Filmes Finos & Revelação de Impressões Digitais Latentes
Introdução
As ciências forenses e criminais desempenham uma função essencial no sistema de
justiça, ao fornecer informação científica fundamental para a investigação
criminal e para os tribunais. O trabalho laboratorial em ciências forenses e
criminais é direccionado para o reconhecimento, identificação e avaliação de
vestígios físicos, nomeadamente impressões digitais, recorrendo a um conjunto
de ciências, em particular à Ciência de Materiais. Este importantíssimo campo
científico, sendo o resultado da sinergia de diferentes campos do saber,
representa actualmente uma área disciplinar própria, leccionada ao nível do 1º
e 2º ciclo universitário nos países mais desenvolvidos. No entanto, apenas uma
pequena parte de todos os vestígios digitais presentes em locais de crime é
detectada, pelo que a investigação com vista a melhorar e desenvolver métodos
de detecção e revelação de vestígios lofoscópicos assume um papel crucial no
campo das ciências forenses. As impressões digitais denunciam a existência de
cristas dermopapilares que são características únicas de cada indivíduo e não
sofrem alterações ao longo da vida. Estas são deixadas nas superfícies devido
aos resíduos (suor, gordura, aminoácidos e proteínas) presentes na pele dos
dedos, ficando impressa na superfície a morfologia das cristas e sulcos,
podendo ser visíveis ou invisíveis. As impressões invisíveis, designadas
impressões digitais latentes, são as mais problemáticas uma vez que é
necessário recorrer a métodos de revelação de modo a permitir a sua
visualização. As linhas descritas pelas cristas dermopapilares apresentam
pontos característicos que possibilitam a sua identificação por comparação com
impressões digitais de indivíduos com cadastro compiladas num banco de dados
digital.
A identificação através das impressões digitais continua a ser a mais utilizada
para efeitos de investigação criminal. Para além do recurso a métodos ópticos,
existem diversos métodos físicos, físico-químicos e químicos que permitem a
revelação de impressões digitais latentes em diferentes superfícies. Devido ao
elevado número de factores internos (natureza da superfície, dador, etc.) e
externos (temperatura, humidade, etc.) que vão afectar a detecção e revelação
de impressões digitais latentes, nenhum método é considerado ideal, pois
consoante o tipo de factores presentes existem métodos mais ou menos adequados.
O método ideal não existe, pelo que para cada caso é importante avaliar a
situação para escolher o método ou a combinação de métodos mais promissores e
consequentemente aquele ou aqueles que permitirão obter melhores resultados.
O trabalho proposto tem por objectivo a utilização da técnica de pulverização
catódica magnetrão (processo físico em fase de vapor) de modo a permitir a
revelação de impressões digitais latentes através da deposição preferencial de
elementos metálicos nas cristas das impressões digitais. De modo a assegurar a
deposição preferencial dos elementos metálicos nas cristas das impressões
digitais, os átomos deverão atingir o substrato com energia e velocidade
reduzidas ' átomos termalizados.
Além do propósito principal do trabalho - revelar impressões digitais latentes
- o método utilizado permite que as amostras reveladas possam funcionar como
base de dados, pois o próprio filme funciona como capa protectora impedindo a
deterioração das impressões e fixando possíveis vestígios, que poderão
posteriormente ser analisados. O depósito de um filme muito fino não compromete
a existência de partículas reveladoras (drogas, explosivos) nas impressões
digitais. Outra vantagem do método em estudo reside no facto da pulverização
catódica ser uma técnica ambientalmente benigna e pouco agressiva para os
utilizadores, ao contrário de outras técnicas utilizadas para a detecção e
revelação de impressões digitais, tal como o método dos pós.
O trabalho de investigação decorreu no Grupo de Nanomateriais e Microfabricação
do Centro de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, cujos membros
possuem uma vasta experiência na modificação de superfícies por pulverização
catódica.
A primeira fase do trabalho consistiu na selecção dos alvos metálicos e dos
substratos a utilizar no equipamento de pulverização catódica. Assim, com base
na pesquisa bibliográfica efectuada e nos alvos disponíveis, foram
seleccionados os seguintes materiais metálicos: cobre e ouro. Para substrato
foi seleccionado um material metálico, uma vez que na bibliografia consultada a
pesquisa sobre este tema recaiu em substratos de materiais poliméricos, e além
disso, os materiais metálicos são frequentemente encontrados em locais de crime
e neste tipo de superfície os métodos de detecção e revelação de impressões
digitais ditos convencionais não são tão eficazes como noutras superfícies. O
material metálico seleccionado foi um aço inoxidável austenítico 316 L (AISI
[a]) recozido e polido de um dos lados. Em algumas deposições também foram
utilizados substratos de silício. Após a selecção dos materiais a utilizar
neste estudo, filmes finos de cobre e ouro foram depositados de forma
sistemática sobre substratos metálicos onde foram colocadas intencionalmente
impressões digitais, com vista à optimização dos parâmetros de deposição
(pressão de deposição, potência aplicada ao alvo e tempo de deposição). Feita a
optimização dos parâmetros e estipuladas as condições óptimas de deposição foi
estudada a influência de alguns factores na qualidade da revelação das
impressões digitais: idade das impressões digitais, dador e teor sebáceo.
Para tal, foram depositados filmes finos em substratos cujas impressões
digitais não eram frescas (mais que um dia) e pertenciam a diferentes dadores.
A qualidade da revelação das impressões digitais foi avaliada visualmente e com
recurso à microscopia óptica e electrónica, enquanto que a morfologia e
topografia dos filmes finos de cobre e ouro foram analisadas por microscopia
electrónica de varrimento e perfilometria tridimensional, respectivamente.
O presente trabalho é composto por 3 capítulos, seguidos das principais
conclusões decorrentes da investigação desenvolvida. No primeiro capítulo é
efectuada uma breve revisão sobre vestígios lofoscópicos. Após uma nota
histórica introdutória, é feita uma primeira abordagem às impressões digitais
incluindo algumas noções de lofoscopia. Por fim, os principais métodos de
detecção e revelação utilizados nos laboratórios forenses são referenciados. No
segundo capítulo são apresentados os materiais, técnicas, equipamentos e
condições utilizados ao longo do trabalho. A técnica de pulverização catódica,
pouco familiar entre os cientistas forenses, é sucintamente descrita. Os
resultados e discussão dos mesmos constam do terceiro capítulo.
1. Breve Revisão sobre Vestígios Lofoscópicos e sua Revelação
A Lofoscopia (do grego lophos + scopia - colina + observação) tem por
objecto o estudo pormenorizado dos desenhos da pele dos dedos, da palma das
mãos e da planta dos pés, com o fim de identificar o indivíduo. Lofoscopia é,
portanto, a Ciência que estuda a identificação do ser humano através das suas
impressões dermopapilares [1]. Estes desenhos são perenes e imutáveis, isto é,
permanecem invariáveis desde o sexto mês de gestação até à putrefacção da
derme, não podendo ser modificados voluntariamente. Além disso, são
infinitamente diversiformes, já que são característicos de cada indivíduo. Com
efeito, as impressões digitais e o ADN (ácido desoxirribonucleico) são as
únicas características humanas que são únicas para cada indivíduo [2].
A análise de impressões digitais continua a ser o método de eleição na
identificação de indivíduos para efeitos de investigação forense e criminal. A
identificação pessoal através de impressões digitais é baseada em 2 critérios
[3]:
i) Os padrões das cristas presentes nas impressões digitais diferem de
indivíduo para indivíduo e ainda de dedo para dedo;
ii) Estes padrões mantêm-se inalteráveis durante toda a vida do indivíduo.
1.1 ' Perspectiva Histórica [4-6]
Há muito tempo atrás que se suspeitava que a unicidade das impressões digitais
poderia servir como método de identificação de indivíduos. Na antiguidade, na
China e Babilónia, foram encontradas impressões digitais em placas de argila
usadas como assinatura nas transacções comerciais. No século XIV, na Pérsia, os
documentos ditos do governo continham impressões digitais como assinatura [2].
A partir de metade do século XIX, técnicas alternativas de identificação
pessoal foram ganhando espaço entre os investigadores criminais. Entre elas uma
ficaria para a história: a impressão digital. As marcas das mãos e dos dedos já
eram utilizadas como uma espécie de assinatura, principalmente nas colónias do
então vasto império britânico. Em 1858, o administrador inglês William Herschel
fazia com que os seus empregados assinassem contratos com a marca das suas
mãos molhadas em tinta. Em 1877, o microscopista americano Thomas Taylor, que
trabalhava no departamento de agricultura dos Estados Unidos, sugeriu, pela
primeira vez, que os traços das mãos fossem utilizados para identificar
criminosos. A sua ideia foi publicada no American Journal of Microscopy and
Popular Science, mas não obteve grande repercussão. Foi apenas em 1880 que o
médico britânico Henry Faulds apresentou oficialmente um método de identificar
as pessoas por meio das marcas existentes nos dedos. Publicado na revista
científica inglesa Nature, o estudo de Faulds é considerado o marco inicial da
técnica de dactiloscopia (ramo da lofoscopia que estuda as impressões dos
dedos) [4]. Radicado no Japão, Faulds começou a ter interesse pelas impressões
digitais por acaso. Observando cerâmicas antigas num museu de Tóquio, ele
detectou marcas de dedos que ficaram impressas na superfície do pote durante
milhares de anos. Comparando com as marcas deixadas pelos seus próprios dedos,
Faulds percebeu que elas eram diferentes. Parecidas no conjunto, mas muito
particulares nos detalhes. Assim, enviou as suas conclusões ao famoso biólogo
britânico Charles Darwin, este enviou-as ao seu primo cientista Francis Galton.
Foi ele quem tornou a análise das impressões uma ciência, desde que percebeu
que os traços das impressões digitais possuíam características únicas em cada
indivíduo, jamais se repetiam e eram mantidos inalterados durante toda a vida
[4]. Além disso, Galton classificou as linhas das pontas dos dedos em três
tipos básicos: arcos, laços e espirais; num sistema cujos princípios perduram
até hoje.
Em 1901, o investigador inglês Edward Henry criou o departamento de
identificação por impressão digital da Scotland Yard, a polícia inglesa que
ficou famosa, entre outras coisas, por contar com os préstimos do fictício
Sherlock Holmes, personagem de Arthur Conan Doyle que, não por acaso, andava
sempre com uma lente de aumento. Foi a primeira iniciativa de se fazer um banco
de dados com as impressões digitais de criminosos para serem comparadas com as
marcas deixadas nos locais do crime. Os investigadores da Scotland Yard
perceberam que era inevitável que os criminosos deixassem as suas marcas
(vestígios lofoscópicos). Foi em 1901 que as impressões digitais foram pela
primeira vez aceites como prova em tribunal, tendo sido adoptado o sistema de
identificação por impressões digitais em Inglaterra e no País de Gales [5].
Em 1911, o advogado criminalista francês Edmond Locard propôs que 12 pontos
característicos coincidentes bastavam para identificar uma impressão digital.
Hoje, cada país adopta um número diferente de pontos para a identificação
positiva [4].
Em mais de um século de uso, o método obteve sucessos históricos, mas também
cometeu erros grotescos. Desde a descoberta, evoluiu muito e, hoje, diversas
polícias no mundo usam um Sistema Automatizado Integrado de Identificação de
Impressão digital (IAFIS[b]). O IAFIS é composto de dois subsistemas que
processam buscas, armazenam e recuperam informação das bases de dados: o
subsistema de armazenamento e recuperação de imagens e o subsistema de
processamento de buscas. Nos estados unidos, o FBI tem um banco digital com
mais de 54 milhões de impressões digitais de pessoas com cadastro [4,6].
1.2 ' Impressões Digitais
Observando os dedos é visível um conjunto de altos, designados por cristas
dermopapilares (nervuras ou linhas), que desenham diferentes padrões. A
impressão digital é a representação gráfica do conjunto de cristas e sulcos
observados na última falange. Na figura 1.1 é apresentado o pormenor das
cristas dermopapilares e a estrutura da pele. Estas cristas funcionam como
antiderrapantes; se as nossas mãos (e também os pés) fossem lisos os objectos
escorregavam com muito maior facilidade.
Figura 1.1 ' Estrutura da pele [7].
Quando se toca numa superfície são deixados resíduos de gordura, suor,
aminoácidos e proteínas. São esses resíduos que permitem obter as impressões
digitais. As impressões digitais são depositadas nas superfícies de uma forma
mais ou menos contínua de acordo com a morfologia das cristas e contêm uma
grande variedade de químicos. A espessura dos resíduos que são depositados nas
superfícies é de apenas poucos micrómetros, e após um período de 1-2 meses
ocorre secagem e evaporação dos químicos presentes [8]. As impressões papilares
podem ser formadas de forma distinta [3]:
i) Impressão moldada ' por decalque do dedo numa superfície macia (pomada,
cera, etc.) ou assentamento numa substância que possa aderir às cristas
(poeira, tinta e verniz frescos, etc.) é possível formar uma impressão;
ii) Impressão visível ' as cristas papilares de um dedo contaminado com um
material colorido (tinta, sangue, poeira) têm a propriedade de se reproduzir
desde que postas em contacto com uma superfície adequada;
iii) Impressão latente ' quando um dedo toca numa superfície, os poros das
cristas dermopapilares depositam resíduos (segregações) de transpiração. Estes
resíduos consistem maioritariamente em água (99%) e o restante em sais
inorgânicos (NaCl) e substâncias orgânicas (ureia). O suor dos dedos faz com
que as cristas sejam reproduzidas se forem apoiadas em superfícies aptas,
resultando impressões invisíveis ou fracamente visíveis à luz directa, por não
haver contraste entre a matéria das impressões e a cor do seu suporte.
De entre os 3 tipos de impressões possíveis de encontrar em locais de crime, as
marcas latentes são as mais comuns e as mais problemáticas. A aplicação de
técnicas ópticas, químicas, físicas e físico-químicas é necessária para a sua
visualização. Os vestígios lofoscópicos são frequentemente encontrados
fragmentados, distorcidos, manchados, o que dificulta a sua visualização. Tem
de se ter em conta que são muitos os factores que influenciam a qualidade da
impressão digital latente (elasticidade da pele, pressão exercida, natureza da
superfície, etc.), fazendo com que esta seja diferente da impressão digital
padrão depositada sob condições controladas para efeitos comparativos.
Sendo os vestígios lofoscópicos latentes constituídos normalmente por uma
mistura de secreções naturais de várias glândulas na pele, podem ser também
muitas vezes contaminados por outras substâncias existentes no ambiente e que
ficam agarradas à pele dos indivíduos [9]. Factores tais como a temperatura, a
exposição à luz e à água e a humidade relativa alteram a natureza química e
física de um vestígio digital [9]. Assim, a qualidade da revelação dos
vestígios lofoscópicos latentes depende de vários factores: quantidade de suor,
gordura, secreções presentes, natureza da superfície, temperatura, humidade,
pressão exercida, etc. [10,11].
De acordo com o sistema de classificação de Edward Henry, as impressões
digitais podem ser agrupadas nos 3 tipos básicos representados na figura 1.2:
laços, espirais e arcos.
Figura 1.2 ' Linhas padrão básicas das impressões digitais: a) Laços; b)
Espiral; c) Arco [12].
Cada um destes padrões tem pontos característicos que servem para classificação
e identificação das impressões digitais. Com efeito, as linhas de uma impressão
digital nem sempre são contínuas nem independentes umas das outras; isto é,
bifurcam, convergem, são interrompidas ou estão simplesmente reduzidas a um
ponto. Estas particularidades ou acidentes morfológicos das linhas papilares,
são os chamados pontos característicos, dos quais se destacam os pontos
esquematizados na figura 1.3. Os padrões tipo arco não apresentam nenhum
centro, nem delta, como os padrões tipo laço e espiral.
Figura 1.3 ' Características típicas de impressões digitais em laço e espiral
[12].
Para que uma impressão digital tenha valor identificativo, não é necessário que
represente toda a superfície digital; a parte ou fragmento que for reproduzido
deve apresentar um número suficiente de pontos característicos. Além dos pontos
característicos de cada padrão, na identificação das impressões digitais é tido
em conta o posicionamento relativo dos vários pontos característicos. Existe
alguma divergência no que respeita ao número de pontos característicos
coincidentes para se poder afirmar a identidade entre duas impressões. No
entanto, a prática continuada ao longo de muitos anos tem demonstrado que dez
coincidências sem dissemelhanças morfológicas ou topográficas são suficientes
para assegurar que duas impressões digitais foram produzidas por igual região
papilar de uma mesma pessoa [1]. Em Portugal, são necessários 13 pontos
característicos coincidentes para identificação positiva. A forma e
distribuição dos poros existentes nas cristas tem igualmente valor
identificativo, mas a resolução das imagens dos vestígios lofoscópicos nem
sempre é adequada. Entre 20 a 40 poros coincidentes deverão ser suficientes
para determinar a identidade de um indivíduo [7]. No entanto, a informação
contida a este nível ainda não é considerada pelo sistema de identificação
IAFIS.
Mais de 1 século depois, desde que foi adoptado o sistema de identificação
legal por impressões digitais, a detecção e identificação das impressões
digitais ainda continua a ser a técnica mais usada nas investigações criminais,
por serem consideradas assinaturas biométricas, únicas e invariáveis, de um
indivíduo.
1.3 ' Detecção e Revelação de Vestígios Lofoscópicos Latentes
Apesar de existirem muitos métodos usados pela polícia para detectar impressões
digitais, existe um grande grupo de superfícies em que nenhum dos métodos é
adequado. Para que sejam desenvolvidas novas técnicas é essencial que as
propriedades físicas e químicas das impressões digitais sejam conhecidas, uma
vez que, a detecção das mesmas é baseada na exploração das diferenças entre a
natureza física e química das impressões digitais e as superfícies subjacentes.
A preservação dos vestígios lofoscópicos latentes é crucial para o exame eficaz
de objectos em, e provenientes, dos locais do crime. Isto significa que se deve
ter especial cuidado no manuseamento e empacotamento desses elementos de modo a
evitar danos nos vestígios lofoscópicos existentes.
Para seleccionar qual o melhor método e sequência a adoptar deve ter-se em
conta, em primeiro lugar, a superfície em que vão ser revelados os vestígios
lofoscópicos. Se um método falhar, outro poderá ter êxito. Quando são
utilizados vários métodos deve ser seguida a sequência correcta uma vez que, se
for utilizado em primeiro lugar o método errado, este poderá danificar os
vestígios latentes que poderiam ter sido revelados por outro método. Os
vestígios revelados devem ser fotografados ou cobertos, conforme o caso, antes
do tratamento seguinte. Sempre que possível, devem ser aplicados localmente
tratamentos separados. Todos os vestígios úteis devem ser fotografados depois
de cada processo, uma vez que poderão ser danificados ou destruídos por um
tratamento posterior [9]. Uma variedade de técnicas tem sido usada para
melhorar a visibilidade das impressões digitais latentes. Para além do recurso
a métodos ópticos, existem diversos métodos químicos, físico-químicos e físicos
que permitem a revelação de vestígios lofoscópicos latentes. A escolha do(s)
método(s) mais adequado(s) depende de vários factores, como sejam, a natureza
da superfície, a presença de contaminantes e factores ambientais. Alguns destes
métodos são de seguida sucintamente descritos, pondo em evidência as suas
principais vantagens e desvantagens.
1.3.1 ' Métodos Ópticos
Exame por Fluorescência.
A fluorescência é a propriedade que alguns químicos possuem de serem capazes de
absorver a luz de uma cor específica e de, em seguida, converterem alguma desta
energia absorvida, em luz de uma cor diferente de maior comprimento de onda. O
tempo que medeia entre a absorção e a emissão é apenas uma fracção de segundo,
de modo que quando a luz iluminante é retirada, a emissão aparentemente pára
[9]. Alguns dos constituintes químicos que aparecem nas impressões digitais,
bem como algum tipo de contaminação decorrente do ambiente e, subsequentemente,
depositados nas impressões digitais, fluorescerão com iluminação adequada
[9,13]. Esta fluorescência poderá ser visível à vista ou poderá ocorrer nas
gamas de infra vermelho (IV) ou ultra violeta (UV) onde são necessários outros
tipos de detectores. Habitualmente, a superfície a ser examinada é iluminada
com luz visível de baixo comprimento de onda (azul, verde) e/ou ultravioleta. A
superfície é, então vista através de filtros que transmitem luz apenas de um
comprimento de onda. Poderão ser utilizados tratamentos que façam com que as
impressões digitais fluoresçam de uma forma mais intensa [9].
1.3.2 ' Métodos Químicos
Ninidrina
A ninidrina é uma substância que é apresentada sob a forma de cristais branco/
esverdeado e reage com o componente dos aminoácidos presentes nos resíduos
deixados pelas impressões digitais (secreção écrina), dando um produto de cor
púrpura conhecido por púrpura de Ruhemann [8,9,11]. As reacções químicas
envolvidas são complexas e, como resultado, as condições de revelação precisam
de ser controladas. O método é muito eficaz para a revelação de vestígios
lofoscópicos em superfícies porosas, tais como o papel [9]. A revelação com
ninidrina pode ser afectada por factores como a temperatura, humidade, pressão
exercida pelo dedo na superfície de contacto, tempo de contacto e quantidade de
suor transferido. Actualmente existem reagentes que actuam de modo idêntico à
ninidrina.
1.3.3 ' Métodos Físico-Químicos
Evaporação de cianoacrilato
O cianoacrilato líquido forma um vapor que reage com certos componentes de uma
impressão digital. O vapor é polimerizado selectivamente nas cristas
dermopapilares formando um polímero branco [9]. As impressões digitais
gordurosas (com elevado componente sebáceo) parecem ser particularmente
sensíveis ao vapor de cianoacrilato. Esta técnica é eficaz na maioria das
superfícies não porosas, em especial as plásticas [9]. O contraste produzido
por impressões digitais reveladas com esta técnica pode ser melhorado pela
aplicação de um agente corante ou luminescente.
Deposição Multimetal (MMD[c])
O uso de ouro coloidal no domínio das ciências forenses, nomeadamente como
método de detecção de impressões digitais latentes, foi introduzido por G.
Saunders em 1989 [14]. Esta técnica, designada deposição multimetal, compreende
dois estágios: i) imersão do objecto a tratar numa solução coloidal de ouro
(componente activo); ii) reforço das impressões detectadas através do uso de um
revelador físico. Posteriormente este método foi optimizado por P. Margot e
seus colaboradores [14,15]. A vantagem deste método reside na sua
sensibilidade, particularmente com impressões digitais antigas. Acresce ainda
o facto de poder ser utilizado em diferentes superfícies, porosas e não
porosas. No entanto, a deposição multimetal requer um elevado número de banhos
e reagentes, traduzidos por um trabalho aturado e por um elevado custo.
Recentemente, impressões digitais reveladas por este método têm sido observadas
por microscopia electroquímica de varrimento [16,17].
1.3.4 ' Métodos Físicos
Revelação por Pós
O método dos pós utiliza reagentes sólidos, sob a forma de pós que aderem às
substâncias transmitidas por meio das cristas dermopapilares, uma vez que estas
têm propriedades de aderência superiores às da superfície que suporta os
vestígios lofoscópicos [3,18]. O pó considerado ideal para a revelação de
impressões digitais deve aderir unicamente aos resíduos deixados pela
impressão, os quais dão informação sobre as características padrão que a
identificam. Desde o início do século XX, este método tem sido muito usado na
revelação de impressões digitais latentes [3]. Existem vários tipos de pós
(magnéticos, fluorescentes, etc.) para a revelação de vestígios latentes, dos
quais se tem destacado o pó de alumínio aplicado com uma escova fina de fibra
de vidro [3,18]. Com vestígios recentes, o componente aquoso do vestígio
contribui de uma forma significativa para adesão dos pós, enquanto que, com
vestígios mais antigos, os pós aderem, principalmente, aos depósitos gordos do
suor sebáceo. A eficácia deste método é variável, dependendo da natureza
química e física do pó, do tipo de aplicador e dos cuidados e perícia do
operador. A maior parte dos dados disponíveis indica que, em muitas
circunstâncias os pós em flocos são mais sensíveis do que outro tipo de pós.
Inicialmente a escolha dos pós e os modos de aplicação foram feitos de modo ad
hoc. Posteriormente, foram desenvolvidos estudos com o objectivo de estabelecer
o mecanismo de adesão dos pós às cristas dermopapilares, permitindo o
desenvolvimento de modos de aplicação dos pós menos interactivos do que o uso
de escovas convencionais [3]. Com efeito, a aplicação dos pós com escova
(pincel) pode danificar mecanicamente as cristas das impressões digitais [8].
Os vestígios revelados por pós podem ser transplantados com fita adesiva
transparente adequada para lamelas de vidro, para papel fotográfico
contrastante com o pó utilizado ou para folhas de mica transparente, para
posterior triagem e fotografia em instalações adequadas [9].
Deposição de Metais em Vácuo (VMD[d])
A deposição de revestimentos finos ou filmes sobre um material tem por
finalidade alterar as suas propriedades superficiais. O desenvolvimento das
técnicas de deposição tem permitido que o leque de aplicação abranja áreas tão
diversificadas como a indústria mecânica, a (micro)electrónica, biomedicina, e
neste caso as ciências forenses. Com efeito, através da deposição em vácuo é
possível revelar impressões digitais latentes. A deposição de um filme sobre a
impressão digital permite igualmente fixar vestígios de explosivos ou
estupefacientes que posteriormente poderão ser analisados. O uso de técnicas de
espectroscopia na análise de vestígios de drogas e explosivos nas impressões
digitais latentes possibilita a obtenção de informação inteligente e estilo de
vida sobre o dador da impressão [19]. A detecção de impressões digitais com
rastreio de explosivos ou estupefacientes constitui uma vantagem do método de
deposição de metais em vácuo relativamente a outros métodos de revelação que
destroem estes vestígios. Quando o objectivo é produzir filmes de reduzida
espessura, sem aquecimento significativo do substrato, as técnicas de deposição
em fase de vapor (PVD[e]) são as mais adequadas [20]. De entre estas técnicas
destacam-se a evaporação e a pulverização catódica de metais puros, cuja
utilização, sobretudo da primeira, na revelação de impressões digitais tem sido
referenciada na literatura [10,21-25].
Evaporação
A técnica de evaporação de metais em vácuo tem sido usada desde meados da
década de 70 nos laboratórios forenses para revelação de vestígios lofoscópicos
latentes em superfícies não porosas, tais como plásticos [10,21]. Esta técnica
é considerada mais sensível que a evaporação de cianoacrilato, a qual é
frequentemente utilizada na revelação de vestígios latentes em superfícies não
porosas. A maior sensibilidade da técnica de evaporação em vácuo, face à
evaporação de cianoacrilato, é especialmente evidente quando os vestígios são
antigos ou tenham sido expostos a condições ambientais adversas [22-24]. A
evaporação não tem sido largamente usada na detecção e revelação de vestígios
lofoscópicos latentes devido aos elevados custos do equipamento e manutenção, e
à necessidade de técnicos habilitados de modo a garantir o funcionamento
adequado do equipamento e permitir a optimização das condições de deposição
[22,23].
O método de evaporação em vácuo tem por base uma propriedade invulgar dos
elementos metálicos do grupo 12 da tabela periódica: zinco, cádmio e mercúrio
[24]. Em vácuo, os átomos destes metais não se depositam em superfícies não
metálicas, a não ser que uma das seguintes condições ocorra [23,24]:
i) a superfície está a temperaturas muito baixas (abaixo de -100ºC);
ii) a superfície apresenta à partida locais de nucleação de outro metal.
Assim, o método de revelação por evaporação envolve a deposição de ouro seguida
da deposição de zinco (ou cádmio) sob vácuo [22-24]. Os locais de nucleação do
ouro têm a forma de pequenos aglomerados (clusters) e são geralmente
considerados os mais adequados para preparação da superfície, quando é
utilizado o zinco na segunda deposição [24].
O primeiro estágio desta técnica consiste na deposição de uma fina camada de
ouro em toda a superfície à excepção das cristas das impressões digitais onde a
deposição é inibida devido à presença de gordura e suor [3,8]. O ácido
esteárico, um dos componentes das impressões digitais, é conhecido por inibir a
condensação de ouro [8]. De seguida, é depositada uma camada mais espessa de
zinco ou cádmio de modo a revelar as impressões digitais pela negativa, já que
estes metais apenas crescem nos locais onde existem núcleos de ouro, ou seja,
em toda a superfície excepto nas cristas das impressões digitais [22-24]. As
cristas ficam transparentes enquanto o fundo da superfície, incluindo os vales
entre elas, ficam cobertos por uma camada de zinco ou cádmio. A camada de ouro
que é formada no primeiro estágio do processo é extremamente fina e
descontínua. A estrutura e espessura do filme de ouro (o tamanho, a forma e a
densidade dos clusters de ouro) são determinantes para o tipo de ligação do
zinco à superfície e consequentemente influenciam a qualidade de revelação
[23].
Pulverização Catódica
A pulverização catódica (sputtering em inglês) é uma técnica de deposição em
fase de vapor, que ocorre a pressões mais elevadas e com velocidades atómicas
inferiores quando comparada com a evaporação. Dependendo das condições de
deposição adoptadas, sobretudo da pressão e da potência/corrente, os átomos
ejectados do alvo podem ficar termalizados, ou seja, apresentar energia e
velocidade muito baixas ao atingir o substrato.
Até ao momento a bibliografia sobre revelação de impressões digitais através da
técnica de pulverização catódica é escassa. De facto, na literatura disponível
apenas foi encontrado um artigo. K. Kent e M. Stoilovic [25] demonstraram que
ocorre deposição preferencial nas cristas das impressões digitais utilizando a
técnica de pulverização catódica em corrente contínua, embora não apresentando
nenhuma explicação teórica para o sucedido. O método foi usado com sucesso na
revelação de impressões digitais latentes depositando filmes metálicos sobre
substratos de polietileno. Neste trabalho foram testados 4 alvos metálicos
puros: cobre, zinco, platina e ouro. Para limitar ao máximo o número de
variáveis, só foi usado um dador e o dedo escolhido foi o médio. As impressões
digitais foram colocadas no interior de sacos (12 cm x 10 cm) de polietileno
para evitar contaminação [25]. Após revelação as impressões digitais foram
observadas e fotografadas.
Algumas fotografias das impressões digitais reveladas foram tiradas com uma
ampliação de 50 x, para mostrar a deposição preferencial em maior detalhe. Na
figura 1.4 é possível confirmar que cada um dos metais é depositado
preferencialmente ao longo das cristas, de forma nem sempre homogénea e
mostrando claramente os poros [25].
Figura 1.4 ' Fotografias de impressões digitais reveladas utilizando: a)
cobre; b) ouro [25].
A comparação entre as revelações utilizando filmes produzidos a partir dos 4
alvos permitiu concluir que a platina e o ouro apresentavam melhores resultados
face ao cobre e ao zinco, embora todos eles possibilitassem a revelação de
impressões digitais frescas (recentes). Seguidamente, foram estudadas
impressões com 1 mês utilizando filmes de ouro e platina, apresentando os
últimos melhores resultados [25]. Por último, a deposição de filmes de platina
foi comparada com um dos métodos mais comuns: evaporação de cianoacrilato, para
a revelação de impressões digitais com 1 ano de idade. Mais uma vez, a
revelação através da deposição de um filme fino de platina se revelou mais
eficaz. Este resultado foi justificado pelo facto de na pulverização catódica
as impressões digitais serem reveladas por átomos de platina, ao invés da
evaporação de cianoacrilato que revela as mesmas através de moléculas de
cianoacrilato. Tendo os átomos de platina dimensões muito inferiores quando
comparados com as moléculas de cianoacrilato é esperado que consigam detectar
quantidades inferiores de resíduos e segregações [25]. Apesar dos resultados
apresentados serem promissores e ao contrário do que era proposto, até à data
este trabalho não teve continuidade.
Apesar de todas as técnicas existentes, subsiste a necessidade de serem
desenvolvidos novos e mais eficientes métodos de detecção de impressões
digitais latentes [26]. Neste contexto, recentemente têm surgido na literatura
referências ao uso de nanopartículas na detecção e revelação de vestígios
lofoscópicos latentes [2,26-29]. As nanopartículas têm dimensões muito
inferiores às partículas convencionais usadas na detecção de impressões
digitais, as quais têm tamanhos da ordem de 1-10 μm [26]. Com efeito, o actual
desenvolvimento dos nanomaterais e nanotecnologias tem também repercussões no
campo das ciências forenses e, no futuro, poderá contribuir de forma decisiva
na detecção de vestígios lofoscópicos. Contudo, a implementação de técnicas com
base em nanotecnologia na resolução de casos forenses rotineiros requer ainda
mais pesquisa e investigação. De salientar que o desenvolvimento de
nanomateriais levanta muitas questões ainda por responder e preocupações quanto
às suas consequências para o ambiente e saúde humana.
Na literatura recente, tem sido feita referência ao uso de nanopartículas de
ouro, prata, óxidos de zinco e titânio, selenieto de cádmio e sulfureto de
zinco utilizando diferentes abordagens, das quais se destacam a deposição
multimetal e a observação directa com luz ultravioleta [26-29].
2.Materiais e Métodos
Neste capítulo são apresentados os materiais utilizados, assim como as técnicas
e os procedimentos experimentais referentes à deposição e à caracterização dos
filmes finos utilizados na revelação de vestígios lofoscópicos.
2.1 ' Materiais
Na técnica de pulverização catódica é designado por alvo o material a partir do
qual vai ser depositado um filme sobre uma fase condensada que fisicamente o
vai suportar e que é designado por substrato [30]. O alvo e o substrato
funcionam como eléctrodo negativo e positivo, respectivamente.
2.1.1 ' Alvos
Na deposição dos filmes finos foram usados alvos metálicos puros, de cobre
(pureza 99,95 %) e de ouro (pureza 99,95 %), ambos com um diâmetro de 50 mm.
Para cada alvo houve necessidade de seleccionar as condições de deposição mais
adequadas.
2.1.2 ' Substratos
Neste trabalho foram utilizados 2 tipos de substrato, aço inoxidável 316L (AISI
[f]) e silício. O aço foi utilizado como substrato na revelação de impressões
digitais, já que em superfícies metálicas os resultados da revelação de
vestígios lofoscópicos por técnicas mais convencionais nem sempre são
satisfatórios [9]. A composição química do aço 316L em peso é Fe/ Cr 18/ Ni 10/
Mo 3 e este foi fornecido pela Goodfellow, em lâminas com dimensões de 90 x 210
mm, com uma espessura de 0,9 mm. O aço já estava recozido e polido numa das
faces. O silício foi usado como substrato na optimização dos parâmetros de
deposição e de modo a permitir a utilização de algumas técnicas de
caracterização, para as quais a rugosidade do aço era demasiado elevada.
Todos os substratos (aço e silício) foram limpos em banhos de ultra-sons,
sucessivamente em acetona e álcool, e posteriormente secos em corrente de ar
quente. Em alguns substratos de silício foi colocada uma gota de nitreto de
boro no centro dos mesmos, permitindo posteriormente, após o seu destacamento,
medir o degrau causado pelo filme depositado e assim avaliar a sua espessura.
2.2 ' Método de Deposição: Pulverização Catódica
A pulverização catódica é um dos métodos mais comummente utilizados para a
deposição de filmes finos. Esta popularidade é devida à simplicidade,
versatilidade e flexibilidade que envolvem este processo físico em fase de
vapor. As primeiras referências a esta técnica datam de 1852, quando Grove
observou a deposição de metal pulverizado a partir de um cátodo onde estava
aplicada uma descarga incandescente; sendo utilizada pela primeira vez no ano
de 1877 no revestimento de espelhos [31]. Desde então, a pulverização catódica
tem sofrido alterações. Esta evolução está relacionada com o desenvolvimento do
equipamento de vácuo [32]. Esta técnica é ambientalmente benigna, de fraco
impacto ambiental, não necessitando do uso de reagentes químicos nocivos.
O processo de pulverização catódica compreende três estágios:
i) Criação de uma fase gasosa;
ii) Transporte das espécies a depositar para o substrato;
iii) Deposição e crescimento do filme no substrato.
Como consequência do bombardeamento de um alvo com iões energéticos (figura
2.1) podem ocorrer os seguintes efeitos [33-35]:
i) O ião é reflectido e neutralizado no processo;
ii) São emitidos electrões secundários devido ao impacto;
iii) O ião arranca átomos do alvo.
Figura 2.1 ' Interacções iões/superfície na superfície do alvo [35].
Os átomos na fase de vapor são condensados na superfície do substrato formando
as chamadas ilhas de átomos, figura 2.2. Com a continuação da deposição, as
ilhas são desenvolvidas lateralmente levando a uma distribuição uniforme do
material por toda a superfície do substrato.
Figura 2.2 ' Interacções na superfície do substrato [35].
No presente trabalho a deposição dos filmes finos foi feita por pulverização
catódica utilizando corrente contínua e recorrendo a um campo magnético
aplicado ao cátodo (alvo) - pulverização catódica magnetrão. A função do campo
magnético é promover o uso eficiente dos electrões, de forma a produzir uma
maior ionização. O campo magnético é aplicado em concertação com o campo
eléctrico de modo a criar trajectórias obrigatórias para os electrões,
promovendo, assim, um maior número de colisões. Neste processo, o plasma está
confinado à região em frente ao alvo e os electrões ficam retidos próximo da
superfície que os emite. A principal desvantagem do modo magnetrão é a desigual
erosão do alvo, devido à concentração do plasma na zona que engloba a
trajectória dos electrões. O desgaste do alvo decorre, preferencialmente, na
zona onde se faz sentir a influência do campo magnético, o que impede a
utilização efectiva do alvo, podendo encarecer significativamente o processo se
o alvo não for recuperável ou reciclável [35].
A pulverização catódica é uma técnica de deposição em vácuo que pode ser
realizada a pressões relativamente elevadas e com átomos termalizados, ao
contrário do que sucede na evaporação. Dependendo das condições de deposição os
átomos ejectados do alvo vão sofrer colisões até chegar ao substrato, podendo
ou não ficar termalizados (muito baixa energia e velocidade) na chegada ao
substrato [20].
Neste estudo, para que ocorresse deposição preferencial dos elementos metálicos
nas cristas das impressões digitais foram aplicadas condições de vácuo de modo
a que os átomos atingissem o substrato com a mínima energia e velocidade,
vindos de diferentes direcções.
2.2.1 ' Equipamento
Após a selecção dos materiais a utilizar, os filmes foram depositados sobre os
respectivos substratos por pulverização catódica magnetrão. Foi usado um
equipamento da marca Edwards Coating System (figura 2.3).
Figura 2.3 ' Equipamento de pulverização catódica.
O sistema de deposição utilizado é formado por três partes fundamentais; o
equipamento de vácuo, a câmara de deposição e o equipamento auxiliar. O
equipamento de vácuo é constituído por uma bomba primária modelo E2M 1,5 da
Edwards e por uma bomba turbomolecular modelo EXT 70 da Edwards. A câmara de
deposição é constituída por um cilindro de vidro assente numa base de alumínio,
em que o topo é amovível, onde está presente um magnetrão circular que permite
a fixação de um alvo. O magnetrão é arrefecido por água, garantindo o
arrefecimento do alvo durante o processo de pulverização. A câmara de deposição
possui várias entradas de forma a permitir a admissão dos gases durante a
deposição. O equipamento auxiliar é constituído por uma fonte de alimentação
modelo PFG 1500 DC- Generator da Huttinger, material de controlo de pressão e
válvulas reguladoras.
2.2.2 ' Procedimento
Antes de iniciar qualquer descarga a câmara de deposição é evacuada até uma
pressão da ordem de 10-3 Pa. Os substratos são colocados no interior da câmara
de modo a que a distância intereléctrodos seja 10 cm.
Deposições para Avaliação de Espessura
Após a limpeza dos alvos, a etapa seguinte deste trabalho consistiu na
deposição para avaliação de espessura. Assim, foram depositados filmes finos
por pulverização catódica magnetrão, fazendo variar os seguintes parâmetros: a
potência (P), a pressão de deposição (Pdep) e o tempo. As condições de
deposição estão reunidas na tabela II.1. Nesta fase foram utilizados tempos de
deposição mais elevados de modo a permitir a avaliação das espessuras por
perfilometria.
Tabela_II.1
' Condições de deposição para avaliação de espessura.
Deposições para Revelação de Impressões Digitais
Como já foi dito anteriormente, todos os substratos foram limpos em banhos de
ultra-sons, sucessivamente em acetona e álcool, e secos em corrente de ar
quente. De seguida, foi colocada intencionalmente uma impressão digital em
cada substrato.
Foram feitas várias deposições para a optimização do processo de deposição.
Mais uma vez, foram depositados filmes finos por pulverização catódica
magnetrão, fazendo variar os seguintes parâmetros: a potência (P), a pressão de
deposição (Pdep) e o tempo. A todas as amostras foi feita uma observação visual
recorrendo ao microscópio óptico e posteriormente foram tiradas fotografias.
A influência da idade e dador das impressões digitais na qualidade da
revelação foi estudada. É de realçar que existem algumas condições e factores
adversos que são difíceis de controlar e reproduzir, tais como, a quantidade de
gordura e água, a presença de impurezas, a força imprimida na impressão
digital, etc [3]. De modo a perceber a influência da idade foram reveladas
impressões digitais frescas e com vários dias, desde 1 até 30 dias; ou seja,
alguns substratos após a limpeza e colocação da impressão digital foram
guardados durante o tempo estipulado para posterior deposição nas condições
definidas como ideais para cada um dos alvos. Quanto ao dador foram escolhidos:
dadores I e II do sexo feminino e dadores III e IV do sexo masculino. Os dedos
escolhidos para a recolha das impressões digitais foram o indicador e o
polegar, dando mais ênfase ao primeiro. Para posterior efeito comparativo foram
recolhidas em papel impressões digitais dos vários dadores utilizando tinta
para marcadores. Alguns exemplos destas impressões são apresentados na figura
2.4.
Figura 2.4 ' Impressão digital do indicador e polegar a) do dador I e b) do
dador III.
Durante este trabalho foram realizadas mais de 100 deposições de filmes finos,
entre o alvo de cobre e ouro. Nestas deposições são incluídas deposições para
optimização dos parâmetros, avaliação de espessura e deposições para revelação
de impressões digitais.
2.3 ' Métodos de caracterização
Para conhecer e compreender o comportamento dos filmes finos foram utilizadas
diferentes técnicas de caracterização. É de ter em conta que para o presente
trabalho o principal objectivo é ver se as impressões digitais colocadas
intencionalmente nos substratos são ou não reveladas através da deposição
preferencial de filmes finos. Assim, é dada maior relevância às técnicas de
observação visual e microscópica, em detrimento de outras técnicas.
Seguidamente são descritas de modo sucinto as técnicas utilizadas na
caracterização dos filmes finos. Além disso, são também referidos os
equipamentos e as condições de operação adoptadas neste estudo.
2.3.1 ' Perfilometria
O recurso a esta técnica teve por objectivo numa fase inicial avaliar a
espessura de filmes finos de cobre e ouro, e posteriormente estudar a
topografia de algumas amostras com impressões digitais.
Espessura
De entre as técnicas para a determinação da espessura de revestimentos, a
apalpação mecânica ou laser com recurso a um rugosímetro é muito utilizada
devido à sua simplicidade e relativa precisão. A determinação da espessura é
efectuada por medição da altura de um degrau criado intencionalmente entre o
filme e o substrato. A medição da rugosidade é feita por uma cabeça mecânica
(de diamante), ou óptica (LASER), que se desloca na superfície em análise, ao
longo de um comprimento pré-estabelecido, registando a altura a que se encontra
em cada momento do percurso.
Para a determinação da espessura dos filmes de cobre e ouro foi utilizada uma
cabeça laser do rugosímetro Perthen S4P (figura 2.5) e definido um percurso de
5,6 mm. Todos os filmes para avaliação de espessura, Cu e Au, foram depositados
sob substratos de silício monocristalino, por se tratar de um material com uma
rugosidade muito baixa e opticamente plano, permitindo a obtenção de um degrau
de fácil leitura. Esse degrau foi provocado intencionalmente com a colocação de
uma gota de nitreto de boro devido à sua fácil remoção em banho de acetona.
Contudo, o equipamento não é sensível a espessuras da ordem dos nanómetros,
pelo que para este efeito foram utilizados maiores tempos de deposição (tabela
II.1).
Figura 2.5 ' Rugosímetro Perthen S4P.
Topografia
A perfilometria 3D ao permitir mapear topografias de superfícies
tridimensionais pode por em evidência as impressões digitais ao reconstituir os
picos e vales que a constituem.
O rugosímetro Rodenstock RM600-3D (figura 2.6) utilizado permite mapear
topografias com base num sensor óptico com laser infravermelho de focagem
dinâmica. O ponto de focagem tem um diâmetro de aproximadamente 2 μm. Este
equipamento gera um ficheiro com os dados da topografia que depois são tratados
num programa de AFM [g] Gwyddion® que permite melhorar as potencialidades de
representação gráfica e obter o volume removido na placa.
Figura 2.6 ' Rugosímetro laser 3D.
2.3.2 ' Microscopia Óptica
As amostras em estudo foram observadas por microscopia óptica. O microscópio
óptico composto permite ampliações de 1000x e uma resolução de 0,2 μm [36]. O
microscópio óptico utilizado é da marca NIKON (figura 2.7), ao qual foi
acoplado uma máquina fotográfica MPEGMovie, Digital still camera DSC-550,
Cyber-shot com 2,1 Mega Pixels.
Figura 2.7 ' Microscópio Óptico.
2.3.3 ' Microscopia Electrónica de Varrimento
O microscópio electrónico de varrimento (SEM - Scanning Electron Microscope)
faz o varrimento da superfície de uma amostra por um feixe de electrões
finamente focado, modulando o brilho em cada ponto da imagem obtida num monitor
de visualização, pelo sinal emitido pela amostra. Este sinal pode ser
proveniente da emissão de electrões secundários, como resultado da interacção
entre os electrões incidentes e as orbitais dos átomos constituintes da
amostra, ou de electrões retrodifundidos. É obtida deste modo uma
correspondência entre a imagem e a região observada da amostra, dependendo a
natureza da informação contida na imagem, do tipo de electrões emitidos e do
detector utilizado [36].
A morfologia superficial e em secção transversal dos filmes de cobre e ouro foi
analisada num SEM de alta resolução com emissão de campo. Para a observação em
secção transversal, o conjunto substrato/filme foi cortado pelo lado não
revestido e partido por impacto para permitir a observação da superfície de
fractura. O microscópio utilizado foi um FEI QUANTA 400 F (figura 2.8) que em
condições ideias possui uma resolução de 1.2 nm, ao qual foi aplicada uma
tensão de 15 kV.
Figura 2.8 ' Microscópio Electrónico de Varrimento de Alta Resolução.
Algumas superfícies revestidas sobre as quais foram colocadas previamente
impressões digitais foram observadas num microscópio Philips, modelo XL30
(figura 2.9), utilizando uma tensão de aceleração do feixe electrónico de 20
kV.
Figura 2.9 ' Microscópio Electrónico de Varrimento.
3.Apresentação e Discussão de Resultados
Neste capítulo são apresentados, analisados e interpretados os resultados
experimentais decorrentes do trabalho de investigação realizado.
3.1 ' Deposições para Avaliação de Espessura
Sabendo que para ter sucesso na revelação das impressões digitais a espessura
dos filmes finos teria de ser muito pequena, e que a técnica de perfilometria
não permitia a avaliação de espessuras tão baixas foram feitas deposições com
tempos mais elevados do que o pretendido para posteriormente ser feita uma
extrapolação dos resultados. Assim, através dos perfis dos filmes de cobre e
ouro com tempos de deposição de 10 e 2 minutos, respectivamente, foram
determinadas as espessuras para diferentes condições de deposição (Tabela
III.1). O tempo de deposição foi mantido sempre constante para cada um dos
alvos, fazendo variar ou a pressão de deposição ou a potência aplicada no alvo.
Para um dado tempo e potência, com o aumento da pressão de deposição a
espessura dos filmes finos diminui. Tal como expectável, com o aumento da
potência aplicada ao alvo, para tempos e pressões de deposição constantes, a
espessura aumentou.
Tabela_III.1
' Espessura dos filmes finos de cobre e ouro.
3.2 ' Deposições para Revelação de Impressões Digitais
Como foi referido no capítulo II, foram feitas várias deposições para a
optimização do processo de deposição por pulverização catódica magnetrão,
variando os seguintes parâmetros de deposição: a potência aplicada ao alvo (P),
a pressão de deposição (Pdep) e o tempo de deposição (t). Após cada deposição,
foi feita uma observação visual à vista desarmada e com o microscópio óptico.
Com base nessa observação, as amostras foram analisadas e conforme os
resultados foram separadas pelos tipos de revelação que apresentavam: pouco
visíveis e nítidas (má revelação), visíveis e nítidas (boa revelação).
A nomenclatura escolhida para a identificação de cada uma das amostras foi do
tipo DID-X-Y-Z: Deposição de Impressão Digital-número da deposição (X = 1, 2,
)-dedo da impressão (Y = I (indicador) ou Y = P (polegar))-identificação do
dador (Z = I, II, III ou IV). Os critérios tidos em conta na avaliação da
qualidade da revelação das impressões digitais foram a nitidez e definição das
cristas. Tal como referido no capítulo 1, para que a identificação da impressão
digital seja positiva é necessário que haja correspondência, dos pontos
característicos e das distâncias relativas dos mesmos, entre o vestígio digital
latente revelado e a impressão digital padrão [1]. Todas as revelações que não
permitiram visualizar convenientemente e com algum detalhe as cristas e pontos
característicos tiveram avaliação negativa em relação à qualidade da revelação.
Pelo contrário, as revelações cujas amostras tinham uma boa definição e
nitidez, foram consideradas promissoras e com boa qualidade de revelação.
3.2.1 ' Optimização das Condições de Deposição
Foi com base nos tipos de revelação apresentados (má qualidade e boa qualidade)
que os parâmetros de deposição foram optimizados. Para ser identificada a
influência de cada um dos parâmetros de deposição na qualidade de revelação, a
cada deposição foram fixados alguns parâmetros e alterado apenas um dos
parâmetros. A optimização das condições de deposição foi efectuada tendo sempre
em conta a necessidade de ter átomos termalizados na chegada ao substrato; pelo
que a pressão de deposição foi a maior possível desde que a estabilidade do
plasma fosse assegurada [25].
Filmes finos de cobre
Tempo de deposição
Inicialmente, para os revestimentos de cobre, foram definidas condições de
pressão de deposição e potência aplicada ao alvo, e de modo a perceber qual o
melhor tempo para essas condições foi alterado o tempo em cada deposição.
Assim, para valores de densidade de potência de 5,1 W.cm-2 e pressões de
deposição de 4 Pa, o tempo variou entre 1 e 5 minutos. Após observação das
amostras o tempo escolhido como óptimo foi 1 min. Algumas amostras com tempo de
deposição superior a 1 min revelaram as impressões digitais mas apresentavam má
definição e nitidez, tornando difícil se não mesmo impossível a identificação
do dador através da correspondência dos pontos característicos. Na figura 3.1 é
feita uma comparação entre duas amostras, a primeira fotografia é exemplo de
uma boa revelação e a segunda é considerada uma má revelação.
Figura _3.1 ' Fotografias das amostras: a)DID-8-I-I (t=1min); b)DID-9-I-I
(t=5min).
Na figura 3.2 são apresentadas duas amostras preparadas com uma pressão de
deposição de 4 Pa e densidade de potência 7,6 W.cm-2, o tempo de deposição para
uma amostra foi 1 min e para a outra 2,5 min. Mais uma vez, apenas na deposição
efectuada durante 1 min foi possível revelar com sucesso a impressão digital
latente. No geral, as amostras revestidas com cobre utilizando tempos de
deposição superiores apresentavam uma tonalidade mais avermelhada do que as
com tempos de deposição inferiores, as quais apresentavam uma tonalidade mais
acobreada, como é o caso das amostras presentes nas figuras 3.1 e 3.2.
Figura _3.2 ' Fotografia das amostras: a) DID-12-I-I (t=1min); b)DID-1-I-I
(t=2,5min)
Densidade de Potência
Fazendo uma análise entre a figura 3.1 a) e a figura 3.2 a) é visível a
diferença de cor entre as amostras para o mesmo tempo e pressão de deposição e
variando a densidade de potência.
No geral, as amostras com valores de densidade de potência superiores
apresentaram uma tonalidade mais avermelhada, tal como as amostras com tempos
de deposição superiores, já que ambos os casos se traduzem numa maior espessura
dos filmes finos depositados. Nos filmes de cobre, é notória uma alteração na
tonalidade consoante a sua espessura. Para o tempo (1min) definido
anteriormente como tempo óptimo de deposição e para uma pressão de deposição 4
Pa, os valores de densidade de potência foram 5,1 W.cm-2 e 7,6 W.cm-2. Em ambas
as amostras (figura 3.3) foi conseguida a revelação dos vestígios latentes,
sendo visível a diferença de tonalidade entre as duas. A amostra DID-13-I-
I apresentava uma revelação com qualidade superior, assim o valor considerado
óptimo para a densidade de potência foi de 5,1 W.cm-2.
Figura 3.3 ' Fotografias das amostras: a)DID-12-I-I (Dens.P=7,6 W.cm-2);
b)DID-13-I-I (Dens.P=5,1 W.cm-2)
Pressão de deposição
Não foram efectuadas deposições, com o alvo de cobre, para valores de pressão
de deposição superiores a 4 Pa, pois para as condições óptimas de deposição
definidas, ocorria um fenómeno (plasma atrás do alvo) que não permitia a
deposição de filme quando a pressão de deposição era aumentada. Assim, de modo
a garantir a estabilidade do plasma nas condições testadas para o alvo de
cobre, a pressão de deposição estava limitada a 4 Pa.
A primeira ilação a apontar, é que foi possível revelar impressões digitais
presentes em substratos metálicos através da deposição preferencial de filmes
finos de cobre utilizando a pulverização catódica magnetrão. O aspecto e
qualidade dos filmes finos são influenciados pelas condições de deposição
utilizadas: pressão de deposição, densidade de potência e tempo de deposição.
Para tempos de deposição superiores a 1 min as revelações apresentaram pouca
nitidez e tonalidades avermelhadas, tornando difícil e em alguns casos
impossível a identificação pelas impressões digitais. Já as revelações com
tempos inferiores não apresentavam as cristas muito definidas relativamente aos
vales e restante superfície do substrato, e algumas amostras nem pareciam
revestidas. Com o aumento do tempo de deposição a tonalidade dos filmes finos
passava de acobreado para avermelhado. A densidade de potência teve um efeito
similar ao tempo de deposição, quando foi aumentada de 5,1 W.cm-2 para 7,6
W.cm-2 originou amostras avermelhadas, quase com um aspecto oxidado.
Filmes finos de ouro
Uma vez que o cobre e o ouro têm taxas de ejecção similares, e para efeitos
comparativos, a densidade de potência nunca foi alterada nas deposições dos
filmes de ouro, tendo sido sempre utilizado um valor de 5,1 W.cm-2.
Tempo de deposição
Numa primeira fase, para os revestimentos de ouro, foram fixadas as condições
de pressão de deposição e potência aplicada ao alvo. De modo a perceber qual o
tempo óptimo para essas condições foi alterado o tempo em cada deposição.
Assim, para valores de densidade de potência de 5,1 W.cm-2 e pressões de
deposição de 8 Pa, o tempo variou entre 0,25 e 1 minutos. As amostras com tempo
de deposição igual ou superior a 1 min revelaram as impressões digitais mas
apresentavam má definição e nitidez (figura 3.4). Do mesmo modo, no filme
depositado durante 0,25 min as cristas da impressão digital não são nítidas
como no caso dos filmes depositados com tempos intermédios (0,5 e 0,75 min).
Figura 3.4 ' Fotografias das amostras: a)DID-71-I-I (t=0,25 min); b)DID-80-I-
I (t=0,5 min); c)DID-75-I-I (t=0,75 min); d)DID-79-I-I (t=1 min).
De acordo com as fotografias da figura 3.4 foi escolhido como tempo óptimo 0,75
min, pois a amostra DID-75-I-I revelou com maior sucesso os vestígios digitais
(maior definição e clareza das cristas). O factor tempo não foi tão
determinante como no caso dos filmes de cobre, pois embora as amostras
apresentem aspectos diferentes, em todos os casos com as condições de deposição
definidas (Pdep=8 Pa; Dens.P=5,1 W.cm-2) as impressões digitais latentes foram
reveladas.
Pressão de deposição
Após encontrado o tempo óptimo de deposição, foram fixadas novamente condições
de deposição, a potência aplicada ao alvo e o tempo de deposição. Nesta fase
foi estudada a influência da pressão de deposição, fazendo-a variar entre 4 e
10 Pa. Para todas estas deposições foi utilizada uma densidade de potência de
5,1 W.cm-2 e tempo de deposição igual a 0,75 min. Os resultados foram melhores
para valores de pressão de deposição mais elevados, assim o valor de pressão de
deposição óptimo definido foi 10 Pa (figura 3.5).
Figura 3.5 ' Fotografias das amostras: a)DID-75-I-I (Pdep=4 Pa); b)DID-76-I- I
(Pdep=8 Pa); c)DID-83-I-I (Pdep=10 Pa)
Tal como nas deposições de filmes finos de cobre, a revelação de impressões
digitais através da deposição de filmes finos de ouro foi possível e, neste
caso, com melhores resultados e mais promissores. Nos filmes finos de ouro, a
alteração dos parâmetros de deposição influenciou a qualidade das revelações,
mas de uma maneira mais subtil quando comparados com os filmes finos de cobre.
Durante as deposições para optimização de parâmetros a grande maioria das
amostras foi revelada sem grandes perdas de nitidez e definição com a variação
das condições de deposição.
Com base na observação visual das amostras revestidas, foram estabelecidas como
condições de deposição ideais para a revelação de impressões digitais, as
condições apresentadas na tabela III.2.
Tabela III.2 ' Condições de deposição optimizadas para os filmes de Cu e Au.
Na tentativa de melhorar a qualidade das impressões digitais foram ainda
efectuadas deposições em que os substratos foram colocados com diferentes
ângulos de orientação (45º < ângulo <90º). No entanto, para as pressões de
deposição utilizadas não se registaram quaisquer vantagens relativamente ao
posicionamento horizontal utilizado nos restantes casos.
Na figura 3.6 são apresentadas duas amostras que foram reveladas com as
condições óptimas de deposição. Os pontos característicos são visíveis em ambas
as amostras, mas sem dúvida que a qualidade de revelação é superior no caso da
amostra revelada com ouro. De acordo com as espessuras da tabela_III.1 e tendo
em consideração os diferentes tempos de deposição, estes filmes devem ser
bastantes finos, com espessuras de apenas algumas dezenas de nanómetros
Figura 3.6 ' Fotografias das amostras: a) DID-33-I-I (cobre); b)DID-85-I-I
(ouro).
As fotografias digitais foram tiradas com uma máquina digital convencional, e
sem o equipamento utilizado nos laboratórios forenses, que consiste numa
máquina digital de bancada, colocada num suporte vertical com iluminação dos
vários lados para não ocorrerem sombras ou reflexos. A máquina fica com a
objectiva virada para baixo e num plano paralelo à superfície da mesa onde está
colocada a impressão digital revelada, a qual vai ser fotografada. Neste
trabalho as fotografias foram tiradas de diferentes ângulos, com diferentes
condições de iluminação e o tratamento posterior das imagens foi muito
rudimentar, assim algumas podem não traduzir o seu aspecto real (definição,
nitidez, tonalidade).
Além, da qualidade das fotografias, existe outro aspecto a ter em conta que
influenciou a aparência das amostras: a oxidação dos filmes finos, sobretudo
dos de cobre [37]. Ao longo do tempo os filmes de cobre começaram a apresentar
vestígios de oxidação em toda a superfície, incluindo e preferencialmente nas
cristas. Este fenómeno parece evidente por se tratar de uma zona com resíduos
sebáceos (gordura, suor) favorecendo a ocorrência de oxidação. A tonalidade das
amostras variou entre os tons de roxo, azul e vermelho. Deste modo, a
conservação das impressões reveladas não é tão eficaz como no caso dos filmes
de ouro que não oxidam com o tempo.
3.2.2 ' Influência da Idade e Dador
Utilizando as condições óptimas de deposição na revelação de vestígios
lofoscópicos latentes, foram analisadas amostras com diferentes idades e
dadores.
A figura 3.7 corresponde a revelações de impressões digitais do dador III com
diferentes idades ' 1 dia, 4 dias, 11 dias. Na figura 3.8 é apresentada a
revelação de uma impressão digital do dador I com 1 mês de idade. Comparando
as figuras 3.7 (a) e (b) não são visíveis grandes diferenças na tonalidade das
amostras e ambas apresentam uma boa definição das cristas. A amostra DID-101-I-
III (figura 3.7(c)) apresenta uma tonalidade diferente e as cristas parecem
definidas com um traço mais heterogéneo, mas sem perder muita qualidade.
Relativamente à figura 3.8, foi considerada uma revelação com sucesso, tendo em
conta que foi revelada 1 mês depois de ter sido colocada no substrato.
Figura 3.7 ' Fotografia digital de amostras revistadas com ouro. Idade a) 1
dia; b) 4 dias; c) 11 dias. (Dador III).
Figura 3.8 ' Fotografia digital da amostra DID 73-I-I (idade=31 dias).
Outro aspecto a enfatizar é o dador ' a quantidade de teor sebáceo (suor,
gordura, etc.) presente nos resíduos e a força aplicada durante a deposição da
impressão digital dependem do dador. Durante a colocação das impressões
digitais foi visível que cada dador deixava uma quantidade de vestígios
diferentes, o dador I apresentou sempre menos vestígios após a colocação da
impressão do que o dador III. Comparando uma vez mais as amostras das figuras
3.7 e 3.8 foi verificado que a impressão do dador III tinha uma área de nitidez
e definição superior à da impressão do dador I. Este fenómeno pode ter
resultado da perda de vestígios da DID-73-I-I com o decorrer dos 31 dias.
Da análise destes resultados foi concluído que foi possível a revelação de
impressões digitais com idades até 31 dias através da deposição preferencial de
filmes finos de ouro, sem ser comprometida a qualidade das revelações.
Contrariamente, os filmes de cobre apenas revelam com qualidade impressões
digitais frescas.
3.2.3 ' Deposição Preferencial
De acordo com o observado previamente por K. Kent e M. Stoilovic [25], em
determinadas condições, filmes metálicos produzidos por pulverização catódica
são preferencialmente depositados nas cristas dermopapilares. Para tal, os
átomos devem estar termalizados, sendo a sua mobilidade reduzida, pelo que
tendem a congelar na posição em que chegam ao substrato. Deste modo, e uma
vez que para pressões de deposição elevadas os átomos sofrem inúmeros colisões
no percurso intereléctrodos adquirindo trajectórias aleatórias, os átomos
atingem numa primeira fase as cristas das impressões que correspondem a picos
de rugosidade e que por isso são as primeiras a ser revestidas (figura 3.9). As
características únicas da técnica de pulverização catódica em conjunto com o
relevo das cristas dermopapilares tornam então possível a revelação de
impressões digitais latentes. Com o aumento do tempo de deposição os filmes
acabam por preencher os espaços entre as cristas (sulcos) formando uma camada
uniforme e impossibilitando a revelação dos vestígios lofoscópicos (figuras_3.1
(b) e 3.2(b)). Ao contrário da técnica de pulverização catódica, a técnica de
evaporação mais utilizada em laboratórios forenses não permite este tipo de
revelação, pois este processo decorre sob alto vácuo, pelo que a trajectória
dos átomos é maioritariamente perpendicular à superfície do substrato não
permitindo a deposição preferencial das cristas e consequentemente a revelação
positiva das impressões digitais (figura 3.10).
Figura 3.9 ' Deposição preferencial por pulverização catódica.
Figura 3.10 ' Deposição por evaporação.
De seguida são apresentadas imagens ópticas e SEM de impressões reveladas
através da deposição preferencial de filmes finos de cobre e ouro. Nestas
imagens são notórios vários pontos característicos (centros, deltas,
bifurcações), indispensáveis à identificação de supostos criminosos.
As amostras apresentadas nas figuras 3.11, 3.12, 3.13, 3.16 e 3.17,
correspondem a revelações de impressões digitais frescas, enquanto que as
figuras 3.14, 3.18 e 3.15, 3.19 correspondem a revelações de impressões
digitais com 4 e 31 dias, respectivamente. As imagens de microscopia óptica
apresentam melhor definição das cristas e sulcos para as amostras reveladas em
que as impressões digitais eram frescas (figuras 3.11, 3.12 e 3.13) e para a
impressão revelada com 4 dias (figura 3.14), quando comparadas com a impressão
digital revelada 31 dias depois de ter sido colocada no substrato. Este
resultado era esperado, uma vez que, ao longo do tempo as segregações presentes
nos vestígios digitais foram evaporando, dificultando a deposição preferencial
de elementos metálicos (cobre e ouro) nas cristas. De qualquer modo, quando
utilizada a pulverização catódica com alvo de ouro, a revelação é
suficientemente explícita permitindo a identificação de pontos característicos
mesmo para impressões digitais com 31 dias.
Figura 3.11 ' Fotografias ópticas da amostra DID 8-I-I (alvo cobre).
Figura 3.12 ' Fotografias ópticas da amostra DID 13-I-I (alvo cobre).
Figura 3.13 ' Fotografias ópticas da amostra DID 33-I-I (alvo cobre).
Figura 3.14 ' Fotografias ópticas da amostra DID 99-I-III (alvo ouro; 4 dias).
Figura 3.15 ' Fotografias ópticas da amostra DID 73-I-I (alvo ouro, 31 dias).
Figura 3.16 ' Micrografias SEM da amostra DID 20-I-I (alvo cobre).
Figura 3.17 ' Micrografias SEM da amostra DID 33-I-I (alvo cobre).
Figura 3.18 ' Micrografias SEM da amostra DID 99-I-III (alvo ouro; 4 dias).
Figura 3.19 ' Micrografias SEM da amostra DID 73-I-I (alvo ouro; 31 dias).
A possibilidade de observar a presença de poros (figura 3.17), que tal como os
pontos característicos são próprios de cada indivíduo, constitui uma mais valia
do método adoptado neste estudo. No futuro a distribuição dos poros das cristas
dermopapilares pode contribuir de modo decisivo para a identificação pessoal
[7,17]. A identificação por poros é importante pois as impressões reveladas
correspondem normalmente a fragmentos que muitas vezes não permitem a
correspondência do número de pontos característicos necessários a uma
identificação positiva.
Na imagem da direita, os pontos escuros nas cristas parecem corresponder a
poros.
As imagens ópticas e SEM apresentadas anteriormente correspondem a substratos
de aço. A título de exemplo, os substratos das imagens da figura 3.20 são de
silício. Ainda que seja possível a revelação das impressões digitais, o aspecto
das cristas reveladas é distinto do observado sobre aço. De notar que estas
impressões eram frescas. Aparentemente, a superfície sobre a qual é colocada a
impressão digital influencia a transmissão e absorção de gordura e suor. No
caso do silício, parece que as impressões consistem em pequenas gotículas
uniformemente distribuídas ao longo das cristas. Assim, ao escolher o(s) método
(s) mais adequado(s) para a revelação de impressões digitais deve ser tido em
conta o tipo de superfície em que estas foram, intencionalmente ou não,
colocadas.
Figura 3.20 ' Imagens (a) ópticas e (b) SEM da amostra DID 85-I-I (substrato
silício; alvo ouro).
3.3 ' Caracterização dos Filmes Finos
De modo a melhor compreender o fenómeno que permite a revelação de vestígios
lofoscópicos latentes através da deposição preferencial por pulverização
catódica, os filmes produzidos foram caracterizados em maior detalhe. Para o
efeito, foram produzidos filmes nas condições óptimas de deposição, utilizando
substratos de aço e silício.
3.3.1 ' Morfologia
A morfologia dos filmes de cobre e ouro foi observada por microscopia
electrónica de varrimento de alta resolução após fractura do conjunto
substrato/filme. Nas figuras 3.21 a 3.24 são apresentadas micrografias
representativas da morfologia superficial e transversal dos filmes finos em
estudo. Enquanto que os filmes de cobre apresentam uma morfologia compacta sem
detalhes (figuras 3.21 e 3.22), os filmes de ouro exibem uma superfície
descontínua e porosa a que corresponde uma morfologia transversal colunar
(figuras 3.23 e 3.24).
Figura 3.21 ' Micrografias SEM de alta resolução (superfície) de um filme de
cobre.
Figura 3.22 ' Micrografias SEM de alta resolução (secção transversal) de um
filme de cobre.
Figura 3.23 ' Micrografias SEM de alta resolução (superfície) de um filme de
ouro.
Figura 3.24 ' Fotografias em SEM de alta resolução (secção transversal) de um
filme de ouro.
Durante a preparação das secções transversais os filmes não acompanham a
deformação do substrato e, junto à zona de fractura, acabam por se destacar tal
como ilustrado nas imagens das figuras 3.22 e 3.24. Contudo, a observação dos
filmes, em secção transversal tornou possível avaliar a sua espessura, cujo
valor é de cerca de 30 e 25 nm para os filmes de cobre e ouro, respectivamente
(figuras 3.22 e 3.24). Os valores de espessura determinados por SEM estão de
acordo com os resultados extrapolados a partir das espessuras determinadas pela
técnica de perfilometria.
3.3.2 ' Topografia
A topografia dos filmes mais promissores na revelação de vestígios lofoscópicos
latentes foi analisada num rugosímetro laser. Para as condições óptimas de
deposição, consideradas para cada alvo, os resultados mais satisfatórios e
promissores foram os provenientes do alvo de ouro. As revelações feitas com
revestimentos de ouro tiveram mais sucesso e os seus resultados foram sempre
mais consistentes, mesmo com a variação das condições de deposição. Assim, na
figura 3.25 é apresentada uma imagem de uma impressão digital colocada num
substrato de silício e revelada através da deposição de um filme de ouro. Como
se pode observar a zona das cristas apresenta uma elevada rugosidade, o que
permite a sua visualização e a identificação de pontos característicos. Alguns
picos observados correspondem a sujidade que não pode ser eliminada, já que os
vestígios lofoscópicos poderiam ser danificados. Traçando um perfil ao longo de
uma linha recta (figura 3.26) é possível identificar as diferentes cristas que
este atravessa e confirmar a reduzida altura das cristas dermopapilares (cerca
de 1 μm).
Figura 3.25 ' Topografia da amostra DID-85-I-I (substrato silício; alvo ouro).
Figura 3.26 ' Amostra DID-85-I-I (substrato de silício; alvo de ouro): a)
Perfil; b) Zona onde foi traçado o respectivo perfil.
Conclusões
O objectivo deste estudo foi revelar impressões digitais latentes através da
deposição preferencial de elementos metálicos por pulverização catódica
magnetrão. A investigação recaiu sobre filmes finos de cobre e ouro depositados
sobre substratos de aço inoxidável.
O trabalho desenvolvido permitiu revelar impressões digitais latentes
utilizando filmes finos (20 a 30 nm de espessura) produzidos por pulverização
catódica, desde que optimizadas as condições de deposição. Para além de
revelarem as impressões digitais, os filmes finos depositados sobre superfícies
contendo impressões digitais actuam como escudo protector dos vestígios
lofoscópicos, impedindo a sua deterioração e, simultaneamente, fixando
explosivos ou estupefacientes que possam ter sido manuseados pelo dador da
impressão. O método adoptado não compromete a visualização dos poros existentes
nas cristas dermopapilares, cujas forma e distribuição são características de
cada indivíduo.
A revelação de impressões digitais latentes e a caracterização dos filmes finos
de cobre e ouro produzidos permitiram retirar as seguintes ilações:
· A qualidade da revelação das impressões digitais é influenciada pelas
condições de deposição (pressão de deposição, potência aplicada ao alvo e tempo
de deposição).
· A revelação através de filmes finos de cobre é mais sensível a variações
nos parâmetros de deposição.
· Existe uma relação entre a espessura dos filmes de cobre e a sua
tonalidade. Os filmes mais finos apresentam tons mais acobreados ao invés dos
filmes com maior espessura, que possuem um tom mais avermelhado.
· Para os filmes de cobre as condições de deposição consideradas óptimas são:
Pdep=4 Pa, Dens.P=5,1 W.cm-2 e t=1 min.
· Para os filmes de ouro as condições de deposição consideradas óptimas são:
Pdep=10 Pa, Dens.P=5,1 W.cm-2; t=0,75 min.
· Embora tenha sido possível a revelação de impressões digitais com filmes de
cobre e de ouro, os filmes de ouro são mais eficazes, sobretudo na revelação de
impressões digitais não frescas e na conservação das impressões reveladas.
· Devido à evaporação dos resíduos sebáceos com o tempo, nas impressões não
frescas a deposição preferencial dos elementos metálicos (cobre e ouro) nas
cristas não é tão evidente.
· Através da deposição de filmes finos de ouro foram reveladas impressões
digitais com idades entre 1 e 31 dias. Mesmo após um mês, é possível detectar
pontos característicos, necessários a uma identificação positiva.
· O dador (teor de gordura, suor, força imprimida, etc.) influencia a
qualidade de revelação das impressões digitais.
· A superfície na qual foi colocada a impressão digital influencia a
transmissão e absorção de resíduos sebáceos, e consequentemente a qualidade da
revelação.
· Os filmes de cobre apresentam uma morfologia compacta sem detalhes,
enquanto que os filmes de ouro possuem uma superfície descontínua e morfologia
transversal colunar.
· O relevo das cristas dermopapilares torna-as detectáveis através da análise
por perfilometria tridimensional.
Neste trabalho, pela primeira vez a técnica de pulverização catódica foi
utilizada no Centro de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra no âmbito
das Ciências Forenses e Criminais. Os resultados promissores alcançados abrem
perspectivas no sentido de no futuro prosseguir a investigação neste domínio.