ESTUDO DA INFLUÊNCIA DE DIFERENTES ALIMENTOS SOBRE
CARACTERÍSTICAS DA GORDURA EM PORCOS DE RAÇA ALENTEJANA
INTRODUÇÃO
Os suínos de raça Alentejana, pelas suas
características genéticas particulares e pelas
especificidades do sistema tradicional de
exploração extensivo, com recurso aos frutos
e pastagem de montado (montanheiras), têm
sido utilizados ao longo das últimas décadas
para produção de matéria-prima altamente
valorizada pela indústria de produtos de
salsicharia, em particular para a produção de
presunto, o seu expoente mais valorizado. Este
modo de utilização contribui para a
sustentabilidade do ecossistema do montado,
devendo portanto ser mantido e incentivado,
numa óptica de preservação deste ecossistema
mediterrânico particular.
A montanheira é, no entanto, um recurso
limitado, que apenas se encontra disponível
durante uma época do ano, e ainda assim
sujeito a variações de ano para ano, o que faz
com que o produtor se depare com frequência
com a existência de um número de animais
desadequado à capacidade da montanheira de
que dispõe.
Por outro lado, nos últimos anos tem-se
verificado uma crescente preocupação por
parte dos consumidores em conhecer a origem
e o modo de produção dos alimentos,
acompanhada de um interesse cada vez maior
nas carnes ditas biológicas ou orgânicas (Cava
et al., 2001). Esta situação cria um mercado
complementar ao dos produtos transformados,
que pode constituir uma fonte de receita
adicional para o produtor.
Sabe-se que a qualidade da carne é função,
por um lado, da relação entre a idade e o peso
vivo, e tipo genético dos animais e, por outro,
da alimentação e sistema de produção a que
esses animais estão sujeitos (De Pedro Sanz
& Garcia Olmo, 2000). Por este motivo,
tivemos como objectivo do presente trabalho
conhecer o modo como diferentes alimentos
influenciam a qualidade da carne e da carcaça,
tendo também em consideração a produção de
carne fresca.
MATERIAL E MÉTODOS
Neste estudo foram testados três alimentos
complementares da alimentação em
montanheira: alimento comercial, cereal
(triticale) e mistura de cereais com bagaço de
soja (52,06% triticale + 32,46% aveia +
15,47% bagaço de soja44) (Quadro 1). Cada
alimento complementar foi distribuído de
modo a fornecer diariamente as seguintes
quantidades estimadas de Energia Digestível
(ED): 4250 kcal entre os 30 e os 40 kg de peso
vivo; aumentando posteriormente até 6800
kcal aos 60-70 kg; e diminuindo progressivamente até 4800 kcal, aos 90-100 kg de peso
vivo. Estes valores foram estimados recorrendo às tabelas de composição de alimentos
do Institut National de Recherche Agrónomique, no caso do triticale, da aveia e do
bagaço de soja, e à declaração do fabricante
do alimento comercial.
O ensaio foi delineado em dois blocos
casualizados, com três parcelas contíguas
(correspondentes às modalidades em estudo)
de 1,3 ha cada e oito animais por parcela. Os
animais, de raça Alentejana, entraram para o
ensaio com 35 kg e foram abatidos com 100
kg de peso vivo. O maneio e as condições
físicas da exploração tradicional foram, dentro
do possível, mantidos. O fornecimento diário
de alimento era feito sensivelmente à mesma
hora.
No matadouro, realizou-se a desmancha,
desossagem e pesagem de peças de 8 meias
carcaças de cada modalidade (4 de cada
parque). Registou-se o peso do tecido adiposo
subcutâneo e das banhas (cuja soma deu
origem à variável “gordura na carcaça”), assim
como a medida da espessura da gordura
subcutânea dorsal ao nível da última vértebra
torácica. De cada uma destas meias carcaças
retiraram-se também amostras de lombo
(músculo Longíssimus dorsi) e de gordura
subcutânea dorsal. Estas amostras foram
posteriormente analisadas em laboratório, com
o objectivo de quantificar os lípidos totais no
músculo L. dorsi, e os ácidos gordos no
músculo e na gordura subcutânea.
Os dados analisados referem-se aos ácidos
gordos maioritários (ácido palmítico - C16:0,
ácido esteárico - C18:0, ácido oleico - C18:1
e ácido linoleico - C18:2), que representam
cerca de 95% da massa total de ácidos gordos
(Neves, 1998).
Obtidos os dados, realizámos um estudo
da correlação entre as variáveis analisadas, e
uma análise de variância (ANOVA – 1 factor).
Utilizámos o teste de Tukey para a comparação
estatística de médias, para um nível de
confiança de 95%. O tratamento estatístico dos
dados foi efectuado utilizando o programa
informático STATISTICA, versão 6
(Statsoft©).
RESULTADOS
Os resultados obtidos apresentam-se nos
Quadros 2, 3 e 4. Da observação do Quadro 2,
podemos verificar que o coeficiente de
variação observado nos lípidos totais no lombo
foi bastante elevado (cerca de 43 %), sendo
também elevada a variação referente ao teor
de ácido esteárico no lombo (25,35 %), e ao
ácido linoleico, tanto no lombo como na
gordura subcutânea dorsal.
Observando a matriz de correlação
(Quadro 3), encontramos algumas correlações
significativas.
No que diz respeito à composição da
gordura em ácidos gordos, encontraram-se
correlações positivas significativas entre as
percentagens de ácido palmítico (C16:0) e
ácido esteárico (C18:0), tanto no músculo L.
dorsi (LD) como no tecido adiposo
subcutâneo. Verificámos também a existência
de correlações significativas de sinal negativo
entre as percentagens de ácido oleico (18:1) e
ácido linoleico (C18:2) em ambos os tecidos
analisados. Verificaram-se ainda outras correlações significativas, parecendo-nos digna de
nota a correlação negativa encontrada entre a
percentagem de ácido linoleico (C18:2) e os
indicadores quantitativos da gordura na carcaça.
Com o intuito de averiguar a influência do
tipo de alimento ingerido pelos animais sobre
as variáveis analisadas, realizámos uma análise
de variância, cujo resultado se expressa no
Quadro 4.
Encontrámos diferenças significativas
entre alimentos para a quantidade de gordura
na carcaça, em termos absolutos, assim como
para as percentagens de C18:1 e C18:2 na
gordura subcutânea dorsal. O triticale foi o
alimento que conduziu a uma maior quantidade de gordura na carcaça, tanto em termos
absolutos (Figura 1 a), como relativos (Figura
1 b), embora neste caso as diferenças não
sejam estatisticamente significativas (Quadro
4). Foi também este alimento que conduziu a
uma maior quantidade de gordura intramuscular (lípidos totais) no músculo L. dorsi
(Figura 2), ainda que as diferenças sejam não
significativas (Quadro 4).
DISCUSSÃO
Caracterização da gordura na carcaça em
termos quantitativos
O elevado grau de adiposidade da carcaça
do porco Alentejano poderá atribuir-se ao seu
carácter adipogénico (em termos genéticos),
associado ao maneio alimentar fortemente
energético na fase de engorda (Neves, 1998).
Os valores descritos na literatura para a
percentagem de gordura na carcaça (Quadro
5) são ligeiramente superiores aos obtidos no
nosso estudo, em que a média das 3 modalidades foi de 39,4%, com um valor mínimo de
36% e um valor máximo de 43,1% (Quadro
2). Para esta diferença poderão ter contribuído
os factores idade e peso ao abate, que no nosso
caso foram inferiores àquilo que é geralmente
praticado nesta raça, e também a restrição
energética a que os animais foram sujeitos,
principalmente a partir dos 70 kg de peso vivo.
Eventualmente, diferenças na metodologia de
determinação da percentagem de gordura na
carcaça também poderão explicar esta discrepância. Deve, no entanto, salientar-se que para
igual peso vivo, os animais alimentados com
triticale apresentaram, como já referimos, uma
percentagem de gordura na carcaça superior
(embora a diferença não seja significativa em
termos estatísticos).
Os valores de espessura do tecido adiposo
subcutâneo dorsal encontrados neste estudo
(4,1 cm em média) são consistentes com os
descritos por outros autores, para porco Alentejano e Ibérico (Quadro 6), tendo em conta o
peso vivo dos animais ao abate (cerca de 100
kg). A correlação encontrada entre a percentagem de gordura no peso desmanchado e a
espessura do tecido subcutâneo dorsal está de
acordo com a relação mencionada na literatura
entre este parâmetro e a totalidade da gordura
nas carcaças. A medida da espessura do
toucinho é, aliás, tomada pela sua relação
inversa com o rendimento magro das carcaças
de suíno (Pomar et al., 2000).
Da análise dos nossos resultados importa
também salientar a relação entre o teor de
gordura na carcaça e os teores de ácidos gordos, enquanto reflexo da composição alimentar (nos animais monogástricos).
Pettigrew & Esnaola (2001) salientam em
particular a relação entre alguns isómeros do
ácido linoleico (C18:2) e a deposição de
gordura, referindo-se à aparente acção anti-
lipogénica daqueles, que contribui para
carcaças mais magras. Outros autores (Lebret
& Mourot, 1998) referem que o teor de gordura
da carcaça depende positivamente do teor de
gordura da dieta e do seu grau de insaturação.
Nos nossos resultados, verificamos existir uma
correlação negativa e significativa entre a
percentagem de ácido linoleico na gordura
subcutânea dorsal e a quantidade de gordura
na carcaça, tanto em termos absolutos como
relativos. Estes resultados vão de encontro
àquilo que postulam Lebret & Mourot (1998),
ou seja, que o grau de insaturação dos lípidos
é mais baixo nos animais com mais gordura
do que nos com menos gordura, em resultado
da maior ou menor diluição dos ácidos gordos
poliinsaturados (de origem estritamente
alimentar) no seio de uma massa de lípidos de
origem endógena e exógena. O marcado
carácter adipogénico do porco alentejano leva
a que grande parte da gordura depositada tenha
origem endógena. O alimento “mistura” foi o
que apresentou menor quantidade de gordura
na carcaça e maior teor em ácido linoleico,
tanto no músculo L. dorsi como na gordura
subcutânea dorsal. Estes dados podem apontar
para um maior teor neste alimento de isómeros
anti-lipogénicos de C18:2 . No entanto, Lauridsen et al. (2005), não obtiveram resultados
significativos pela adição de ácido linoleico
conjungado (CLA) à dieta.
Características da gordura no músculo
Longissimus dorsi
Existem vários trabalhos que atestam a
diferença em termos de composição da carne
de animais de raça autóctone (Ibéricos),
criados em sistema extensivo, e da carne de
animais de raças exploradas comercialmente
em sistemas de produção intensiva (Cava et
al., 1996; Cava et al., 2001). De acordo com
estes estudos, a carne dos primeiros tem percentagens de gordura intramuscular e mioglobina superiores às dos segundos; têm uma
maior proporção de lípidos neutros e uma
menor proporção de lípidos polares; finalmente, é mais rica em ácidos gordos
monoinsaturados, em particular o ácido oleico
(C18:1).
Teor de lípidos intramusculares
As características organolépticas da carne
estão ligadas ao teor de lípidos intramusculares
(Gandemer et al., 1990, citado por Neves,
1998), estando demonstrado que o “flavour”
da carne só se desenvolve a partir de um teor
mínimo de lípidos intramusculares que, de
acordo com Sellier (1998, citado por Neves,
1998), seria de 2,5% no músculo L. dorsi. No
que respeita ao teor de lípidos intramusculares
no L. dorsi, o valor médio observado neste
ensaio (4,79%) está de acordo com os valores
encontrados por Neves (1998) em animais
desta raça: 5,28% para animais alimentados
na montanheira e 4,54% para animais alimentados com alimento comercial. No entanto,
devemos salientar que o valor por nós observado nos animais alimentados com triticale
(5,64%) foi superior a qualquer dos valores
referidos por aquele autor, enquanto que os
valores nos animais alimentados com alimento
comercial (4,51%), e nos animais alimentados
com a mistura (4,33%), foram inferiores aos
de Neves (1998). O mesmo autor refere que
teores elevados de proteína bruta na dieta
conduzem a teores de lípidos intramusculares
inferiores, como demonstram os trabalhos de
Christensen (1975) e Éssen-Gustavsson et al.
(1992). Pettigrew & Esnaola (2001) referem
também uma marcada relação entre o grau de
infiltração macroscópica de gordura intramuscular (marmoreado) e regimes alimentares
deficitários em proteína, o que pode explicar
a diferença entre o triticale (13% de proteína
bruta) e os restantes dois alimentos no nosso
ensaio.
Composição em ácidos gordos
A composição em ácidos gordos é um
factor determinante das características da
carne, que afecta directamente a qualidade dos
produtos transformados. Em particular, teores
elevados de ácidos gordos monoinsaturados
associados a baixos teores de ácidos gordos
poliinsaturados são responsáveis pela maior
resistência da gordura à oxidação (Sans et al.,
2004), permitindo, portanto, processos de cura
prolongada que caracterizam os produtos
transformados tradicionais. Por outro lado, os
compostos voláteis responsáveis pelas características aromáticas da carne têm também
origem no metabolismo oxidativo dos ácidos
gordos. Sabe-se que, no presunto curado, os
principais compostos aromáticos resultantes
da oxidação do ácido oleico (nonanal, octanal,
etc.) são responsáveis por aromas mais
agradáveis do que aqueles que são produzidos
pela oxidação do ácido linoleico (hexanal,
pentanal, etc.) (López Bote, 1999).
Do ponto de vista nutricional, o aumento
do teor de ácidos gordos saturados na dieta
está associado ao aumento das lipoproteínas
de baixa densidade (LDL) na circulação
sanguínea, e este aumento está, por sua vez,
associado ao desenvolvimento de doenças
cardiovasculares (Neves, 1998). Em oposição,
os ácidos gordos monoinsaturados reduzem a
concentração de LDL circulantes, não interferindo com a concentração de lipoproteínas
de alta densidade (HDL) (Grundy, 1986), e
estas têm aparentemente uma correlação
negativa com a incidência de patologia cardiovascular.
As diferenças, em termos médios, encontradas por alguns autores nos teores dos quatro
principais ácidos gordos no músculo L. dorsi
exibem-se no Quadro 7.
Os valores por nós encontrados (Quadro
2) são, em termos gerais, da mesma ordem de
grandeza dos referidos por estes autores. No
entanto, no nosso estudo observa-se, por um
lado, uma menor proporção de ácidos gordos
saturados, em particular do ácido esteárico
(7,81%, em média) e, por outro lado, uma
maior proporção de ácidos gordos insaturados,
que se deve sobretudo à maior proporção de
ácido linoleico (10,40%, em média). Estas
diferenças poderão dever-se ao peso dos
animais no momento do abate, que foi inferior,
no nosso caso (100 kg), ao dos estudos
referidos (115-130 kg). De facto, Almeida et
al. (1993) e Secondi (1997) (citados por Neves,
1998) observaram durante a engorda uma
diminuição gradual do teor de ácidos gordos
poliinsaturados, e um aumento relativo das
proporções de ácidos gordos saturados.
Devemos no entanto ressalvar os elevados
coeficientes de variação calculados para os
valores de C18:0 e C18:2.
Características da gordura no tecido
adiposo subcutâneo dorsal
De uma maneira geral, os factores de que
depende a composição em ácidos gordos dos
tecidos são: os teores em hidratos de carbono
e gordura da dieta, a sua composição em ácidos
gordos e a duração da engorda. Por um lado,
rações muito energéticas devido à elevada
concentração em hidratos de carbono promovem a síntese de novo de gordura, que se
caracteriza por um teor muito elevado de
ácidos gordos saturados, especialmente C16:0
e C18:0. Inversamente, a introdução de
gordura na dieta leva a uma diminuição dos
ácidos gordos saturados com aumento dos
restantes, levando a que o perfil de ácidos
gordos dos tecidos reflicta o perfil de ácidos
gordos da dieta (Cava et al., 1999). Este efeito
dá-se, por um lado, pela inibição da síntese
endógena de ácidos gordos saturados pela
ausência de substratos. Por outro lado, os
ácidos gordos da dieta, além de serem depostos
directamente nos tecidos, exercem também um
efeito regulador sobre as enzimas responsáveis
pela síntese de ácidos gordos saturados (palmítico) e sua dessaturação (em palmitoleico e
oleico), de tal modo que dietas ricas em ácidos
gordos monoinsaturados (principalmente
ácido oleico) activam a formação nos tecidos
de ácido oleico a partir do ácido esteárico; pelo
contrário, a presença de ácidos gordos polinsaturados (linoleico) inibe a formação de
ácidos monoinsaturados a partir dos saturados
correspondentes (Periago et al., 1989; Chang
et al., 1992; citados por Cava et al., 1999). A
duração da engorda influi na medida em que
os depósitos de gordura de reserva são usados
para a manutenção do animal e os ácidos
gordos vão, portanto, sendo substituídos por
outros, ingeridos ou sintetizados de novo.
A resposta do tecido adiposo subcutâneo
às alterações nos ácidos gordos da dieta é
muito lenta, já que este tecido é composto
maioritariamente por lípidos de reserva,
constituídos por triglicéridos (lípidos neutros),
cujo tempo de renovação é também ele muito
lento (cerca de 150 dias). Isto faz com que a
composição em ácidos gordos do tecido
adiposo subcutâneo reflicta a composição em
ácidos gordos do alimento ingerido muito
tempo antes do sacrifício. Pelo contrário, o
tempo de renovação da gordura intramuscular,
em particular dos lípidos polares, é bastante
menor (40-90 dias). Este facto, conjugado com
a deposição da gordura intramuscular ocorrer
em idades mais tardias do que a deposição da
gordura subcutânea, leva a que o perfil de
ácidos gordos dos lípidos intramusculares
reflicta mais a composição de ácidos gordos
da dieta no final do período de engorda (Cava
et al., 1999).
No nosso estudo, encontrámos valores
muito semelhantes entre os 3 regimes alimentares, no que respeita à composição em ácidos
gordos saturados (C16:0 e C18:0) no tecido
adiposo subcutâneo. Estes valores são consistentes com os valores referidos por diversos
autores quanto ao teor de ácidos gordos saturados em animais alimentados com alimentos
concentrados comerciais (Quadro 8).
No entanto, no que se refere ao teor em
ácidos gordos insaturados, encontrámos no
nosso estudo diferenças significativas para os
teores em ácido oleico (C18:1) e linoleico
(C18:2), sendo a gordura subcutânea dorsal
dos animais alimentados com triticale significativamente mais abundante em C18:1 e mais
escassa em C18:2. Comparando novamente
com os resultados obtidos por outros autores
com animais alimentados com alimento
comercial, verificamos que os alimentos no
nosso estudo tiveram um comportamento
semelhante ao observado por estes autores,
embora também nesta comparação os valores
do triticale sejam ligeiramente diferentes, em
particular no que se refere ao teor em ácido
linoleico.
Comparando os nossos resultados com os
de Neves (1998), verificamos que os nossos
animais apresentaram teores superiores de
ácido linoleico no músculo (Quadro 7) e teores
inferiores do mesmo ácido na gordura subcutânea (Quadro 8). Estas diferenças poderão não
ter qualquer significado, uma vez que a
literatura refere que, no que respeita a este
ácido gordo em particular, a variabilidade
encontrada em diferentes estudos é enorme, e
não está ainda claro de que modo a alimentação influencia a sua percentagem nos tecidos
do animal (Cava et al., 1999). O teor em ácido
linoleico nos tecidos dos suínos é influenciado
não só pelo tipo de alimento, como também
pela quantidade de alimento fornecido. Lopez
Bote et al. (1997) referem que, ao alimentarmos dois grupos de animais com um mesmo
alimento, sendo um grupo alimentado ad
libitum e o outro restringido, se detecta uma
maior insaturação, principalmente no que
respeita ao C18:2, no grupo que recebe
alimentação restringida. Tendo em conta que
a composição alimentar em ácidos gordos é a
mesma, esta diferença apenas se pode justificar
pela síntese de novo. Como os suínos são
incapazes de sintetizar o ácido linoleico, a sua
elevada proporção deverá estar relacionada
com a menor síntese endógena, precisamente
porque a restrição alimentar obriga a quase
totalidade da energia metabolizável ingerida
a cobrir as necessidades de manutenção. Se
tomarmos em conta o facto de que a composição da gordura intramuscular reflecte mais
a última fase da engorda, enquanto que a da
gordura subcutânea, como já foi referido,
reflecte também fases anteriores da recria do
animal, então as diferenças observadas nos
nossos resultados quanto ao ácido linoleico
parecem apontar para um efeito da restrição
severa a que os animais foram sujeitos entre
os 70 kg de peso vivo e o abate, que justificaria
que, no tecido muscular, se observassem
valores mais elevados de ácido linoleico,
enquanto que na gordura subcutânea se vissem
ainda reflectidos os efeitos de um fornecimento energético bastante acima das necessidades de manutenção do animal.
CONCLUSÕES
No que respeita à avaliação quantitativa
da gordura nas carcaças, o triticale foi o
alimento que resultou numa maior quantidade
de gordura nas carcaças, o que prejudicou o
rendimento das carcaças em termos comerciais. No entanto, e em virtude do regime de
restrição energética a que os animais foram
sujeitos, e ao peso de abate (100 kg de peso
vivo), os valores foram ainda assim inferiores
aos que se observam nesta raça, quando sujeita
ao regime de engorda tradicional (monta-
nheira), com pesos de abate superiores.
Por outro lado, este foi o alimento que conduziu a um maior teor de gordura intramuscular ao nível do músculo Longíssimus dorsi,
e também um teor mais elevado de ácido oleico
(C18:1) e um teor mais baixo de ácido linoleico (C18:2), tanto no músculo L. dorsi como
na gordura subcutânea dorsal. Estes resultados
estão associados, por um lado, a uma maior
suculência da carne, e, por outro lado, a
melhores características do ponto de vista do
aroma da carne e do ponto de vista nutricional.
No cômputo geral, pensamos que quaisquer dos três alimentos testados se adequam
aos objectivos propostos, desde que administrados sob um regime de restrição energética,
que controle a síntese endógena de lípidos
saturados. Parece-nos, no entanto, que o triticale poderá ser um alimento interessante para
os criadores que produzam animais com estes
objectivos, não só pelas vantagens que apresentou neste ensaio, mas também por ser um
alimento facilmente produzido na própria
exploração, e que por esse motivo terá possivelmente vantagens económicas para o
produtor, em particular se este estiver inserido
no modo de produção biológico.