Seleção preliminar de genótipos de pinheira em Bom Jesus-PI
INTRODUÇÃO
A pinheira (Annona squamosa L.), também conhecida como ata ou fruta-do-conde,
pertence à família Anonaceae, ao qual pertencem muitas frutíferas tropicais
nativas do Brasil (Manica, 1997) dentre as quais a pinheira destaca-se por
possuir maior expressão econômica, sobretudo nas regiões Nordeste e Sudoeste,
onde a exploração comercial está voltada principalmente para atender o mercado
de consumo in natura, através das centrais de abastecimento de diversas
cidades, além do preparo de sorvetes bastante apreciados no Nordeste Brasileiro
(Dias et al., 2003; Carvalho et al., 2000).
O cultivo da pinheira tem sido implantado nas regiões mais quentes de muitos
estados brasileiros (IBGE, 2010), porém a maioria dos produtores não dispõe de
tecnologias de irrigação, manejo de fertilizantes e, sobretudo, promovem a
implantação de plantios comerciais a partir de mudas formadas por via
seminífera, cujas sementes são obtidas de frutos oriundos da própria lavoura ou
coletados sem informações fundamentais da planta matriz, o que ocasiona
variabilidade no pomar e, consequentemente, produção de frutos sem padrão de
características físicas e químicas (Araújo et al., 1999) o que dificulta sua
comercialização.
A região sul do estado do Piauí possui relevante potencialidade para o
desenvolvimento da fruticultura (Brasil, 2006) devido às favoráveis condições
climáticas e a abundância de recursos hídricos. Dentre as frutíferas com
potencial destaca-se a pinheira, que é adaptada às condições locais, mas que,
no entanto, é carente de estudos no âmbito local, tanto no que diz respeito às
práticas adequadas de manejo, quanto à seleção de material genético de boa
qualidade, com bons atributos físico-químicos de frutos e alta produtividade.
Nesse sentido, estudos que tenham como objeto de estudo a seleção de genótipos
com características desejáveis, especialmente quanto à qualidade de frutos e
produtividade merecem destaque (Cavalcante et al., 2007), pois irão
disponibilizar informações úteis à implantação de pomares com padrão e índices
produtivos compatíveis com a exigência do consumidor brasileiro.
Assim, o objetivo deste trabalho foi avaliar a produção e as características
físicas e químicas de frutos de dez genótipos de pinheira em Bom Jesus, PI.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo foi conduzido no pomar do Campus Profª Cinobelina Elvas
(CPCE) da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Bom Jesus, PI, localizado a
09º04'28" de latitude Sul, 44º21'31" de longitude Oeste e com altitude média de
277 m. Segundo (Köeppen, 1948), o clima da região é classificado como tipo Cwa,
que corresponde a uma região tropical de altitude, com inverno seco e verão
quente e chuvoso, precipitação local média de 900 a 1400 mm/ano e temperaturas
médias de 28ºC, embora durante o ano sejam comuns temperaturas entorno de 40ºC
(Viana et al. 2002), com umidade relativa média é de 64% (INMET, 2010).
O pomar de pinheira (Annona squamosa L.) foi implantado em 2005, em Latossolo
Vermelho Eutrófico (Cavalcante, 2008), com plantas propagadas por via
seminífera, a partir de sementes oriundas de diferentes plantas espontâneas da
região sul do Piauí, constituindo uma coleção de dez genótipos, identificados
como: Gen-01, Gen-02, Gen-03, Gen-05, Gen-06, Gen-07, Gen-08, Gen-09, Gen-10 e
Gen-12. Nas plantas de todos os genótipos foi realizada poda de limpeza e
adubação em cobertura com NPK.
Adotou-se delineamento inteiramente casualizado, com tratamentos representados
por dez genótipos de pinheira e três repetições, representadas por uma planta,
das quais os frutos foram colhidos manualmente entre o início de abril e o fim
de maio, quando apresentavam ponto de colheita, caracterizado pelo inicio do
afastamento dos carpelos e coloração verde-amarelada dos tecidos intercapelares
(Araújo et al., 1999), ou seja, antes da maturidade completa.
Os frutos foram devidamente acondicionados em sacos de papel e imediatamente
conduzidos ao laboratório de Físico-Química de Alimentos onde foram
uniformizados quanto ao tamanho, quando se selecionaram quatro frutos
intermediários por repetição para realização das análises físicas e químicas,
em duplicata.
As avaliações físicas incluíram: i) diâmetros longitudinal (DL) e transversal
(DT), obtidos com paquímetro digital (0,01 mm-300 cm, Digimess®); ii) relação
DL/DT; iii) número de sementes por fruto (NSF); iv) massa de frutos (MF),
determinada em balança de precisão 0,01g; e v) produção por planta (kg planta-
1).
As avaliações químicas seguiram a metodologia descrita por (Lara et al. 1976) e
incluíram: i) teor de vitamina C (ácido ascórbico) (VIT_C) em mg 100g de polpa,
determinada pelo método de redução do iodo; ii) acidez titulável (AT), obtida
por titulação do suco com solução de hidróxido de sódio e expressa em
percentagem de ácido cítrico; iii) sólidos solúveis (SS), determinado por
refratrometria em refratômetro Abbe®; e iv) relação SS/AT, "ratio".
Os resultados foram submetidos à análise de variância (ANOVA) e comparação de
médias pelo teste de Scott-Knott realizadas a partir do software (SAS, 2002),
considerando significativo a P<0,01. Foi realizada uma análise multivariada de
agrupamento pelo método UPGMA (Unweighted Pair Group Method with Arithmetic
Average) (Sokal e Michener, 1958), usando como parâmetro de agrupamento a
distância euclidiana.
RESULTADOS E DISCUSÃO
Para os parâmetros físicos dos frutos, registrou-se significância estatística
apenas para o número de sementes por fruto (NSF), massa de frutos (MF) e a
produção por planta (PP), conforme pode ser observado no Quadro 1, enquanto
todas as variáveis químicas apresentaram diferença significativa entre os
genótipos de pinheira estudados (Quadro 2).
Quadro_1
- Valores médios de diâmetro longitudinal (DL), diâmetro transversal (DT),
relação DL/DT, número de sementes por fruto (NSF), massa de fruto (MF) e
produção por planta (PP) em dez genótipos de pinheira. Bom Jesus-PI, 2008.
Quadro_2
- Valores médios obtidos nas análises químicas de sólidos solúveis (SS),
acidez titulável (AT), relação SS/AT e vitamina C (VIT_C), em dez genótipos de
pinheira. Bom Jesus-PI, 2008.
Características físicas e de produção
Para os valores de diâmetro longitudinal e transversal, apesar da ausência de
significância estatística, houve amplitude de 1,53 cm e 2,75 cm (Quadro_1).
Independentemente do genótipo, os resultados desses parâmetros foram
compatíveis aos encontrados por (Dias et al., 2003 e Silva et al., 2007), porém
as médias gerais de DL e DT foram inferiores as de (Costa et al., 2002), que
obtiveram diâmetro longitudinal médio de 73,3 mm e transversal de 81,5 mm.
A relação DL/DT, importante para determinar o formato do fruto, é uma
característica relevante para a comercialização de frutas de mesa, pois quando
o valor aproxima-se de 1,0, os frutos são de formato arredondado,
classificando-os como frutos de qualidade para mesa, característica de especial
relevância para pinha cujo consumo quase que total é realizado na forma in
natura (Araújo Filho et al., 1998). Quanto a essa variável, os valores
situaram-se entre 0,73 e 1,09 (Quadro_1), demonstrando que os frutos avaliados
possuem o formato requerido pelo mercado.
Ainda quanto ao formato (relação DL/DT), os frutos dos Gen-01, Gen-03, Gen-06,
Gen-07, Gen-08 e Gen-09 atenderam aos padrões de classificação da Companhia de
Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP), o maior distribuidor de
frutas do Brasil. Segundo os critérios de padronização da CEAGESP os frutos de
pinha são divididos em tipo 8, 9, 12, 15 e 18, caracterizados respectivamente
por relação DL/DT de 0,91, 0,95, 0,90, 0,94 e 0,88 (Yokota, 1986, citado por
Araújo et al., 1999).
Conforme se pode observar no Quadro_1, o número de sementes por fruto (NSF)
variou de forma significativa de 11 a 47. Apesar da elevada amplitude das
médias, os genótipos possuem frutos de boas características para o consumo in
natura, visto que os resultados são drasticamente inferiores aos encontrados
por (Pereira et al. 2003), que obtiveram médias variando entre 66,23 e 84,03
sementes por fruto, e (Dias et al., 2003) que registraram de 53 a 66, (Dias et
al., 2004) com 71,5 a 80,9 sementes. Mesmo a baixa média de 37 sementes,
encontrada por (Silva et al. 2002), fica acima da média geral do presente
estudo, que ficou em 24,7 sementes por fruto.
A massa de frutos, uma importante característica para escolha de novas
cultivares, apresentou superioridade para Gen-01, Gen-02, Gen-03 e Gen-10
(Quadro_1). Comparativamente às médias de (Silva et al., 2002; Costa et al.,
2002 e Pereira et al.,2003) observa-se que os frutos de todos os genótipos do
presente trabalho são mais leves, independentemente do genótipo. (Marcellini et
al., 2003) identificou massa média de 201,42 g da pinha, portanto próxima às
verificadas nos Gen-01, Gen-02 e Gen-03.
A produção por planta (PP) seguiu a mesma tendência da massa de frutos, com
destaque para os genótipos Gen-01 e Gen-02, os únicos que ultrapassaram os 10
kg/planta (Quadro_1). Apesar da massa de frutos (MF) ter sido inferior aos
dados na literatura, a produção por planta foi bastante superior ao reportado
por (Silva et al., 2007) em estudos com diferentes progênies de pinha no Rio
Grande do Norte. Esse fato pode ser explicado pela falta de raleio dos frutos
(prática que proporciona o aumento dos frutos remanescentes, pela retirada do
excesso), fazendo com que apesar da boa produção total, os frutos fiquem
menores (Ilha, 1999).
Características químicas dos frutos
Para os resultados de sólidos solúveis (SS, em ºBrix) registrou-se variação de
33% entre os genótipos de maior (Gen-09) e menor (Gen-03) média (Quadro_2).
Conforme (Kluge et al., 2002), sólidos solúveis são compostos solúveis em água
e importantes na determinação da qualidade da fruta, pois caracterizam o sabor
adocicado, principalmente em frutíferas da família das anonáceas.
Quantitativamente, os resultados contidos no Quadro_2 são menores à média de
24,7 ºBrix obtida por (Silva et al., 2007) em estudo com progênies de pinheira
no Rio Grande do Norte, bem como aos resultados encontrados por (Pereira et
al., 2003), os quais se situaram entre 25,5 e 27,5 ºBrix. Excetuando os Gen-02
e o Gen-09, todos os demais são inferiores as médias apresentadas por (Silva,
2000), entre 21,5 e 24,5 ºBrix, mas, no entanto, compatíveis aos resultados de
(Dias et al., 2003), com médias variando de 19,7 a 21,2 ºBrix.
Os resultados do estudo realizado por (Marcellini et al., 2003) foram
superiores, apresentado média de sólidos solúveis de 27,5 ºBrix. O mesmo
trabalho demonstrou que os valores contidos no Quadro_2, quando comparados a
outras anonáceas, possuem valores menores que os da atemóia, que apresentou
30,9 ºBrix, e maiores que os da graviola, com 12,2 ºBrix.
A acidez titulável apresentou grande variação entre os genótipos, com
resultados de 0,01% (Gen-06 e Gen-08) a 0,16% (Gen-05), conforme médias do
Quadro_2. Esses resultados, para todos os genótipos estudados, estão abaixo dos
valores apresentados por (Silva et al., 2007) e da variação entre 0,22% e 0,25%
reportada por (Dias et al., 2003).
No trabalho de (Marcellini et al., 2003), a acidez titulável encontrada foi de
0,18%, apenas 0,02% maior que o valor obtido pelo Gen-05 no presente estudo,
todavia de uma forma geral, os resultados obtidos foram muito inferiores,
principalmente se comparados aos dados de outras frutas pertencentes à mesma
família, como a atemóia (0,47%) e a graviola (0,58%). De acordo com (Nascimento
et al., 1998) elevados valores de acidez titulável são importantes para o
processamento de frutos, pois reduz a necessidade de adição de componentes
ácidos artificiais, e, por outro lado, para frutos consumidos na forma in
natura baixos valores de acidez são requeridos.
Individualmente, os sólidos solúveis e a acidez titulável representam um falso
indicativo de qualidade de frutos, enquanto o "ratio" ou relação dos açúcares/
ácidos inorgânicos é um índice de qualidade dos frutos, pois ele determina o
balanço entre os sabores doce/ácido (Kluge et al., 2002). Nesse sentido,
observa-se no presente trabalho que a relação SS/AT variou significativamente
entre os genótipos estudados, registrando-se o maior valor para o Gen-08 e o
menor para o Gen-05 (Quadro_2), resultados que convergem aos obtidos por (Silva
et al., 2007). (Kimball, 1984) afirma que o "ratio" é uma variável tecnológica
de qualidade de frutos baseado na competição, entre açúcares e ácidos, pelos
locais de percepção na língua.
Quanto à vitamina C, o genótipo que apresentou melhor resultado foi o Gen-02,
com 138,55 mg/100g de polpa, sendo este, mais que o dobro do resultado obtido
no genótipo com menor média (Gen-12), resultando assim em uma grande amplitude
de dados (71,03). Se comparados à outra anonácea, a graviola, os resultados
(Quadro_2) são bastante superiores à variação de 35,60 a 38,51 mg/100g de polpa
registradas de (Sacramento et al., 2003).
O agrupamento dos genótipos realizado pelo método UPGMA (Unweighted Pair Group
Method with Arithmetic Average), usando com parâmetro de agrupamento a
distância eucliana foi elaborado a partir dos dados das análises físicas e
químicas e revelam elevada variabilidade entre os genótipos de pinheira
estudados. Ao se considerar a distância euclidiana 10 (Figura 1), os genótipos
se agruparam em sete grupos: grupo I que abrange os Gen-01 e Gen-03; grupo II
formado pelo Gen-10; grupo III que possui o Gen-02; grupo IV no qual está
inserido o Gen-05; grupo V que compreende os Gen-06 e Gen-08; grupo VI formado
pelo Gen-07 e o grupo VII no qual estão inclusos os Gen-09 e Gen-12.
Figura_1 - Diagrama de agrupamento de genótipos de pinheira, obtido através das
variáveis físicas e químicas de frutos. (Bom Jesus, PI).
Dentre os genótipos estudados, o Gen-02 e o Gen-05 foram os que apresentaram
menor similaridade, o que pode ser atribuído ao fato ambos tenham se mantido em
grupos distintos mesmo em distâncias euclidianas maiores, ao contrário do que
ocorre no grupo VII (Gen-09 e Gen-12) que demonstraram possuir características
semelhantes (Figura 1).
As variações observadas entre os resultados dos genótipos estudados estão
relacionadas à variabilidade genética, registrada na Figura_1. Enquanto as
divergências entre os dados deste estudo e os de outros autores, a exemplo
(Costa et al., 2002 e Pereira et al., 2003), elas podem ser explicadas pelo
fato da grande variação entre os genótipos usados nesse trabalho e os
utilizados pelos pesquisadores citados, bem como ao estado nutricional da
cultura e/ou as condições edafoclimáticas sob as quais os experimentos foram
conduzidos, afirmação que concorda com os resultados de (Endres, 2007) ao
afirmar que a pinheira é influenciada pela disponibilidade hídrica e déficit de
pressão de vapor, características que variam conforme a região.
CONCLUSÕES
Os genótipos foram agrupados em sete grupos, com destaque para o grupo III
(Gen-02) e grupo IV (Gen-05), que apresentaram maior variabilidade. Os
genótipos apresentam diferenças quanto às características químicas, físicas e
produtivas dos frutos. Genótipos Gen-01 e Gen-02 apresentam potencial para
instalação em plantios comerciais, pela produtividade, formato do fruto ou por
se caracterizarem fontes naturais de vitamina C. Entretanto, mais estudos são
necessários para obtenção de novos parâmetros de fenologia, fisiologia,
nutrição e propagação são necessários para obter uma nova variedade com
potencial de exploração comercial.