Quantificação da Biomassa em Pinhal Bravo recorrendo a Fatores de Conversão e
Expansão (Bcefs)
Introdução
Os estudos de biomassa florestal são feitos com propósitos variados, entre os
quais se destaca a quantificação da biomassa para avaliação da produção
primária líquida e armazenamento de carbono, avaliação de resíduos florestais
para fins energéticos e quantificação da reciclagem de nutrientes. Em qualquer
dos casos referidos, estes estudos são de grande importância para a tomada de
decisões de gestão dos recursos florestais (Páscoa et al., 2004). A utilização
de biomassa florestal para bioenergia é cada vez mais reconhecida ao nível dos
países da Europa, fazendo parte de uma estratégia integrada, que visa a
mitigação das alterações climáticas, o aumento da segurança das energias
renováveis e a prevenção dos fogos florestais (VIANA et al. 2012). A United
Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC) e, em particular, o
Protocolo de Quioto, reconhecem igualmente a grande importância da biomassa e
do carbono florestal e a necessidade de monitorizar, conservar e aumentar o seu
armazenamento, na medida em que este influencia a concentração de CO2
atmosférico.
A biomassa florestal pode ser avaliada através de dois métodos: o método
destrutivo, que engloba a quantificação de pesos e / ou volumes de árvores
individuais, a partir do corte de material lenhoso; e o método não destrutivo,
através do qual se procede à estimação do volume ou da biomassa através de
modelos matemáticos, normalmente através da utilização de equações alométricas.
Na maior parte das situações, o primeiro método é reservado à obtenção de dados
que permitam o desenvolvimento dos modelos.
O modelo alométrico apresenta a expressão geral , ondeY representa o volume ou
a biomassa (do tronco, por exemplo), Xrepresenta o diâmetro a 1,30 m e a e b
são constantes. A relação assume que o crescimento em biomassa é proporcional
ao crescimento em diâmetro. Quando a estimação é feita em volume, o valor
obtido pode ser convertido em biomassa utilizando um valor médio da densidade
do lenho.
Um método expedito que tem sido proposto para obtenção indireta de valores de
biomassa dos povoamentos assenta nos designados BCEFs (Fatores de Conversão e
Expansão de Biomassa). Genericamente, os BCEFs são fatores que permitem
converter valores de volume do tronco, em biomassa, seguida da expansão do
quantitativo em biomassa para outra(s) componente(s) das árvores. Os fatores
são calculados através do quociente entre a biomassa da componente em
consideração (copa, aérea e total) e o volume do tronco da(s) árvore(s). Este
método, inicialmente divulgado por Johnson e Sharpe (1983), tem sido usado por
diversos autores (por exemplo, BROWN, 2002; LEHTONEN et al., 2004; SOMOGYI et
al., 2006; FAIAS, 2009; SANQUETTA, 2011 e CASTEDO-DORADO et al., 2012), para
diferentes ecossistemas florestais.
A utilização destes fatores é extremamente útil dado que na maior parte dos
inventários florestais a informação relativa ao volume dos povoamentos (ie, ao
valor acumulado dos volumes dos fustes) encontra-se, de um modo geral,
facilmente acessível, o mesmo não se podendo dizer quanto à biomassa do tronco
e da copa, ou mesmo dos valores individuais de variáveis como o diâmetro e a
altura das árvores. A facilidade de aplicação para recuperação de informação
expressa em biomassa torna estes fatores muito interessantes para monitorização
de alterações em biomassa e em carbono. O uso dos BCEFs está previsto e é
aconselhado pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC, 2006 ' Vol.
4, Cap. 2, p. 2.12 e seguintes) nos casos em que a informação sobre a
quantidade de biomassa não está disponível e é necessário obter estimativas com
base em dados de volume.
O presente trabalho tem como objetivo a análise dos fatores de conversão e
expansãopara povoamentos de pinheiro bravo (Pinus pinaster Ait.). O pinheiro
bravo é a espécie resinosa com maior representatividade em Portugal, ocupando
27% da área florestal (885.000 ha) do território continental e responsável por
um volume de 64,1 milhões de m3. A gestão dos povoamentos desta espécie tem
como objetivo principal a produção de madeira maciça, tendo em consideração
todas as boas práticas culturais que lhe estão subjacentes. O modelo de
condução mais comum considera rotações de 40 a 50 anos com realização de 2-
3 desbastes com espaçamentos de 5 a 10 anos ou de acréscimos em altura
dominante da ordem dos 2 metros (OLIVEIRA et. al., 2003). Esta prática visa
redistribuir o potencial produtivo da estação pelos indivíduos escolhidos para
manter no povoamento e, simultaneamente, facultar rendimentos intermédios antes
do termo de explorabilidade. Este tipo de material de menores dimensões
retirado em desbaste tem cada vez mais interesse para aproveitamento de
biomassa para energia, o que poderá levar a modificações quanto aos modelos de
silvicultura adotados para a espécie, com promoção de rotações mais curtas.
As existências desta espécie têm sido, historicamente, quantificadas em volume
e restringidas à componente do fuste limpo, por ser a componente comercialmente
com maior valor. O interesse crescente pelas avaliações em biomassa, não só do
tronco, mas também da copa (ramos e agulhas) e mesmo das raízes, torna
interessante o estudo de fatores de conversão e expansão para esta resinosa
para permitir avaliar, de forma expedita, a produção lenhosa, expressa em
biomassa.
Pretende-se, especificamente, estudar a variação dos BCEFs em séries temporais
e entre povoamentos com caraterísticas dendrométricas distintas. As componentes
consideradas são (1) a copa, (2) a parte aérea (tronco e copa) e (3) a parte
aérea e subterrânea (tronco, copa e raízes).
Para exemplificação, concretiza-se a aplicação dos fatores, generalizando uma
tabela de produção estabelecida para a espécie para facultar estimativas de
biomassa para as componentes supracitadas.
Material e métodos
Este estudo teve como suporte a base de dados de parcelas permanentes Data
Pinaster, criada em 1997 e atualizada periodicamente ao abrigo de projetos de
investigação e experimentação conduzidos no Departamento de Ciências Florestais
e Arquitetura Paisagista da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
Foram utilizados dados de 41 parcelas, localizadas no Vale do Tâmega,
apresentando três séries de medições em 23 delas, e duas séries de medições nas
restantes 18, num total de 105 observações. Estes dados abrangem povoamentos de
pinheiro bravo, em diferentes fases fisionómicas de desenvolvimento e
densidades, como se mostra no Quadro_1.
A classificação das fases de desenvolvimento tem por base os valores das
caraterísticas diâmetro e altura das árvores dominantes, conforme indicado por
OLIVEIRA et al. (2000).
A variação do número de árvores e da área basal, acompanha o padrão esperado ao
longo do desenvolvimento dos povoamentos.
A partir dos dados colhidos no campo, foram calculadas diferentes variáveis
dendrométricas, cujas estatísticas sumárias são apresentadas no Quadro_2.
Calcularam-se ainda, no mesmo número de séries, os BCEFs para a componente
aérea da árvore e também para a soma das componentes aérea e subterrânea
(raízes) da árvore.
Para o cálculo da biomassa (de cada componente e total) utilizaram-se as
equações alométricas propostas por LOPES (2005). Para o cálculo dos BCEFs (t m-
3) adotou-se a seguinte expressão:
ondeV representa o volume do povoamento (m3ha-1) e Ba biomassa (peso seco, t
ha-1), da componente i,neste caso, da copa, da componente aérea (tronco e copa)
e total (tronco, copa e raízes). O volume refere-se à componente do tronco, com
casca, e assume o cepo com uma altura de 10 cm, tendo sido calculado através do
modelo apresentado por FONTE (2000).
Resultados e discussão
Caraterização estatística dos parâmetros do povoamento
Na sequência do tratamento de dados apresenta-se no Quadro_2 a descrição
estatística sumária das variáveis dendrométricas (n=105 observações).
Tal como é visível no Quadro_2, a base de dados abrange povoamentos com uma
grande amplitude de idades (t), de densidade, e de produção em volume (V) e em
biomassa (B). A variação do índice de qualidade de estação (SI, definido como a
altura dominante à idade de referência de 35 anos; MARQUES, 1987) mostra que
foram abrangidos povoamentos em estações de qualidade inferior, média e
superior, com predominância da classe de qualidade média (14 <SI=18m).
Perante os resultados obtidos para os fatores de conversão e expansão,
confirma-se que não é adequado usar-se um valor médio de BCEF para o pinheiro
bravo, atendendo aos valores de dispersão determinados para qualquer das
componentes em análise (Coeficientes de Variação entre 9 a 15%).
Para aprofundar o estudo obteve-se a matriz de correlação (r) entre os
principais parâmetros dendrométricos dos povoamentos e os BCEFs. No Quadro_3
sumariam-se os resultados obtidos por ordem decrescente de significância (para
esta amostra, r = 0.304 a 5%).
Verifica-se que a altura dominante é a variável que melhor se correlaciona com
os BCEFs das diferentes componentes, sendo essa associação de sentido inverso,
ou seja, o BCEF é tanto menor quanto maior for a altura dominante. Uma
tendência, no mesmo sentido, é verificada com a variável idade, sendo esta a
segunda mais importante para as componentes da copa e total. Este padrão é
atribuído à existência de alometrias distintas ao longo do estádio de
desenvolvimento dos povoamentos, com uma maior alocação relativa da biomassa
para a componente tronco, à medida que se avança para a maturidade. Resultados
apresentados por PORTÉ et. al. (2002) para povoamentos de pinheiro bravo de
diferentes idades, acerca da distribuição da biomassa total por componentes,
confirmam esta tendência. Segundo PORTÉ et. al. (2002), a percentagem de
biomassa dos ramos relativamente à biomassa total diminui expressivamente com a
idade. No estudo realizado, os autores referem valores de 49,3 % aos 5 anos,
comparativamente a valores de 13,2 e 11,4 %, respetivamente, para povoamentos
de 26 e 32 anos.
Uma vez que a altura dominante é uma variável que conjuga em simultâneo a idade
e a qualidade da estação, é natural que o indicador altura dominante tenha uma
relação ainda mais acentuada com os BCEFs do que a idade. Refira-se que FAIAS
(2009), também tinha assinalado uma relação significativa entre os fatores de
conversão e expansão de biomassa e a altura dominante, para povoamentos de
pinheiro bravo e de eucalipto.
Dado não ser suficientemente preciso usar um valor médio de BCEFpor componente,
propõe-se a modelação da relação dos fatores em função da altura dominante dos
povoamentos, dado ser esta variável a que apresenta um grau de associação mais
forte com estes fatores (r>-0,7, Quadro_3).
Criação de modelos para estimação dos BCEFs
A análise gráfica entre os BCEFs e a variável hd, evidenciou uma relação
curvilínea entre as variáveis, daí ter-se optado por utilizar o modelo
alométrico para traduzir esta relação. A estimação dos modelos não lineares
considerando como variável dependente o BCEFe como regressor a altura dominante
foi feita por aplicação do método de Gauss-Newton, recorrendo ao programa JMP.
O ajustamento das curvas encontra-se representado graficamente na Figura_1.
Pela análise visual dos diagramas, pode-se verificar que os modelos
desenvolvidos conformam-se bem com a dispersão das observações.
O resultado dos ensaios está sumariado no Quadro_4.
De acordo com o teste de t, todos os coeficientes são assintoticamente
significativos, para um nível de probabilidade de 0,05 ou inferior.
A análise gráfica do padrão dos resíduos relativamente aos valores estimados
pelos modelos, não revelou qualquer padrão que traduzisse uma situação de
violação relativa aos pressupostos assumidos aquando da estimação do modelo,
nomeadamente vestígios de heterocedasticidade ou uma especificação incorreta da
forma funcional do modelo.
Para consubstanciar este estudo apresenta-se no Quadro_5 uma adaptação da
tabela de produção para o pinhal bravo do Vale do Tâmega (Moreira e Fonseca,
2002), generalizada à avaliação de biomassa com base nos modelos supracitados.
O exemplo respeita a uma Qualidade de estação média (SI= 16 m, MARQUES, 1987).
No que respeita aos valores expressos em biomassa, a simplicidade da previsão
da produção lenhosa torna-se ainda maior, esperando-se que os modelos de
estimação dos BCEFs apresentados neste trabalho sirvam de apoio à gestão dos
povoamentos de pinheiro bravo. A possibilidade de generalização a estimativas
de biomassa de outras componentes que não apenas o tronco, permite a obtenção
de avaliações expeditas ao nível de resíduos florestais e de ganhos e perdas em
carbono, da componente arbórea dos ecossistemas florestais.
Conclusões
O estudo permitiu confirmar que para o pinheiro bravo não é adequado usar-se
valores médios deBCEF para obter estimativas de biomassa a partir de informação
do volume, independentemente das componentes em apreciação (aérea ou total). Os
valores de BCEF variam ao longo do tempo e com a qualidade da estação.
Povoamentos com maior idade e/ ou localizados em estações de melhor qualidade
tendem a apresentar valores mais baixos dos fatores. A variável altura
dominante ao traduzir em simultâneo o efeito da idade e da estação revelou ser
a variável mais interessante para modelar a variação dos BCEFs.
Os modelos desenvolvidos viabilizam a estimação indireta da biomassa florestal
(t ha-1) a partir de registos da produção em volume (m3 ha-1) e do conhecimento
da variável hd, sendo facilmente conjugáveis com modelos de crescimento e/ou
produção, como se demonstrou com o modelo de povoamento de MOREIRA e FONSECA
(2002).