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EuPTCVHe0871-34132006000400004

EuPTCVHe0871-34132006000400004

National varietyEu
Country of publicationPT
SchoolLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0871-3413
Year2006
Issue0004
Article number00004

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Osteoporose Induzida por Corticóides

INTRODUÇÃO A osteoporose é uma doença óssea sistémica que se caracteriza por alterações da quantidade e da qualidade do osso, as quais condicionam diminuição da resistência e aumento da fragilidade ósseas, predispondo a maior risco de fractura (1-3).

Os corticoesteróides (CT) são fármacos amplamente utilizados, pelas suas conhecidas propriedades antiinflamatórias e imunossupressoras, no tratamento de diversas patologias, tais como as doenças reumatológicas, auto-imunes, respiratórias e no processo de transplantação de órgãos. No entanto a administração de CT produz alterações no processo fisiológico de remodelação óssea, conduzindo a uma diminuição da massa mineral óssea e consequente aumento da incidência de fracturas (4-6).

A osteoporose induzida por corticóides (OPIC) constitui a causa mais frequente de osteoporose secundária, correspondendo a cerca de 25% de todas as causas de osteoporose. Metade dos doentes que realizam corticoterapia, por mais de seis meses, têm osteoporose e cerca de 1/3 desenvolve fracturas, se o tratamento se prolongar por 1 ano (7). As fracturas osteoporóticas vertebrais e dos ossos longos são causa de morbilidade e associam-se a diminuição da esperança média de vida em idades avançadas (1). Alguns autores constataram uma incorrecta aplicação das recomendações internacionais para a prevenção da OPIC (8-14).

FISIOPATOLOGIA Os mecanismos pelos quais os CT conduzem a uma diminuição da massa mineral óssea são multifactoriais (Tabela 1) (15). Os CT provocam um desequilíbrio no metabolismo de remodelação óssea normal, aumentado a reabsorção e diminuindo a formação (16-18).

Uma das consequências clássicas do tratamento com CT é a redução do número e da função dos osteoblastos (16,18,19), influenciando, directamente, os processos de síntese, replicação e apoptose celular (20). Além disso, inibem a produção pelo osso de factores de crescimento, como o insulin-like growth factor 1 (IGF-I) e o transforming growth factor β (TGF-β) que têm actividade anabólica sobre o tecido ósseo (7,15,21).

Os CT reduzem a produção de hormonas sexuais (estrógenios e andrógenios), actuando, directamente, a nível das gónadas ou, indirectamente, inibindo a produção de gonadotrofinas (hormona folículo estimulante - FSH e hormona luteinizante - LH) (19). Os CT inibem, também, a secreção da hormona adenocorticotrófica (ACTH) pela hipófise, conduzindo à atrofia das glândulas supra-renais e à diminuição da produção de estrona, dehidroepiandrosterona e androstenediona, hormonas anabólicas com importante papel na OPIC (7,15,16,17,18).

A nível metabólico, os CT são, ainda, responsáveis pela diminuição da absorção intestinal e da reabsorção tubular renal de cálcio. Os mecanismos pelos quais produzem uma diminuição da absorção intestinal de cálcio são motivo de alguma discussão. No entanto, parecem associados a uma diminuição do transporte intestinal deste ião e a uma resistência à vitamina D, uma vez que a administração desta vitamina não repõe a normalidade metabólica iónica (16,22).

O aumento da excreção renal de cálcio, associado à menor absorção intestinal deste ião, produz uma diminuição do cálcio sérico. A diminuição deste ião é o principal estímulo para a secreção de paratormona (PTH) pelas glândulas paratiróides, conduzindo a um estado de hiperparatiroidismo secundário (16,17). Estudos in vitro têm demonstrado que os CT aumentam a expressão dos receptores de PTH em osteoblastos (23) e potenciam a sensibilidade destas células a essa hormona; desta forma os osteoblastos actuam como mediadoras principais no aumento de reabsorção óssea induzida pela PTH (24).

O sistema constituído pelo receptor activador do factor nuclear - kappaB (RANK), RANK ligando (RANKL) e osteoprotegerina (OPG) parece desempenhar um papel fundamental na fisiopatologia da osteoporose (1). O RANK ligando (RANKL) é uma proteína transmembranar produzida pelos osteoblastos que, ao ligar-se ao receptor RANK existente nos percursores dos osteoclastos, transmite um sinal que induz a sua diferenciação em osteoclastos, potenciando assim a reabsorção óssea. A osteoprotegerina (OPG) é um receptor solúvel, secretado pelas células pré-osteoblásticas (21), que ao ligar-se ao RANKL, impede a ligação deste ao RANK, inibindo por isso a osteoclastogénese (1).

Os CT produzem uma supressão da síntese de OPG e um aumento de RANKL, estimulando a osteoclastogénese (7).

Finalmente, os CT exercem importantes efeitos secundários sobre o músculo, produzindo debilidade e fadiga muscular. Estes efeitos diminuem as forças de carga músculo-esquelética responsáveis pela estimulação da remodelação óssea fisiológica (16,19).

DOSE DE RISCO As doses de CT diárias e cumulativas, e o tempo de duração do tratamento são factores muito importantes na patogénese da osteoporose (7,25,26,27).

A perda de massa mineral óssea ocorre, mais intensamente, a nível do osso trabecular (6,15,17), quantificada em cerca de 10 a 20% nos primeiros 3 meses de tratamento, seguida de uma perda mais lenta de cerca de 2% por ano. A nível do colo do fémur o ritmo de perda de massa mineral óssea ocorre mais lentamente, estimando-se em cerca de 2-3% no primeiro ano (7).

Actualmente, não está completamente esclarecido se existe uma dose mínima de CT que seja, simultaneamente eficaz e segura para o tecido ósseo (7,25).

Alguns autores determinaram uma dose de 5mg de prednisolona por dia (ou equivalente) como limite inferior de dose deletéria para a homeostasia metabólica normal da remodelação óssea (7). No entanto, num estudo retrospectivo, Van Staa et al documentaram um aumento do risco relativo de fractura vertebral para doses inferiores a 2,5 mg por dia de prednisona (4) e do risco relativo de fractura do colo do fémur para doses superiores a 2,5 mg por dia.

Os CT orais aumentam o risco relativo de fractura do colo do fémur de forma independente dos habituais factores de risco (idade, peso, densidade mineral óssea, doença de base). Alguns estudos documentam maior risco de fractura em populações que realizam corticoterapia, mesmo para valores de densidade mineral óssea (DMO) idênticos ou mais elevados (7,25).

Continua por esclarecer se outras vias de administração de CT, como a via inalatória, apresentam os mesmos efeitos e motivam semelhante preocupação no sentido da prevenção da OPIC. No entanto, parece seguro que as aplicações tópicas de CT não causam alterações significativas da DMO (7,16,25).

IMPORTÂNCIA E INTERPRETAÇÃO DA DENSITOMETRIA ÓSSEA A Densitometria Óssea por absorciometria radiológica de dupla energia (DEXA) é, actualmente, o método mais importante de avaliação diagnóstica e terapêutica na osteoporose (1,3,7,28).

A DEXA determina habitualmente o valor da DMO a nível da coluna lombar, que é representativa do osso trabecular, e a nível do colo do fémur, representativo do osso cortical. Estes são os locais de eleição para avaliação da DMO, uma vez que representam as alterações quantitativas da DMO nos dois tipos de osso e constituem duas das localizações de maior prevalência de fracturas associadas a osteoporose. O valor da DMO é expresso em g/cm2.

O valor da DMO do indivíduo é comparado com o valor médio de DMO de uma população saudável de adultos jovens, da mesma raça e sexo no pico de massa óssea e, desta relação, obtém-se o score T que se expressa em desvios padrão (DP).

Quanto menor a massa mineral óssea maior o risco de fractura; o risco duplica aproximadamente, por cada unidade de score T que diminui (2).

Em 1994, um grupo de estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendou uma classificação densitométrica de osteoporose baseada no valor do score T (Tabela 2) (1,3,6,7,21,28,29).

Esta definição encontra-se validada, apenas para a população de mulheres pós-menopausa, caucasianas, pelo que a sua aplicação em homens, outros grupos étnicos ou crianças deve ser motivo de grandes reservas (28).

Outro score, designado por Z, obtém-se através da comparação do valor da DMO do indivíduo com a média de um grupo saudável da mesma idade, sexo e etnia.

Valores de score Z abaixo de -2,0 DP estão muitas vezes relacionados com causas secundárias de perdas de DMO (3,30). O score Z deve ser utilizado na avaliação das crianças e adolescentes que ainda não atingiram o pico de massa óssea (1). Este score pode, ainda, ajudar a caracterizar melhor determinados grupos de risco com idades superiores a 70 anos de idade (28). As variações deste score estão também associadas a um risco relativo de fractura óssea. Um valor de score Z de -1,0 significa uma probabilidade 2 vezes maior de fractura, durante a vida, e se for de -2,5 significa uma probabilidade 4 vezes superior (2,28).

ABORDAGEM DOS DOENTES QUE RECEBEM CORTICOTERAPIA CRÓNICA Os doentes que recebem, ou vão receber, tratamento com CT, por mais de 3 meses, devem ser avaliados, através de uma história clínica adequada quanto aos principais factores de risco de osteoporose, devem, também, sempre que se justifique, realizar exames bioquímicos para avaliar o metabolismo ósseo e excluir outras causas de osteoporose secundárias (1,7,31). A tabela 3 resume os principais exames bioquímicos com interesse neste tipo de patologia (1,3,7,31).

Alguns autores recomendam a realização de uma densitometria óssea no início do tratamento com CT crónico (7,32), considerando que o resultado da avaliação da densidade mineral óssea nestes doentes pode justificar a introdução de bifosfonatos na prevenção e tratamento da OPIC (7).

Os doentes tratados com CT mostram maior tendência para sofrer fracturas múltiplas que outros doentes com osteoporose involutiva ou pós-menopáusica, tendo em conta valores semelhantes de DMO, ou mesmo valores de DMO superiores (7,25,32).

Neste sentido, alguns grupos defendem um valor de limiar mais elevado de score T como indicativo de início de tratamento farmacológico com bifosfonatos (Tabela 4) (7,25,26,32).

O papel da DEXA na monitorização terapêutica ainda não foi, claramente estabelecido (25). Em alguns doentes pode ser conveniente repetir a avaliação da massa mineral óssea por DEXA anualmente, ou bianualmente, para avaliar quer os efeitos deletérios dos CT, quer a eficácia dos tratamentos aplicados na prevenção da OPIC (7,26,32). Segundo alguns autores, a realização de densitometrias ósseas seriadas pode constituir um reforço à adesão terapêutica quando os resultados atingem as expectativas (1,7).

PREVENÇÃO E TRATAMENTO DA OSTEOPOROSE INDUZIDA POR CORTICÓIDES A prevenção e o tratamento da OPIC envolvem medidas gerais e farmacológicas.

É fundamental corrigir os factores de risco modificáveis de osteoporose (evitar o tabagismo e o consumo excessivo de álcool), adquirir hábitos dietéticos saudáveis que assegurem uma ingestão adequada de cálcio e vitamina D e realizar exercício físico regular e programado (7,25,26,31).

Os CT devem ser utilizados com ponderação, na menor dose eficaz, pelo menor período de tempo necessário e, sempre que possível, em preparações tópicas (25,31).

Os doentes medicados com CT prolongada (mais de 3 meses) devem iniciar terapêutica com cálcio e vitamina D no sentido de prevenir o aparecimento de OPIC (7,25,26,31).

Os bifosfonatos são fármacos adequados na prevenção e tratamento da OPIC e poderão ser iniciados quando os valores de cut-off da DEXA forem inferiores aos aconselhados pelos grupos referidos anteriormente (Tabela 4) (7); o seu efeito aumenta comprovadamente a massa mineral óssea na coluna e no fémur e diminui a incidência de fracturas ósseas (7, 25).

Segundo alguns autores a calcitonina pode ser uma alternativa terapêutica aos bifosfonatos nos doentes com perda de massa mineral óssea que realizam CT crónica, especialmente nos casos em que os últimos se encontram contra-indicados ou mal tolerados (3,7). No entanto, os estudos realizados sobre os efeitos da calcitonina na prevenção da OPIC foram inconsistentes e não revelaram redução do risco de fracturas ósseas (25,32).

Não existem muitos estudos sobre a utilidade da terapia hormonal de substituição em doentes medicados com CT crónica e não foi comprovada a redução da incidência de fracturas ósseas nestes doentes (3,7,25).

Contudo, tem sido recomendada a sua utilização no contexto do hipogonadismo no sexo masculino e da pósmenopausa no sexo feminino (3,7,31,32).

Os moduladores selectivos dos receptores dos estrogénios não foram suficientemente estudados nos doentes que realizam CT crónica (7,25,32).

O flúor aumenta a massa mineral óssea a nível da coluna nos doentes medicados com CT crónica, mas não o faz a nível do colo do fémur, nem reduz a incidência de fracturas, pelo que não se recomenda a sua utilização na prevenção ou tratamento da OPIC (7).

Finalmente, o fragmento 1-34 da PTH humana aumenta a densidade mineral óssea na coluna lombar e no colo do fémur, mas ainda não foi confirmada a redução da incidência de fracturas nos doentes medicados com CT crónica.

CONCLUSÃO

A OPIC corresponde a cerca de 25% de todas as causas de osteoporose. Metade dos doentes que realizam corticoterapia, por mais de seis meses, têm osteoporose e cerca de 1/3 desenvolve fracturas se o tratamento se prolongar por 1 ano (7). Alguns autores constataram uma aplicação incorrecta das recomendações da prevenção da OPIC (8-14).

A DEXA é, actualmente, o método gold standard na avaliação diagnóstica e terapêutica da osteoporose (1,3,7,28,30).

A aplicação da definição densitométrica de 1994 da OMS a populações diferentes do grupo de mulheres pósmenopáusicas é motivo de discussão e reserva (28).

Os CT orais aumentam o risco relativo de fractura do colo do fémur de forma independente dos habituais factores de risco e os doentes tratados com CT mostram maior tendência para sofrer fracturas múltiplas que outros doentes com osteoporose involutiva ou pós-menopausa (7,25).

Neste doentes é fundamental corrigir os factores de risco modificáveis de osteoporose, adquirir hábitos dietéticos saudáveis, realizar exercício físico regular e receber tratamento farmacológico com suplementos de cálcio e vitamina D no sentido de prevenir o aparecimento de OPIC (7,25,26).

Nos doentes que realizam corticoterapia crónica, alguns grupos (25,26) defendem um valor de limiar mais elevado de score T como indicativo de início de tratamento com bifosfonatos (score T<-1,0 e score T<-1,5). Nestes doentes poderá ser importante a valorização do score Z, possibilitando a identificação de eventuais perdedores rápidos de DMO.


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