas. O mais marcante
para as ciências sociais não foi o "colapso da modernização", título do livro
publicado em 1991 por Robert Kurz, mas o colapso da União Soviética, no mesmo
ano. Já desde a publicação de Lyotard sobre a "condição pós-moderna", em 1979,
surgiram inúmeras publicações que levantaram, de uma forma ou de outra, a
hipótese de que a formação sóciohistórica contemporânea não seria mais
compreensível se ela fosse entendida exclusivamente como sociedade moderna.
Surgiu uma variedade de conceitos que tentaram transmitir a emergência de algo
novo, algo tão radicalmente novo que legitimaria falar até de uma ruptura de
época, como sugere a postulação da emergência de uma "pósmodernidade".
As ciências exatas, que nunca foram tão exatas assim, contribuíram, por sua
vez, para perturbar os "pesquisadores sociais". Foram elas que convidaram a
pensar o "caos determinístico" no âmbito socioeconômico (Prigogine, 1984) ou
propuseram imaginar a história como um "campo de acontecimentos" dentro de um
espaço com "n" dimensões (Eigen, 1989 e 1978). Assim estimulada, a teoria
social lembrava-se nos últimos anos de algumas das suas mais valiosas e,
freqüentemente esquecidas, tradições. Assim, Bauman chamou atenção em inúmeras
publicações para a "ambivalência" da própria modernidade; Maffesoli constata,
se não festeja, as "vagabundagens pós-modernas" e resgata questões existenciais
para a sociologia, e assim adiante (Maffesoli, 2001 [1997]).
A "ruptura semântica" exigia novos conceitos para uma realidade transformada.
Junto com a fala habermasiana, ainda cautelosa, da "nova intransparência",
surgiram as primeiras propostas (Habermas, 1990 [1985]). Ulrich Beck alcançou
um grande sucesso editorial quando lançou o livro A sociedade de risco(Beck,
1986). Desde então, assistimos a um debate sobre o "risco" e a "sociologia do
risco" (Luhmann, 1991), que expressa o espírito de incerteza da época.
O livro de Beck não foi até agora, apesar do seu grande sucesso editorial na
Alemanha e em outros países, traduzido para a língua portuguesa. Apesar da
dificuldade de acesso, Ulrich Beck tornou-se também uma referência no Brasil,
com a coletânea Modernização reflexiva, de 1994, que une contribuições de
Anthony Giddens, Scott Lash e do próprio Ulrich Beck (Beck, Giddens e Lash,
1994). Muitos pesquisadores usam hoje o termo "sociedade de risco" de forma
corriqueira e descobrem riscos nos mais variados contextos. Parece que o já
mencionado clima de crise e incerteza que precedeu e acompanhou o fim do
comunismo soviético e o paralelo desenvolvimento tecnológico em escala global
encontrou um público, também, teoricamente cada vez mais inseguro e ávido para
abraçar novos paradigmas. Descobrir "riscos", como Beck, ou perceber a situação
histórica como "intransparente", como Habermas, são somente sintomas de um
estado de espírito caracterizado pela consciência da contingência da
modernidade e pela crescente "incredulidade nas metanarrativas", das quais
Lyotard fala.
Assim, ganha maior plausibilidade a hipótese de que o curioso sucesso do
conceito "sociedade de risco" deve-se mais a essas circunstâncias históricas e
teóricas do que à força de convicção de uma teoria sociológica consistente
sobre uma nova formação social. Não precisamos aqui discursar mais uma vez
detalhadamente sobre a argumentação de Beck (cf. Brüseke, 2001). No contexto
desta reflexão meramente conceitual sobre risco e contingência queremos
brevemente lembrar as teses centrais de Beck, convidando em seguida para uma
reflexão mais ampla.
As teses centrais sobre a sociedade de risco: Ulrich Beck
De maneira geral, pode-se levantar nove tópicos que traduzem as teorias
centrais do autor:
* A sociedade industrial torna-se uma sociedade cada vez mais saturada,
contudo repleta de imponderações e efeitos não-intencionados.
* Existem riscos individuais e riscos globais. Riscos individuais sempre
existiram, mas distinguem-se de forma radical dos riscos que a
modernidade traz consigo. O mundo encontrase hoje em uma disposição de
perigo que se expressa de forma exemplar na ameaça nuclear. A disposição
de perigo atinge potencialmente todo o mundo. O risco é global.
* A distribuição dos riscos é desigual.
* O risco que a civilização corre não possui evidência; surge aí a
necessidade da reflexão científica sobre a modernização.
* A sociedade industrial entrou numa fase demodernização reflexiva, na qual
se tornou tema para si mesma.
* Existe uma distinção entre a cientificização reflexiva e a
cientificização simples. A primeira é a cientificização voltada a si
mesma. O conceito da modernização reflexiva abrange tanto a modernização
refletida, não por movimentos sociais críticos da sociedade industrial-
capitalista, mas também da modernização da própria modernização.
* A invisibilidade imediata dos riscos da modernização coloca os cientistas
e os políticos numa posição-chave, como intérpretes do perigo. Por meio
deles um risco pode sofrer minimização ou dramatização; o risco é aberto
para processos sociais de sua definição.
* Os riscos relativizam as posições de classe. Ricos e pobres, empresários
e assalariados sofrem ou podem sofrer, por exemplo, as conseqüências da
poluição.
* Os riscos produzem também novas desigualdades internacionais. Elas são
novas porque não correspondem necessariamente a dicotomias antigas entre
metrópole e periferia.
O que significa risco?
A palavra risco aparece hoje em qualquer contexto discursivo que quer alertar
para as conseqüências futuras negativas de uma variedade praticamente ilimitada
de fenômenos e processos. Por isso, é mais do que oportuno lembrar de algumas
conotações básicas do emprego da palavra risco na qualidade de um conceito.
Dispomos hoje de vários trabalhos científicos que, nos anos que seguiram a
publicação de Beck, se debruçaram sobre esta tarefa. Entre os trabalhos
exaustivos sobre o "risco" na modernidade, como o de Wolfgang Bonss (1995), há
estudos mais teóricos como o de Niklas Luhmann (1991). Coube a Luhmann o mérito
de ter tentado uma primeira aproximação sistemática ao problema do "risco" no
campo da sociologia, dedicando a ele o livro A sociologia do risco(Luhmann,
1991).
Este autor reclama que a sociologia ainda não conseguiu oferecer mais do que
observações do óbvio a respeito desse assunto. "Sociedade de risco" é um
conceito de moda, ele já afirmara, com uma ironia que lhe é peculiar. E mais
uma vez como prova do seu bom humor, Luhmann diz:
Como as outras disciplinas também a sociologia parece partir do
pressuposto que os danos são danosos, que desvantagens devem
preferencialmente ser evitadas e que isto vale ainda mais para danos
que podem assumir extensões catastróficas. [ ] Todavia não alcançamos
com isso um conceito teórico e a pesquisa fica no estado da
fascinação pelo horrível (Luhmann, 1990, p. 140).
Luhmann propõe uma distinção entre risco e perigo. Assim, só devemos falar de
riscos quando possíveis danos são conseqüências da própria decisão. Não
obstante, seria mais adequado falar de perigos quando os danos ou as perdas
estão relacionados com causas fora do próprio controle.
A modernidade na sua fase atual não conhece mais um téloshistórico; o futuro
pode realizar este ou aquele projeto. Na medida em que a trajetória histórica
se abre e se torna uma função de decisões individuais, assumem estas a
responsabilidade também para possíveis fracassos e perdas. O risco de uma
decisão pressupõe a consciência desses danos possíveis, assim como o cálculo da
decisão de viajar de avião, por exemplo, conta com a probabilidade de chegar
sem acidente aéreo ao lugar do destino. Quando acontece um desastre, o que é
improvável mas não impossível, o dano assumido torna-se algo real. Quem fuma,
diz Luhmann, assume o risco de morrer de câncer, mas para os outros o câncer
continua sendo um perigo (Idem, p. 148). Alguém que assume o risco de morrer
atrás do volante do seu carro, o que seria uma possível conseqüência da decisão
de andar em alta velocidade, representa um perigo para os pedestres e outros
motoristas. Assim a mesma ação é um risco para um e um perigo para os outros.
Percebemos como a operação de distinção de Luhmann entre risco e perigo não
pode evitar o fato de que os dois estão interligados. Todavia, a argumentação
do autor chama a atenção para algo essencial, que é a distinção entre um dano
hipotético em conseqüência da própria ação consciente e um dano hipotético em
conseqüência da ação dos outros, da natureza ou de outras causas fora do
próprio controle.
Contingência e teoria social: Luhmann
Luhmann não se contenta com uma polêmica apenas sobre a "sociologia do risco";
já em 1992 ele chama atenção para a "contingência como valor próprio da
sociedade moderna" (Luhmann, 1992). Com isso o autor abriu a sociologia dos
anos de 1990 para um debate que, além de operar com um conceito antigo, cria
uma nova sensibilidade teórica para imprevisibilidades e possibilidades
surpreendentes no campo dos acontecimentos. Na verdade, não é somente Luhmann
que se dedica à questão da "contingência"; Richard Rorty, já em 1989, discorria
em contextos da ciência literária e da filosofia sobre "contingência e ironia",
contribuindo para um ciclo de reflexões que até então não perderam nada do seu
vigor inicial (Rorty, 1992 [1989]). Muito pelo contrário, podemos verificar um
número crescente de pesquisadores tentando "explorar" o termo da contingência
nas áreas mais diversas (Makropoulos, 1997 e 1999; Brüseke, 2002).
O senso comum confunde facilmente o conceito de contingência com o "acaso" ou
com "algo imprevisto". Essa compreensão deriva-se, também, do uso da expressão
"contingências" para denominar, na fala cotidiana, os acontecimentos casuais
que sempre atravessam as trajetórias planejadas. Nessa linha de raciocínio, o
administrador elabora "planos de contingência" para desenhar alternativas de
ação em caso do surgimento de eventualidades que põem em cheque a execução dos
planos empresariais. Assim, o "plano B" é uma resposta aos efeitos não-
esperados e a qualquer tipo de emergência de novidades relevantes (Chandler,
1962; Burns e Stalker, 1961; Lawrence e Lorsch, 1972).
Apesar do fato de a representação cotidiana das "contingências" e, também, do
uso desta palavra nos "planos de contingência" tocar no problema da
contingência, é necessário enfatizar que o conceito de contingência não
significa simplesmente "acaso", "imprevisto", "inesperado"ou algo desse gênero!
É importante ter isso em mente para evitar um encaminhamento errôneo das
reflexões logo na entrada. Se contingência significasse simplesmente acaso,
seria melhor adotar logo esta palavra, em vez de introduzir um conceito novo.
O que, então, significa contingência? O conceito é usado na filosofia desde
Aristóteles e na teologia por Tomás de Aquino (endechomenon, gr.; contingens,
lat.) e, mais recentemente, na sociologia, nas obras de Talcott Parsons e do já
citado Niklas Luhmann. A contingência denomina algo que não é necessário, nem
impossível e, dessa forma, diz respeito à abertura fundamental da experiência
humana no âmbito social. O conceito de contingência também se estende à
percepção do mundo que depende de distinções (entre aquilo que está dentro do
sistema e aquilo que está no seu ambiente); essas distinções podem ser feitas
desta ou daquela maneira, são então "contingentes". A necessidade da redução de
complexidade deriva-se dessa abertura fundamental do agir e perceber humano.
Sistemas sociais têm a função de reduzir a complexidade e controlar a
contingência, possibilitando assim um agir direcionado e com sentido por parte
do ator social.
"Tudo é contingente que nem é necessário, nem impossível" (Luhmann, 1992, p.
96). Nesta definição o conceito de contingência é resultado de uma dupla
negação, primeiro da necessidade e, segundo, da impossibilidade. Uma lógica
bipolar, baseada no "ser" ou "não-ser", traz seus problemas. Precisamos
aparentemente de um terceiro pólo, o da indefinição, para captar melhor a
mensagem deste curioso conceito. Luhmann pergunta por isso com perspicácia:
"Existe de todo uma teoria que pode manusear o conceito de contingência?"
(Idem, p. 98).
Para responder a esta pergunta, ele introduz os conceitos de observação de
primeira e de segunda ordem. Observações simples, chamadas de primeira ordem,
usam diferenciações, mas ainda não geram, para o observador, a contingência.
Somente as de segunda ordem, que são observações de observações, podem ver a
contingência. Estas reduzem o campo da observação: exclusivamente o observar
está sendo observado. Tal procedimento significa, de um lado, uma redução de
complexidade, mas abre, de outro, a possibilidade de um aumento de complexidade
no campo da observação da observação. Eu posso perguntar por que um observador
observa exatamente esta e não uma outra coisa. Assim, a observação observada
torna-se contingente, pois ela é o que é, mas poderia ser uma outra. Através da
observação do observador abre-se a possibilidade de aplicar também a
consciência da contingência com intenção terapêutica ou sociológica. Quando um
observador não vê algo que é evidente, isto fica para ele na latência. A sua
observação atribui a ele, ao observador de primeira ordem, a incapacidade de
ver o que ele não pode ver.
Quando dois indivíduos entram em comunicação surge o problema da contingência
dupla. Isso resulta da dependência de cada indivíduo da ação (ou informação)
contingente do outro. "Eu sei que você sabe e você sabe que eu sei." Esta
situação faz na interpretação de Luhmann da comunicação correta uma mera
possibilidade ou até uma improbabilidade (Luhmann, 1992) facilmente verificável
no momento do pênalti, quando jogador e goleiro tentam fazer seus cálculos de
ação na base da dupla contingência. Em decorrência do aumento da complexidade
das sociedades modernas, resultado da sua diferenciação funcional, crescem as
opções de ação para cada indivíduo. Isso, por sua vez, resulta no aumento de
experiências da contingência por parte do ator social.
Risco e contingência
Um olhar mais geral sobre o uso do conceito de risco na literatura leva a
conclusão de que existem basicamente duas concepções de risco. A primeira, que
podemos chamar de conceito "restrito de risco", segue a definição de Luhmann,
isto é, quando um ator sabe das conseqüências do seu agir e procede na
consciência tanto do possível sucesso da sua ação como de possíveis danos. A
segunda, que podemos chamar de conceito "amplo de risco", vai mais além e
inclui aquilo que Luhmann denomina perigo. Assim há uma "zona de risco" quando
se trata, por exemplo, de regiões onde terremotos são, por causa da localização
geográfica, freqüentes; ou quando se trata de risco de uma guerra nuclear;
risco de uma epidemia ou risco da desertificação em regiões com um uso
excessivo do solo. Esse conceito amplo quer alertar para a emergência de
futuros eventos danosos para o homem, sejam eles frutos de uma ação individual,
sejam resultado nãointencionado de uma ação coletiva, sejam ainda simplesmente
fenômenos naturais com efeitos negativos para a sociedade.
Em termos operacionais, o conceito restrito, favorecido por Luhmann, é sem
dúvida mais preciso. Não obstante, a aplicação do conceito amplo de risco
ganhou, por causa do seu largo uso, uma importância que não podemos
simplesmente eliminar no âmbito do combate conceitual. Avaliamos que a grande
aceitação do conceito amplo de risco é resultado, exatamente, da crescente
consciência da contingência, que se expressa sui generis, isto é, a consciência
de contingência não se apresenta sob a denominação ("filosoficamente correta")
de contingência, mas sob outras formas lingüísticas. Nesse sentido, o discurso
do risco é uma maneira de se comunicar num campo de eventos contingentes. Tal
categoria é sempre, para o homem, uma ameaça hipotética. Existem outros eventos
avaliados como chance, sorte, benção, graça etc., que, apesar de ter a mesma
estrutura contingente do risco, ocultam facilmente seu caráter, uma vez que são
vividos de forma positiva. O homem tem a compreensível inclinação de atribuir
as "contingências positivas" ao seu próprio mérito e buscar a culpa para as
"contingências negativas" fora da própria responsabilidade.
Entendendo o "risco" desta maneira, ou seja, como uma expressão moderna da
consciência da contingência, é preciso voltar no tempo para elucidar a
consciência pré-moderna da contingência. Essa viagem vai nos trazer, em
determinado momento, de volta ao presente.
O Deus necessário e o contingens: Tomás de Aquino
O conceito de contingência existe desde Aristóteles (endechomenon). Não
obstante, a consciência da contingência aumenta dramaticamente com a adoção da
"dúvida metódica" pela filosofia ocidental. Descartes (1951 [1637]) introduz e
valoriza positivamente observações de segunda ordem, passo decisivo e marcante
para os tempos modernos. Observações de segunda ordem são a especialidade dos
críticos de qualquer gênero. Afinal, a crítica é somente possível quando feita
neste segundo nível das observações. Como uma faceta do processo reflexivo como
um todo, a crítica passou a ser a paixão dos pensadores modernos. O
intelectual, que nasce na Idade Média com a fundação das primeiras
universidades, é o portador privilegiado da consciência da contingência,
resultado também do aumento da reflexividade da teologia cristã. Ademais, o
intelectual não consegue se levantar a uma auto-reflexão, a uma observação de
terceira ordem, que revelaria a sua própria consciência crítica como
contingente.
Parece logicamente impossível pensar o infinito nas circunferências do finito.
Todavia, seria possível, partindo de observações do finito, deduzir
racionalmente a sua "existência". Dessa maneira Tomás de Aquino apresenta na
Suma Teológica (1273) cinco vias que provam "existência" de Deus: 1) do
movimento deduz-se a força última, imóvel; 2) das causas, chega-se a uma
primeira causa, não-causada; 3) o possível existe, somente porque algo o faz
existir; 4) dos variados graus de perfeição deduz-se a existência da perfeição
e da verdade absoluta; 5) a regularidade nos fenômenos naturais é intencional;
Deus é a inteligência primeira e ordenadora na raiz da finalidade das coisas.
Desenvolvidas com base nas quatro "causas aristotélicas" (causa materialis,
causa for malis, causa finalise causa efficiens), essas vias são, no fundo, as
argumentações que destacam a necessidade de Deus, apontando o não-necessário
que pode ou não ser. As cinco "provas da existência de Deus" de Aquino podem
ser vistas como somente cinco perspectivas de observação do mesmo fenômeno, as
quais revelam diferentes modos de manifestação do contingente (Thomas de Aquino
afirma: Contingens est, quod potest esse et non esse, Sum. Th. I, 86, 3 c). Na
sua compreensão, o contingente pressupõe o absoluto. Em outras palavras, a
existência do condicionado exige a existência do incondicionado, isto é, Deus.
Seria impossível a existência apenas de seres contingentes. O contingente pode
ser causa de outro contingente, e assim por diante, mas a última ratiodo ser
contingente é o Ser que é por conta própria, é o ens a se, Sein aus sich, ou
"Ser de si mesmo", Deus.
Tomás de Aquino separa a necessidade absoluta do ser acidental. Assim, seu
conceito de contingência aponta o que é acidental, o que pode ser de um jeito
ou de outro, mas não abrange e inclui a necessidade. Esse entendimento ainda
encontramos hoje, quando ouvimos referências às "contingências da vida
cotidiana", ou quando se emprega o termo contingência como se fosse sinônimo de
acaso. Os entes contingentes, todavia, participam no Ser absoluto. Tomás ainda
"esquece", como diria Heidegger, a "questão do Ser" e dissolve a possível
ambiguidade da contingência dos Seres na dicotomia entre o finito e o infinito,
o condicionado e o não-condicionado, o perfeito e o imperfeito. Não obstante, a
estrutura paradoxal da contingência aparece, já em Tomas de Aquino, na curiosa
problemática da trindade,. Sendo "Um em três", o Deus absoluto torna-se "carne"
e participa, iluminado pelo espírito santo, das amarguras da vida, humana e
finita. Pensando radicalmente a idéia do Deus cristão, podemos até descobrir
que este, somente quando "desce" ao nível do singular, quando se esgota num
projeto singular e finito, mostra que é absoluto até na sua dedicação radical
ao relativo. O absoluto não seria absoluto se este não tivesse a possibilidade
de se manifestar, quando quiser, no relativo. Transformando dessa maneira (e
com o devido respeito) a teoria de Tomás de Aquino, reinserimos a necessidade
(o fundamento) naquilo que é.
O conceito de contingência, que nós favorecemos, lembra a estrutura paradoxal
presente na doutrina da trindade. Seu emprego hoje somente faz sentido quando
carrega no seu significado acidental aquilo que é necessário. Somente da
simultânea presença de estruturas necessárias e eventos e qualidades acidentais
o conceito ganha força e sua razão de ser. A definição da contingência
empregada por nós, portanto, seria: "Algo é necessariamente como é, mas também
poderia ser diferente".
O atual conceito de necessidade acompanhou a revolução paradigmática do século
XX. Primeiro, constatou-se que as leis científicas da mecânica de Newton valem
para espaços, tempos e grandezas "médias", mas são relativizadas quando se
trata do extremamente grande (o universo) e o extremamente pequeno (a
subestrutura do átomo). Também passamos pela revolução termodinâmica que (no
mínimo) introduziu de forma convincente o conceito da "irreversibilidade", já
nos anos de 1860, o que contrasta com a reversibilidade e a congruência
temporal da física clássica. O que, todavia, transformou nossa percepção de
estruturas e processos necessitários são alguns paradigmas desenvolvidos por
Einstein, Max Planck e Heisenberg. A relatividade, a física quântica e as
relações de incerteza tornaram muitos fenômenos físicos antinômicos e
paradoxais. Com isso, apresenta-se o Ser numa perspectiva radicalmente
diferente. Uma perspectiva não somente nova para a física, mas, também, para a
filosofia, que encontrou em Heidegger o pensador do "segredo do Ser".
Em suma, o conceito de necessidade que propomos integrar no conceito
contemporâneo de contingência não é mais uma grandeza "metafísica" de outrora.
Quem, todavia, quer vincular a idéia de "necessidade" com a idéia de Deus
deveria ir além de Tomás de Aquino e resgatar as fontes da teologia (mística)
de pensadores como Mestre Eckart, Bernardo de Claraval e João da Cruz, entre
muitos outros. Aqui se apresenta, já no contexto "teo-lógico", o absoluto como
um paradoxo. Quem busca a gestão de riscos deveria, então, saber que esse
projeto não pode escapar das antinomias e das instabilidades contidas no
próprio Ser, que é necessariamente como é, mas, também, poderia ser diferente,
exatamente no momento em que nós menos esperamos.
Crítica do conceito de contingência de Rorty
Rorty, como muitos outros contemporâneos, apropria-se do conceito de
contingência, transpondo-o para um plano antimetafísico, reduzindo, assim, seu
teor. O que queremos dizer com isso? O contingensnão é entendível, em Tomás de
Aquino e em toda teologia e filosofia até Nietzsche, se o separamos do seu
oposto, do totalmente incondicionado, que é Deus. Deus é a necessidade
absoluta, sem nenhuma razão de ser, fora de si ("Eu sou quem eu sou!"). O
contingensé o dependente, o criado e o acidental, que pode ser ou não. A última
causa, pela qual algo pode ser ou não, ou porque algo é de tal maneira e não
diferente, está fora do alcançe da razão humana ("Os caminhos do Senhor são
insondávéis.") O contingensé "acidental", mas assegurado pela vontade de Deus,
que lhe dá sentido, mesmo que este seja incompreensível. Grandes infortúnios
que castigam o homem aparecem, assim, sob uma nova luz: a doença incurável ou a
perda súbita da vida num "acidente" podem ser suportadas como "provação", ser
aceitadas como "castigo" e "penitência " ou fazem transparecer de forma
enigmática, na mística da dor, o divino (Brüseke e Sell, 2006).
O contingens, sem o seu oposto, não faz sentido, é um conceito pela metade,
amputado do seu sentido mais profundo. Todavia, tentamos pensar, em tempos
modernos, sem recorrer a categorias metafísicas. Tal empreendimento leva, em
muitos casos, a uma transposição de categorias metafísicas para um plano
laicizado, já apontado por Carl Schmitt no âmbito da ciência política, e conduz
freqüentemente a um emprego de categorias "tradicionais " sem informar sua
origem. Silenciando a genealogia metafísica dos conceitos, e de muitos dos
nossos valores, essa transposição aproveita, não obstante, seu poder de
convicção.
O contingens, sem sua dimensão necessária, só pode informar sobre eventos
desprovidos de sentido. A contingência separada do seu fundamento aparece como
o radicalmente gratuito na literatura e na filosofia do século XX. Desde Franz
Kafka até Albert Camus e o jovem Jean-Paul Sartre, entre outros pensadores,
segue a corrente daqueles que sabiam que mesmo a própria vida é, mas poderia
não ser. O contingenssem o seu sentido oculto transforma-se (com certa
necessidade) no "absurdo"; o evento possível e surpreendente no "acaso"; a
possível emergência de uma perda, no "risco".
O uso do termo "contingência" quando, na verdade, se deseja falar do "acaso"
não faz o menor sentido, apenas empobrece esse conceito. Sua riqueza deriva-se
exatamente da relação simultânea, tensa e, por vezes, enigmática com a
necessidade e a possibilidade. É difícil manter hoje a argumentação de Tomás de
Aquino fora de contextos teológicos; não obstante, podemos conservar a
estrutura básica do seu entendimento da contingência, sem exigir de nós mesmos
um sacrificium intelectum.
Se queremos fazer uma referência ao necessário e ao possível a um só tempo,
apenas uma idéia de "contingência" será concernente: algo é necessariamente
como é, mas, também, poderia ser diferente. Sem a insistência na necessidade
seria inexplicável o sucesso da ciência e da técnica modernas. As ciências
(exatas) referem-se a regularidades contidas no próprio Ser, apresentam-nas na
forma de leis científicas e abrem o caminho à sua manipulação técnica.
A exploração da contingência
A sociedade industrial explora a contingência. Explora na base dos
conhecimentos científicos daquilo que é possível. A grande metáfora da
contingência é "o plástico", que demonstra a plasticidade daquilo que é. Ser
"plástico" significa ser cientificamente transparente e acessível às
manipulações técnicas. O "plástico" é a realização de uma possibilidade; é uma
possibilidade que emerge de estruturas determinadas por padrões que seguem
suficientemente regras causais. A contingência é, então, muito mais do que o
acaso, a aleatoriedade ou o risco que o indivíduo corre quando se encontra com
um perigo inesperado. A contingência "abraça" esses conceitos e faz deles
somente um aspecto de uma realidade "plástica", determinada e livre, no mesmo
(!) momento.
É conhecido que, em comparação com outros mamíferos, o homem é pobre de
instintos. Essa deficiência obriga a criança humana a adquirir estratégias de
sobrevivência (táticas de vida, diria Oswald Spengler) culturalmente, imitando
os adultos (Spengler, 1993 [1931]). A fraca determinação do comportamento
humano pelos instintos significa também, usando um linguajar mais filosófico,
que o homem "nasce livre". Essa "liberdade" é desde cedo um desafio, pois cada
indivíduo confronta-se com a possibilidade do fracasso dos seus esforços de
assimilar as estratégias de sobrevivência com sucesso. Também não parece tão
evidente que as práticas tradicionais são as mais indicadas em qualquer
situação. Infância e juventude são, em maior ou menor intensidade, o palco da
contestação das regras herdadas. O mundo em permanente mudança não permite a
fixação da ação daquele que quer sobreviver, também, em contextos
transformados. A resposta à mudança externa é a inovação da tática de vida, e
os exemplares juvenis das espécies tendem a "brincar" com as possibilidades
abertas. "Brincando com o fogo" descobriu o homem sua utilidade, e garantiu sua
sobrevivência em áreas atingidas por choques climáticos. A fraca determinação
instintiva do ser humano fez da "raça humana" a ponta de uma variação evolutiva
da vida orgânica capaz de penetrar os mais diversos espaços. O homem é o Ser
que possui entre os Seres a mais íntima ligação com a possibilidade de poder
ser diferente, de poder viver diferente. A diferenciação das suas táticas e
estilos de vida nasce da sua incapacidade de se entregar plenamente a uma
determinação biológica, característica para todas as outras espécies. O homem
fez da contingência sua vida, ou deveríamos dizer o contrário? A vida fez do
homem o guardião engenhoso da contingência.
O Ser é contingente
O conceito de contingência é ambíguo; importante lembrar, mais uma vez, que
concernea um só tempoà necessidade e à possibilidade. Na passagem para os
tempos modernos, podemos observar a exploração cada vez mais sistemática do
lado necessitário do Ser. O que entendemos hoje como ciência é um conjunto de
conhecimentos sobre regularidades tanto morfológicas como processuais. Essas
regularidades fascinaram os primeiros cientistas, cujos novos conhecimentos
abriram caminho para as primeiras experiências científicas, pois o Ser, na
medida em que segue suficientemente regras causais, é conhecível e manipulável.
Os grandes sucessos da tecnociência na Revolução Industrial encontram aí sua
base.
Não obstante, nunca deixou o Ser sua qualidade de ser plenamentecontingente ' e
não somente necessitário ', lembrando, quando o homem menos espera, do seu
caráter aberto. Essa "abertura" do Ser não desmente as chamadas leis da
natureza, as quais, todavia, sofrem uma reinterpretação que limita a sua
validez a determinados distritos de realidade (Heisenberg, 1989 [1939]). Da
perspectiva atual, podemos observar, nas primeiras décadas do século XX, uma
convergência do pensamento vanguardista tanto do campo da física como da
filosofia; convergência que também se expressa em inúmeras produções literárias
e artísticas e se refere a um novo entendimento do Ser (e de ser). Einstein,
Planck e Heisenberg expressam essa ruptura semântica com os meios da física, ao
passo que Heidegger e Sartre empregam os instrumentos discursivos da filosofia
para afirmar que o Ser não tem fundamento. "Sein bleibt als Sein grund-los"
(Heidegger, 1992 [1957], p. 185).
Heidegger apresenta o homem, em Ser e Tempo, como lançado para dentro do mundo.
Sendo, o homem está "aí", "no mundo", "com os outros", "fatual", "histórico" e
"preocupado", porque está condenado a existir sabendo da sua temporalidade (o
que inclui a consciência da possibilidade da própria morte em qualquer
instante) e das suas condições existenciais, circunstanciais e limitadas
(Heidegger, 1993 [1927]). O Ser-aí é sem poder ter escolhido estar aí. Não há
condenação mais dramática do que essa à própria existência ' temática bastante
explorada na obra literária de Sartre. Heidegger, muito antes de Sartre,
apresenta a existência do selfcomo "possibilidade necessitária", dizendo:
"Dasein istje seine Möglichkeit [ ]" (SuZ, 42) ["O Ser-ai é sempre a sua
possibilidade"]; "Und weil Dasein wesenhaft je seine Möglichkeit ist,
kanndieses Seiende in seinem Sein sich selbst wåhlen, gewinnen, es kann sich
verlieren, bzw. nie und nur scheinbar gewinnen [ ] (SuZ, 42) ["E por que o ser-
aí é sempre essencialmente sua possibilidade é que ele pode, em seu ser, isto
é, sendo, escolher-se', ganhar-se ou perder-se ou ainda nunca se ganhar ou
somente se ganhar aparentemente'" (Idem, p. 78)]. Critério para a escolha do
ganho ou da perda é a categoria da autenticidade, que funciona como um redutor
de complexidade, ou um meio da Möglichkeitsbåndigung(domesticação das
possibilidades) no mar das livres escolhas entre perdas e ganhos (Makropoulos,
1990). No entanto, o que nos interessa mais neste momento é que a ontologia
fundamental de Heidegger, e, a partir de então, de toda a filosofia e a
literatura existencialista, apresenta o Selfcomo um ser que é a sua própria
possibilidade. Isso não quer dizer o mesmo que teruma possibilidade. Quando
tenho uma possibilidade, fica ela, assim dizer, fora de mim, e eu posso
realizá-la ou não. No entanto, quando soua minha possibilidade, ganha ela um
fundamento necessário, que, todavia, está aberto, porque é permeado por
possibilidades a serem escolhidas, ou não. Sartre cunhou essa compreensão da
existência humana na conhecida fórmula: "O homem é condenado a ser livre".
Usando uma contradição em si, pois a liberdade não pode se derivar de uma
condenação, fala Sartre daquilo que é caro, também, para Heidegger, isto é, a
descrição do homem como um ser contingente.
Padrões de possibilidade
A afirmação "tudo é possível" tem mais a função de despertar a nossa mente para
a variedade de trajetórias e estados possíveis do que expressar adequadamente o
campo dos acontecimentos. Na verdade, não é "tudo" que é possível, mas é
possível muito mais do que a mente comum acha que seja. A possibilidade,
também, não cai do céu como um meteorito cai no nosso jardim, apesar de
surpreender o sujeito que foi atingido por ele. A surpresa cria freqüentemente
a impressão da completa falta de regras, que, todavia, não deixam de existir
para determinados distritos da realidade. Devemos lembrar que a existência de
regularidades do comportamento das coisas faz com que elas sejam passíveis de
manipulações técnicas e insightscientíficos.
Nem tudo é possível, mas muito mais do que nós comumente imaginamos. Sabemos
muito pouco sobre o possível. Este conhecimento incipiente leva-nos, às vezes,
a esperar demais, às vezes a esperar de menos ou, em outros momentos, a esperar
coisas impróprias. Esperamos, por exemplo, do campo político a realização de
possibilidades e expressamos essa esperança em utopias políticas. Mas a
contingência do campo histórico não é u topos, nenhum lugar. O lugar da
historia humana é limitado temporal e fisicamente; é limitado em qualquer uma
das suas dimensões culturais, econômicas e sociais, embora continue sendo um
campo aberto. Estudos sobre as nossas possibilidades (reais) distinguem-se
nitidamente de utopias políticas, porque elas trabalham com probabilidades ou
padrões de possibilidades e não partem do desejo, que é um potente gerador de
fantasias prazerosas. Fantasias são uma expressão dos padrões de possibilidades
da nossa mente; no entanto não constam no arsenal das possibilidades da
realidade social.
Em outras áreas podemos observar, nos últimos tempos, grandes avanços
referentes à percepção de padrões de possibilidades, relevantes para a
sociedade. Assim, depois de uma fase meramente reativa, quando se tratava de
catástrofes, surgem a cada ano mais estudos sobre suas causas, para chegar a um
mínimo de planejamento e ação preventiva. Nesse contexto, ganhou o conceito
ampliado de risco bastante relevância, pois permite trabalhar com cenários
catastróficos dentro dos padrões de possibilidades de cada caso. Estudos sobre
riscos concernem a um determinado campo de eventos onde estão em jogo perdas
indesejadas. A contingência do Ser permite que possamos cercar tais riscos com
meios probabilísticos, permite que possamos trilhar caminhos menos arriscados.
Possibilidade, no entanto, não deve ser confundida com probabilidade, assim
como probabilidade não é sinônimo de contingência.
O pensamento probabilístico é útil para descrever o comportamento de grandes
conjuntos. A taxa de mortalidade por faixa etária, por exemplo, informa a
seguradora sobre o "tempo de vida residual" (Restlebenszeit) do segurado. Para
o sujeito em si, esses dados dizem relativamente pouco, pois "a morte está à
espreita debaixo de tudo" (Malcolm Lowry, 1981 [1947], p. 266); do ponto de
vista do indivíduo, a "expectativa de vida" de morrer tem uma probabilidade de
100%; e até a consumação deste fato inevitável o sujeito vive com a consciência
do risco de uma morte súbita a qualquer momento. Para ele, a probabilidade não
expressa a realidade individualmente vivida. Não obstante, ela alimenta a
consciência do risco (ou da chance) com informações (ou expectativas) dentro
dos padrões de possibilidades de um organismo vivo. O possível é o companheiro
fiel do necessário, lembrando o indivíduo da sua presença quando achar
oportuno.
Para finalizar...
Falar da contingência não pode significar que o mundo está à disposição plena
do homem. Muito pelo contrário, a contingência remete exatamente àquilo que
Heidegger denominou o "segredo do Ser". As manifestações variadas do Ser fazem
esquecer que o Ser desses Seres escapa de um acesso científico e técnico pleno.
A perspectiva da ciência e da técnica é sempre científica e técnica; nós não
podemos observar o que não podemos observar, diria Luhmann. Heidegger introduz
o conceito do desocultamento técnico para caracterizar o acesso específico e
reduzido da técnica moderna àquilo que é (Brüseke, 2000 e 2001).
A contingência parece ser um conceito impossível, uma vez que viola a lei da
lógica aristotélica que expulsa a contradição e exige identidade. Algo é ou não
é; nunca pode ser e não ser ao mesmo tempo. Por isso, a lógica formal
apresenta, em relação à contingência, seus problemas. Quem quer compreender o
que a constatação da contingência do Ser significa vai, em certo momento, tomar
uma atitude mais contemplativa, com a qual o pensar se abre para aquilo que
está aberto. A viagem na direção do aberto do Ser deixa, a partir de um dado
momento, a linguagem científica para trás
Nossa referência a Tomas de Aquino e sua leitura "às avessas" podem ajudar a
recuperar o sentido do contingente, ou seja, é contingente devido a seu
condicionamento pelo incondicionado. Integrando o incondicionado no
condicionado, como sugere Heidegger a respeito do aberto do Ser, descobrimos,
além do horizonte plástico da consciência moderna, algo que tínhamos esquecido
' a bifurcação entre o plástico e o aberto do Ser é o lugar onde nos
encontramos; tomar o caminho certo é uma chance, perdê-lo é, por assim dizer,
um risco.