Avaliação do Risco de Incêndio Florestal no Concelho de Arganil
Avaliação do Risco de Incêndio Florestal no Concelho de Arganil
Catarina Carvalho Antunes *, Domingos Xavier Viegas ** e José Manuel Mendes ***
*Mestre em Dinâmicas Sociais e Riscos Naturais
**Professor Catedrático
Universidade de Coimbra. Departamento de Eng.ª Mecânica, Pólo II, 3030-788
COIMBRA
***Professor Auxiliar
Universidade de Coimbra. Faculdade de Economia,Av. Dias da Silva, 165, 3004-512
COIMBRA
Sumário
O presente trabalho descreve o risco de incêndio florestal como um risco
natural, e tem como objectivo fazer a sua avaliação de acordo com o modelo
conceptual de risco internacionalmente aceite. Para área de estudo, foi
seleccionado o concelho de Arganil devido à sua extensa área florestal, à sua
apreciada paisagem natural, ao património histórico-cultural e aos espaços de
recreio, a fim de se aplicar uma metodologia original de integração das
variáveis físicas e sociais, com impacte no risco de incêndio, através de um
Sistema de Informação Geográfica (SIG). Além disso, identificaram-se os
elementos em risco e efectuou-se o cálculo do seu dano potencial. Como
resultado desta análise obtiveram-se dois mapas de risco: um respeitante às
perdas económicas e outro às perdas ambientais. A metodologia seguida permitiu
avaliar, por um lado, onde é mais provável que um incêndio florestal ocorra e,
por outro, onde existe maior potencial de perda. Os resultados obtidos neste
estudo mostram que, no concelho de Arganil, o índice de perigosidade é elevado
embora o índice de risco de incêndio florestal seja reduzido. Fica também
demonstrado que o cálculo do índice de risco de incêndio florestal baseado no
valor paisagístico revela que áreas como a Mata da Margaraça, a Aldeia
Histórica do Piódão e outros elementos de recreio florestal, são os que podem
sofrer as maiores perdas relativas com os incêndios florestais, o que teria
graves consequências no turismo e na economia da região.
Palavras-chave: Incêndio florestal; perigosidade; risco; dano potencial
Wildland Fire Risk in the Municipality of Arganil
Abstract
This paper describes forest fire risk as a natural risk and aims to make its
assessment in accordance with the conceptual model of risk internationally
accepted. For this purpose, the municipality of Arganil was chosen as a study
area due to its extensive forest area, its appreciated natural scenery, its
historical and cultural heritage and its recreational sites. Thus, a
methodology was developed for integration of physical and social variables
through a Geographic Information System (GIS). Moreover, components at risk
were identified and the potential damage estimated. As a final result two maps
of risk were obtained: one map economic on losses and other on losses to the
environment. The methodology used allowed to evaluate where is more likely that
a fire occurs and the greatest potential for loss. The results obtained from
this study showed that in the municipality of Arganil the wildland fire danger
index is high and the wildland fire risk index is low. It is also shown that
the wildland fire risk assessment based on the landscape value reveals that
natural reserve of Margaraça, the Historical Village of Piódão and other
recreational elements are those that may suffer the greatest losses with forest
fires, which would have serious consequences for the tourism and economy of the
region.
Key words: Wildland fire; hazard; risk; potential damage
Risque d'Incendie de Forêt dans la Municipalité d'Arganil
Résumé
Ce document décrit le risque d'incendie de forêt comme un risque naturel, et
vise à faire son évaluation, conformément aux modèles conceptuels du risque
internationalement acceptés. Dans ce travail, la municipalité de Arganil a été
choisie comme zone d'étude en raison de sa vaste zone forestière, de son
paysage naturel, de l'intérêt historique et culturel et de ses espaces de
récréation, afin d'appliquer une méthodologie, basée sur un système
d'information géographique (SIG), d'intégration des variables physiques et
sociales pouvant affecter le risque d'incendie. En outre, les éléments à risque
ont été identifiés et leur potentiel de dommage a été estimé. À la suite de
cette analyse ont été obtenues deux cartes de risque: l'une concernant les
pertes économiques et l'autre concernant les pertes environnementales. La
méthodologie a permis d'évaluer, d'une part, où sera plus probable qu'un
incendie de forêt survienne, et où il y aura un plus grand potentiel de perte.
Les résultats de cette étude montrent que, dans la municipalité d'Arganil,
l'indice de danger est élevé, bien que le taux de risque d'incendie de forêt
soit réduit. Il a été également montré que le calcul de l'indice de risque
d'incendie de forêt, basé sur la valeur du paysage, indique que la réserve
forestière de Margaraça, le village historique de Piódão et d'autres éléments
forestiers de loisir, seront ceux qui souffriront le plus de pertes liées aux
incendies de forêt, ce qui peut avoir de graves conséquences pour le tourisme
et l'économie de cette région.
Mots clés: Feu de forêt; danger; risque; dommage potentiel
Introdução
Nos países mediterrânicos, e particularmente em Portugal, centenas de incêndios
atingem, todos os anos, extensas áreas florestais causando avultadas perdas
ambientais, económicas e sociais. Este fenómeno é considerado como um risco
natural, não tanto por se desenvolver espontaneamente, mas por se processar na
Natureza e a sua propagação depender fortemente de factores naturais
(MILLINGTON, sd). Em sentido lato, entende-se como risco de incêndio florestal
a possibilidade de ignição do fogo através de causas humanas (acidentais ou
voluntárias) ou naturais (raios) (MACEDO e SARDINHA, 1987). No entanto, esta
noção é insuficiente na medida em que não integra as diferentes variáveis de
risco, nem contabiliza os danos causados pelos incêndios. Deste modo, BACHMANN
e ALLGÖWER (1999) colmatam estas lacunas ao definirem risco de incêndio
florestal como a probabilidade de um incêndio ocorrer num local específico, sob
determinadas circunstâncias, e das suas consequências esperadas se manifestarem
pelos impactes nos objectos afectados. Neste sentido, o risco expressa o
potencial de perda dos elementos, em função da perigosidade de um incêndio
florestal.
A avaliação do risco de incêndio florestal é um processo muito dificultado pelo
facto de os incêndios serem um fenómeno complexo e por serem provocados, na sua
quase totalidade, pela acção humana. A avaliação do risco baseia-se, em geral,
num modelo de integração dos factores que contribuem para o risco de incêndio
florestal: coberto vegetal, topografia e meteorologia, acrescido dos factores
ou variáveis sociais. Este método de avaliação do risco traduz-se, geralmente,
em índices que podem ser materializados em mapas nos quais estão expressas
zonas ou níveis de risco. Segundo OLIVEIRA (2002), estes mapas de risco
proporcionam uma visualização da distribuição espacial do risco através de
áreas delimitadas, em função do potencial de ocorrência e propagação do fogo e
identificadas pelas características ambientais comuns, que se traduzem num
mesmo potencial de perigo.
A avaliação do índice de risco de incêndio florestal traduz-se, pois, numa
ferramenta de apoio ao planeamento, ao permitir a identificação das zonas mais
susceptíveis e, portanto, com um perigo de incêndio mais elevado. Porém, a
identificação de zonas com perigo de incêndio mais elevado não significa que se
um incêndio ocorrer, se desenvolva unicamente nessas zonas já que o
comportamento do fogo é muito variável (CHUVIECO e CONGALTON, 1989). Contudo,
esta avaliação do índice de risco revela-se de grande utilidade na definição de
acções de planeamento e ordenamento florestal com vista à distribuição dos
recursos e equipamentos destinados à prevenção ou, ainda, na hierarquização de
prioridades relacionadas com a supressão do fogo, de acordo com o nível de
perigo determinado.
De acordo com a sua escala temporal, os índices de risco de incêndio podem ser
classificados em três classes: dinâmicos ou de curto prazo, estruturais ou de
longo prazo e integrados ou avançados (VORISSIS, 1999).
Os índices de risco dinâmico ou de curto prazo baseiam-se em parâmetros que
variam de forma quase contínua, como as condições meteorológicas e o estado da
vegetação. De entre a variedade de índices de curto prazo existentes destaca-se
o índice Canadiano para Indexação do Perigo de Incêndio (Canadian Fire Weather
Índex - FWI), adaptado para Portugal e utilizado pelo Instituto de Meteorologia
desde 1998. Segundo VIEGAS et al. (1999) este é o método de cálculo cujo
desempenho é melhor e que possui maior capacidade preditiva do perigo para
fogos de Verão.
Os índices de longo prazo ou estruturais assentam em variáveis estáticas ou que
não variam rapidamente ao longo do tempo. Deste modo, estes índices permitem
explicar, em igualdade de circunstâncias meteorológicas, a variabilidade
espacial decorrente dos diversos factores de risco, identificando regiões onde
a probabilidade de incêndio é mais elevada. Esta abordagem é muito útil na
percepção dos padrões de risco de incêndio (CHUVIECO et al., 1997) e é válida
durante um período de tempo alargado. Contudo, está confinada a uma aplicação
regional (FREIRE et al., 2002).
Os índices de risco integrados ou avançados incluem, simultaneamente, variáveis
estáticas e dinâmicas, devidamente ponderadas, e assentam no princípio de que a
ocorrência e propagação de um incêndio florestal são condicionadas por factores
de natureza e variação temporal distintas exigindo, deste modo, uma análise
integrada desses parâmetros (CARVALHO, 2005).
A impossibilidade de utilização dos parâmetros dinâmicos neste trabalho impediu
a modelação de um índice integrado de risco de incêndio florestal. Deste modo,
o presente estudo tem como objectivo determinar um índice de risco de incêndio
florestal de longo prazo, baseado na modelação da perigosidade, de acordo com a
integração de variáveis físicas e sociais e na quantificação do dano potencial
dos elementos que se encontram sujeitos ao risco. Os mapas obtidos poderão
constituir um contributo inovador para a avaliação do risco de incêndio
florestal generalizável a outras regiões.
Área de estudo
Este trabalho tem como área de estudo o concelho de Arganil, o qual se localiza
na Região Centro de Portugal (Figura 1). A sua sede concelhia situa-se à
latitude 40º13'N e longitude 08º03'W e, em termos administrativos, engloba
dezoito freguesias, abrangendo uma superfície total de 332,8 Km2 (INE, 2002). O
relevo deste território é fortemente determinado pela variedade geomorfológica,
oscilando a altimetria entre os 70 metros no vale do rio Alva e os 1342 metros
no cume da Serra do Açor. De um modo geral, o clima caracteriza-se por uma
influência marcadamente mediterrânea, embora atenuado pela interferência
oceânica, assim como pela altitude.
Figura 1 ' Enquadramento geográfico do concelho de Arganil. Fonte: IGP
Relativamente à cobertura vegetal, os matos são a classe mais abundante no
território, seguindo-se os povoamentos florestais de eucaliptais e pinhais. Em
termos paisagísticos, os elementos naturais ocupam um lugar de destaque, com
extensas áreas territoriais enquadradas em regimes especiais de protecção, como
é o caso da Área de Paisagem Protegida da Serra do Açor (APPSA), onde está
incluída a Mata da Margaraça, que constitui uma Reserva Integral. A par das
áreas protegidas, as aldeias de xisto, como a Aldeia Histórica do Piódão,
desempenham um forte atractivo em termos de turismo rural, com impacte a nível
nacional e internacional.
Materiais e método
Os riscos naturais são acontecimentos incontroláveis e inesperados de invulgar
magnitude que ameaçam pessoas, actividades e infraestruturas (NHERC, 2008).
Neste sentido, o risco pressupõe valor e expressa o potencial de perda de
elementos, em função da perigosidade de um determinado fenómeno e da
vulnerabilidade desses mesmos elementos em risco. A perigosidade equivale ao
que na literatura anglo-saxónica se designa por hazard. Segundo a definição de
VARNES (1984), a perigosidade é a probabilidade de ocorrência de fenómenos
potencialmente destruidores, com um nível de intensidade ou gravidade
determinado, num intervalo de tempo e num local específicos. Esta noção de
perigosidade engloba duas dimensões: tempo e espaço. A dimensão temporal
expressa-se pela probabilidade de ocorrência do fenómeno no tempo, cujo cálculo
se pode basear no histórico existente para o evento; a dimensão espacial advém
da susceptibilidade ou propensão para um território, face aos seus factores
condicionantes, ser afectado pelo evento natural, independentemente do seu
período de recorrência (VERDE e ZÊZERE, 2007). O conceito de vulnerabilidade
foi introduzido por VARNES (1984), e corresponde ao grau de dano ou perda
potencial num determinado elemento ou conjunto de elementos como consequência
da ocorrência de um fenómeno de determinada intensidade. O seu valor expressa-
se numa escala que varia entre zero (não ocorre qualquer dano) e um (o dano é
total), resultando na destruição do elemento em risco (VARNES, 1984; CARDONA,
2003).
Quantitativamente, o risco (R) é muitas vezes expresso pelo produto entre a
perigosidade (P) e a vulnerabilidade (V) (FELL, 1994; PEDUZZI et al., 2001;
UNDP, 2004; DILLEY et al., 2005; CARDONA et al., 2005).
Contudo, uma dificuldade que essa abordagem levanta é a de não conseguir
diferenciar adequadamente a perda real de elementos diferentes com a mesma
vulnerabilidade. Para colmatar esta dificuldade surgiu a necessidade de
introduzir o valor dos elementos (S), seja este um valor económico ou outro.
Neste contexto, surge o conceito de dano potencial, o qual se reporta a todos
os elementos em risco: população, edificações e obras de engenharia,
actividades económicas, serviços públicos, infraestruturas e património natural
na área potencialmente afectada pelo processo considerado (FILHO, 2001; IUGS,
1997). O dano potencial corresponde ao produto entre a vulnerabilidade dos
elementos e o seu respectivo valor. Deste modo, a fórmula de cálculo de risco
sofre uma modificação, passando o risco a ser entendido como o produto entre a
perigosidade e o dano potencial, fórmula esta que se encontra de acordo com o
quadro conceptual internacionalmente aceite no domínio dos riscos naturais
(VERDE e ZÊZERE, 2007).
A modelação da perigosidade de incêndio florestal consistiu num processo de
análise multi-critério ou multi-variável executado de acordo com a metodologia
desenvolvida por ALMEIDA et al. (1995) tendo, no entanto, sido efectuadas
algumas alterações. A utilização deste tipo de metodologia no desenvolvimento
de cartografia de perigo de incêndio florestal não é original, tendo sido
anteriormente utilizada por CHUVIECO e CONGALTON (1989) e FERRAZ e VETTORAZZI
(1998), entre outros. Contudo, a opção pela sua utilização deve-se ao facto de
se tratar de uma metodologia intuitiva e completa, adaptada às características
do problema e que reconhece as suas variadas facetas.
Neste sentido, efectuou-se a selecção de variáveis de acordo com a sua
representatividade ou contributo para a perigosidade, havendo o especial
cuidado de seleccionar apenas variáveis independentes entre si, de modo a
reduzir o efeito de enviesamento dos resultados por autocorrelação. Estas
variáveis, cujo carácter exclusivamente biofísico/natural ou social nem sempre
está bem definido, podem ser classificadas, quanto à sua natureza, em três
grupos distintos: físicas, sociais e histórico-geográficas. Do grupo de
variáveis físicas fazem parte o uso e ocupação do solo, a hidrografia e a
orografia, concretamente, o declive e a exposição solar. No grupo de variáveis
sociais estão incluídos aspectos como: densidade demográfica, interface urbano/
florestal, rede viária, espaços de recreio florestal e componentes
infraestruturais específicos de defesa da floresta contra incêndios,
nomeadamente, postos de vigia, pontos de abastecimento de água e quartéis de
bombeiros. Relativamente à variável histórico-geográfica, o critério utilizado
foi a incidência espacial de incêndios. Assim, da série estatística de áreas
ardidas entre 1975 e 2005 seleccionaram-se aleatoriamente dez anos para
validação independente do modelo, e utilizaram-se os restantes vinte e um anos
para a modelação.
O passo seguinte consistiu em integrar as variáveis, de modo a reflectirem o
perigo que lhes está associado, tendo-se procedido à ponderação de cada
variável e atribuição de pesos às suas sub-classes de acordo com a sua
importância na perigosidade de incêndios florestais, correspondendo os valores
mais elevados a uma maior influência na ocorrência dos incêndios florestais, e
os valores mais baixos a uma influência mais reduzida (Quadro 1) para
posteriormente efectuar a soma ponderada das mesmas.O método de ponderação
usado foi o método de "comparação entre pares de critérios". Para este efeito,
a informação vectorial relativa às diferentes variáveis foi rasterizada (em
formato Grid com uma resolução de pixel de 10 metros de lado), recorrendo a
software SIG (ArcGIS 9.1®). O modelo utilizado foi organizado de modo a que o
índice de perigosidade de incêndio varie entre 0 (perigo mínimo) e 1 412
(perigo máximo). Este método permitiu a reclassificação do resultado da soma
ponderada das variáveis em cinco classes de perigosidade (Muito Baixa, Baixa,
Média, Elevada e Muito Elevada), com intervalos de valores constantes para cada
classe.
Quadro 1 ' Matriz de ponderação e valoração das variáveis. Adaptado de: ALMEIDA
et al.(1995)
Após a modelação da perigosidade, como forma de validação do modelo utilizado,
efectuou-se o cálculo da incidência relativa da área ardida, entre 1975 e 2005,
sobre as classes de perigosidade de incêndio florestal. A relação de
proporcionalidade resultou do quociente entre a proporção de área ardida em
cada classe e a proporção de cada classe de perigosidade.
Relativamente ao cálculo do dano potencial dos elementos, neste trabalho, a
floresta foi considerada determinante, uma vez que, para além de ser vulnerável
a incêndios, desempenha duas importantes funções, essenciais para a
sustentabilidade do concelho de Arganil, produção e conservação. Este facto
conduziu à adopção de dois tipos de valoração: económica e paisagística. Neste
sentido, as perdas potenciais apuradas são de duas ordens, apesar de se
encontrarem intrinsecamente ligadas, sendo o resultado final constituído por
duas análises distintas de danos potenciais. No que concerne à vulnerabilidade
dos elementos, a sua atribuição foi efectuada de acordo com o nível ou grau de
destruição a que os elementos estão sujeitos face um incêndio.
Quanto ao dano potencial exclusivamente económico, a sua quantificação resultou
da atribuição de valores monetários às classes de uso e ocupação do solo, de
acordo com o vigente na Portaria n.º 1152/2006, de 30 de Outubro, relativamente
aos custos de construção de edificações e infra-estruturas, e no documento
"Estratégia Nacional para as Florestas" elaborado pela AFN (2006), onde estão
definidos os valores de mercado das diferentes espécies florestais (Quadro 2).
Desta forma, este dano potencial traduz-se na perda monetária por área de
superfície.
Quadro 2 ' Valores de referência para vulnerabilidade e valor económico dos
elementos e respectivo dano potencial
Relativamente às perdas potenciais na paisagem, ou seja, o dano potencial
paisagístico, a sua quantificação foi efectuada por extrapolação e ajustamento
dos valores de referência propostos pelo ICNB (2007) para as unidades de
paisagem (Quadro 3). Estes valores paisagísticos, e por inerência os danos
potenciais na paisagem, são adimensionais, uma vez que o valor paisagístico
resulta da atribuição numérica a parâmetros classificados qualitativamente.
Neste âmbito, identificaram-se os seguintes elementos ou unidades de paisagem
de carácter natural e/ou antrópico: a Mata do Hospital e o Santuário do
Montalto, na freguesia de Arganil; um núcleo de Quercus suber na freguesia de
Folques; a reserva de recreio da Fraga da Pena e o Vale da Ribeira do
Carqueivão, na freguesia de Benfeita; a Mata da Margaraça, nas Freguesias de
Benfeita, Teixeira e Moura da Serra; a Mata do Convento, um núcleo de Quercus
Pyrenaica e um núcleo de Acer Monspessulanum, na freguesia de Vila Cova de
Alva; e a Aldeia Histórica do Piódão, na freguesia de Piódão, para além das
aldeias, socalcos agrícolas, pinhais e matos existentes em todas as freguesias.
Quadro 3 ' Valores de referência para vulnerabilidade e valor paisagístico dos
elementos e respectivo dano potencial
Por último, a integração dos componentes de risco (perigosidade e dano
potencial) obedeceu à fórmula seguinte:
Dado que foram considerados dois danos potenciais diferentes para os elementos
em risco e as suas unidades não são compatíveis entre si, da avaliação do risco
de incêndio florestal resultaram dois mapas de risco. Tal como na modelação de
perigosidade, os resultados obtidos nos mapas de risco foram distribuídos por
cinco classes (Muito Baixo, Baixo, Médio, Elevado e Muito Elevado), através de
quebras naturais.
Resultados e discussão
O mapa de perigosidade obtido através da integração das diferentes variáveis
indica que, em termos gerais, as áreas de perigo Muito Elevado (17,5%)
localizam-se, predominantemente, no sector Este do concelho, ao longo das
vertentes da Serra do Açor (Figura 2).
Figura 2 ' Mapa de perigosidade de incêndio florestal
As áreas de perigosidade Elevada (45,6%) conjuntamente com as áreas da classe
Média (25,1%) são as que têm maior representatividade e distribuem-se
fragmentariamente por todo o concelho. Já as classes de perigo mais reduzido,
Baixa (10,6%) e Muito Baixa (1,2%), têm pouca representatividade no território
e concentram-se, essencialmente, nos núcleos populacionais das freguesias que
se estendem ao longo do vale do rio Alva. Note-se que a predominância das
classes mais altas de perigosidade no sector Este do concelho deve-se,
fundamentalmente, aos acentuados declives; às extensas áreas de matos, os quais
possuem elevado grau de combustibilidade; à baixa densidade de caminhos
agrícolas e florestais, cujas características impedem um tempo de deslocação
reduzido por parte dos meios de combate a incêndios florestais; e ainda, à
forte incidência das áreas ardidas neste sector do concelho.
O cálculo da incidência das áreas ardidas, entre 1975 e 2005, sobre o mapa de
perigosidade deu origem a duas curvas: sucesso e validação (Figura 3). A curva
de sucesso resulta da aplicação das áreas ardidas utilizadas na construção do
modelo, e a curva de validação resulta da aplicação das áreas ardidas que não
foram consideradas na construção do modelo (no caso em apreço, áreas ardidas
dos dez anos seleccionados aleatoriamente para este efeito). Para ambas as
situações verifica-se uma incidência crescente com o aumento da perigosidade,
apesar de, como seria de esperar, ser menor na curva de validação. A curva de
sucesso do mapa de perigosidade demonstra que, quando se consideram os 17,5% da
área total classificada com perigosidade Muito Elevada, verifica-se que ela
integra 80% da área ardida. A curva de predição demonstra que mais de 50% da
nova área ardida está constrangida aos 17,5% da área classificada com maior
perigosidade. Neste sentido, a curva de sucesso indica um bom ajustamento do
modelo utilizado e a curva de validação evidencia que o modelo tem um
comportamento eficiente para representar a perigosidade de incêndio florestal
no concelho de Arganil.
Figura 3 ' Incidência relativa das áreas ardidas nas classes de perigosidade
O mapa de risco de incêndio florestal, resultante do produto entre a
perigosidade e o dano potencial económico, evidencia que a classe de risco
Muito Baixo (59,6%) é a dominante no concelho de Arganil (Figura 4). Para a
prevalência desta classe de risco muito contribuiu o facto de os matos serem,
simultaneamente, os elementos com maior predominância no território e, também,
aqueles que detêm o dano potencial mais reduzido, em virtude do seu baixo valor
monetário.
Figura 4 ' Mapa de risco de incêndio florestal em função do valor económico
As classes de risco Baixo (15,0%) e Médio (17,0%) surgem dispersas por todo o
concelho, circundando as superfícies urbanas ou mesmo nas encostas serranas
onde se localizam algumas das superfícies agrícolas, bem como povoamentos
mistos e puros de pinhal.
A classe de risco Elevado (7,2%) é pouco significativa e a sua incidência é
maior no sopé da cadeia montanhosa, onde os povoamentos de eucaliptal ocupam
grandes extensões. A estes povoamentos a metodologia utilizada conferiu
perigosidade e dano potencial consideravelmente elevados, o que incrementou o
risco de incêndio florestal.
A classe de risco Muito Elevado (1,2%) tem uma expressão territorial muito
reduzida, estando representada nos principais núcleos urbanos e nos espaços
destinados aos pólos industriais, os quais se localizam próximo das principais
vias rodoviárias. Na maioria das superfícies urbanas o perigo de incêndio
florestal é reduzido, no entanto, o facto de o dano potencial ser muito elevado
incrementa o risco, especialmente nas áreas de interface urbano-florestal, onde
o perigo de incêndio é elevado.
Relativamente ao mapa de risco de incêndio florestal resultante do produto
entre a perigosidade e o dano potencial paisagístico, verifica-se que as
classes de risco se distribuem em duas áreas geográficas distintas (Figura 5).
As classes de risco mais baixas ' Muito Baixo (17,1%) e Baixo (33,6%),
localizam-se nas freguesias do vale do rio Alva, ao passo que as classes de
risco mais altas ' Médio (39,2%) e Elevado (9,7%), se distribuem ao longo da
Serra do Açor. A classe de risco Muito Elevado (0,4%) é, praticamente, residual
e a ela correspondem as áreas abrangidas pela Aldeia Histórica do Piódão e pela
Mata da Margaraça.
Figura 5 ' Mapa de risco de incêndio florestal em função do valor paisagístico
Conclusões
No presente estudo foi possível concretizar com sucesso a avaliação do risco de
incêndio florestal com recurso a variáveis físicas e sociais e à valoração dos
elementos. Da integração das variáveis, através da sua soma ponderada, no
modelo de perigosidade resultou um mapa de perigo de incêndio florestal que
indica que, no concelho de Arganil, na sua globalidade, os níveis de
perigosidade são elevados. Estes resultados devem-se, essencialmente, às
condições morfológicas propícias à eclosão e desenvolvimento de incêndios
florestais, à disponibilidade de material com elevada combustibilidade e à
forte incidência de incêndios nas últimas décadas. Em suma, as características
físico-naturais deste concelho potenciam a ocorrência de incêndios. Devido aos
baixos níveis de presença humana, as características sociais demonstram ter um
papel redutor na eclosão do fogo, mas, opositor na sua supressão. Estes dados
revelam que é urgente tomar medidas de prevenção eficazes tais como: a gestão
de faixas de combustíveis com vista à compartimentação dos espaços florestais,
o reforço dos postos de vigia, a construção e manutenção de aceiros e a
melhoria na eficácia da primeira intervenção, preconizada pelas diferentes
equipas a quem foi atribuída esta competência. Estas medidas, para que surtam
efeito, implicam o contributo e participação de todos os agentes da gestão do
território, inclusivamente das populações.
Relativamente ao índice de risco de incêndio florestal, conclui-se que as duas
metodologias utilizadas indicam que o concelho de Arganil apresenta, na
generalidade, níveis baixos de risco; o que significa que o potencial de perda
perante o fenómeno incêndio é reduzido. Este resultado decorre do facto de os
elementos com maior dano potencial, económico ou paisagístico, terem uma baixa
representatividade cartográfica no concelho. No entanto, a propensão a
incêndios (que poderão atingir dimensões catastróficas) expressa no mapa de
perigosidade, possibilitará a ocorrência de eventuais perdas avultadas,
sobretudo nos elementos que fazem parte do ex libris que o concelho de Arganil
oferece em termos turísticos, e dos quais muito depende a subsistência de
habitantes deste concelho, para além das possíveis perdas irreversíveis ao
nível do património natural.
Neste sentido, os mapas obtidos revelam-se de grande utilidade. O mapa de
perigosidade é particularmente indicado para acções de defesa da floresta
contra incêndios, concretamente nas acções de prevenção, permitindo identificar
os locais onde o potencial para a ocorrência de incêndios florestais é maior e
onde um incêndio poderá adquirir maior magnitude. Por outro lado, o mapa de
risco de incêndio florestal é relevante, sobretudo, em acções de supressão,
permitindo identificar o potencial de perda de cada lugar cartografado; não
obstante, este mapa pode ser utilizado em acções de planeamento e gestão da
floresta, quando analisado em conjunto com o mapa de perigosidade. Os índices
expressos nos dois mapas produzidos neste trabalho adquirem uma utilidade
prática, ainda maior quando conjugados com o índice diário de risco de
incêndio, uma vez que têm um carácter de complementaridade no processo de
tomada de decisões.
Os índices obtidos têm, aproximadamente, uma validade temporal de trinta anos,
contudo, caso ocorram mudanças drásticas de alguns factores, o cenário pode ser
alterado. As variáveis fisiográficas não tenderão a sofrer mudanças, em
contrapartida, as restantes variáveis estão sujeitas a modificações que podem
ser mais ou menos rápidas. A manutenção da tendência expressa nas últimas
décadas para a diminuição da população e o aumento das áreas ocupadas por
matos, conduzirá a modificações que poderão ser ainda mais acentuadas do que o
previsto. Por sua vez, a diminuição populacional colocará em causa a melhoria
das infraestruturas de defesa da floresta contra incêndios. De igual modo, os
valores monetários dos elementos poderão sofrer grandes oscilações, o que
implicará a actualização do mapa de risco de incêndio florestal.