Recensões
RECENSÕES
C. Sérgio, C. A. Garcia, M. Sim-Sim, Cristiana Vieira, Helena Hespanhol e Sara
Stow 2013 - Atlas e Livro Vermelho dos Briófitos Ameaçados de Portugal (Atlas
and Red Data Book of Threatened Bryophytes of Portugal). MUHNAC. Documenta.
Lisboa. 464 pp.
Jorge Capelo
Investigador Auxiliar. Herbário do INIAV, IP.
O presente livro é o maior contributo, de sempre, para o conhecimento das
espécies de briófitos de Portugal Continental. Trata-se de uma síntese
resultante de um esforço monumental de compilação e atualização do trabalho das
gerações de botânicos que estudaram este grupo de plantas, incluindo também,
com especial relevo, a própria equipa que assina a obra. Este trabalho está
primariamente orientado, com rigor e assertividade científica, para constituir
uma ferramenta de base para definir políticas de conservação consistentes com a
Convenção da Conservação da Diversidade Biológica, nos níveis regional,
nacional e global. A brioflora do continente português inclui cerca de 40% das
espécies europeias e aproximadamente 65% de todos os briófitos ibéricos, dos
quais vários são endemismos portugueses e ibéricos com estatuto de ameaça
crítico. A informação taxonómica e de distribuição geográfica, ora obtida,
permitiu determinar pela primeira vez, os estatutos de ameaça da UICN (União
Internacional para a Conservação da Natureza) relativos a 704 táxones
avaliados. Neste livro, acham-se, para além de informação sobre a biologia dos
briófitos (e nesta medida constitui também um livro de texto), informação
histórica sobre os estudos de briologia portuguesa desde o século XIX e com
destaque, uma Checklist dos briófitos de Portugal Continental. Cada um dos 141
táxones selecionados para o Atlas e Livro Vermelho tem, no livro, uma ficha
ilustrada com fotografia e mapas da distribuição conhecida, para além da
descrição morfológica, informação autoecológica, a posição que a espécie ocupa
nos ecossistemas e habitats naturais, assim como o enquadramento e estatuto nos
diplomas legais nacionais e comunitários de conservação. Para cada espécie, os
autores indicam ainda quais as ameaças e medidas de conservação a adotar. O
livro apresenta ainda uma metanálise detalhada da Checklist e do Atlas, que
inclui, por exemplo, estatísticas por categoria de ameaça UICN, distribuição
por tipos de Habitat Natura 2000, por unidades territoriais administrativas e
por fim, medidas de conservação e propostas de atuação. Os autores destacam,
nomeadamente, a conclusão pouco conhecida do público e de decisores: que as
situações mais sérias de diminuição de efetivos populacionais de briófitos
correspondem aquelas dos habitats de alta montanha em face de alterações
climáticas. As alterações rápidas de uso do solo são cotadas em segundo lugar,
nomeadamente as que derivam da expansão de floresta de produção em antigas
áreas florestais e agrícolas extensivas. A avaliação do estatuto taxonómico e
corológico (i.e., relativo à área de distribuição) nacional e em relação com a
distribuição europeia e mundial foi um trabalho aturado de revisão de toda a
bibliografia portuguesa e internacional, mas sobretudo de observação e revisão
de todo o material de herbário português, assim como de estudo de campo e
modelação ecológica espacial para colmatar as lacunas de conhecimento. O
estatuto de ameaça UICN foi determinado com base no preenchimento, pela equipa,
durante vários anos, de uma base de dados especialmente desenhada para o efeito
(base de dados BROTERO) e da análise de muitos milhares de pranchas dos
herbários portugueses analisadas criticamente. Tratando-se de verdadeiro
serviço público em prol da Conservação da Natureza, a realização de uma obra
com níveis de leitura que vão desde o científico ao compreensível pelo público
interessado, implicou por certo, dificuldades de financiamento e manutenção do
esforço científico por um período prolongado por vários anos. Estamos certos
que este esforço foi efetuado em detrimento de outras atividades mais
favoráveis à carreira profissional e científica dos autores numa época em que
os curricula, o destino profissional e a obtenção de financiamento para
projetos futuros dos investigadores, sobretudo dos mais jovens, é avaliada
estritamente pela publicação intensa de artigos com fator impacto elevado. O
'Atlas e Livro Vermelho dos Briófitos Ameaçados de Portugal' terá eventualmente
uma injusta pontuação mediana quando chegar algum momento de avaliação
contabilística dos curricula vitae dos seus autores. No entanto, certo é, que à
Ciência, à Cultura e à Conservação da Natureza, prestaram, pelo seu enorme
trabalho, um serviço de cidadania digno do maior louvor.
Av. da República, Quinta do Marquês,
2780-159 Oeiras - Portugal
silva.lusitana@inrb.pt