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EuPTCEEx1646-88722014000300007

EuPTCEEx1646-88722014000300007

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolEx-Tech-Multi Sciences
Great areaExact-Earth Sciences
ISSN1646-8872
Year2014
Issue0003
Article number00007

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Resíduos sólidos em manguezal no rio Potengi (Natal, RN, Brasil): relação com a localização e usos

1. Introdução Apesar da incontestável importância (Cintrón & Schaeffer-Novelli, 1983), os manguezais têm sido alvo, principalmente quando próximos de áreas urbanas, de uma crescente pressão antrópica, que acaba alterando sua qualidade e comprometendo a saúde do ecossistema como um todo, com forte impacto na biota local.

Os principais fatores são o desmatamento para projetos industriais, urbanísticos e turísticos e a poluição dos mangues e seus produtos por esgotos, resíduos da aqui-cultura e substâncias químicas (Lacerda, 1999). Outro importante impacto é a deposição de resíduos sólidos urbanos de origem antrópica, que representa, quando não devidamente equacionado, um grave problema ambiental. Nenhum outro tipo de poluente que afeta os ambientes costeiros e o mar tem fontes tão distintas quanto os resíduos sólidos. A significância dessas fontes variou ao longo do tempo, mas, em conjunto, representa um dos maiores e mais difíceis problemas de poluição da atualidade (Coe & Rogers, 2000). A disposição de resíduos costuma ser pesadamente concentrada em estuários ou em águas marinhas costeiras, ambientes que chegam a receber em torno de 80 a 90% de tudo que é descartado em decorrência de atividades antrópicas (Araújo & Costa, 2007).

Estudos sobre o impacto de resíduos sólidos em regiões costeiras são bastante difundidos e conhecidos, porém são geralmente realizados com foco nas praias ou no ambiente marinho (Coe & Rogers, 2000; Araújo & Costa, 2007; Moore, 2008), enquanto que as pesquisas em estuários e manguezais são bastante escassas (Costa et al., 2011; Ivar do Sul & Costa, 2013; Vieira et al., 2011). Esse enfoque é cada vez mais importante, visto que os manguezais estão entre os ambientes costeiros mais sensíveis, e sua preservação deve ser uma prioridade (Ivar do Sul et al., 2014).

A presença de lixo pode causar diversos prejuízos econômicos, sociais e ambientais, que vão desde os gastos despendidos na limpeza pelos órgãos públicos até a perda do potencial estético e turístico, contaminação do ambiente por agentes patogênicos e danos causados à biota (Coe & Rogers, 2000; Derraik, 2002; Moore, 2008; Silva et al., 2008; Silva-Cavalcanti et al., 2009; Ivar do Sul et al., 2011). Os plásticos presentes no lixo compõem uma das maiores preocupações em termos de poluição, por causa de suas propriedades intrínsecas, sua persistência, seu aporte crescente com o tempo e sua ampla disseminação do uso (Derraik, 2002; Ivar do Sul & Costa, 2007).

Nos manguezais, as características ambientais favorecem a retenção dos resíduos, os quais podem tanto se acumular sobre o sedimento, total ou parcialmente enterrados, como ficar presos ou suspensos nas raízes e nos galhos. Essa particularidade torna muito difícil sua retirada por processos naturais ou de limpeza pública. Ligar o lixo às suas fontes mais prováveis é o ponto chave para efetuar o seu controle no ambiente (Earll et al.,1997; Ivar do Sul & Costa, 2007; UNEP, 2009).

O estuário do rio Potengi possui uma grande importância ambiental e socioeconômica. Em seus manguezais, cerca de 1.200 famílias sobrevivem da coleta de crustáceos e moluscos. Porém, de acordo com estudos locais (Cunha, 2004), o estuário está sendo prejudicado por intensas modificações, ocorridas no decorrer do último século, agravadas principalmente em função do crescimento desordenado da cidade de Natal, e, de forma mais específica, do lançamento de grande carga de esgotos domésticos sem tratamento prévio; da presença de favelas, em áreas de planície fluvio-estuarina, sob influência das marés; além de desmatamentos e utilização predatória dos manguezais. É importante uma avaliação detalhada, que, além de quantificar os resíduos, possa identificar os tipos mais frequentes, a fim de se determinar a fonte mais provável; os pontos de maior acumulação e os fatores que atuam na acumulação. Sendo assim, este estudo teve por objetivo realizar uma caracterização dos resíduos sólidos presentes no manguezal associado ao estuário do rio Potengi, em Natal-RN, estabelecendo sua relação com a localização e os níveis de uso locais, de forma a subsidiar monitoramentos futuros.

2. Material e métodos 2.1. Descrição das áreas de estudo Os locais de estudo compreendem duas áreas do manguezal associado ao estuário do rio Potengi e próximas à área urbana de Natal-RN. A área 1 é mais interna e está localizada nas imediações de um dos canais do rio (Lat. 45' 47,22"S / Long. 35º 14' 10,11"O). A área 2 está localizada na foz do rio Potengi (Lat. 45' 30,61"S / Long. 35º 11' 59,31" O), próxima à praia do Forte e da Fortaleza dos Reis Magos (Figura 1).

Em cada área, foram demarcadas três parcelas de 50m2 cada (Figura_1). Na área 1, as parcelas são paralelas ao rio e perpendiculares a um pequeno canal. As parcelas 1 e 2 são alagadas mais rapidamente do que a 3. Na área 2, as parcelas são perpendiculares à praia; as parcelas 1 e 3 são alagadas rapidamente por pequenos canais, ficando submersas, a parcela 2 fica mais isolada, recebendo água mais lentamente. O estudo foi realizado mensalmente durante 10 meses (de fevereiro a novembro de 2011), com as coletas ocorrendo sempre em marés baixas de sizígia.

2.1.1. Avaliação das características de uso e exploração das áreas Inicialmente, o diagnóstico das áreas foi realizado mensalmente (nos cinco primeiros meses), com base na análise de cinco parâmetros, cada um com seis opções de atributos (Tabela_1).

Posteriormente, as atividades mais preponderantes em cada área foram analisadas de forma mais detalhada, visando a estimativa dos impactos gerados e sua relação com os níveis de poluição encontrados. Para detalhamento dos principais usos, foram realizados contatos e entrevistas informais com os moradores locais e pescadores nas áreas 1 e 2; e com turistas, comerciantes e órgãos públicos responsáveis pela administração do Forte dos Reis Magos na área 2.

2.1.2. Avaliação da poluição por resíduos sólidos As amostragens foram realizadas mensalmente durante 6 meses (três do período chuvoso: maio, junho e julho; e três do período seco: setembro, outubro e novembro), determinados com base em dados pluviométricos obtidos para a região.

A coleta dos resíduos foi realizada através de caminhamento em cada parcela (facilitada pela reduzida profundidade do sedimento lamoso, especialmente na área 2). Nos três primeiros meses, todos os resíduos com tamanho >3 cm foram identificados e contados, mas não retirados do local.

Nos três meses posteriores (período seco), além do procedimento anterior, houve a retirada dos resíduos, visando estimar a taxa de aporte dos resíduos em cada local. Foram analisados, além da abundância (Tabela_2), a localização no ambiente (no sedimento ou suspenso nos galhos e nas raízes), a classificação segundo a constituição (plástico, metal, vidro, papel, madeira, tecido e orgânico) e, quando possível, sua fonte mais provável (usuários locais, doméstica, mista e pesca), segundo a Tabela_3.

3. Resultados 3.1. Caracterização dos usos das áreas As duas áreas, embora dentro da área urbana de Natal e apresentando em seu entorno muitas residências e estabelecimentos comerciais, possuem características distintas em relação aos parâmetros analisados (Tabela_4).

Na Área 1, o acesso é difícil porque é feito através de uma estrada de barro que entrada a uma trilha muito estreita margeada por vegetação espessa, sem sinalização e com desníveis e processos de erosão. O manguezal local apresenta boas condições, com recuperação da vegetação, a qual foi retirada no passado, em alguns trechos, para construção de viveiros e posteriormente replantada, após a desativação do cultivo.

Na área 2, apenas uma faixa estreita de mangue, totalmente limitada em suas faces oeste e sul por estruturas urbanas. Além das pistas asfaltadas que permitem a chegada à área, o local dispõe de um acesso que foi aberto com a retirada do manguezal e construído sobre um elevado de pedras e de forma a permitir a chegada ao Forte dos Reis Magos (Figuras_2A_e_2B). Na entrada do acesso ao Forte, uma área asfaltada é utilizada como estacionamento de veículos e por vários comerciantes (fixos e ambulantes) que disponibilizam inúmeros itens de consumo aos visitantes (Figura_2C). Segundo os comerciantes fixos, a Fundação José Augusto, responsável pela administração da área, não permite a presença de ambulantes, no entanto tal determinação é descumprida.

O manguezal da área se conecta com a faixa de praia. No local, podem ser percebidas mudanças nas condições ambientais (sedimentos e biota) em direção ao mar. A coloração do sedimento vai passando de escura para clara, e a biota característica do mangue vai desaparecendo (Figura_2D). O local frequentemente utilizado como acesso praia do Forte.

O manguezal da área se conecta com a faixa de praia. No local, podem ser percebidas mudanças nas condições ambientais (sedimentos e biota) em direção ao mar. A coloração do sedimento vai passando de escura para clara, e e a biota característica do mangue vai desaparecendo (Figura_2D). O local é frequentemente utilizado como acesso à praia do Forte.

Durante as visitas iniciais às áreas, procurou-se observar qual o tipo de público frequentador e quais as atividades realizadas, a fim de determinar os principais usos. Na área 1 é frequente a presença de pessoas da comunidade local que entram no mangue em busca de caranguejos, principalmente aratus (Gonipsis cruentata), além de ostras (Crassostrea rhizophorae) e sururus (Mytella charruana ). A principal atividade na área é a pesca nos canais do estuário do Rio Potengi, como também a retirada de ostras nas raízes da vegetação e caranguejos. A retirada desses recursos visa o consumo próprio, segundo informações recolhidas durante os contatos com as pessoas encontradas no mangue; segundo essas pessoas, exploração comercial da pesca apenas nos canais principais. No entanto, como existe proibição da retirada de algumas espécies, as pessoas têm medo de fornecer informações que possam prejudicá-las, e talvez omitam a exploração comercial.

Próximo ao local, na mata ciliar, algumas pessoas da comunidade se reúnem (especialmente nos finais de semana), em uma clareira para beber e cozinhar alimentos de forma improvisada, que o local dispõe de três cacimbas com água doce.

O manguezal também é utilizado por alguns pesquisadores com o intuito de desenvolver pesquisas ou atividades de educação ambiental. Próximo à área (aproximadamente 500 metros de distância), existe um viveiro de camarões que atualmente se encontra ativo, com finalidade comercial.

Na Área 2 ocorre a exploração da pesca artesanal, porém de forma muito esporádica, , para consumo próprio e para a fabricação de artesanato.  Segundo informações coletadas com pessoas no local, ocorre também a retirada de galhos da vegetação da restinga e do mangue para a fabricação de artesanato.

A área 2 é bastante utilizada para o turismo (visitas ao Forte dos Reis Magos), além de atividades recreacionais e educacionais no manguezal (estudantes) (Figura_2B), mas praticamente não a utilização para fins de pesquisa. A principal atividade que ocorre na área é visitação ao Forte dos Reis Magos.

Segundo o Centro de Documentação Cultural Eloy de Souza, CEDOC, da Fundação José Augusto, FJA, o local recebe uma intensa visitação durante o ano todo, concentrada principalmente nos meses de verão, segundo dados fornecidos pelo órgão para 2010. Nos finais de semana, mais de 10 ônibus de turismo podem ser observados no estacionamento.

3.2. Avaliação dos resíduos sólidos 3.2.1. Análise quali-quantitativa dos resíduos sólidos Nos seis meses de amostragem, foi registrado um total de 1.381 itens de resíduos sólidos, sendo 77 para a área 1 (0,51 itens/m-2) e 1.304 para a área 2 (8,69 itens/m2).

A área 2 apresentou aproximadamente 17 vezes mais itens que a área 1, no entanto, em ambas as áreas, a categoria de resíduo mais encontrada foi o plástico, superando, em quantidade, mais de dez vezes todas as outras categorias (metal, vidro, papel, tecido, madeira e orgânico) juntas (Figura_3).

Na área 1, dentre 71 itens plásticos, aproximadamente 40% foram encontrados no período chuvoso, enquanto que 60% foram registrados no período seco. Na área 2, dentre 1.236 itens plásticos, 31% foram registrados no período chuvoso, enquanto 69 % foram registrados no período seco. Com base nesses dados e nos critérios estabelecidos na Tabela_2, a presença de resíduos sólidos foi considerada praticamente ausente na área 1 e com presença razoável na área 2.

3.3.2. Análise das fontes dos resíduos sólidos Apesar de não ser possível identificar com precisão a origem de todos os resíduos amostrados (principalmente quando fragmentados), e enquadrá-los em suas devidas fontes, cerca de 92% dos itens da área 1 e 67% da área 2 tiveram sua fonte mais provável identificada (Figura_4). O menor percentual de identificação para a área 2 foi decorrente da grande quantidade de fragmentos encontrados.

Na área 1 a fonte predominante foi a mista contribuindo com 49 % do total de itens, enquanto na área 2, 57% dos resíduos identificados, tiveram origem provávelmente nos usuários locais.

Em virtude da pequena quantidade de resíduos encontrados na área 1, o detalhamento dos itens mais comuns para cada fonte foi realizado apenas para a área 2. Na categoria usuário, alguns itens se destacaram em abundância (Figura 5) Embora de ocorrência incomum em estudos desse tipo, os preservativos foram encontrados com muita frequência no local, principalmente presos à vegetação.

O item latas/tampas metálicas de bebidas também chamou atenção pela sua ausência, pois se trata de um ítem amplamente comercializado.

Quanto aos itens mais abundantes relacionados a categoria fonte mista destacam- se as sacolas plásticas, correspondendo a 81% do total de itens, ou seja, mais abundante que os outros itens mais frequentes (Figura_6).

Quanto aos itens mais abundantes, relacionados a categoria doméstica, destacaram-se as embalagens plásticas e o papelão, correspondendo a 47% e 26% dos itens da categoria respectivamente. Enquanto que na categoria pesca, os itens predominantes foram fios/fitas de nylon e o poliestireno expandido contribuindo com 81% e 19%, respectivamente.

3.3.3. Variação espaço-temporal nas áreas amostradas Foi observada uma maior quantidade total de resíduos sólidos no período seco.

Esse padrão é bem definido na área 2, onde os itens amostrados na época seca correspondem a  mais que o dobro dos encontrados durante o período chuvoso (Figura_7). Este fato provavelmente está relacionado com o maior uso da área nesse período.

Com relação à localização dos resíduos no ambiente (no sedimento ou suspenso), para a área 1, o percentual de resíduos sobre o sedimento foi de 57%. na área 2, atingiu cerca de 65% (Figura_8). O padrão se repetiu nos dois períodos estudados em ambas as áreas.

Entre as parcelas, em ambas as áreas, também houve uma maior quantidade de lixo no período seco. Na área 1, as quantidades foram semelhantes entre as parcelas 1 e 2 e mais que o dobro na parcela 3; na área 2 a semelhança ocorreu entre as parcela 1 e 3, as quais apresentaram 4 vezes mais itens que parcela 2.

Tabela_5

4. Discussão O grau de uso de uma determinada área normalmente decorre do quanto ela é propícia para exploração de seus recursos naturais, sejam eles a biota, bens minerais, beleza cênica ou aspectos culturais que justifiquem atividades de turismo. É fato que quanto maior o isolamento da área, ou as dificuldades de acesso à mesma, mais protegida ela se torna. Apesar da proximidade com áreas residenciais e de comércio, e da exploração de recursos naturais para fins de subsistência, a Área 1, pode ser considerada bastante conservada. Isso pode estar relacionado ao difícil acesso, e à falta de atrativos turísticos, o que restringe o seu uso e exploração.

A Área 2, embora com pouca exploração de recursos naturais, sofre um elevado impacto antrópico, básicamente decorrente de dois fatores: a atividade turística e comercial agregada ao Forte dos Reis Magos, que recebe um grande número de visitantes durante o ano inteiro, e a proximidade com a praia do forte, fato que favorece a entrada de um grande número de pessoas na área do manguezal, pois durante a maré baixa os canais propiciam piscinas naturais. A abundância de pessoas na área contribui para o aumento de comerciantes que fornecem uma diversidade de lanches, bebidas e até vestuários, trazendo aos banhistas e visitantes, comodidade e uma ampla variedade de itens para consumo.

Quanto maior a disponibilidade de alimentos e bebidas, maior a geração de resíduos, representados na maioria das vezes por embalagens plásticas, reconhecidamente de baixo poder de degradação (Silva et al., 2008; Silva- Cavalcanti et al., 2009).

A discrepância na quantidade de resíduos encontrada entre as áreas provavelmente está diretamente relacionada com as características de localização e uso de cada uma. De acordo com Vieira et al. (2011), a intensa utilização de ambientes naturais, como praias e manguezais próximos à praia é acompanhada quase sempre de um descarte irregular de resíduos.

Entre as parcelas, as diferenças quantitativas estão associadas principalmente com os padrões de localização de cada uma e hidrodinâmica local. Na área 1, embora as parcelas 1 e 2 fiquem mais próximas do canal e o alagamento ocorra sucessivamente da 1 em direção à 2, a maior quantidade de resíduos ocorreu na parcela 3 (mais próxima da mata ciliar e da entrada do manguezal), provavelmente em decorrência do melhor acesso para usuários locais. Na área 2, as parcelas 1 e 3 recebem uma maior quantidade de resíduos transportados pela maré, porque estão localizadas exatamente na entrada de pequenos canais (recebendo água rapidamente e em maior volume); enquanto que a parcela 2 é a última a ser alagada e sofre um menor alagamento.

Do ponto de vista qualitativo, a abundância de itens plásticos em ambas as áreas, era esperado. A presença majoritária de plásticos entre os itens de resíduos sólidos coletados em ambientes costeiros, tanto praias como estuários, é um padrão que tem se repetido em inúmeros locais (Araújo & Costa, 2007; Ivar do Sul & Costa, 2007; Ivar do Sul & Costa, 2013; Vieira et al, 2011; Moore et al, 2011; UNEP, 2005; UNEP, 2009), evidenciando este tipo de poluição como um grave problema ambiental, que está associado a alguns fatores como: i) ampla utilização do plástico pela população; ii) baixo reaproveitamento e ineficiência de técnicas de reciclagem; iii) longo tempo de persistência e difícil degradação dos plásticos. O encalhe de plástico em manguezais foi evidenciada em outros trabalhos, (Browne etal., 2010; Neves et al., 2011; Vieira et al., 2011; Ivar do Sul & Costa, 2013). Além disso, as características morfológicas desse ambiente contribuem para a retenção dos resíduos .

Dos resíduos plásticos recolhidos na área 2, e relacionados com usuários, os copos, canudos, embalagens de alimentos de Polipropileno Biorientado (BOPP) metalizado, e talheres, são amplamente utilizados, persistentes no ambiente e de difícil reciclagem, o que intensifica os impactos. Apesar da presença constante de comerciantes na área, não se encontraram muitas latinhas metálicas, provavelmente devido à intensa reutilização de latas de alumínios.

Este fato também foi observado em outros estudos (Araújo & Costa, 2007; Dias Filho et al., 2011; Silva-Cavalcanti et al., 2009). A grande quantidade de itens de lixo encontrada com origem nos usuários locais reflete a falta de educação das pessoas, representada pelo descaso com o meio ambiente e com os espaços públicos. Os comportamentos e os atos humanos - acidentais ou intencionais - são as fontes do lixo para ambientes naturais.

A contribuição de usuários na presença e acumulação de resíduos sólidos em áreas costeiras é comprovada e relatada em inúmeros estudos realizados no Brasil (Araújo & Costa, 2007; Santos et al., 2003; Silvaet al., 2008; Dias Filho et al., 2011). Na área 2, não lixeiras para destinação de resíduos, em toda a extensão da passarela que acesso ao Forte, depósitos para colocação de resíduos são encontrados apenas na parte do estacionamento. Este fato com certeza contribui na poluição da área, pois estimula o descarte dos resíduos em locais inapropriados. Sendo uma área de intensa atividade turística, a instalação e manutenção de lixeiras deveriam ser obrigatórias.

Os itens enquadrados na categoria de fonte mista foram classificados como tal exatamente pela dificuldade em se estabelecer sua origem mais provável, portanto, tanto podem ter chegado aos locais através do rio (fonte doméstica); terem sido descartados diretamente no ambiente por usuários locais ou transportados pela maré. A influência da maré pode ser determinante para a movimentação e retenção de resíduos sólidos, que a ação das correntes pode conduzir os resíduos para áreas além daquelas de seu descarte (Thornton & Jackson, 1998).

No entorno das duas áreas, em todos os meses, foi observada a presença de resíduos sólidos. Na área 1 a principal concentração de resíduos fora dos locais de amostragem (acúmulos de garrafas PET, principalmente), ocorre na entrada do manguezal. É provável que os pescadores levem esse material até o mangue para construir armadilhas. Lixo também é encontrado com frequência no local onde moradores se reúnem próximo às cacimbas.

Embora discreto na área 1, o fato é alarmante na área 2. Em vários locais, uma grande quantidade de resíduos pode ser facilmente visualizada tanto na restinga adjacente ao manguezal (Figura_9A), como dentro do próprio manguezal, em locais imediatamente abaixo da passarela de concreto que acesso ao Forte (Figura 9B). Muito provavelmente esses locais podem estar atuando como fontes de recarga contínua de resíduos para dentro das áreas mais alagáveis do manguezal, onde o sedimento mais fino e o emaranhado da vegetação funcionam como aprisionadores do lixo. Muitos resíduos foram encontrados quase completamente enterrados nas áreas mais lamacentas.

Os resíduos presentes nesses locais têm muito provavelmente origem direta nos usuários que os frequentam. O lixo encontrado abaixo da passarela pode estar sendo lançado pelos passantes que se dirigem ao Forte; o lixo encontrado na restinga, pelas pessoas que utilizam a área como acesso à praia, ou em atividades no próprio local.

Um fato que chama à atenção é a grande quantidade de preservativos usados, presentes dentro do manguezal, principalmente suspensos nos galhos. Esse tipo de resíduo foi o quinto mais comum dentro da categoria usuário, fato incomum em outros estudos. Corroborando os dados, podem ser encontradas nas áreas de restinga adjacentes ao manguezal, especialmente em locais sombreados nas árvores, muitas embalagens vazias de preservativos, indicando que seu uso é bastante elevado na área (Figura_9A). Talvez a proximidade com a praia e a possibilidade de abrigo na vegetação expliquem o fato.

Com relação a outros tipos de resíduos presentes em ambientes costeiros, como sacolas plásticas, cotonetes, frascos de produtos de limpeza, resíduos hospitalares etc., a ocorrência é consequência da falta de um gerenciamento eficaz dos resíduos recolhidos nos municípios. Na área 2, as sacolas plásticas contribuíram com 81% dos itens classificados como de origem mista. Esse tipo de resíduo é facilmente retido nos manguezais porque são soterrados pelo sedimento rapidamente, ficando enterrados por períodos indefinidos, ou ficam presos nos galhos e raízes também por longos períodos.

As áreas 1 e 2 apresentaram respectivamente, 2 e 3% de itens na categoria doméstica. Apesar de parecer um número baixo, a fonte doméstica é a de mais difícil controle, porque depende das condições de saneamento nas municipalidades costeiras e da manutenção das bacias hidrográficas livres desse tipo de poluição.

Proporcionalmente, os itens de origem em atividades de pesca obtiveram uma participação relevante na área 1, em contraste com a área 2; isto pode  estar relacionado ao fato de que a pesca atua como uma das formas de sustento para muitas pessoas na área 1, o que explicaria a maior presença de itens como linhas de nylon, poliestireno expandido e armadilhas artesanais construídas com partes de garrafas PET. na área 2, a pesca é esporádica, por isso a baixa quantidade de itens provindo dessa fonte.

Embora os resíduos tenham sido totalmente retirados do local nos meses do período seco, a quantidade de itens aumentou a cada mês na área 2 (Figura_7), evidenciando uma recarga permanente na área, provavelmente em função do aumento do número de visitações turísticas que ocorrem à partir de setembro, segundo informações do Centro de Documentação Cultural Eloy de Souza (CDOC/RN). Na área 1, também ocorreu um aumento nos dois primeiros meses do período seco, o que foi uma surpresa, pois esperava-se que, pelo fato da área não ser turística, o aumento fosse maior nos períodos de maior vazão do rio, como relatado em outros trabalhos (Araújo & Costa, 2007; Moore et al., 2011; Ivar do Sul & Costa, 2013). Talvez o fato possa ser explicado pela melhoria das condições de acesso à área no período seco, o que atrai um maior número de pessoas da comunidade. Uma outra possibilidade é a ação da maré, trazendo resíduos provenientes de áreas mais costeiras, onde a quantidade aumenta no período seco.

De acordo com os resultados encontrados em ambas as áreas, os resíduos sobre o sedimento foram maioria. Os sedimentos do mangue têm um alto poder de retenção de resíduos, que na maioria das vezes ficam parcialmente ou totalmente enterrados. Quanto maior o grau de recobrimento ou soterramento, menor a probabilidade de remoção por processos naturais. Itens como sacolas plásticas e copos são frequentemente encontrados nessas condições. Embora em menor proporção, a presença de itens suspensos nos galhos e raízes pode ser considerada alta. Quando os resíduos são suspensos pela maré e ficam retidos e emaranhados na vegetação, também têm o seu poder de remoção diminuído, afetando esteticamente o manguezal e causando o aumento progressivo do acúmulo de lixo.

Além do impacto gerado pela presença dos resíduos sólidos, a área 2 é afetada por outro problema; segundo alguns comerciantes locais, muitas pessoas que frequentam o local utilizam o manguezal como um banheiro natural, encorajadas provavelmente pela ausência de banheiros apropriados. Em decorrência dessa prática, odores desagradáveis podem ser sentidos com frequência no local. Esta situação não deveria ocorrer de forma alguma em uma área de tamanha importância turística.

5. Conclusões Sendo ambientes extremamente sensíveis e propensos ao acúmulo de resíduos sólidos, áreas de manguezal, especialmente aquelas próximas à praias muito frequentadas, devem receber atenção especial, no sentido de controlar os possíveis impactos gerados pela presença humana. É muito importante o conhecimento adequado da quantidade e variedade das fontes de resíduos sólidos para esses ambientes, porque ele serve como a base principal para as decisões gerenciais sobre ações para prevenir, reduzir e controlar os problemas causados pelo estuarino. Os dados obtidos poderão servir como uma base de dados para comparação com outros estuários, visando estabelecer o quanto o uso pode interferir na qualidade ambiental.

A grande quantidade de resíduos encontrados na área de manguezal próxima ao Forte dos Reis Magos demonstra que a área necessita de planejamento e infraestrutura para receber os turistas, com instalação de lixeiras em quantidades suficientes e ações de educação ambiental com comerciantes e guias turísticos. duas abordagens para se lidar com o lixo marinho, uma é prevenir e reduzir a sua entrada nos ambientes costeiros, e a outra é remover o lixo acumulado que está descartado, despejado e abandonado no meio ambiente; obviamente a segunda opção é a mais dispendiosa e difícil. A prevenção é geralmente mais eficaz e eficiente do que ações para remediar.

A constatação de que os usuários são os principais responsáveis pela geração de resíduos presentes na área 2, pode contribuir no desenvolvimento de ações direcionadas para redução do problema, como instalação de lixeiras, distribuição de recipientes para coleta do lixo e campanhas educativas com usuários. A conscientização do público e o encorajamento das pessoas para mudanças de atitudes relacionadas com o gerenciamento de resíduos sólidos são componentes essenciais nos esforços de mitigação da presença de resíduos sólidos em ambientes costeiros.


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