Estudo dos fluidos associados com a epissienitização de granitos biotíticos do
Gerês e da Guarda (Portugal)
1 – INTRODUÇÃO
Tem sido referenciada desde há longa data, nas regiões predominantemente
graníticas do norte e centro de Portugal continental, a existência de
afloramentos de rochas alteradas que apresentam afinidades epissieníticas.
As rochas epissieníticas ocorrem em contextos graníticos onde, frequentemente,
se verifica também a presença de mineralizações de U e/ou Sn-W, entre outras.
Esse facto fez com que se registasse um maior interesse pelo estudo deste tipo
específico de alteração onde, para algumas das situações, chegou a ser admitida
como tendo uma relação directa com o próprio processo mineralizante. As
interpretações relativas a este processo de alteração de rochas graníticas,
considerado como hidrotermal e designado por epissienitização, são tema de um
grande número de trabalhos desenvolvidos em diversos maciços da cadeia
Hercínica europeia, destacando-se os realizados por Sarcia & Sarcia (1962),
Leroy (1971, 1978, 1984), Cuney (1974 e 1978) e Cathelineau (1985, 1986, 1987)
no Maciço Central Francês, por Ugidos (1974), Caballero et al. (1993, 1996) e
Recio et al. (1997) no Sistema Central Espanhol e, mais recentemente, por Hecht
& Thuro (1998) e Hecht et al. (1999) no Maciço da Boémia, na Alemanha.
No caso do território de Portugal, Ávila-Martins (1972), Palácios (1974),
Ávila-Martins & Saavedra (1976), Cheilletz & Giuliani (1982) e Giuliani
& Cheilletz (1983), referem a ocorrência de rochas epissieníticas no norte
do país, nomeadamente, no maciço granítico do Gerês, onde os últimos autores
consideram a sua possível associação com a ocorrência de mineralizações de Sn-
W. Também, na região centro, Torre de Assunção (1956) refere a existência, nos
granitos das Beiras, de rochas alteradas com as mesmas características,
assumindo a possibilidade de uma relação genética entre este processo e as
mineralizações de U que aí ocorrem. Mais recentemente, Neiva et al. (1987)
descreveram o mesmo tipo de litologias associadas com a ocorrência de falhas e
zonas de cisalhamento, em rochas graníticas da Serra da Estrela.
Na generalidade das ocorrências referidas, as zonas que são caracterizadas pela
alteração epissienítica e que afectam localmente as rochas graníticas, ocupam
áreas pouco expressivas em termos de largura, não ultrapassando algumas dezenas
de metros à escala do afloramento e apresentam uma cor avermelhada, por vezes,
muito intensa. Normalmente, observa-se a existência de uma zona periférica a
envolver a parte central, maciça e rica em feldspato. As zonas alteradas
ocorrem na dependência directa de fracturas que cortam os maciços graníticos,
as quais terão proporcionado um aumento da permeabilidade da rocha, facilitando
a circulação dos fluidos hidrotermais que lhes deram origem.
O desenvolvimento deste processo de alteração, implica a ocorrência de
importantes transformações ao nível da mineralogia principal da rocha granítica
encaixante, tendo como resultado a génese de associações minerais mais
estáveis. A transformação mineralógica mais frequente, corresponde à dissolução
do quartzo de origem magmática, o que leva à formação de cavidades na rocha
granítica alterada, as quais podem posteriormente, ser preenchidas com fases
minerais mais tardias.
Admite-se que a origem do processo de epissienitização das rochas graníticas,
estará directamente associada com a circulação de fluidos hidrotermais ao longo
de zonas fracturadas, com expressão regional. Pêcher et al. (1985) determinaram
a existência de uma relação geométrica entre a ocorrência de zonas
epissieníticas com a presença frequente de microfracturas nos minerais, as
quais comparativamente com o granito não alterado, poderão ser consideradas
como “verdadeiras zonas de circulação de fluidos hidrotermais”.
O presente estudo consiste na determinação das condições P-V-T-X dos fluidos
directamente associados com o principal processo de alteração hidrotermal, que
implicou a epissienitização das rochas graníticas em duas áreas distintas. Com
este intuito, procedeu-se ao estudo dos Planos de Inclusões Fluidas (PIF), que
ocorrem no quartzo de origem magmática. Tal facto deve-se à particularidade
deste mineral ter revelado a presença significativa de microfracturas
preenchidas com inclusões fluidas (IF), que possuem direcções idênticas às das
fracturas onde ocorre a epissienitização.
2 – ÁREAS ESTUDADAS
Para o presente estudo, foram seleccionadas duas áreas graníticas, as quais se
situam na serra do Gerês (Área 1) e na região da Guarda (Área 2). A primeira
localiza-se no norte de Portugal, na Zona Galiza – Trás-os-Montes – ZGTM,
enquanto a segunda se situa no centro, na Zona Centro-Ibérica – ZCI (Fig. 1).
Fig._1Estudo dos fluidos associados com a epissienitização de granitos
biotíticos do Gerês e da Guarda (Portugal)
2.1 – Área 1: Gerês
A Área 1 integra uma região montanhosa situada na parte NO do território de
Portugal continental, junto à fronteira com a província da Galiza, Espanha
(Fig. 1). O maciço granítico do Gerês é circunscrito e intrusivo em granitos
sin a tardi-tectónicos e migmatitos, bem como, rochas metassedimentares com
idade Silúrica inferior (Noronha & Ribeiro, 1983). Este maciço é
constituído por quatro fácies graníticas distintas: Gerês, Paufito, Illa e
Carris, sendo que as três primeiras evidenciam um zonamento espacial
concêntrico (Mendes & Dias, 1993). Os dados geocronológicos relativos à
fácies do Gerês, indicam que esta se instalou entre 296 e 290 Ma e corresponde
a um granito pós-tectónico, relativamente à fase D3 da orogenia Hercínica (Dias
et al., 1998).
Na mesma região, ocorrem ainda filões aplíticos e aplito-pegmatíticos, com
direcções NO-SE, NNO-SSE e NE-SO estando encaixados, principalmente, nas
unidades metassedimentares que ocorrem a nascente. De referir, também, a
ocorrência de filões de rochas de composição básica, tanto no interior do
maciço do Gerês, como no seu encaixante granítico e metassedimentar, por vezes,
em associação com filões de quartzo com direcções preferenciais NNE-SSO, ENE-
OSO, NE-SO e E-O. Os filões de quartzo são numerosos e ocorrem, principalmente,
na parte sul e nascente do referido maciço, assim como, no seu encaixante mais
próximo, constituindo estruturas orientadas segundo as direcções principais N-
S e E-O e, nalguns casos, NO-SE. Nestas estruturas, o quartzo apresenta-se mais
fracturado e, por vezes, brechóide.
A ocorrência de zonas mineralizadas, nomeadamente, em filões quartzosos com
orientação ENE-OSO e ESE-ONO, dá-se por exemplo com os filões mineralizados com
W (Cu, Mo) das antigas minas da Borralha, a nascente do maciço do Gerês e
encaixados em formações metassedimentares do Silúrico (Noronha, 1983). Dentro
da parte portuguesa do maciço granítico do Gerês, deve referir-se ainda a
ocorrência de mineralizações de W-Mo-(Sn), principalmente, nas antigas minas
dos Carris e Borrageiro (Noronha, 1984).
2.2 – Área 2: Guarda
Esta área localiza-se na região da Guarda, Beira Alta, a qual é fronteiriça com
a província de Castela-Leão, em Espanha. Trata-se de uma região montanhosa,
onde predominam granitos, que cortam unidades de natureza metassedimentar, onde
afloram inúmeras rochas filonianas de diferentes tipos. As rochas graníticas
que ocorrem na Área 2 correspondem a granitos biotíticos, sin e tardi a pós-
tectónicos relativamente a D3,sendo a fácies mais abundante, porfiróide e de
granularidade grosseira. Dias et al. (1998) atribuem uma idade situada entre
311 e 300 Ma, para a instalação de rochas graníticas com características
semelhantes da ZCI.
Ocorrem ainda formações metassedimentares pertencentes ao Complexo Xisto-
Grauváquico (CXG), juntamente com rochas graníticas de duas micas sin-D3. As
estruturas frágeis regionais que afectaram as diferentes litologias, albergam
filões de quartzo e de rochas básicas. Os primeiros, têm orientações NE-SO,
NNE-SSO e, mais raramente, NO-SE. São constituídos por quartzo leitoso, podendo
ter aspecto brechóide, sendo quase sempre verticais. Quanto às rochas básicas,
apresentam cor escura e grão muito fino, ocorrendo em filões com espessura
decimétrica a métrica, verticais ou subverticais e com orientação E-O, NO-SE e
NNE-SSO. Por vezes, acompanham os filões de quartzo.
De referir que a Área 2 se situa na “subprovíncia uranífera das Beiras”
(Thadeu, 1965), pois nela ocorrem numerosos filões de quartzo brechóide, onde a
mineralização é constituída por pecheblenda e por minerais secundários de
urânio, nomeadamente, de autunite e torbernite.
3 – AS ROCHAS EPISSIENÍTICAS
Nas observações de campo efectuadas em ambas as áreas de estudo, foi possível
verificar que as zonas de alteração epissienítica constituem corpos planares
com forma mais ou menos regular, os quais atravessam as rochas graníticas
encaixantes, e apresentam uma extensão lateral que é variável à escala do
afloramento (Fig. 2-A).
Fig. 2 – Alguns aspectos macroscópicos das rochas epissieníticas que ocorrem
nas duas áreas em estudo. A) Vista parcial de um afloramento de rochas com
enrubescimento que ocorre na região do Gerês, na Área 1. A coluna
epissienítica, com cerca de 15 metros de extensão ao longo do caminho, insere-
se no granito de Carris, com o qual contacta através de uma falha; B) Pormenor
de uma rocha epissienítica, caracterizada através do forte enrubescimento dos
megacristais de feldspato potássico que ocorre na região da Guarda, na Área 2.
Apesar de evidenciar uma textura muito semelhante à da rocha granítica
original, é nítida a ocorrência de uma zona central mais rica em feldspato
potássico e desprovida de quartzo magmático. O contacto com a rocha granítica
alterada é do tipo abrupto.
A passagem e/ou transição desde a rocha granítica original para as zonas
alteradas, desenvolve-se normalmente ao longo de alguns centímetros. No
entanto, em certas situações, o contacto pode ser bastante abrupto, parecendo
evidenciar uma origem tectónica. À escala do afloramento, apresentam um
enrubescimento intenso e uma textura muito semelhante à da rocha granítica
original da qual derivaram (Fig. 2-B).
O desenvolvimento deste processo de alteração sobre as rochas graníticas,
implicou o desaparecimento do quartzo primário ao longo destas zonas. Em alguns
casos, verifica-se a ocorrência de zonamentos dentro do mesmo corpo de rocha
avermelhada, através do desenvolvimento de zonas centrais maciças, enriquecidas
em feldspato potássico, as quais passam lateralmente para zonas com cavidades,
as quais podem apresentar preenchimento tardio de quartzo, muitas vezes,
automórfico, juntamente com outras fases minerais secundárias, nomeadamente,
albite, epídoto, clorite e óxidos de ferro.
A zona mais periférica é caracterizada através de uma cor mais ou menos
avermelhada, assim como, pela presença de algum quartzo magmático
correspondendo, neste caso, a um granito em vias de epissienitização.
Relativamente à Área 1, foi possível confirmar no campo a ocorrência de uma
etapa de fracturação, que terá sido anterior à própria formação das estruturas
alteradas com enrubescimento, a qual originou fracturas e/ou cisalhamentos N-S,
NE-SO e, menos frequentemente, NO-SE. De referir que Cheilletz & Giuliani
(1982) determinaram para a região de Las Sombras-Dos Carris, situada mais a
norte desta área, uma orientação geral bastante regular, para as “bandas” de
rochas epissie-níticas que aí ocorrem, muito próxima do quadrante N-S.
Na Área 2, também se registou a ocorrência de um controle tectónico para a
origem e evolução posterior deste processo de alteração. Neste caso, a
orientação NE-SO que caracteriza as estruturas de rochas epissieníticas,
corresponde a uma das orientações regionais principais, que ocorrem nesta área.
4 – METODOLOGIAS
Com o objectivo de se determinarem as características físico-químicas dos
fluidos responsáveis pelos processos de alteração das rochas graníticas,
procedeu-se a um estudo detalhado de IF, nomeadamente, uma caracterização dos
Planos de Inclusões Fluidas (PIF) presentes nos quartzos das rochas graníticas.
Assim, foram estudadas amostras orientadas recolhidas nas proximidades do
contacto entre as zonas com enrubescimento e a rocha granítica encaixante. Em
todas as amostras estudadas, o quartzo com origem magmática mantém-se
preservado, apesar da coloração ligeiramente avermelhada evidente na rocha
granítica.
Inicialmente foi efectuado um estudo petrográfico do(s) tipo(s) de quartzo com
interesse neste estudo, tendo-se utilizado um microscópio óptico polarizante de
luz transmitida (Olympus). As lâminas espessas usadas neste estudo, foram
realizadas a partir de amostras orientadas.
Para a caracterização petrográfica das IF presentes nos quartzos, foram
utilizados diversos critérios descritivos, baseados em metodologias propostas
por Roedder (1984), Shepherd et al. (1985) e Van den Kerkhof & Hein (2001).
Foi efectuada uma identificação e caracterização dos PIF ao microscópio em
amostras de ambas as áreas de estudo, tendo-se registado entre outros, a sua
orientação relativa nas lâminas orientadas utilizando para tal o programa
Planif (Nogueira & Noronha, 1995). Posteriormente, os resultados obtidos
foram tratados através de um “software” apropriado (StereoNet – versão 3.03), o
qual permitiu construir diagramas do tipo roseta. Deste modo, foi possível
obter dados estatísticos, nomeadamente, relativos à orientação dos PIF e sua
relação com o tipo de fluidos.
A análise das IF envolveu a utilização de duas técnicas não-destrutivas,
nomeadamente, a Microtermometria e a Espectroscopia micro-Raman, as quais foram
realizadas nos respectivos laboratórios do Centro de Geologia da Universidade
do Porto (CGUP).
As análises microtermométricas envolveram a realização sistemática de medições
de criometria e de termometria em IF. No primeiro caso, foi utilizada uma
platina Chaixmeca (Poty et al., 1976), em que o arrefecimento das IF foi
produzido através de uma fonte externa de azoto líquido. Este equipamento
permite o arrefecimento até cerca de – 180 ºC. Na calibração desta platina,
foram utilizadas IF padrão de cristais sintéticos e naturais de quartzo.
Para o aquecimento das IF, foi utilizada uma platina Linkam (modelo PR 600),
que permite o aquecimento até cerca de 600 ºC. Neste caso, para a calibração
desta platina foram utilizados produtos químicos com pontos de fusão
conhecidos, tendo-se obtido uma curva de calibração, para a correcção dos
resultados obtidos.
Nas análises de Microtermometria, obtiveram-se resultados referentes a diversos
parâmetros. Assim, durante o processo de criometria foram registadas as
seguintes temperaturas: Te – temperatura de fusão do primeiro cristal de gelo e
TfG – temperatura de fusão do gelo. No aquecimento, apenas foi registada a
temperatura TH – temperatura de homogeneização global, que pode ocorrer em fase
líquida (L), vapor (V) ou crítica (C).
Os resultados microtermométricos obtidos, permitiram a obtenção de algumas das
propriedades mais importantes relativamente aos fluidos estudados. Assim, foi
possível obter dados referentes à composição global, salinidade, volume molar e
densidade desses fluidos.
Uma forma expedita para a determinação das principais propriedades dos fluidos,
consistiu na aplicação do programa Fluids (Bakker, 2003) aos resultados
microtermométricos obtidos neste estudo. Assim, para o cálculo dos dados
composicionais dos fluidos utilizou-se o programa Bulk (versão 01/03), enquanto
que a determinação das respectivas isócoras, foi obtida através de um outro
programa, Isoc (versão 01/03), neste caso, com alguns dos dados calculados a
partir do anterior. No primeiro caso, para a determinação do volume molar e da
densidade, optou-se pela equação de estado de Zhang & Frantz (1987). Quanto
ao cálculo da salinidade, contou-se com o recurso à equação de Potter et al.
(1978). Para o cálculo das isócoras, foi seleccionada a equação de estado de
Bodnar & Vityk (1994).
Para a realização das análises de Espectroscopia micro-Raman, foi utilizada uma
microssonda Labram Dilor – Jobin Yvin-Spex, com uma potência de laser He-Ne de
20 mW, cujo equipamento apresenta uma vasta gama espectral, combinada com uma
resolução em profundidade superior a 2,5 mm, com a objectiva de 100x. O
aparelho apresenta um sistema electrónico, o qual se encontra directamente
ligado a um computador, para controlo de aquisição e tratamento de dados. Neste
caso, as medições foram efectuadas com o recurso a um laser de 633 nm
(vermelho).
Os resultados analíticos adquiridos, permitiram a obtenção de um espectro Raman
individual, relativo a cada IF analisada. Neste caso, analisou-se a fase vapor
para verificar a possível presença de determinados compostos voláteis, tais
como, CO2, CH4 e N2.
5 – RESULTADOS
Na Área 1 foram recolhidas três amostras (GE-P1, GE-P2 e GE-P3), em
afloramentos onde ocorre este tipo de litologias e que aparentam diferentes
orientações espaciais. Quanto à Área 2, apenas foi reconhecida uma orientação
predominante para as estruturas que manifestam enrubescimento, tendo sido
efectuado o estudo de três amostras (GA-P1, GA-P2 e GA-24).
5.1 – Descrição petrográfica do quartzo
Os cristais de quartzo de origem magmática (Qz I) presentes nas rochas
graníticas de ambas as áreas, mantêm as mesmas características petrográficas
dentro das zonas levemente alteradas, próximas de estruturas alteradas com
enrubescimento. Nestas últimas, os cristais de Qz I evidenciam, geralmente, a
presença mais intensa de microfracturas intergranulares.
De uma maneira geral, é possível verificar que na generalidade das amostras
estudadas, os cristais de Qz I apresentam formas anédricas, sendo ainda
frequente o reconhecimento de alguns sinais reveladores de deformação,
traduzindo-se através de extinção ondulante e de microtexturas de subgranulação
e recristalização.
Quando as microfracturas se apresentam preenchidas, formam PIF intergranulares
com orientações distintas, sendo de assinalar a presença de diferentes
“famílias” (Fig. 3). Neste estudo, apenas foram caracterizados os PIF com
orientações concordantes com as estruturas regionais alteradas com
enrubescimento, sendo de admitir que estes constituíram as zonas preferenciais
para a circulação de fluidos, que resultaram directamente no fenómeno de
epissienitização das rochas graníticas, propriamente dito.
Fig. 3 – Alinhamentos de IF secundárias resultantes da microfissuração que
afectou um cristal de Qz I, presente na rocha granítica alterada do Gerês. Os
PIF apresentam uma orientação concordante com as estruturas alteradas com
enrubescimento que é, neste caso, próxima do alinhamento N-S.
5.2 – Tipos de IF
O Qz I evidencia frequentemente a presença de microfracturas que, muitas vezes,
se apresentam preenchidas com IF alinhadas, de origem secundária (PIF). Um dos
principais objectivos deste estudo, prendeu-se com o facto de se poderem
determinar as direcções principais dos PIF presentes. A existência de
diferentes orientações dos PIF, é reveladora de uma sobreposição mais ou menos
complexa, de diversos eventos de circulação de fluidos, os quais ficaram melhor
registados nos cristais de quartzo.
No caso da Área 1, foram estudadas três amostras orientadas representativas de
estruturas alteradas com diferentes orientações regionais, nomeadamente, N-S
(GE-P1) NE-SO (GE-P2) e NO-SE (GE-P3). Assim, foram reconhecidos PIF com
direcção N-S, NE-SO, NO-SE e, menos frequentemente, E-O (Fig. 4-A). Quanto às
IF secundárias que se encontram representadas nos PIF que cortam os cristais de
Qz I, são de pequena dimensão, raramente ultrapassando 10 mm. Apresentam formas
bastante regulares, por vezes, em “cristal negativo”, sendo também observadas
IF ovais e alongadas (Fig. 5-A). Correspondem a IF bifásicas, em que a fase
gasosa pode ocupar entre 5 e 30% do volume total da IF, sendo mais frequente um
valor aproximado de 10% (grau de preenchimento, Flw = 0,90). Neste último caso,
não foi possível efectuar a análise de muitas IF dado que, na sua maioria
possuem uma fase gasosa metaestável com movimentos “brownianos”, o que
dificulta a realização de medições microtermométricas.
Fig. 4 – Orientações preferenciais dos PIF que foram medidos em diferentes
amostras orientadas de ambas as áreas em estudo. Representam-se os diagramas de
rosetas e de contornos de pólos, respectivamente, para as amostras do Gerês (A)
e Guarda (B). As direcções das estruturas com enrubescimento encontram-se
preenchidas a vermelho. A) GE-P1: n=74, N 0-10º; GE-P2: n=70; N 40-70º; GE-P3:
n=69; N 120-160º; B) GA-P1: n=67, N 0-20º; GA-P2: n=69; N 10-40º.
Fig. 5 – Aspecto das IF secundárias associadas aos PIF com direcção NE-SO,
presentes em cristais de Qz I do granito alterado do Gerês (A) e da Guarda (B).
Em ambos os casos, correspondem a IF aquosas bifásicas com forma muito regular.
Também, são frequentes IF secundárias, monofásicas, apenas com fase líquida. A
sua origem parece, contudo, ser muito semelhante à das anteriores. Em ambos os
tipos de IF, não foi detectada a presença de fases sólidas.
Para a Área 2, foram estudadas três amostras, GA-24, GA-P1 e GA-P2. Foi
efectuado um estudo microestrutural sobre as duas últimas amostras, com o
objectivo de se determinarem as orientações principais que caracterizam os PIF
presentes no Qz I. Este estudo permitiu a confirmação da existência de três
orientações distintas para os PIF, nomeadamente, NE-SO, NO-SE e E-O, conforme é
possível verificar através dos respectivos diagramas de rosetas (Fig. 4-B). Na
globalidade, correspondem a PIF que podem apresentar continuidade variável ao
longo do cristal. Contudo, tal como para a Área 1, nas medições efectuadas
predominam os PIF intergranulares e, em menor grau, os intragranulares.
Também aqui se procedeu à selecção de alguns PIF com uma direcção idêntica à
orientação regional dominante das estruturas com enrubescimento, segundo NE-SO,
a qual se encontra mais bem representada na amostra GA-P2 (Fig. 4-B). O facto
de na amostra GA-P1 esta orientação se encontrar mais aproximada da direcção
NNE-SSO, poderá ser explicado através de variações locais do próprio campo de
tensões regional ou, mesmo, da própria distância à zona alterada mais central.
Nas amostras da Guarda, as IF presentes são bastante regulares, sendo
frequentemente arredondadas, podendo ocorrer na forma de “cristal negativo”
(Fig. 5-B). Também, podem apresentar formas tubulares. São bifásicas, de
pequeno tamanho e raramente excedem 10 mm. O volume da fase gasosa da IF pode
variar entre 5 e 30% sendo, o valor mais frequente de cerca de 10% (Flw =
0,90). Tal como no caso do Gerês, não foi detectada a presença de fases sólidas
no interior destas IF.
5.3 – Resultados de Microtermometria
Na Tab. 1 apresentam-se de uma forma sintética, as principais características
dos fluidos analisados em ambas as áreas. Os resultados microtermométricos
obtidos, encontram-se representados nos histogramas referentes a TfG e a TH
(Fig. 6-A e 6-B).
TABELA_1
Principais características físicas, microtermométricas e composicionais dos
fluidos associados aos PIF presentes em Qz I, estudados nas duas áreas em
estudo. 1PIF N-S; 2PIF NE-SO; 3PIF NO-SE.
Fig. 6 – Histogramas representativos dos resultados globais referentes às
temperaturas de fusão do gelo (TfG) e de homogeneização global (TH) obtidos em
IF secundárias associadas aos PIF presentes em quartzos magmáticos (Qz I) para
as áreas de Gerês (A) e Guarda (B), respectivamente.
Para o caso da Área 1 foram estudadas 152 IF de origem secundária. Na amostra
GE-P1, procedeu-se preferencialmente à caracterização das IF presentes em
alinhamentos N-S. De acordo com os diagramas representados na Fig. 6-A, a TfG
varia entre – 5,0 e 0,0 ºC (média de –2,2 ºC), com dois máximos aos –3,0 e –1,0
ºC, respectivamente. Para a amostra GE-P2, onde foram estudadas PIF com
orientação NE-SO, os valores de TfG são ligeiramente mais baixos, variando
entre – 6,1 e 0,0 ºC (média de –3,1 ºC), cujo máximo se situa próximo de – 4,0
ºC. Em GE-P3, os valores registados para TfG são mais elevados, variando de –
2,7 a 0,0 ºC (média de –1,1 ºC).
De uma forma geral, verificou-se que o valor de TfG é pouco variável ao longo
do mesmo PIF, o que poderá indiciar que este não tenha sofrido modificações
mais tardias. As medições de criometria efectuadas nestas IF, não indicaram a
presença de substâncias voláteis nos fluidos, nomeadamente, de CO2, CH4 e N2,
entre outras, tendo o mesmo sido confirmado através de Microssonda Raman. Não
foi detectada a presença de clatratos em qualquer situação analisada. No
entanto, foi possível a obtenção de resultados relativos ao início da fusão do
gelo, tendo-se obtido valores de Te situados entre –50 e –30 ºC. De acordo com
Davis et al. (1990), estes valores indicam a presença, além de Na+, de outros
catiões na fase fluida aquosa, nomeadamente, de Mg2+ ou, mesmo, de Ca2+.
Para a homogeneização global, registaram-se intervalos de temperatura bastante
mais alargados, em que TH é variável consoante a amostra (direcção)
considerada, tendo a mesma ocorrido sempre em líquido (Fig. 6-A). Assim, para a
amostra GE-P1, determinou-se um intervalo situado entre 148 e 293ºC (média de
196 ºC), sendo ligeiramente mais baixo para GE-P2, de 143 a 207 ºC (média de
178ºC). No caso de GE-P3, os valores registados são bastante inferiores aos
restantes, situando-se entre 122 e 162 ºC (média de 128 ºC).
Quanto aos resultados globais de TfG e TH obtidos para o Gerês, é possível
verificar através dos histogramas da Fig. 6-A, a existência de dois picos de
TfG situados aos –4,0 e –1,0 ºC e, apenas um pico para TH entre 180 e 200 ºC.
Relativamente à Área 2, foram analisadas 146 IF de origem secundária em três
amostras. No cômputo geral, as IF associadas com os PIF orientados segundo NE-
SO (próxima de N40º), apontam para a presença do mesmo tipo de fluidos. Assim,
relativamente às TfG obtidas, indicam uma variação no intervalo de –6,6 a –0,1
ºC (média de –3,3 ºC). Os dados relativos ao início da fusão do gelo, indicam
que as temperaturas do eutético (Te) são muito semelhantes, tendo-se cifrado
entre –52 e –30 ºC, o que aponta para a presença além de Na+, de outros catiões
nos fluidos, nomeadamente, de Mg2+ ou Ca2+.
Tal como para o caso anterior, verificou-se que a temperatura registada foi
muito semelhante para as IF presentes no mesmo PIF. Por outro lado, não foi
confirmada através das medições efectuadas a presença de voláteis, mesmo em
quantidade suficiente para formarem clatratos, quer através de criometria, quer
com a Microssonda Raman.
Quanto a TH, esta varia entre 171 e 305 ºC (média de 249 ºC), tendo a mesma
ocorrido sempre em líquido.
Na generalidade, os resultados globais obtidos para a Guarda são ligeiramente
diferentes dos do Gerês. Assim, através da análise dos diagramas representados
na Fig. 6-B, verifica-se que TfG é geralmente mais baixa, com dois picos aos
–5,0 e –3,0 ºC. Quanto a TH, os valores globais obtidos indicam temperaturas
superiores, com um pico situado entre 240 e 260 ºC.
5.4 – Composição dos fluidos
De acordo com os resultados microtermométricos obtidos através do estudo dos
PIF, foi possível concluir que estes correspondem na generalidade, a fluidos
aquosos (Lw) de baixa salinidade, do sistema H2O – NaCl – (Ca, Mg, Cl2). Para a
Área 1, o cálculo da composição dos fluidos indicou a existência de pequenas
diferenças, relativamente a cada uma das orientações dos PIF analisadas (Tab.
1). Os fluidos N-S apresentam uma densidade (D) mais baixa, situada entre 0,83
e 0,96 (média de 0,91). Para as restantes direcções, o valor médio é
ligeiramente mais elevado, sendo de 0,93 (NE-SO) e 0,95 (NO-SE). A situação
inversa é verificada para o volume molar (Vm) dos fluidos.
A salinidade média é, também, variável em função da direcção de circulação dos
fluidos. Os valores mais elevados registaram-se nos PIF com orientação NE-SO,
variando entre 0,00 e 9,34 % eq. peso NaCl (média de 5,11 % eq. peso NaCl).
Para os PIF com direcção N-S a salinidade média situa-se em 3,71 % eq. peso
NaCl e, para a direcção NO-SE em 1,91 % eq. peso NaCl. No diagrama TH vs.
Salinidade, representado na Fig. 7, é possível verificar a variação da
salinidade dos fluidos com a TH obtida para cada direcção. Assim, para o caso
do Gerês, assiste-se a uma diminuição gradual dos valores de salinidade com TH,
que é mais evidente para os PIF com orientação N-S (amostra GE-P1).
Para a Área 2, os fluidos associados com os PIF NE-SO, indicam resultados muito
semelhantes (Tab. 1). O valor relativo à densidade global (D) destes fluidos é
pouco variável, situando-se entre 0,74 e 0,93 (média de 0,86 g/cc). Do mesmo
modo, o volume molar (Vm) é, também, bastante constante.
Relativamente à salinidade obtida, a mesma varia na globalidade entre 0,18 e
9,98 % eq. peso NaCl sendo que, a média mais elevada de 6,25 % eq. peso NaCl
foi registada na amostra GA-P2. Conforme se pode observar através da análise da
relação TH vs. Salinidade, representada no diagrama da Fig. 7, verifica-se tal
como para o Gerês, que os valores de salinidade mais elevados correspondem a
valores de TH, também, mais elevados.
Fig. 7 – Diagrama representativo da relação TH vs. Salinidade (% eq. peso
NaCl), para os fluidos presentes nos PIF associados com as estruturas alteradas
das áreas em estudo. A evolução dos fluidos é semelhante, verificando-se uma
diminuição gradual da salinidade com a temperatura de homogeneização.
5.5 – Condições P-T de aprisionamento
Na determinação das condições P-T de aprisionamento dos fluidos associados aos
PIF, recorreu-se aos resultados microtermométricos para o cálculo das isócoras
respectivas, bem como, a outros geotermómetros, nomeadamente, da clorite e da
moscovite (Jaques, 2008). Para o caso da clorite foi utilizado o geotermómetro
de Cathelineau & Nieva (1985), o qual assume uma relação positiva entre a
temperatura de cristalização e o teor em AlIV na estrutura deste filossilicato.
Os valores médios de temperatura obtidos são variáveis, relativamente ao
processo de cloritização das rochas graníticas. Assim, para as fácies de
alteração epissienítica de ambas as áreas em estudo, registaram-se valores
médios mais elevados de 309 ºC para o caso do Gerês, e de 295 ºC para as
amostras da Guarda (Tab. 2).
TABELA 2
Resultados médios relativos à temperatura de cristalização das clorites e das
micas brancas presentes nas rochas epissieníticas das duas áreas em estudo. Os
valores obtidos foram calculados através do recurso a geotermómetros.
Cl I – clorite resultante da alteração da biotite; Ms II – agregado de micas
brancas a preencher cavidades; Ms II* – micas resultantes da alteração da
biotite; Ms II** – micas resultantes da alteração do feldspato; Gr-a – rocha
granítica alterada sem dissolução do quartzo magmático; Epi – zona de alteração
epissienítica.
Para o cálculo das temperaturas de formação relativas às diferentes gerações de
moscovite, as quais ocorrem associadas às zonas alteradas com enrubescimento da
região da Guarda, recorreu-se ao diagrama definido por Lambert (1959), o qual
relaciona o teor em paragonite das micas brancas com a sua temperatura de
cristalização. Os resultados obtidos indicam valores médios de temperatura mais
elevados de 336 ºC, nomeadamente, para os agregados de micas brancas presentes
em cavidades, de 365 ºC para as micas resultantes da alteração da biotite e de
324 ºC para a formação secundária de moscovite após a alteração dos feldspatos
(Tab. 2). Valores médios inferiores, foram obtidos em amostras provenientes da
parte mais central das estruturas alteradas.
De acordo com o diagrama P-T representado na Fig. 8, é possível verificar
algumas diferenças relativamente à evolução dos fluidos Lw, responsáveis pelo
processo de epissienitização das rochas graníticas, nas duas áreas em estudo.
Assim, para o caso da Área 1, os fluidos aquosos circularam a temperaturas que
não excederam em muito os 300 ºC, a uma pressão que não ultrapassou os 115 MPa.
Assumindo que as pressões são litostáticas, verifica-se que este processo terá
evoluído numa profundidade máxima, da ordem dos 4 km. Noronha (1983) refere a
ocorrência de pressões situadas entre 65 e 100 MPa, para a génese do jazigo de
tungsténio da Borralha, que considera como espacialmente associado aos granitos
pós-tectónicos desta região.
Fig. 8 – Diagrama que evidencia as condições P-T atribuídas aos fluidos Lw
associados aos PIF nas zonas alteradas das áreas em estudo. Estes fluidos terão
sido responsáveis pelos processos de albitização e dissolução do quartzo
magmático, relacionados com o fenómeno de epissienitização que afectou as
rochas graníticas.
Para a Área 2, os resultados obtidos são um pouco distintos, tendo-se registado
temperaturas mais elevadas e pressões mais baixas. As condições atribuídas à
evolução dos fluidos Lw relacionados com a epissienitização de rochas
graníticas da região da Guarda indicam uma temperatura máxima da ordem dos 360
ºC, a que corresponde uma pressão próxima de 67 MPa (Fig. 8). Neste caso, a
profundidade máxima relativa à formação destas litologias de alteração situa-se
em 2,5 km, admitindo tratar-se de pressões litostáticas. Neiva et al. (1987)
definiram neste mesmo contexto, um intervalo de pressões situado entre 100 e
150 MPa, relativamente à alteração das rochas graníticas do maciço granítico da
Serra da Estrela.
6 – DISCUSSÃO E CONCLUSÕES
Lespinasse & Pêcher (1986) e Lespinasse & Cathelineau (1990) consideram
que os PIF marcam a existência de “zonas fossilizadas de circulação”, em que as
IF representarão os vestígios dos fluidos aprisionados, que terão sido
responsáveis pela epissienitização das rochas graníticas.
Assim, assume-se que durante o processo de epissienitização das rochas
graníticas estudadas, parte dos fluidos que percolaram ao longo das zonas de
alteração ficaram aprisionados em microfracturas, as quais se encontram
representadas através de alinhamentos secundários de IF nos cristais de quartzo
de origem magmática (Qz I). Foi possível verificar que as orientações dos PIF,
permitiram evidenciar a existência de uma boa correlação com as principais
estruturas à escala regional, e nas quais se inserem as zonas alteradas com
enrubescimento. Assim, para a Área 1 foram identificadas diferentes
orientações, nomeadamente, N-S, NE-SO e, menos frequentemente NO-SE, enquanto
que para a região da Guarda predomina a direcção NE-SO.
Mateus (2001) e Mateus & Noronha (2001) referem-se à ocorrência de fluidos
aquosos que circularam no soco rochoso da ZCI durante um período designado de
tardi-Hercínico, e que estariam associados com a reactivação de segmentos de
falha, contemporâneos do “arrefecimento progressivo do sistema”. Considera-se
que estarão nesta situação, os fluidos contemporâneos do fenómeno de
epissienitização que afectou as rochas graníticas de ambas as áreas. De facto,
as datações obtidas no feldspato potássico através de K-Ar indicam uma idade de
273,6 ± 11,7 Ma, para a epissienitização das rochas graníticas do Gerês (Jaques
et al., 2010). Para a mesma área, as moscovites associadas com a ocorrência de
mineralizações de Mo nas minas da Borralha, revelaram uma idade K-Ar de 280,0 ±
5,0 Ma (Noronha et al., 2006). No caso da região da Guarda, foram calculadas
idades K-Ar mais recentes para as rochas epissieníticas, de 245,0 ± 4,8 Ma
(Bobos et al., 2005).
Por outro lado, os fluidos que são caracterizados neste estudo apresentam
muitas semelhanças com fluidos associados a outras ocorrências de rochas
epissieníticas situadas em contexto Hercínico, nomeadamente, no Sistema Central
Espanhol (González-Casado et al., 1996; Caballero et al., 1996) e no Maciço
Central Francês (Leroy, 1978; Cathelineau, 1987; Lespinasse & Cathelineau,
1990).
Quanto à origem dos fluidos hidrotermais, e para o caso da Área 1, Turpin
(1984) apresenta resultados isotópicos relativos a um epissienito associado com
um filão de quartzo mineralizado com volframite, proveniente da região de
Lovios-Gerês. Neste caso, foram obtidos valores de d18O no quartzo (+10,8‰) e
no feldspato (+10,9 e +11,5‰), bem como, de dD (–29‰). De acordo com os
resultados, aquele autor considera que estes poderão apontar para uma
contribuição de fluidos hidrotermais com origem meteórica, tanto para a zona
mineralizada como para a génese das próprias rochas epissieníticas.
Relativamente à Área 2, não existem até ao momento quaisquer dados isotópicos,
que indiquem uma origem para os fluidos envolvidos. Contudo, Neiva et al.
(1987) atribuem uma origem essencialmente meteórica, para os fluidos que
participaram directamente nos processos de alteração dos granitos da Serra da
Estrela, admitindo ainda alguma contribuição de fluidos resultantes do
arrefecimento das rochas graníticas. No entanto, tendo em conta a grande
semelhança existente entre estes fluidos com as características físico-químicas
dos fluidos associados com a Área 1, não será despropositado de admitir,
também, uma origem meteórica relativamente aos fluidos directamente
responsáveis pelo processo de epissienitização das rochas graníticas da região
da Guarda.
As características microtermométricas relativas aos fluidos estudados
permitiram identificar a existência de um tipo dominante de fluidos,
relacionados com os PIF que cortam os cristais de quartzo de origem magmática
(Qz I). Trata-se de fluidos aquosos (Lw) do sistema H2O-NaCl, com salinidade
baixa a moderada na Área 1, e moderada para o caso da Área 2. Neste último
caso, as temperaturas mínimas de aprisionamento são, também, mais elevadas.
A relação entre os valores de temperatura relativos a TfG e a TH para ambas as
áreas em estudo, indica a existência de uma “evolução” que se traduz através de
uma diminuição da salinidade do fluido, à medida que diminui a temperatura do
sistema hidrotermal.
O processo de circulação de fluidos que implicou a progressiva dissolução do
quartzo, foi acompanhada por uma albitização mais ou menos intensa dos
feldspatos, a qual corresponde a uma das fases de alteração deutérica,
“subsolidus”, que afectou as rochas graníticas. O início da alteração
hidrotermal que deu origem aos epissienitos, teve lugar posteriormente ao
processo de instalação e consolidação das rochas graníticas e quando estas já
se encontravam num nível crustal mais alto que o correspondente ao da sua
intrusão (Jaques, 2008).
A circulação dos fluidos esteve na dependência directa da intensidade da
fracturação que afectou localmente as rochas graníticas e, consequentemente, da
permeabilidade em grande que caracteriza estas estruturas. Assim, a circulação
do tipo “fissural” terá permitido a entrada no sistema de fluidos hidrotermais
que implicaram, principalmente, a dissolução do quartzo de origem magmática,
juntamente com a alteração das restantes fases minerais “graníticas” ao longo
dessas zonas. O aumento da porosidade, bem como, da permeabilidade da rocha
granítica que se registou durante a actuação deste processo de alteração terá,
de certo modo, induzido a circulação mais intensa desses fluidos com capacidade
para reagir com as restantes fases minerais.
Relativamente ao fenómeno principal de alteração hidrotermal que afectou as
rochas graníticas presentes em ambas as áreas de estudo, os fluidos
directamente relacionados com a albitização dos feldspatos e a dissolução do
quartzo de origem magmática (epissienitização) terão circulado, a uma escala
microscópica, ao longo de planos de IF (PIF) específicos, neste caso,
controlados pelo desenvolvimento de estruturas frágeis principais, que
determinaram a génese das zonas alteradas com enrubescimento.
De uma maneira geral, de acordo com os resultados obtidos através deste estudo,
poder-se-á concluir que o desenvolvimento do processo de epissienitização das
rochas graníticas presentes nas duas áreas, decorreu sob temperaturas
inferiores a 400 ºC, e que a pressão associada não terá ultrapassado os 120
MPa, para o caso de se considerarem condições litostáticas de circulação de
fluidos. Assim, a existência localizada de anisotropias estruturais mais
tardias, terá permitido o influxo e a circulação de fluidos hidrotermais, com
uma origem essencialmente meteórica, até profundidades não superiores a 5 km,
os quais interagiram localmente com as rochas graníticas, resultando na sua
alteração.