XXX: Notícia acerca dos carrascais arbóreos da Serra da Arrábida
XXX: Notícia acerca dos carrascais arbóreos da Serra da Arrábida
Jorge Capelo; Estação Florestal Nacional. Lisboa. Jorge.capelo@esoterica.pt
José Carlos Costa; Instituto Superior de Agronomia. Lisboa. jccosta@isa.utl.pt
Discussão: as populações arbóreas de "carrascos", i.e. Quercus
coccifera L. sensu lato, ocorrentes na Serra da Arrábida e conhecidos
pontualmente noutros pontos da metade sub-litoral do SW de Portugal
continental, sempre representaram uma dificuldade relativamente à posição
taxonómica e ecológica. A interpretação dos autores portugueses mais recentes,
foi assumir uma circunscrição lata no seio da variação de Q. coccifera L., sem
a aplicação de qualquer restritivo infra-específico (VASCONCELLOS e FRANCO,
1954; FRANCO in CASTROVIEJO et al.,1990). Sendo verosímil tratar-se de formas
arbóreas ocorrentes em habitats particularmente favoráveis, do ponto de vista
do solo e regime hídrico ' solos derivados de dolomias - deverá no entanto,
tomar-se em consideração a persistência de uma correlação de caracteres
morfológicos relativamente estável, nomeadamente: ritidoma fendilhado em
placas, ocorrência de muitas folhas de margem sub-inteira; número de pares de
nervuras lobais secundárias estatisticamentemaior [moda = 9 em Q. coccifera
árboreo da Serra da Arrábida vs. moda = 6 em carrascos exteriores a este
território], glandes fusiformes-oblongas a estreitamente ovadas mais longas que
nas plantas típicas e cúpula com escamas patentes da metade superior muito
compridas. Esta correlação está ainda claramente associada a uma área
biogeográfica circunscrita.
Foram aplicados a este táxone, os nomes específicos Quercus pseudo-coccifera
Desf. non Webb [Quercus pseudococcifera Webb = Q. mesto Webb fide auct. pl.] e
diversas combinações usando o primeiro como basiónimo [ e.g. Quercus coccifera
L. var. pseudococcifera (Desf.) A. DC in DC.; Q. coccifera subsp.
pseudococcifera (Desf.) Arcangeli]. Outros autores (e.g.COUTINHO, 1888),
conotaram ainda esta árvore com a var. imbricata A. DC. inDC. Alternativamente,
Q. calliprinos Webb. foi também sugerido como nome a aplicar (BRULLO, com.
pess.). Quanto a Q. pseudococcifera, parece corresponder consensualmente apenas
aos carrascos arbóreos do Mediterrâneo oriental (CAMUS, 1938). Em BM, LISE e
LISU, os exemplares atribuíveis a estes dois nomes são distintos dos
arrabidenses, pelo menor número de nervuras, tamanho, tipo de recorte e
consistência da folha (c.f. CAMUS, 1938). Por outro lado, a Q. calliprinos s.
l. têm sido referidos a totalidade dos carrascos arbóreos mediterrânicos, que
tratando-se aparentemente de um nome colectivo aplicável a um complexo de
táxones afins, não se adequa como modelo taxonómico e poderá por seu turno
corresponder apenas a um dos táxones centro-oriental-mediterrânicos.
Deste modo, propomos, filiado em Q. coccifera L., a aplicação dum novo
restritrivo subespecífico: Quercus coccifera L. subsp. rivasmartinezii nob.,
para designar os carrascos arbóreos dos substratos dolomíticos arrabidenses.
Quercus coccifera L. subsp. rivasmartinezii J.H. Capelo & J.C. Costa,
subsp. nova
Arbor ad 15 malta, cortice demum rimoso; a Querco coccifera typo differt
marginibus foliis plerumque sub-integris vel plus minusve dentatis, dentibus
mucronato-spinosis; venis secundaris utrinque7 ' 9(11), divaricatis; glande ex
oblongis ad anguste-ovatis vel anguste-obovatis: 19 ' 34 x 9 ' 12,5 mm; cupula
hemisphaerica squamis inferne laxe adpressis triangulari-lanceolatis breviter
acuminatis velutinis, sed superne patentibus vel retroflexis longissimis
acuminatis: 1,8 ' 3,3 mm.
Typus: LISIs.n., "Mata abaixo do Convento da Arrábida", 30-8-1939,
leg. G. Pedro & P. Torres s.n.
Haec arbor pulchra habitat maxime in nemora ad Serra da Arrábida dicta.
Cl. Salvador Rivas Martínez egregio hispano botanico et Universitatis
complutensis praeclaro magistro, hoc nomem grato animo dicamus.
=Quercus pseudo-coccifera auct. lusit. pl. non Desf.
=Q. pseudococcifera sensu auct. lusit. pl. Webb
=Q.mesto sensu auct. lusit non Boiss.
=Q. cocciferaL. var.imbricataA. DC. sensu Coutinho., p.p.
=Q. calliprinos auct. pl. non Webb
=Q. species vel varietas"arrabidensis", nom. nud. auct. lusit et
hisp. pluribus.
Diagnose: Árvore até 15 metros de altura e 60-70 cm de DAP, com ritidoma por
fim fendido em placas; diferindo ainda do tipo de Quercus coccifera pelas
margens das folhas frequentemente sub-inteiras ou mais ou menos dentado-
espinhosas; com 7-9 (11) pares de nervuras secundárias divaricadas; pela glande
oblonga a estreitamente ovada ou estreitamente obovada, maior que no tipo, com
19 ' 34 x 9 ' 12,5 mm; pela cúpula hemisférica com escamas curtas triangular-
lanceoladas, ligeiramente acuminadas e mais ou menos imbricadas na metade
inferior mas compridas (1,8 ' 3,3 mm), retroflexo patentes e longamente
acuminadas, na metade superior.
Ecologia: Árvore preferente de cambissolos eutricos profundos derivados
geralmente de calcários dolomíticos ou dolomias, podendo esporadicamente
ocorrer noutros substratos ricos em bases, como calcários, margas calcárias,
basaltos, arcoses, etc. Integra bosques cerrados da Quercetalia ilicis (Querco
rotundifoliae-Oleion sylvestris), no andar termomediterrânico sub-húmido quasi-
hiper-oceânico a eu-oceânico, sendo dominante nas comunidades arrabidenses do
Viburno tini-Quercetum (cocciferae) rivasmartinezii. Ocorre ainda mais
raramente como árvore co-dominante no Teucrio baetici-Quercetum suberis Rivas-
Martínez in Díez Garretas, Cuenca & Asensi 1986 português [subass.
centaureetosum crocatae Capelo inéd. = Myrto communis-Quercetum suberis sensu
Rivas-Martínez, Lousã, T.E. Diáz, F. Fernández-González & J.C. Costa 1990
nonBarbero, Benabid, Quézel &; Rivas-Martínez 1981 ex Rivas-Martínez, Costa
& Izco 1986]. Pode ocorrer pontualmente como arbusto alto a pequena árvore
noutros bosques da mesma aliança ou territorialmente afins (Asparago aphylli-
Quercetum suberis, Viburno tini-Oleeteum sylvestris, Arisaro clusii-Quercetum
broteroi).
Distribuição geográfica: quase estritamente ocorrente na Serra da Arrábida,
sendo conhecidos exemplares isolados na Serra de Grândola (S. Francisco da
Serra), Odemira (Ribeira do Torgal) e no superdistrito Olissiponense. É, com a
circunscrição taxonómica ora adoptada, endémico de Portugal.
Sintaxonomia: Em face da alteração taxonómica proposta e de acordo com o Código
de Nomenclatura Fitossociológica BARKMAN et al., 1986), - c.f. artigo 43 - a
introdução do epíteto sub-específico no nome do táxone dominante, justifica a
sua correcção nomenclatural: Viburno tini-Quercetum rivasmartinezii Rivas-
Martínez, Lousã, T.E. Diáz, F. Fernández-González & J.C. Costa 1990
correxit Capelo & J.C. Costa 2001 hoc loco[≡Viburno tini-Quercetum
cocciferae Rivas-Martínez, Lousã, T.E. Diáz, F. Fernández-González & J.C.
Costa 1990, Itinera Geobotanica (3): 54.].